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Levando em conta a proposta de Bosi (2003, p.50) segundo a qual os dois grandes níveis para definir o método de um trabalho científico são a orientação geral da pesquisa e o procedimento, ou sua técnica particular, neste capítulo nos propomos a oferecer o grupo de referências que constitui a “tendência teórica” que guiou o trabalho, desde a aproximação inicial com o objeto, até a interpretação final dos dados.

Nosso objeto de estudo, o espaço discursivo da responsabilidade social empresarial, é marcado pela convergência de diferentes referenciais teóricos, dos quais destacamos os três aspectos, que surgem entrelaçados, e que consideramos especialmente relevantes para discuti- lo, buscando, em cada um deles, autores cujas proposições e teorias nos oferecessem elementos capazes de ampliar o entendimento do objeto e do tema estudados.

O primeiro aspecto, uma vez que se trata de um discurso sobre o social, refere-se à sociedade e às esferas pública e privada, com foco nas questões relativas à cidadania e à democracia. Para tratar dessas questões, trabalhamos com textos de Hannah Arendt, trazendo a discussão para o contemporâneo e a realidade brasileira com textos de Florestan Fernandes, Milton Santos, Boaventura de Sousa Santos, Evelina Dagnino, entre outros.

O segundo refere-se à mídia, ao marketing e publicidade e ao consumo, tanto do ponto de vista da comunicação com o mercado, quanto da crítica ao consumo e ao simulacro da sociedade atual. Essas questões serão discutidas a partir dos textos de Guy Debord, Marilena Chauí e Nestor Garcia Canclini.

O terceiro refere-se ao mundo do trabalho e, num sentido mais amplo, ao momento atual do capitalismo, no qual foram trabalhados, sobretudo, textos de Richard Sennett.

Como lembra Bosi (2003, p.50), a escolha desses referenciais delimita um caminho, uma visão preliminar do objeto a ser estudado, uma vez que várias outras referências possíveis foram deixadas de lado. Nesse sentido, tendo em vista a escolha de um enfoque dialético, deixamos de lado, a partir da orientação da banca de qualificação, trabalho de Michel Foucault. Não passamos, contudo, imunes à leitura de seus textos, cujas teorias parecem ressoar na análise do espaço discursivo das empresas (como referência metodológica, que será apresentada adiante, o autor retorna como um dos referenciais da análise de discurso de linha francesa). Não pareceu prudente, mantê-lo como referência fundamental num trabalho que pretendia privilegiar autores que trabalham numa perspectiva dialética e não apenas a determinação, como Foucault faz de maneira irretocável, mas também

movimentos que negam essa determinação. Como lembrou o professor Paulo de Salles Oliveira, na banca de qualificação, o real sempre produz determinações, mas, ao mesmo tempo, recusas e contradições, elementos fundantes em qualquer interpretação dialética.

Vita activa

Hannah Arendt (2004, p.15-20) utiliza a expressão vita activa para compreender três atividades humanas fundamentais: o labor, atividade relacionada ao processo biológico de sobrevivência do indivíduo e da espécie, e cuja condição humana é a própria vida; o trabalho, que corresponde à produção de um mundo “artificial”, cuja condição humana é a mundanidade e o produto, o artefato humano, e empresta certa permanência e durabilidade à vida mortal e ao caráter efêmero do tempo; e a ação, única atividade exercida (que se exerce) diretamente entre os homens, sem mediação das coisas ou matéria, cuja condição humana é a pluralidade e, na medida em que se empenha em fundar e preservar corpos políticos, cria condição para a lembrança e para a história. A ação relaciona-se à condição humana de natalidade, como capacidade de criar algo novo, de agir. A condição humana e a objetividade do mundo complementam-se reciprocamente. A autora ressalta, contudo, a distinção entre condição humana e natureza humana, o que somos, pois as condições da existência humana – a própria vida, a natalidade e a mortalidade, mundanidade, pluralidade e o planeta Terra – não dão conta de explicar o que somos, jamais nos condicionam de modo absoluto.

Arendt (2004, 20-26) utiliza o termo numa acepção distinta da visão tradicional, que desde os gregos percebe a ação como subordinada à contemplação (theoria), colocando em xeque a hierarquia proposta, sob a premissa de que a ênfase na contemplação obscureceu as características da vita activa e que esta não é superior nem inferior à vita contemplativa.

Para ilustrar os dois princípios, de ação e de pensamento, Arendt (2004, 26-30) usa a diferença entre imortalidade e eternidade. A luta pela imortalidade, que é o modo de vida do cidadão (bios politikos), relaciona-se à sua capacidade de produzir obras, feitos e palavras que possam pertencer à eternidade. A experiência do eterno, por sua vez, não corresponde a qualquer tipo de atividade, nem mesmo o pensamento (bios theoretikos). A queda do Império romano e a promoção do evangelho cristão decretaram a vitória da idéia de eternidade, tornando vita activa e bios politikos servos da contemplação; situação que, segundo a autora, não foi alterada na era moderna.

A autora (2004, p.31-37) prossegue dizendo que as três atividades componentes da vita activa são condicionadas pelo fato dos homens viverem juntos, mas a ação é a única que

não pode ser imaginada fora da sociedade dos homens, uma relação que justifica a tradução do zoon politikon como animal socialis, que aparece em Sêneca e até Tomás de Aquino e foi aceita como consagrada. Ressalta, contudo, que são conceitos distintos, pois a palavra “social” é de origem romana e não tem equivalente em grego, cujo termo societas significa aliança para fins específicos. Só com o conceito romano de societas generis humani “sociedade da espécie humana” é que o termo social começa a adquirir o sentido geral de condição humana fundamental. Para os gregos, essa era uma condição próxima dos animais, imposta pelas necessidades da vida biológica, centrada na casa (oikia) e família, e oposta à organização política. Para Aristóteles, só duas atividades constituíam o bios politikos: a ação (práxis) e o discurso (lexis), das quais surge a esfera dos negócios humanos, que exclui tudo que seja apenas necessário ou útil. As ações políticas incluem o ato de encontrar as palavras no momento certo, independente da informação ou comunicação que transmitem e, na experiência da polis, a ênfase passou da ação para o discurso. Ser político, viver na polis, significava tudo decidir por palavras e persuasão.

Arendt (2004, p.37-47) lembra, ainda, que a ascensão da esfera social é um fenômeno que coincidiu com o surgimento da era moderna e encontrou sua forma política no estado nacional. Por não ser pública nem privada, e de certa forma sobrepor-se a elas, borrou a divisão entre essas esferas, dificultando a distinção entre atividades pertinentes a um mundo comum e atividades pertinentes à manutenção da vida. Para Arendt, a linha divisória é difusa, por percebermos os corpos de povos e comunidades políticas como “uma família cujos negócios diários devem ser atendidos por uma administração doméstica geral e gigantesca”. (p37) Nesse sentido, o termo “economia política” seria, para os antigos, uma contradição, pois o que fosse “econômico”, relacionado com a vida individual e sobrevivência da espécie, não era assunto político, mas doméstico por definição. A autora ressalta não negar que o estado nacional e sua sociedade tenham surgido no feudalismo, onde família e casa tinham muito mais importância do que entre os antigos, mas destaca que a casa real e os senhores feudais organizavam-se como pares e não como uma família. Historicamente, portanto, é provável que o surgimento da cidade-estado e esfera pública tenha ocorrido em detrimento da esfera privada da família. Mas a antiga santidade do lar, maior na Grécia clássica do que na Roma antiga jamais foi inteiramente esquecida. O respeito pelos limites da casa não se relacionava, no entanto, à propriedade como a entendemos, mas pelo fato de que ser dono de uma casa significava ter um lugar no mundo e, portanto, poder participar dos negócios mundanos. Chama a atenção, nesse aspecto, o fato de que cidadãos eram obrigados por lei a dividir a

colheita, mas tinham propriedade absoluta de seu pedaço de terra, pois como destaca a autora, eram dois tipos de propriedade completamente diferentes.

A esfera familiar era movida por necessidades e carências, e unida pela própria vida, cuja manutenção era obtida individualmente pelo labor do homem no suprimento de alimentos e, pelo labor da mulher, no parto. A esfera da polis, por sua vez, era a esfera da liberdade, sendo que a superação das necessidades na vida em família era condição para alcançar a liberdade da polis. A força e violência, atos pré-políticos, eram justificadas na esfera privada, do lar, por serem os únicos meios de vencer a necessidade e alcançar a liberdade. Um homem livre e pobre preferia a insegurança de um mercado de trabalho, a trabalho regular garantido (considerado servidão), que restringia a liberdade de fazer o que quisesse a cada dia. Trabalho árduo e penoso era preferível à vida tranqüila de alguns escravos domésticos.

A autora afirma que a família era o centro da mais severa desigualdade, enquanto a polis só reconhecia iguais, que não obedeciam nem mandavam. Essa igualdade da esfera política tem, contudo, pouco a ver com o conceito contemporâneo de igualdade, pois significava estar entre pares e supunha desiguais (em maior número) para sustentá-la, não se relacionando com a justiça como nos tempos modernos. Era a própria essência da liberdade, que significava estar isento da desigualdade presente no ato de comandar, e mover-se numa esfera sem governo nem governados.

No mundo moderno, a política é apenas uma função da sociedade, sendo ação, discurso e pensamento superestruturas assentadas no interesse social.

A promoção do social

De acordo com Arendt (2004, p.47-59) para os antigos a esfera privada referia-se a se privar de alguma coisa, até mesmo das mais altas capacidades do homem. O enriquecimento dessa esfera, com o moderno individualismo, transfigurou essa visão, fazendo com que ela passasse a ser percebida não como o oposto da esfera política, mas da social – com a qual tem laços autênticos e mais estreitos. A autora lembra que o primeiro explorador e teorista da intimidade foi Rousseau que, com os românticos, promoveu uma rebelião do íntimo contra o social, não pelo princípio de igualdade, mas pelo fato de a sociedade exigir comportamento similar ao de uma grande família. Na sociedade, a força do interesse comum replicado acaba dispensando o homem que o representa, resultando no fenômeno do conformismo, característico da última fase dessa evolução moderna.

A sociedade passa a excluir a possibilidade de ação – algo antes exclusivo do lar doméstico – em todos os níveis, inicialmente pela imposição de regras de comportamento, até chegar, após séculos de desenvolvimento, à sociedade de massas, na qual a esfera do social atingiu o ponto que abrange e controla, igualmente e com igual força, todos os membros de determinada comunidade (ARENDT, 2004, p.50).

A igualdade moderna é, portanto, baseada no conformismo, com a ação sendo substituída pelo comportamento como principal forma de relação humana. O conformismo, suposição de que homens se comportam ao invés de agir em relação uns aos outros, está na base da moderna ciência da economia, que nasceu com a sociedade e tornou-se a ciência social por excelência, junto com seu principal instrumento, a estatística. Arendt (2004) lembra que, por trabalhar com grandes números e flutuações, a estatística descarta feitos e eventos, de forma que quanto maior a população tem-se maior validade e menos “desvios”, aumentando a probabilidade de que o social ocupe o lugar do político na constituição da esfera pública.

A autora ressalta que o moderno tratamento matemático da realidade, com grandes números justificando o conformismo, o behaviorismo e o automatismo nos negócios humanos carrega a “triste verdade” (referindo-se especialmente às “leis” behavioristas) de que quanto mais pessoas existem, maior é a possibilidade de que se comportem e menor de que tolerem o não-comportamento. Com o declínio da flutuação, feitos não conseguem conter a maré do comportamento e eventos perdem importância. Arendt (2004, p.53) afirma, portanto, que a uniformidade estatística, portanto, o ideal político, não mais secreto, de uma sociedade que, submersa na rotina do cotidiano, aceita pacificamente a concepção científica relativa à sua própria existência.

A substituição da ação pelo comportamento, evidenciada pelas “ciências do comportamento”, vai além dos padrões econômicos e pretende reduzir o homem ao nível de um animal de comportamento condicionado. Indicam o estágio final da vitória da sociedade com a “conduta social”, promovida a modelo de todas as áreas da vida. O processo vital passa a ser tratado em escala mundial na esfera pública, fato evidenciado pela conversão de todas as comunidades do mundo em assalariados e operários voltados para o labor. Mesmo que não sejam operários de fato, consideram o que fazem primordialmente como modo de garantir a própria subsistência e a vida de suas famílias. Contra esse crescimento da esfera social, que devora as demais, a intimidade, por um lado, e a política, por outro, se mostram impotentes. O antes obscuro labor (ligado entre outras coisas às dores do parto) adquiriu uma excelência anônima, mas a capacidade de discurso e ação perdeu muito de sua antiga qualidade, desde

que a esfera social ascendente os baniu para a esfera do íntimo e do privado. A crítica a esse fato repousa, contudo, numa possível mudança psicológica do ser humano – padrões de comportamento – e não numa mudança do mundo que habitamos. Essa é uma interpretação psicológica, que parece duvidosa para a autora, uma vez que nenhuma atividade pode se tornar excelente, se o mundo não proporciona espaço para que seja desenvolvida. “Nem a educação, nem a engenhosidade, nem o talento podem substituir os elementos constitutivos da esfera pública, que fazem dela o local adequado para a excelência humana”. (ARENDT, 2004: 59)

A esfera pública: o comum e a esfera privada: a propriedade

Termo “público” indica dois fenômenos correlatos, mas não idênticos. Primeiramente, significa que tudo que vem a público pode ser visto e ouvido por todos e tem a maior divulgação possível. A percepção da realidade depende da aparência, e, portanto, da existência de uma esfera pública na qual as coisas possam emergir da treva da existência resguardada, da vida privada e íntima, cuja meia-luz deriva da luz da esfera pública. A autora ressalta, contudo, que há coisas que não podem suportar essa luz. O amor, por exemplo, falsifica-se, quando deslocado do espaço privado aparecendo, por exemplo, no discurso de um político, traduzido como transformação ou salvação do mundo. O amante da bondade, por sua vez, é um homem isolado, pois convive com os outros, mas deve ocultar-se deles e nem permitir a si mesmo ver o que está fazendo, pois a bondade que sai do esconderijo e assume papel público torna-se corrupta. Algo que remete ao significado elementar de que há coisas que devem ser ocultadas e outras que necessitam ser expostas em público, para adquirir alguma forma de existência.

O segundo significado é o próprio mundo, enquanto artefato humano; o mundo feito pelo homem é público, na medida em que é comum a todos nós e diferente do lugar que nos cabe dentro dele. Em contraste com a “objetividade”, cuja base única é o dinheiro como denominador comum para satisfação de todas as necessidades, a autora lembra que

Somente quando as coisas podem ser vistas por muitas pessoas, numa variedade de aspectos, sem mudar de identidade, de sorte que os que estão à sua volta sabem que veem o mesmo na mais completa diversidade, pode a realidade do mundo

manifestar-se de maneira real e fidedigna. (ARENDT, 2004: 67)

Nas condições de um mundo comum, a realidade não é resultante da natureza comum dos homens, mas do interesse num mesmo objeto. Por outro lado, quando não se pode discernir a natureza do objeto, o mundo comum é destruído, e os homens tornam-se prisioneiros da subjetividade das próprias existências singulares, que continuam singulares

mesmo multiplicadas inúmeras vezes, num mundo comum visto por um único aspecto e uma única perspectiva.

Desenvolvimento do lar e da família, deve-se ao senso político do povo romano, que jamais sacrificou o privado em benefício do público, por compreender que eles só subsistem em coexistência. A esfera privada oferecia espaço protegido, por exemplo, para os escravos, que encontravam espaço para acumulação de riqueza e devoção às artes e ciências. Havia, contudo, a clara consciência de que a vida restrita do lar era privada de algo essencial, consciência que perdeu força e quase se extinguiu com o cristianismo, uma vez que a moralidade cristã sempre pregou que cada um cuidasse de seus afazeres, e que a atividade política constituia-se em um ônus aceito em prol do bem-estar dos demais.

Para a autora, isso parece indicar que o estágio final do desaparecimento da esfera pública seja acompanhado pela ameaça de igual liquidação da privada. Nesse sentido, lembra que, na discussão sobre a propriedade privada ser desejável ou não, a palavra privada, em conexão com propriedade, perde caráter privativo e grande parte de sua oposição à esfera pública.

Arendt apresenta, então, outra distinção entre propriedade e riqueza, importante para discutirmos as ações de responsabilidade social empresarial. Lembra que a propriedade privada tinha caráter sagrado para todas as civilizações, antes da era moderna e, por outro lado, a riqueza do indivíduo ou publicamente distribuída não era sagrada. Propriedade significava seu lugar em determinada parte do mundo e poder pertencer ao corpo político. A riqueza não substituía essa propriedade, e a pobreza não fazia com que o chefe da família perdesse seu lugar no mundo. A esfera privada era o complemento da esfera pública. Ser político significava atingir a mais alta existência, mas não possuir lugar próprio e privado significava deixar de ser humano. Origem diferente e mais recente tem a riqueza privada como condição para entrar na esfera pública, não pelo empenho em acumulá-la, mas por representar liberdade em relação à subsistência. A moderna evolução das riquezas por si, independente da ocupação dos proprietários, as converteu em qualificação para a cidadania, mas cidadania como privilégio, desvinculado de atividades políticas específicas.

Arendt conclui, dessa forma, que a defesa moderna da propriedade privada como riqueza particular não pode vinculá-la à tradição de defesa da esfera pública, uma vez que o enorme acúmulo atual teve sua origem na expropriação (esbulho das classes camponesas, efeito quase acidental da expropriação de bens monásticos e da Igreja, após a Reforma) e jamais demonstrou grande consideração com a propriedade privada. O dito de Proudhon – a

Aponta, ainda, que, a longo prazo, a apropriação individual de riqueza não deve tratar com maior respeito a propriedade privada, que pode apenas estorvar a “produtividade” social geradora de acumulação de riqueza. Observamos que a lógica do “acesso”7, com a tendência desenhada atualmente de uma desmaterialização da economia, pode ser entendida como mais um estágio da expropriação. A abolição dos bens materiais seria uma forma de desobstruir de vez o livre fluxo de capitais, que não preza a propriedade privada, mas sim a acumulação de riquezas. Tratar-se-ia, portanto, do esvaziamento das formas de propriedade – individual ou coletiva – capazes de garantir lugar no mundo. Nesse sentido, o esvaziamento das profissões também tira esse lugar no mundo. Os únicos que se sentem bem nessas condições são os muito ricos, que podem – embora escravos do financeiro – comprar moradas provisórias, ou os muito jovens, que podem exercer diversas capacitações e obter posições profissionais sempre provisórias, como indicam as considerações de Richard Sennett, que abordaremos adiante.

Arendt não vê, portanto, onde se baseia o otimismo dos economistas liberais que afirmam que a apropriação individual de riqueza será suficiente para proteger as liberdades individuais, lembrando que, numa sociedade de detentores de empregos (que também se corroeram), essas liberdades só estão seguras, se garantidas pelo Estado. A riqueza pode durar por gerações, mas é algo destinado ao uso e consumo e não pode, portanto, tornar-se comum. O que se tornou comum, com o tempo, foi o governo, nomeado para proteger os proprietários privados uns dos outros na competição por mais riqueza. Nesse sentido, a autora afirma que a mais revolucionária contribuição moderna ao conceito de propriedade foi situá-la não no mundo, mas no próprio homem, na posse de um corpo e na indiscutível propriedade da sua força, chamada por Marx de “força de trabalho”. A autora ainda atenta para o fato de que a intimidade não é substituto seguro para a propriedade privada no sentido de lugar tangível, possuído na terra por uma pessoa. A eliminação da necessidade, correlata à vida, não estabelece automaticamente a liberdade, mas dificulta a percepção da diferença entre ser livre e ser forçado pela necessidade

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