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Nossas considerações

No documento Chapter Details - Blucher Open Access (páginas 45-48)

Os resultados de pesquisas anteriores evidenciam problemas provocados pelo ensino que enfatiza tarefas que associam a concepção parte-todo mobili- zando representações de figuras planas, que são resolvidas pela técnica da dupla contagem das partes.

Com base nessa constatação, decidimos elaborar uma Organização Mate- mática que considerasse as demais concepções de números fracionários, além de relações entre essas concepções. Identificamos, também, em um estudo episte- mológico, as tarefas que estão na gênese do ensino dos números fracionários, procurando as concepções associadas e possíveis relações entre elas. Estes estudos foram usados como suporte para a formação dos professores do Ensino Funda- mental engajados em nosso projeto de pesquisa, nesta fase, que tratou do ensino e aprendizagem de fracionários na quinta série.

Nossos estudos mostraram que na Antiguidade a necessidade de medições de terras pelos administradores do estado fez emergir os números fracionários e, consequentemente, a exigência de registros e de cálculos com os resultados das medições.

Surge, assim, a figura do escriba e a demanda de uma escola para formar escribas que impõe a elaboração de praxeologias didáticas com tarefas de diver- sos tipos e técnicas que as resolvam com o intuito de ensinar os conhecimentos necessários para se formar um escriba.

Com o crescente desenvolvimento das sociedades e novas formas de orga- nização, os estados passaram a ter necessidade de preparar jovens aos cursos de Engenharia e para as Academias Militar e da Marinha, fazendo com que alguns tratados fossem editados e utilizados durante muito tempo para esses fins.

Posteriormente, as mudanças sociais ocorridas dão um novo lugar à criança e levam ao surgimento de um novo tipo de escola, especialmente para elas, as escolas de primeiras letras, que em determinado momento instituíram o ensino de Matemática nessas escolas.

No entanto, as referências para cumprir tal exigência baseiam-se nas publica- ções já existentes, os tratados matemáticos, que salvo algumas pequenas mudan- ças mantêm sua essência. No estudo, que realizamos, percebemos que os tipos de tarefas utilizados no ensino de fracionários sofreram poucas alterações, enquanto houve um avanço, não antes visto, no discurso tecnológico-teórico, promovido sobretudo pelo desenvolvimento da Álgebra.

As discussões a respeito do ensino e da aprendizagem passaram pela reforma da Matemática Moderna e culminaram com o surgimento da Didática da Mate- mática nos anos 70 do século XX, que se justificam, pelo menos, pela constatação de que não é possível ensinar da mesma forma crianças que entram na escola para uma educação geral e “crianças” que entravam na escola para ingressar em uma carreira militar.

A necessidade primordial da escola de primeiras letras seria, então sua ade- quação aos novos níveis de escolaridade, a seus objetivos e ao aluno que nela está presente. Vivemos, hoje, um momento semelhante, por motivos diferentes, um deles, evitar a evasão escolar.

O ensino de fracionários, em sua gênese, apresenta, tanto a concepção de operador quanto a concepção parte-todo associada à resolução de tarefas que solicitam a mobilização da concepção de medida, quociente e razão. A concep- ção parte-todo com vida própria no ensino de fracionários, desvinculando-se da submissão a outras concepções, é orientação recente do ensino, em termos histó- ricos, sendo mobilizadas em tipos de tarefas que não aparecem nos primórdios da construção do campo dos números fracionários. Provavelmente, porque as necessidades práticas do ensino anteriormente realizado não eram pertinentes ao ensino das crianças.

A inserção no contexto escolar do ensino de fracionários baseado na concep- ção parte-todo e apoiado na contagem, parece-nos um movimento no sentido de

auxiliar a criança no aprendizado dos novos números, utilizando seus conheci- mentos dos números naturais.

No entanto, não se levou em conta consequências, como, a discretização do contínuo e o domínio de validade restrito que esse enfoque propicia. Da mesma forma não podemos dizer que antes o ensino fosse mais significativo, porque a presença de tarefas cuja resolução conduz a respostas que não fazem sentido na realidade em que a tarefa apresenta-se vem desde a Antiguidade.

Vimos que a história do desenvolvimento do ensino e do estudo dos núme- ros fracionários tem um marco importante no século XVI com a possibilidade da mudança de registro da escrita fracionária à escrita decimal e todo o desen- volvimento posterior das estruturas algébricas com operações e propriedades bem definidas.

Estes desenvolvimentos teóricos acabam por afastar o ensino de fracionários de situações que pudessem lhes dar algum sentido ou mostrar sua razão de ser para privilegiar definições, como vimos no estudo anterior de terminologia e sig- nificados, do tipo: “fração é divisão” ou “fração é o quociente de dois números” ou “razão é divisão”, entre tantas outras.

Se nosso interesse é fazer com que as crianças construam o conceito de nú- mero racional, então, podemos entender que precisamos levá-las a construir os conhecimentos necessários para conceituar esse objeto matemático. Assim, enten- demos que o estudo da gênese dos números fracionários mostra, como pode ser visto no esquema da Figura 7, que tipos de tarefas que associam a concepção de medida e que se associam diretamente ou mobilizam em suas técnicas as concep- ções parte-todo, razão e operador permitem a construção do conhecimento de medida relacionado aos números fracionários.

Da mesma forma, os tipos de tarefa que associam a concepção de quociente e de razão permitem construir os conhecimentos de comparação e de distribuição relacionados a esses números. Os conhecimentos de medida, comparação e distri- buição permitem a percepção da razão de ser dos fracionários que relacionados facilitariam a construção do conceito de número racional pretendido.

No entanto, como nosso objetivo é trabalhar com a quinta série não pode- mos esquecer que os alunos dessa série possuem conhecimentos anteriores de nú- meros fracionários que, provavelmente, foram desenvolvidos baseados somente na concepção parte-todo.

Por isso, trataremos dessa concepção em nossa Organização Matemática e, também, da concepção de operador, visto que esta auxilia na conceituação dos fracionários como números.

Figura 7 – Esquema da conceituação de números racionais.

Falamos de conceituar números racionais por entender que a conceituação de números fracionários concretizar-se-á no ensino médio com a relação do con- ceito de número racional já construído com outros conhecimentos como o de frações algébricas, números complexos, polinômios, etc. que permitirão formar o campo conceitual13 do sujeito para números fracionários.

De acordo, com Artigue (1990), uma análise histórica e ou matemática au- xilia na definição do conjunto de problemas significativos e operatórios na cons- trução de processos didáticos. Nesse sentido, apresentaremos, a seguir, uma Or- ganização Matemática que considera os estudos feitos anteriormente, além das concepções de fracionários e alguns resultados de pesquisa que utilizaremos como referência para a formação dos professores.

3 Uma organização matemática para a formação

No documento Chapter Details - Blucher Open Access (páginas 45-48)

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