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Depois de muitas discussões e várias modificações, a lei nº 16.157/2013 foi votada e aprovada com o seguinte texto, no que se refere ao CBVJ:

Art. 12. Considera-se infração administrativa toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas e técnicas concernentes às medidas de segurança e prevenção a incêndios e pânico.

§ 1º São autoridades competentes para lavrar autos de infração e responsáveis pelas vistorias e fiscalizações os bombeiros militares e os Municípios, podendo os Municípios delegar competência aos bombeiros voluntários (BRASIL, 2013a, p. 4).

Entres os argumentos que justificaram a posição do CBVJ nos debates públicos na ALESC, os principais se relacionavam ao fato de que a instituição fora a primeira corporação de bombeiros voluntários criada no Brasil e que possui o reconhecimento público da alta qualidade dos serviços prestados. “A população está satisfeita. Joinville está comprometida com os Bombeiros Voluntários. O trabalho é excepcional”, defendeu o Deputado Darci de Matos em reunião plenária na ALESC (observação direta).

O CBVJ foi fundado em 1892, por lideranças comunitárias da cidade. Essa decisão, motivada por incêndios que assolavam a população e seu patrimônio, resultou no início de um fenômeno de inovação social que completa 122 anos de existência, em julho de 2014. A legitimação da inovação social associada ao CBVJ, ao longo de todos esses anos, é o objeto deste estudo de caso.

Ora, a fundação de uma nova organização não implica, necessariamente, em uma inovação social. Então, o que torna o pioneirismo dessa corporação um objeto válido para este estudo? São as modificações nas relações sociais que caracterizam esse fenômeno como uma inovação social. A emenda na lei nº 16.157/2013 é apenas uma de várias ações, coordenadas pelo CBVJ, que se traduziram em legitimação de mudanças nas relações sociais, ao longo de sua história.

Estudar a legitimação de uma inovação social representa um amplo desafio, pois além de recente e de construção teórica pouco robusta, a definição de inovação social tem sido apropriada de diferentes formas por autores de múltiplos campos de estudo (ver Anexo A). Para enfrentar esse desafio, apresento uma contextualização da perspectiva

adotada nesta pesquisa para reconhecer o fenômeno e suas nuances, além do escopo por meio do qual a inovação social será analisada.

A inovação foi inicialmente conceituada e estudada como um tema relacionado à atividade econômica. A partir de certo momento, as perspectivas de estudos sobre inovação se diversificaram, deixando de ser radicadas somente em fenômenos de caráter econômico, para se orientarem também a partir da dimensão social, desembocando ou não na esfera econômica (LÉVESQUE, 2004).

Essa temática da inovação, no contexto do desenvolvimento econômico, tem sido amplamente explorada cientificamente. O economista austríaco Joseph Alois Schumpeter, com a publicação de sua obra “A Teoria do Desenvolvimento Econômico”, em 1911, pode ser considerado como um dos principais autores deste tema. Ele é reconhecido como o pioneiro a defender a ideia de que as mudanças provocadas por inovações estão entre os aspectos centrais do desenvolvimento econômico. A produção de inovações implica em combinar de forma diferente os recursos disponíveis nas organizações. Essas novas combinações de caráter descontínuo é que são capazes de despertar o fenômeno de mudança social que caracteriza o desenvolvimento econômico. A destruição criadora é o processo de mudanças tecnológicas que revoluciona incessantemente a estrutura econômica a partir de dentro, criando elementos novos e destruindo o antigo (SCHUMPETER, 1989).

Não obstante o reconhecimento dado aos trabalhos de Schumpeter, alguns autores afirmam que a relação entre inovação e o desenvolvimento econômico tem sido alvo de estudos, desde os autores clássicos da administração. Lundvall (2002), por exemplo, sugere que a ideia de que a inovação tem relação com o desenvolvimento econômico pode ser encontrada na análise da divisão do trabalho de Adam Smith, ainda no século XVIII, a qual incluía não só a criação de conhecimento em relação às atividades diretamente produtivas, como também os serviços especializados de cientistas.

A busca por um desempenho inovador, baseado em uma perspectiva primariamente econômica, parece não ter atendido totalmente às expectativas acerca do desenvolvimento. Surge então, um amplo debate crítico sobre aspectos que podem ser relacionados à modernidade, como a centralidade das organizações de mercado e o desenvolvimento exclusivamente econômico. A crítica ao sentido de desenvolvimento apenas econômico extrapolou o campo da Administração e envolveu as demais ciências sociais. Em estudos

realizados, já no século XXI, o empreendedor (ou empresário), as organizações econômicas e os outros agentes ligados ao sistema econômico deixam de representar objetos de estudo centrais sobre inovação e desenvolvimento, passando a dividir a atenção acadêmica com conceitos como o de empreendedorismo social e inovação social, organizações da sociedade civil (OSC’s), economia social e solidária, economia plural, etc. Esses novos conceitos mais complementam do que contradizem os anteriores e são explorados pela Nova Sociologia Econômica (NSE) (SAUVAGE, 1996; SERVA; ANDION, 2006;

ANDION; SERVA; LÉVESQUE, 2006; LÉVESQUE, 2009;

ANDREW; KLEIN, 2010).

Abordando o fenômeno do desenvolvimento de forma mais ampla do que a esfera econômica, Lévesque (2009) o caracteriza sob o ângulo do chamado paradigma societal e das interações que ele mantém com o território e com a economia plural e social. Para Sachs (2002, p. 73), o desenvolvimento socioeconômico territorial apresenta requisitos como:

[...] o planejamento local e participativo, no nível micro, das autoridades locais, comunidades e associações de cidadãos envolvidas. Para alguns autores mais radicais, é necessário também o reconhecimento dos direitos legítimos aos recursos e às necessidades das comunidades locais dando a estas um papel central no planejamento da proteção e do monitoramento das áreas protegidas.

Sauvage (1996) lembra que as atividades de subsistência e as atividades informais ocorrem em âmbito local, gerando a necessidade de uma “passagem à economia de mercado local”. Essa lógica é inerente ao conceito de economia social.

A economia social é a parte da economia que reconhece explicitamente a dimensão social, em primeiro lugar, por seus valores, mas, sobretudo, por priorizar as pessoas, mais do que o capital, na tomada de decisão (poder) e nos resultados (organizações sem fins lucrativos) (LÉVESQUE, 2004).

Buscando sustentar a importância da contribuição do conceito de economia plural com base nos estudos sobre economia social e solidária, Laville et. al. (2007) salientam que a economia social envolve geralmente três componentes: cooperativas, mutuais e associações que mantêm atividades econômicas. Além disso, os autores lembram que a

economia social e solidária depende duplamente de uma economia plural, ou seja, do ponto de vista de uma pluralidade de princípios (princípio da troca mercantil, princípio da reciprocidade maussuniana e princípio da redistribuição) e também de uma pluralidade de recursos: recursos mercantis (receitas), recursos não mercantis (doações privadas ou apoios financeiros do poder público) e recursos não mercantis e não monetários (voluntariado).

Para Lévesque (2002), as organizações da economia social podem ser consideradas inovadoras porque reúnem fatores produtivos diversos, têm foco em iniciativas associativistas e cooperativas locais, incluem os próprios usuários dos serviços nos processos de trabalho e estabelecem relações sociais voltadas para maior qualidade de vida no trabalho. Inovações na tecnologia e no processo produtivo, por exemplo, certamente também são relevantes para o desenvolvimento da economia social. O aspecto inovador distintivo, no entanto, reside na inovação social, ou seja, em novas formas de fazer as coisas com o fim explícito de rearranjar os papéis sociais ou de dar outras respostas para situações sociais insatisfatórias e problemáticas.

Como já mencionado anteriormente, a natureza do papel do empreendedor e a importância da inovação na economia tem sido objeto de atenção da academia, contudo, para Lévesque (2004) o empreendedorismo social não recebeu sistematização comparável. O interesse pela justiça social parece assumir caráter central na diferenciação do conceito de empreendedor social. Para compreender o processo da inovação social, é preciso considerar a perspectiva peculiar do empreendedor social (visão de mundo), seus recursos (monetários e não monetários) e ações (racionalidade aplicada), além de seu sistema de atuação (interação com atores). Se, em geral, para o empreendedor de mercado, a medida principal do sucesso da inovação é o retorno sobre o investimento, para o empreendedor social é viabilizar a melhoria de determinada condição social (LÉVESQUE, 2004).

De acordo com Lévesque et al. (2001), o estudo da inovação social está inserido entre os temas que interessam à Nova Sociologia Econômica, situado na vertente que aborda a economia social, plural e solidária. A NSE é definida como o: “Conjunto de teorias que se esforçam para explicar os fenômenos econômicos a partir de elementos sociológicos” (SWEDBERG, 1994, p. 35). Mesmo possuindo múltiplas correntes, a NSE apresenta certo consenso em, pelo menos, dois aspectos: (1) a ênfase na construção social da economia; e (2) a postura crítica em relação aos fundamentos da economia neoclássica. Tais

elementos são fundamentais para basear estudos sobre inovações sociais, pois uma perspectiva crítica sobre relações sociais é necessária para o avanço do campo, como será discutido a seguir.

Embora sejam relativamente recentes, os trabalhos sobre inovação social propõem múltiplas definições (OECD, 2010). Para os fins desta pesquisa, adotar-se-á a concepção proposta por membros de uma organização científica de língua francófona, fundada em 1985. Trata-se do CRISES – Centro de Pesquisa em Inovação Social, da Universidade de Quebec, em Montreal (UQUAM) – cujos pesquisadores definem inovação social como:

une intervention initiée par des acteurs sociaux, pour répondre à une aspiration, subvenir à un besoin, apporter une solution ou profiter d’une opportunité d’action afin de modifier des relations sociales, de transformer un cadre d’action de proposer de nouvelles orientations culturelles (BOUCHARD E LÉVESQUE, 2010, p. 6).

uma intervenção iniciada por atores sociais para responder a uma aspiração, atender a uma necessidade, criar uma solução ou aproveitar uma oportunidade de ação a fim de modificar as relações sociais, transformar um quadro de ação ou propor novas orientações culturais (tradução do autor).

Nota-se que a definição de inovação social, proposta pelos pesquisadores da UQUAM, concebe como atores sociais – capazes de empreender tais inovações sociais – indivíduos, coletividades ou organizações, que podem ser tanto empresas, quanto organizações sem fins lucrativos, como também entidades públicas. Outro aspecto importante é que o fenômeno de mudança das relações sociais assume papel central na definição desses autores. O interesse em compreender essa transformação social que leve a um quadro com maior justiça social, justifica a ênfase desses autores na economia social, solidária e plural.

Fontan (2011) esclarece que o processo de inovação social implica em emendas, contrapropostas, reformatação e reorganização da

ideia inicial. Dessa forma, a nova proposta é constantemente sujeita ao teste e julgamento social. Em resumo, o desafio da construção do uso social de uma inovação é torná-la socialmente legítima e útil aos públicos de interesse (stakeholders), que estiverem numa posição de decidir pela “vida ou morte” da inovação. Os processos de inovação social nem sempre se traduzem em sucesso, assim como ocorre com as inovações de caráter econômico. Eles podem ser abandonados, ou ficar dormentes por um período e reaparecer para serem legitimados em outro. Nesse contexto, o autor ressalta a importância da liderança exercida na promoção da mobilização de recursos para facilitar a inserção da inovação em um âmbito cada vez maior de relações sociais.

Bignetti (2011, p. 4) também ressalta a controversa interação dos atores sociais, ao descrever a inovação social como:

[...] um processo de constante relação entre desenvolvedores e beneficiários, numa construção social resultante da interação entre os atores participantes. Assim, a descrição de como surgem as ideias, como se dá a interação, quais as controvérsias que resultam e como elas são resolvidas propicia o surgimento de aspectos importantes do processo de inovação social.

De acordo com Mulgan (2006), muitas inovações sociais promissoras morrem no nascedouro, bloqueadas por interesses escusos, ou são marginalizadas. As pressões competitivas que impulsionam inovações em mercados comerciais são fracas ou ausentes no campo social e a ausência de instituições e fundos direcionados à inovação social significa que, muito frequentemente, é uma questão de sorte que essas ideias deem frutos ou substituam alternativas menos efetivas.

As particularidades relacionadas ao campo da inovação social e seu processo de aceitação tem estimulado adaptações das perspectivas sobre inovações de caráter econômico. Uma das formas recentemente utilizadas para analisar a aceitação de inovações sociais se baseia no conceito de adoção, típico das teorias sobre difusão de inovações (HORTA, 2012).

Uma das teorias mais conhecidas sobre difusão de inovações, cujo nome original em inglês é: diffusion of innovation (DOI) foi propagada por Rogers (2003). Esse autor define DOI como o processo

pelo qual uma inovação é comunicada por meio de certos canais ao longo do tempo, entre membros de um sistema social. Um modelo típico consiste na adoção sequencial e em estágios de implantação. Tais estágios ajudam a prever a difusão da inovação ao longo do tempo e espaço, baseando-se nas características da inovação e do sistema em seu entorno para determinar sua taxa de adoção. Em geral, a aplicação desses conhecimentos busca, como resultado final, uma maior previsibilidade nos tempos e taxas de retorno do investimento na inovação.

Rogers (2003, pk 7957) explica a lógica utilitária do cálculo de consequências utilizado em sua noção de difusão da inovação e critica pesquisas sobre o tema que não possuam natureza generalizante, como estudos de caso:

Consequences are the changes that occur an individual or a social system as a result of the adoption or rejection of an innovation. Invention and diffusion are but means to an ultimate end: the consequences that result from adoption of an innovation. In spite of the importance of consequences, they have received relatively little study by diffusion researchers. Furthermore, the data we have about consequences are rather “soft” in nature, based mainly on case studies, which makes it difficult to generalize about consequences. Here we establish categories for classifying consequences, but we cannot predict when and how these consequences will happen. The unpredictability of an innovation’s consequences, at least in the long term, is one important type of uncertainty in the diffusion process.

Em estudo recente, Horta (2013, p. 180, GRIFO NOSSO) propõe reflexões importantes acerca das limitações surgidas na aplicação das teorias, originalmente propostas por Rogers (2003), no estudo de inovações sociais.

O processo de difusão de inovações sociais também é distinto de uma inovação tecnológica, uma vez que apresenta especificidades que tornam o processo único. Essas características também indicam a necessidade de estudos que

aprofundem cada uma das especificidades que foram encontradas no processo de difusão de inovações sociais, principalmente a cultura e a questão política.

A cultura está intimamente relacionada à cognição. Os indivíduos aprendem observando comportamentos do seu grupo e delimitam os seus padrões de comportamento de acordo com as formas simbólicas que compreenderam nas suas interações. Esses processos simbólicos modificam-se de acordo com os contextos: político, social, econômico, etc., onde os sujeitos estão inseridos e que não são estanques.

No presente trabalho, buscamos uma abordagem que tenta atender à recomendação apresentada por Horta (2013). Se por um lado o conceito de Rogers (2003) de difusão de inovações de mercado se relaciona principalmente à legitimação (aceitação social) de novas tecnologias (BERGEK et al., 2008;), a proposta de Horta (2012) explorou o potencial da aplicação dessa abordagem no estudo de adoção de inovações sociais, identificando as complementaridades entre esses campos de estudo.

Nesta pesquisa, em vez de utilizarmos a lógica da “adoção”, orientamos nosso trabalho pela perspectiva da “legitimação”. A partir do conceito de inovação social do CRISES, a sua aceitação se refere à legitimação de um novo quadro de relações sociais ou novas orientações culturais, construído por meio de intervenções iniciadas por atores sociais (BOUCHARD; LÉVESQUE, 2010). Nossa perspectiva de legitimação, portanto, está em linha com a adotada pelo trabalho de Krieger e Andion (2014). As autoras propuseram a compreensão do fenômeno da legitimidade das organizações da sociedade civil (OSC), interpretando-o à luz da teoria da capacidade crítica. Para essas autoras, o conceito de legitimidade é definido a partir de contribuições de atores como Suchman (1995), Atack (1999), Edwards (2000) e Krieger (2011): Legitimidade é aqui compreendida como a percepção generalizada de que uma organização tem o direito de ser e fazer algo na sociedade, tendo suas ações julgadas como apropriadas, de acordo com um sistema normativo e com base em justificações para a sua ação política e social (KRIEGER; ANDION, 2014, p.85).

Nos estudos organizacionais existe uma tradição em lidar com a legitimidade, cuja origem weberiana inspirou o novo institucionalismo na sociologia organizacional (DIMAGGIO; POWELL, 1991). Para Weber (2004), uma ordem social é legítima somente se a ação é aproximadamente ou em média orientada por certas máximas ou regras. Sendo assim, a formulação weberiana esclarece que, embora os indivíduos possam não compartilhar as mesmas normas, valores e crenças, o comportamento deles é orientado por uma ordem que está de acordo com regras e crenças que eles presumem ser aceitas pelos outros. Johnson, Dowd e Ridgeway (2006) realizaram um estudo sobre a legitimação como um processo social, que envolveu duas amplas áreas da sociologia: (a) abordagens da psicologia social, que focam na legitimação de características de status, status de estruturas de grupo, estruturas e práticas da autoridade organizacional, e ordens estratificadas; e (b) abordagens institucionais na literatura das organizações, que estudam a legitimação de formas organizacionais, práticas, e estratificação. Os autores enfocaram a análise de como novos objetos sociais, tanto individuais quanto coletivos, são criados e legitimados, isto é, como eles se tornam amplamente aceitos em um quadro cultural mais amplo. Eles chamam esses novos objetos sociais de inovações sociais e concluem que seu processo de legitimação pode envolver quatro estágios: (1) a criação de inovações sociais; (2) a validação local; (3) a difusão em novas situações locais; e (4) o consenso em múltiplas situações locais, criando um consenso geral na sociedade, isto é, uma validação geral da inovação social.

Bignetti (2011, p. 4) entende que “metodologias de pesquisa específicas devem ser adotadas de modo que se contemplem as particularidades inerentes ao processo de inovação social.” Nesta pesquisa, a noção de legitimação é baseada na corrente francesa da sociologia da crítica. A abordagem de Boltanski e Thévenot (2006) para compreender a coordenação de ações justificáveis envolve noções peculiares de legitimação, distinta do entendimento weberiano mais universalista acerca desses conceitos. O foco em atos justificáveis para referenciar posições conflitantes tem por consequência a possibilidade de ordenação dos princípios em disputa. Para os autores, esta ordenação de diferentes princípios segue a lógica da teoria dumontiana conhecida por Englobamento dos Contrários (DUMONT, 2008), detalhada posteriormente neste trabalho.

Além das contribuições da NSE, a Sociologia Pragmática (SP) de Boltanski e Thévenot (2006) tem posição destacada nesta pesquisa. Os

autores esclarecem haver diferença de lógicas cognitivas entre as múltiplas perspectivas de posicionamento possíveis em uma determinada sociedade. Essas perspectivas são chamadas de mundos. Sendo assim, eles propõem a existência de sete mundos diferentes, os quais possuem princípios, objetos e características específicas que são utilizadas para justificar um posicionamento individual frente a um desacordo. Nas complexas sociedades modernas, vários regimes de justificação podem coexistir dentro do mesmo espaço social, apesar de sua relevância poder variar de acordo com as características da situação. Sendo assim, acordos legítimos serão construídos por meio dessas disputas de justificação.

A pluralidade de mundos em que ocorre a racionalização dessas ações justificáveis e o envolvimento de múltiplas formas de equivalência para basear a busca do bem comum enseja o uso de uma competência intelectual de origem aristotélica chamada prudência ou sabedoria prática (phronesis) (THÉVENOT, 2002; BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006). Embora a Sociologia Pragmática cite o conceito clássico de prudência ao tratar sobre racionalidade nos atos de justificação, os principais autores desta corrente teórica não exploram, em maior profundidade, elementos de racionalidade que orientam a coordenação da ação.

Por outro lado, a racionalidade possui caráter ubíquo nos estudos organizacionais (SOUTO-MAIOR, 1998), mais especificamente na coordenação da ação humana (HABERMAS, 2012). Talvez, fazendo uso de uma afirmação parsoniana, a importância da racionalidade na ação seja uma questão que dispense maiores justificativas: “[…] there is obviously a very solid common-sense foundation for attributing a large importance to rationality in action” (PARSONS, 1966, p. 57).

Não obstante, as contribuições desse campo se deparam com questões limitadoras ao se relacionarem a teorias de ação. O estudo de Serva (1996) propôs uma abordagem que contribuiu para o avanço do

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