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Capítulo 3 – Políticas públicas, indústria cultural e inclusão social

3.7 Novas mídias, redes e educação

As novas vias de acesso e difusão da informação, em sua maior parte, vêm se configurando através do digital. Esse tipo recente de leitura de mundo vem mudando a forma como as pessoas (especialmente as jovens) aprendem, jogam, socializam e participam da vida civil – o que reflete tanto na forma como recebem quanto na que produzem cultura (JENKINS, 2009).

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A mudança começa a ocorrer a partir dos anos 1980, quando os processos de comunicação sofrem tal crescimento, que alavancaram a difusão de formas de gravação de áudio e vídeo sem custos caros. A democratização desses sistemas de gravação, contudo, começa a ser notada de fato a partir dos anos 1990, conforme explica José Eduardo Paiva:

“Esse crescimento tem o seu ponto máximo com as tecnologias digitais desenvolvidas a partir dos anos 90, que baratearam imensamente o custo dos equipamentos, tornando disponível a qualquer um a possibilidade de utilização de sistemas de produção audiovisual a preços acessíveis e com um bom padrão de qualidade. Com isso os processos de comunicação pulverizaram-se, fazendo com que hoje praticamente todas as pessoas possam ter acesso a meios de produção de conteúdo audiovisual a baixo custo” (PAIVA, 2007, p. 309).

Na primeira década deste século XXI, muitos jovens, portanto, já cresceram em contato com estas novas mídias, principalmente pelo uso da Internet e das mídias móveis (como celulares, por exemplo). Ainda assim, apesar do aumento do acesso, a limitação ao se examinar a mídia em si ainda perdura, junto com a necessidade crescente de se integrar conhecimento de fontes diversas - como vídeo, áudio, multimídia, bases de dados, entre outros -, uma vez que esta emergência de modos de expressão digitais mudou nosso relacionamento com textos impressos (JENKINS, 2009).

Neste contexto, a concepção sobre „alfabetização‟ (literacy) vem se expandindo para além da habilidade de escrita e leitura. Henry Jenkins utiliza, para conceituar a „alfabetização para as novas mídias‟ („new media literacies‟), a definição do New Media Consortium (http://www.nmc.org/), organização sem fins lucrativos dedicada a estudar e explorar o uso de novas mídias e tecnologias, que a explica como

“um grupo de habilidades onde a instrução sonora, visual e digital se sobrepõe. Isso inclui a habilidade de entender o poder das imagens e sons, de reconhecer e utilizar esse poder, de

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manipular e transformar a mídia digital, distribuí-la, e facilmente se adaptar a estas novas formas” (tradução. JENKINS, 2009).

A percepção dos motivos e metas que modelam a mídia que consomem pode ocorrer no momento em que as pessoas compreendem as potencialidades dos novos veículos de comunicação, e de como esses possibilitam a colaboração de usuários em múltiplas vias – o que ainda não é possível com o formato atual do principal veículo a que se tem acesso no Brasil, a televisão em sinal analógico.

Na distribuição de verbas por segmentos na Lei Rouanet, nota-se que, em 2008, 14,3% dos recursos captados se destinaram ao Audiovisual, e 10,1% às Artes Integradas (segmento onde também se encontram os projetos de produção para novas mídias). Seriam números expressivos, não fosse o fato dos circuitos em que se fecham essas produções após sua realização. Filmes, em grande parte, percorrem festivais da área ou vão para as salas de cinema, as quais atingem parcela pequena da população (de acordo com levantamento do Ministério da Cultura, apenas 3% da população brasileira vai ao cinema pelo menos uma vez ao ano). Produtos digitais, quando não encaminhados para utilização por escolas públicas, acabam restritos à população que tem acesso a Internet.

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Figura 7. Mecenato: Quantitativo de Projetos Captados. Fonte: MinC / SalicNET, Comparativos/ Quantitativo/ Mecenato/ Captação de Recursos/ Por Ano e Área Cultural – 2008.

Henry Jenkins (2009) explica que nos Estados Unidos, por exemplo, há regiões com banda larga gratuita e disponível por toda a cidade. Acrescenta, entretanto, que a liberação de tecnologia não é suficiente, e que a expansão do acesso a computadores e Internet contribui para a quebra das barreiras das pessoas perante o digital apenas quanto vem atrelada a iniciativas educativas que ensinem as pessoas a utilizar as ferramentas de forma eficiente.

Isso vale para o Brasil também, com um início de casos de cidades – como Agudos (SP) – que disponibilizam banda larga gratuita para toda a população. Essa oportunidade de acesso a tecnologia funciona na medida em que seja trazida também para dentro da sala de aula, ou até mesmo dentro de contextos de educação informal que ajudem crianças e jovens a utilizar a Internet de forma rica, diversificada e útil. A inclusão digital depende menos da tecnologia em si do que em se providenciar as habilidades e conteúdo para utilizá-la de forma benéfica, o que pode levar inclusive a

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uma mudança grande na forma como a mídia é produzida e consumida (JENKINS, 2009).

Entre os pontos da mudança, quebra-se a linearidade do texto escrito e sua relação com o desenvolvimento escolar por níveis de idade, modelo de comunicação pedagógica que ainda está arraigado na sociedade (MARTÍN-BARBERO, 2004, p. 336). Já na educação informação, as relações se estabelecem por afinidades, onde as pessoas participam mais ativamente, de forma mais experimental e inovadora do que através da escala de diferenciação por idade e níveis de leitura. Também se acentua o sentimento de comunidade através da participação, onde as pessoas não se vêem como consumidores, e sim como produtores (CHAUÍ, 2006).

Não se trata de deixar a alfabetização escrita de lado, mas sim de, através dela, estabelecer bases para uma „segunda alfabetização‟, onde se reconfiguram as formas de se navegar por um texto, o que “nos abre para as múltiplas escritas que hoje conformam o mundo do audiovisual e da informática”. (MARTÍN-BARBERO, 2004, p. 344). É muito interessante, neste aspecto, a compreensão que Martín-Barbero possui sobre o desordenamento de „seqüências‟ do aprendizado por idades, através do vídeo e da televisão:

“...complexa e crescente cumplicidade entre oralidade e visualidade, cumplicidade que nada tem a ver com o analfabetismo. Os jovens hoje sabem ler, só que sua leitura não tem o livro como ponto e centro da cultura” (MARTÍN-BARBERO, 2004, p. 349).

E é justamente o ponto para atingir esta „construção de cidadãos‟ de que tanto se fala: assegurar educação que propicie a leitura do mundo de forma cidadã, capaz de incitar as pessoas a desenvolver uma visão crítica sobre as imagens, produtos e publicidades que as cercam.

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