• Nenhum resultado encontrado

3.4 TERRITÓRIOS NEGROS

3.4.3 Nova Restinga

E a vila Restinga foi se desenvolvendo desordenadamente, pois, cada nova necessidade de remoção de malocas do perímetro urbano, a Restinga era o centro receptor das populações desalojadas. Urgia uma planificação e a solução foi dividir a área de 52 hectares em 16 ruas, com 46 quarteirões. Destes, 41 foram divididos em lotes, na segunda metade da década de 70, porque devido a pobreza da população ali instalada, não havia retorno financeiro para os cofres públicos municipais. O poder público optou por dar início a um gigantesco projeto ao lado esquerdo da João Antônio Silveira: a construção da Nova Restinga.131

Soster em estudo sobre a nova configuração dos bairros em Porto Alegre menciona que a Nova Restinga foi de fato um grandioso empreendimento apontado na época como um dos maiores projetos habitacionais do Brasil. Seu projeto é de 1969. Em um ano se concluiu a primeira Unidade (1970-1971) e no ano de 1981, a quarta unidade estava sendo entregue. O projeto foi financiado pelo BNH, assim como o Renascença.

Souza relata que, o BNH, já demonstrava uma percepção em relação aos locais da cidade que os diferentes grupos sociais deveriam ocupar, grupos de renda baixa na periferia e grupos de renda média ou elevada em áreas mais centrais.

Mas, mesmo na periferia da cidade, criaram-se tais espacializações, num mesmo bairro, uma linha divisória apartava a estruturação urbana(incipiente mas contrastante), e a precarização.

A partir daí, uma outra realidade: Restinga Velha e Nova Restinga, a Avenida João Antônio da Silveira separava duas realidades:

131

Outro projeto que ficou conhecido nacionalmente - quer pela sua grandiosidade, quer pelo conjunto de serviços que criou nas comunidades - foi o loteamento Nova

Restinga. O perfil do projeto enquadrava-se perfeitamente nas diretrizes do BNH, o

que representou a captação de uma considerável verba advinda deste órgão. Assim, já em 1969, é comprado o terreno, e realizadas várias pesquisas para a viabilização desse projeto. Ele representou um marco no desenvolvimento da política habitacional de Porto Alegre.132 (Grifos meus).

O projeto incluía toda a infraestrutura necessária destacando-se a qualidade das unidades habitacionais (e não apenas lotes), com lotes de 150m², casas de alvenaria, telhas francesas, e de até três quartos. Ruas calçadas, com rede de água, luz e esgoto. Exatamente o oposto da Restinga Velha. A Nova Restinga seria dividia em cinco áreas, denominadas unidades vicinais. Cada qual teria uma escola primária, creche, igreja e um local para esporte além de um pequeno centro comercial.

Em 1971, foram construídas as primeiras unidades, 390 ao todo. Elas já possuíam parte da infra-estrutura especificada no projeto como “escolas, creches, centro comercial, centro de comunidade, praças, áreas de recreação, água potável, esgoto, iluminação domiciliar e pública e pavimentação asfáltica.133

As casas eram entregues aos moradores, à medida em que eram concluídas. A aquisição dependia de inscrição feita no DEMHAB que, através de sorteio, as entregava aos trabalhadores que percebessem até cinco salários mínimos. Entretanto, seguindo a prática do favoritismo e conseqüente clientelismo, estes critérios não foram respeitados. 134

Os vários depoimentos, das pessoas entrevistadas para a realização da obra Memória dos Bairros atestam que havia uma expectativa de que os moradores da Restinga Velha deveriam ser contemplados com as casas da Nova Restinga. Logo, descobriram que a maioria não podia arcar com as prestações e comprovações exigidas.

Em 1977 as três primeiras unidades estavam concluídas, assim como CECORES- Centro Comunitário da Restinga. Em 1981, a quarta unidade e o Monte Castelo, com 512 apartamentos estavam sendo entregues.

Ainda assim, faltava rede de telefone, transportes, e hospital, mas em relação a Restinga Velha, é incomparável [...]. Muitas lutas foram conjuntas, para o posto de saúde, por exemplo. Assim como a fundação da Escola de Samba Estado Maior da Restinga.

132 D’AVILA, 2000, p. 77. 133 Ibid., p. 78. 134 NUNES, 1997, 15.

Para continuar na luta e seguir assegurando a união da comunidade para que atendesse ao chamado quando fosse necessário, nada melhor do que propiciar atividades culturais e recreativas, uma vez que a Restinga não possuía cinema, teatro biblioteca. Havia o Centro Comunitário - CECORES, com um ginásio de esporte coberto, campos de futebol espalhados por quase todas as ruas. A criação de uma

escola de samba, além de mobilizar a comunidade para um novo tipo de divertimento e lazer, serviu também para conscientizá-la de que o carnaval não deveria ser visto apenas como um bando de homens e mulheres pulando nas ruas, mas também como um mecanismo para o desenvolvimento de um tipo de cultura , a cultura popular.135 (Grifos meus).

A construção das unidades vicinais não foi concluída nos três anos consecutivos, conforme o planejamento inicial, a burocracia e a dependência de aprovação do senado para a liberação das verbas foi referida como um dos maiores entraves a finalização dos projetos.

Somente no final dos anos 70 concluiu-se as quatro unidades, garantindo-se já a área para a quinta unidade, que viria a ser construída quase vinte anos depois.

Também foi obra do DEMHAB o Centro Administrativo, que funcionava inicialmente numa das casas que ainda não haviam sido entregues. Agilizando, desta forma as demandas da comunidades, que outrora tinham que se dirigir ao centro da cidade para encaminhar as solicitações de serviços. Outra problemática enfrentada pelo moradores era o péssimo abastecimento de água:

Em 1979, o DEMHAB resolveu um sério problema de todo o complexo Restinga, ou seja, a falta de água. Conseguir verbas para esse fim, segundo Artur Paulo Araújo Zanella, foi no mínimo, complicado [...] “O BNH dizia que no contrato com Prefeitura ela havia se comprometido a colocar água e que eles não financiavam órgão municipal de água e esgoto, conforme regra do PLANASA. Mas o DEMAE, Departamento Municipal de Água e Esgoto, além de não ter dinheiro, afirmava que em um loteamento da Prefeitura o loteador, seja particular ou municipal é que tinha de responsabilizar-se pela infraestrutura”. Depois de muitas negociações, o BNH acabou por financiar o projeto que resultou na construção do maior reservatório de água de Porto Alegre, com capacidade para cinco mil litros. A caixa da água por seu tamanho, favoreceu também grande parte dos bairros da Zona Sul.136

Por fim, o bairro planejado pelo poder público (somente na década de 90, o bairro é criado oficialmente, pela Lei nº 6.571, de 08/01/1990) vai se estruturando a duras penas, em termos de obras e mobilizações. Ao longo deste processo, as vivências comunitárias e a identidade cultural vão se sobressair, fortalecendo laços, criando identidades.

135 NUNES, 1997, p. 17. 136 D’AVILA, 2000, p. 80.

Documentos relacionados