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Notícias e anúncios em Pelotas no final do século XIX : jornais e

expressiva, da qual se extraiu o “Correio Mercantil” e a “A Pátria”. Esses jornais foram selecionados para mostrar o modo de vida dos pelotenses, tomando por base os dois primeiros periódicos diários, conforme a tabela 1, de maior “circulação” local. Feitas algumas considerações sobre o jornal “O Pelotense”, nos deteremos, agora, nos dois outros citados, ou seja, “A Pátria” (1886-1896) e o “Correio Mercantil” (1875-1915). Inicialmente, se fará uso do jornal “A Pátria”, para análise da edição do dia 18 de julho de 1887 e, após, o “Correio Mercantil”, de 26 de fevereiro de 1898. Justifica-se a escolha deste último pelo fato de ser, dentre as edições pesquisadas, o exemplar mais próximo ao final do século XIX, o que é bastante significativo para este trabalho; e àquele por ser o único exemplar a que se teve acesso.

Ao ser fundado, o jornal “A Pátria” teve como redatores Fernando Pimentel, Albino Costa e Gomes Corrêa. Em um exemplar que circulou no dia 18 de julho de 1887, uma segunda-feira dos tempos do Império, pode ser lida, na capa, a notícia “não confirmada” do “misterioso” desaparecimento do paquete12 “Rio Apa”. Em três colunas estreitas e compridas, caracterizando-se

pela continuidade vs descontinuidade de suas formas, é mostrada a notícia entremeada de parcialidade:

... Continua o silêncio, o mysterio sobre o destino do paquete Rio Apa. De positivo nada se póde affirmar e é por isso que sobre este melindroso assumpto continuamos a escrever com todo o cuidado e reserva.

Entendemos que não devendo occultar a verdade, quando esta se manifestar de forma exuberante e irrecusavel, tambem seria leviandade e imprudencia de nossa parte, dar noticias tão alarmantes quanto infundadas, servindo-nos para isso da primeira informação, de boatos espalhados sem o menor fundamento.

Pensando deste modo não podemos deixar de estranhar as noticias aterradoras que hontem deu um jornal da terra, relativamente ao por

emquanto supposto naufragio do Rio Apa, e ao apparecimento na praia de setenta cadaveres.

A primeira dessas noticias carece de confirmação e esta não é ainda possivel fornecel-a quem quer que seja; e a ultima é tão verdadeira como a que deu ante-hontem a mesma folha, de ter o comandante Franco se recusado a entrar com seu vapor no dia 11.

Por emquanto nada se póde adiantar quanto ao naufrágio do paquete. O que há, são simples conjecturas, meras suposições; de real nada existe...

Nos trechos aqui reproduzidos sobre a notícia do “Rio Apa”, utiliza-se o recurso da debreagem enunciativa, criando uma ilusão de subjetividade, de aproximação do sujeito, constituindo-se numa enunciação enunciada. Este tipo de estratégia é diferente das que se utiliza a maioria dos jornais diários da atualidade, que empregam a terceira pessoa, portanto uma debreagem enunciva, para a criação de uma ilusão de objetividade. De acordo com Barros, nesta estratégia

... finge-se um afastamento da enunciação, que, dessa forma, é “neutralizada” e nada mais faz que comunicar os “fatos” e o modo de ver de outros. Além de produzir efeito de verdade objetiva, o jornal com aparência de afastamento, evita arcar com a responsabilidade do que é dito, já que transmite sempre a opinião do outro, o saber das fontes. (1990, p.56).

No texto da notícia sobre o “Rio Apa”, o destinador, ao criar uma situação de comunicação manipuladora, realiza um fazer persuasivo, que tem sua resposta no fazer interpretativo do destinatário. O fazer persuasivo procura o

fazer-crer por meio do fazer-parecer-verdadeiro, criando-se efeitos de verdade. O

sujeito do fazer persuasivo quer levar seu destinatário a crer que a notícia que este jornal veicula e não a do outro jornal, que a deu pela primeira vez, parece

ser verdadeira, realizando uma performance cognitiva. O enunciado,

modalizado veridictoriamente, é sobredeterminado pela modalidade epistêmica do crer.

Mais de trinta e cinco anos após o lançamento do primeiro jornal pelotense, nota-se, neste exemplar do jornal “A Pátria”, de 1887, um estreitamento considerável das colunas que compõe a estrutura do jornal. Em relação ao grafismo, mais precisamente em relação ao significante do anúncio, pode-se perceber que sua superfície é dividida em três faixas horizontais e seis longas faixas verticais, o que convida para uma leitura contínua, com colunas mais altas do que largas. Para Bringhurst, “... as altíssimas e estreitíssimas colunas de jornais..., viraram sinônimos de prosa descartável, de leitura displiscente e apressada (2005, p.179). Estas, são interrompidas conforme a distribuição do texto.

Ao se retomar às notícias da primeira página do jornal “A Pátria”, vê-se que, dentre elas, também se encontra um romance, mas que, infelizmente, pela deterioração do jornal, não é possível visualizar o título ou o autor. Entretanto, no final do texto, consegue-se ler a palavra “continua”, o que nos leva a identificar o mesmo tipo de estratégia adotada pelo jornal “O Pelotense”, praticamente 25 anos após. Esta manipulação é um artifício a mais para manter a atenção do destinatário, interessado não só nas notícias, informações da cotidianidade, mas, também em literatura. Lonner explica que

... eram nos jornais onde eram veiculados poemas e contos, mesmo de escritores hoje clássicos de nossas letras e, além disso, quase sempre, na primeira ou última página, expressivo espaço do fim da página era ocupado com o folhetim, uma forma de conto ou romance popular, preparado para o gosto do público da época. (1998, p.7).

O destaque deste número de “A Pátria” constitui o primeiro artigo do jornal e ocupa um espaço de evidência. Trata-se de um informe sobre a “indústria do xarque”13, escrito por Eduardo Perié, na seção “Colaboração”, do qual se extraiu

alguns trechos:14

13 Em função do estado do jornal, deteriorado pela ação do tempo, não foi possível escrever a

A industria do xarque, precisa aperfeiçoar-se se quizer viver, isto é, se cançada de arrastar sua existência difícil e arriscada não decide a entrar de vez na senda do progresso que a experiencia tem traçado, durante alguns annos de serios e continuados prejuizos, os quaes, ainda que tenham cessado na presente safra, por uma circumstancia especial podem de novo apresentar-se, sucessivamente, pela logica dos factos.

Uma fabrica de beneficiar carnes – e cito para exemplo o estabelecimento de Fray Bentos – tem que ser, na actualidade, alguma cousa mais do que um matadouro, pois os seus beneficios dada a competencia que tem a sustentar a industria rio-grandense, hao de consistir em aproveitar tudo que hoje se desperdiça ou não se utiliza convenientemente.

As gorduras, em ver de serem offerecidas por preços excessivamente infimos, como acontece na actualidade, devem aproveitar-se em uma ampla fabrica de velas stearinas, que daria um lucro certo de seis mil réis mais por cada rez, e tomado por tremo medio o numero de 350,000 rezes beneficiadas annualmente, o resultado de cada safra seria de 2,100(00$000) mais de lucros effectuados.

Os couros em vez de salgal-os, e pagar, em cosequencia de seu peso e volume, duas ou tres vezes mais o valor do frete para conduzil-os aos mercados onde teem de ser curtidos deviam sair da xarqueada para os tanques do cortume, e, uma vez preparados e beneficiados no paíz, com toda a sciencia da arte, pois que esta provincia dispõe da melhor casca do mundo para curtir, o lucro de cada rez, somente ao couro, não poderia estimar-se em menos de cinco mil réis, mais do que produz actualmente, dando um resultado sobre as 350,000 rezes de (?).750:000$000 em cada ano.

...

Tanto se cota nas bolsas de Paris e Londres, o papel do Egypto e da Grecia, como o argentino e brazileiro: a questão se apoia pura e simplesmente em que haja uma base sólida que attraia o capital. Ora, como todas as cousas necessitam de um principio, e eu, não obstante o que em contrario me teem dito, tenha fé no espirito progressista desta localidade, que tantas e tão repetidas provas

offerece nesse sentido concebi a ideia e não vacillei em lançal-a ao publico em minha conferencia.

...

Tenho fé em que com um pouco de boa vontade por parte das industriaes e estancieiros, isto que nada mais é, senão a ideia de um homem que se interessa pela localidade, pode ser a base de um futuro fecundo em resultados, em progressos e prosperidade.

...

Tenho fé, porque creio que, convencidos os industriaes e estancieiros de que sua união ha de resultar um bem extraordinario para seus interesses, contribuindo, por esse meio, para o bem de todos e progresso de sua patria, não se negarão, ao menos, a estudar essa ideia que lanço a publicidade sem outras miras alem de ser útil a uma cidade pela qual tanto me interesso.

“Modernidade” e “transformação” são os temas centrais da narrativa, que apela para mudanças na forma de produção das charqueadas. Esses temas parciais apresentam um elemento comum, uma oposição entre ascenção e declínio, sendo que o primeiro termo é visto como eufórico e o segundo como disfórico. No texto sobre a indústria do charque, são valorados aspectos relativos ao fazer transformador. O destinador, aqui, já previa problemas sérios relativos ao desenvolvimento da região, principalmente de Pelotas. Sem investimentos capazes de colocar a indústria do charque em sintonia com que havia de moderno no mercado, e sem repensar os processos de reaproveitamento do que era descartado, como o sebo, por exemplo, provavelmente a indústria do charque viria a sucumbir. Nele, encontra-se uma “sugestão” para que o sujeito charqueador entre em conjunção com a modernidade (um valor descritivo) para não declinar. Trata-se de uma modalidade exotáxica, em que o sujeito modalizador impõe um dever ao destinatário do texto. A obediência (não-poder- não-fazer) do sujeito modalizado a estas diretrizes implica a prescrição (dever- fazer), e caracteriza a manipulação por tentação. É a aceitação deste contrato

implícito que desencadeia o fazer, permitindo a passagem do cognitivo ao pragmático, da competência ao desempenho (Greimas, 1996, p.11).

Continuando pelo jornal, observa-se que ele se divide em várias seções: expediente, colaboração, atualidade, ocorrências, comércio, seção livre, declarações, leilões e anúncios.

A seção de ocorrências, na página dois, subdivide-se em vários itens, como “últimos telegramas recebidos”, “assuntos do dia”, “vapores e paquetes”, dentre outras pequenas “notas” da cidade. Do item “últimos telegramas recebidos”, extraiu-se

Últimos telegrammas – Rio, 16 de julho. – Os festejos que a colonia franceza levou a effeito nesta côrte para solemnisar o aniversario da queda da Bastilha estiveram brilhantes, bem assim o concerto-baile realisado no Cassino Fluminense.

Paris, 15 – As festas celebradas aqui para commemorar o grandioso

facto historico da revolução franceza estiveram animadissimas, se effectuando, para mais realce e luzimento das mesmas, uma grande revista militar.

Dentre os pequenos trechos de notícias que compunham esta segunda página do jornal, selecionou-se um da Biblioteca Pública Pelotense e outro do Parque Pelotense:

Biblioteca P. Pelotense

A illustre directoria da Biblioteca Publica occupo-se, em sua sessão de ante-hontem, de uma medida que bem merece as adhesões de todos, como são dignos dos maiores applausos os iniciadores das mesmas medidas.

Representando aquella casa uma das mais honrosas e ao mesmo tempo mais civilizadoras instituições de Pelotas, é justo que sejam por todos bem acolhidos os emprehendimentos tendentes a dotal a de um novo melhoramento, ou a assegulhar-lhe mais prospera existencia...

Parque Pelotense

Apezar da tarde de hontem se ter tornado bastante nebulosa, nem por isso deixou de affluir regular numero de passeantes ao parque, a appreciar alli as diversoes constantes do programa annunciado, que foi integralmente cumprido. A musica União abrilhantou com seus accordes o recreativo passeio.

Na seção de “Declarações” da página três, lêem-se notas de dois clubes: um do “Club Commercial”, convidando aos senhores sócios a comparecerem à reunião da assembléia geral e outro do “Club Democrito”, convidando para um sarau.

No local destinado aos anúncios, ainda nesta página, encontram-se ao mesmo tempo, reclames referentes à busca de refinador “No PARQUE PELOTENSE precisa-se um refinador habilitado e que seja de boa conducta. Póde ser branco ou de côr”, até anúncios de atelier de modas, comunicando um variadíssimo sortimento de “chapéos, capotas, toucados agretes de vidrilhos”. Ali também estavam anúncios de fotógrafos, expoentes de visibilidade à época. Em um deles lia-se:

PHOTOGRAPHIA AMORETTY

O proprietario deste estabelecimento, chama a attenção do respeitavel publico para o

RETRATO A OLEO

exposto em sua vitrine, (rua Andrade Neves n.102), trabalho do habil pintor Sr. Guilherme Johansen, artista da Academia de Bellas-Artes de S. Petersburg, (Russia). Tambem avisa que no seu estabelecimento recebe encommendas de retratos a Oleo sobre téla bem como tambem photographias de qualquer tamanho, retocadas a Oleo, Pastel, aquarella, Tinta da China e Crayon.

O Sr. Johansen tendo resolvido fixar residencia por alguns annos nesta cidade, aceita discipulos.

partir dos retratos, que tinham como função exaltar, homenagear e reconhecer o trabalho e a importância de vultos expoentes da sociedade (1996, p.40). Neles, indivíduos e grupos sociais se fazem figurar. Mostram-se, exibem-se e perpetuam-se enquanto figuras de poder. Miceli (1996) refere que, no início do século XX o retrato no Brasil sobreviveu, embora estando em decadência no resto do mundo, porque aqui foi fortemente prezado pelas elites (citado por Silva, 1996, p.40), o que justifica a circulação de artistas estrangeiros pela cidade.

Outro reclame, o da Livraria Americana, de Carlos Pinto & C. Sucs, divulgava em seu anúncio as novidades recém chegadas, qualificando-as de “Alta novidade Litteraria”. Dentre elas, A bohemia do espírito, de Camillo C. Branco, um livro de 450 páginas, adornado com “o retrato do author”, expressamente tirado para este fim.

Foram vários os elementos encontrados na seção de anúncios, que podem revelar o modo de vida na cidade de Pelotas. De acordo com Landowski, jornais caracterizam-se como “... à prospeccção e à programação do ‘vivido’ mais imediato dos seus leitores” (1992, p.120), aqui mostrado através dos anúncios de um comércio variadíssimo, que oferecia produtos nacionais e internacionais, notícias, curiosidades, literatura, moda, retratos a óleo, dentre outras divulgações de igual interesse. De acordo com o mesmo autor, jornais são capazes de instaurar espaços, “... visando à manipulação dos estereótipos sociais, que configuram a imagem do Sujeito normatizado por e para a própria recepção do discurso ‘midiático’” (1992, p.120), ou seja, a construção do público leitor.

Sabe-se que na relação jornal-leitor, um sujeito leva outro a querer e dever entrar em conjunção com um objeto de valor “saber” de uma dada realidade, numa espécie de retroalimentação: o primeiro constrói o objeto, o segundo busca entrar em conjunção com o objeto. Na relação entre destinador e destinatário, o primeiro manipula, modalizando o destinatário a um querer e a um dever saber sobre uma dada realidade, a fim de que este nela se inclua.

Figura 20: Anúncios do jornal “A Pátria”, edição de 18 de julho de 1887. O “saber, o consumir e o mostrar-se” identificava a elite pelotense.

Conforme referência já feita neste trabalho, a energia elétrica só chegou à cidade no início do século XX, efetivamente em 1913, porém, na época, nem todos tiveram acesso a ela. Em razão disso, alguns anúncios divulgavam formas alternativas de iluminação, numa cidade em franco desenvolvimento. Eis alguns:

LAMPADAS Á KEROSENE

Lampeões de pé de todos os gostos.

Lampeões para pendurar de uma a cinco luzes. Vidros e todos os pertences.

Receberam grande sortimento. M. de Souza Gomes & C. RUA JERONYMO N.37

PARA GAZ CARBONICO Lampeões de uma a cinco luzes. Arandellas de crystal.

Tiggelinhas modernas.

Receberam esplendido sortimento M DE SOUZA GOMES & COMP. RUA S. JERONYMO N.37

Também merece destaque um anúncio sobre a “exposição de móveis na Marcenaria Sem Rival”, do qual se transcreverá algumas partes:

... Todos os moveis nessa occasião exhibidos, são nacionaes, trabalhados e primorosamente acabados em nossas officinas; entre elles, serão sem duvida apreciados: ricos quartos completos para noiva, adornados com riquissimas esculpturas que rivalisam estas, com o que do estrangeiro nos vem de mais elegante e melhor: camas avulsas, guardas-roupas, etagéres, commodas, mobilias para a sala, estofadas e de palhinha, toiletes, chaisse-longue acolxoados de riquissimos brocatel, damascos, borlas, etc, etc. e uma infinidade de objectos para adornos de salas e quartos, que é difícil classificar...

o nosso continuo labutar de artistas, para chegarmos ao maior aperfeiçoamento possível nos dão o direito de contar com a honrosa visita do publico, e vêr corôados os nossos esforços, se o seu juizo a respeito dos nossos trabalhos, nos fôr favoravel, como disso estamos convencidos, não por nossa vaidade, porém sim, pelo progresso que a nossa industria vai attingindo na nossa bella cidade.

A última página, de número quatro, destinava-se exclusivamente aos anúncios, onde se podia encontrar uma gama diferenciada de ofertas relativas a colégios, colxoarias, consultórios médicos, remédios, máquinas de costura, fazendas (tecidos), ferrarias e outros. A Livraria Americana divulgava os livros que podiam ser adquiridos em suas lojas de Pelotas, Porto Alegre e Rio Grande. Dentre mais de quarenta sugestões para leitura, havia títulos como: A Penelope

Normanda, de Alphonso Karr; Portugal de Cabelleira, de Alberto Pimentel; O castello de Montsabrey, de Julio Sandeau; O marquez de la Seigliére, trad. De

Pinheiro Chagas; O desmoronar do Império, de Emilio Gaboriau, dentre outros.

Um colégio feminino, chamado “Honra e Trabalho”, esclarece, em seu anúncio, que o ensino na instituição é dividido em dois cursos: primário e secundário. No curso primário, o programa é o seguinte: leitura, caligrafia,

aritmética elementar, gramática nacional, análise, noções de geografia e história do Brasil. No curso secundário estuda-se português, francês, aritmética e trabalhos de agulha. Como observação, acrescenta que o colégio também

oportuniza o ensino de música, mediante o pagamento de uma taxa.

Verifica-se, portanto, que não existe uma ordem na disposição dos anúncios, ou seja, eles não eram “categorizados”. Após o anúncio da escola, por exemplo, lia-se o da Colxoaria Universal: oficina de colxoeiro, armador e tapeceiro, administrado por Domenique Villard. A seguir ao da Colxoaria, vinha o anúncio da

Fábrica a vapor, das Farinhas Pelotense, e, depois, o de um consultório médico.

Neste exemplar do jornal “A Pátria”, pelo menos uma página e meia, das quatro páginas que o compunham, eram dedicadas aos anúncios, ou seja,

aproximadamente 40% do jornal. Cabe inferir que os tipos de notícias e anúncios tinham como destinatários sujeitos que queriam estar a par do que acontecia na cidade, no país e no mundo, ou das novidades que aqui chegavam. Pelo jornal, mantinham-se informados sobre educação, arte, entretenimento (saraus), tecidos, saúde, livros e, também, trechos de obras literárias. Mais do que leitores, os destinatários desses periódicos eram ativos consumidores de objetos sofisticados e culturais. Para Magalhães (1993), este período final do século XIX, em Pelotas, caracterizou-se por um apogeu sócio-cultural, pela convergência de boas condições urbanas e econômicas e por uma influência externa, nacional e internacional, rotulada como Fin-de-Siècle. Uma época de grande progresso social e científico, em que a industrialização, a imigração e as melhorias no transporte público alteraram, radicalmente, a vida na cidade, o que caracteriza o período da Belle Époque.

Os traços semânticos luxo, novidades, literatura e produtos importados, identificam um destinatário-leitor pertencente à “elite”. As diferenças do capital cultural, de competência para o poder-ver, marcam as oposições entre as classes e é essa diferença que obstaculiza o acesso efetivo de “todos”. Uma visão de mundo, de uma determinada classe social, que caracteriza uma formação ideológica, isto é, “um conjunto de representações e idéias que revelam a compreensão que uma dada classe tem do mundo” (Fiorin, 1998, p.32). Ainda de acordo com o mesmo autor, “a cada formação ideológica corresponde uma formação discursiva, que é um conjunto de temas e figuras que materializa uma dada visão de mundo” e é a partir dessa “formação discursiva assimilada que o homem constrói seus discursos”, portanto, o “discurso é mais o lugar da reprodução que o da criação” (1998, p.32).

Pelo fato de expressivo espaço jornalístico ser destinado a anúncios