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1.3. U MA NOVA CONCEPÇÃO DO M ARKETING

1.3.3. O novo papel do consumidor

A par com as mudanças verificadas nas organizações, também o comportamento social dos indivíduos tem sofrido alterações nos últimos anos, com um impacto direto na forma como as empresas se dirigem ao seu público e na interação desse mesmo público com a empresa (Dionísio et al, 2009: 295). Assistimos, atualmente, a grandes sinais de transformação na sociedade cujo impacto representa transformações substanciais sobre todo o tecido social (Cardoso, 2014: 98). Castells caracteriza esta sociedade contemporânea, como uma sociedade informacional, na qual a produção de informação, processamento e transmissão da mesma são as suas principais fontes de produtividade e poder (ibid: 101). Estas sociedades caraterizam-se, igualmente, como sociedades em rede, segundo Cardoso (2014) que defende que “da mesma forma que a organização hierarquizada do modelo industrial permeou toda a sociedade industrial, também o modelo

descentralizado e flexível da rede permeia as nossas sociedades contemporâneas” (ibid: 101-103). Trata-se de um novo contexto social, dinâmico e inovador, apropriado para “a economia, trabalho, política e organização social da nossa época” (ibid: 103). Esta nova sociedade vê a sua maior expansão ocorrer na segunda metade da década de noventa devido, essencialmente, à difusão da Internet nas famílias e na generalidade do tecido empresarial. Esta começa a difundir-se a uma velocidade sem paralelo, respondendo à necessidade da sociedade de se organizar em rede para a sua evolução social. Castells defende que “as sociedades encontram-se a viver uma transformação significativa que pode ser caracterizada por duas tendências paralelas que enquadram o comportamento social: individualismo e comunalismo” (ibid: 123) - enquanto o individualismo se define pela construção de sentido na concretização de projetos individuais, o comunalismo desenvolve a construção de sentido em torno de valores coletivos e internalizados pelos membros do grupo. Neste sentido, a Internet possibilita, em conjugação com os mass media, a socialização em rede de indivíduos que partilham interesses e valores similares, enquanto perseguem os seus projetos individuais (ibid: 123).

Nesta nova sociedade o consumidor tem, agora, um poder sem precedentes junto das marcas. Deixou, assim, o seu papel passivo, e passou a ter um papel ativo, com poder de influência no desenvolvimento da marca, dos seus produtos e serviços – é, agora, um “prossumidor” (Kotler et al., 2011: 21). Este novo papel resulta, em grande parte, do desenvolvimento das novas tecnologias que potenciaram a relevância da opinião do consumidor que cria informação ao mesmo tempo em que a está a consumir (ibid.: 21). Estes fatores conduziram à maior transformação de comunicação nos últimos anos: “a mudança de comunicação de massa para a auto-comunicação de massa” (Castells, 2013: ix).8

Com a globalização, o mundo torna-se, cada vez mais, pequeno, acessível e interligado – uma Aldeia Global, segundo Marshall McLuhan – com um novo público, uma nova marca e um novo produto estão agora à distância de um clique. Não só a audiência é globalmente maior mas também a concorrência, no mundo digital, é infinitamente maior. O indivíduo consegue alcançar, agora, marcas e produtos do outro

8 A auto-comunicação de massa é “o processo de comunicação interativa com o potencial de atingir uma

audiência de massa, em que a produção da mensagem é autogerada, a reaquisição das mensagens é

autodirigida e a recepção e cruzamento de conteúdo de redes de comunicação eletrônica é auto-selecionada” (Castells, 2013: ix).

lado do globo, reformulando os seus interesses e assumindo uma personalidade, cada vez mais, universal (Kotler et al, 2011: 26-28). Estamos, assim, integrados numa só sociedade, conectados através de uma grande comunidade digital, constituída pela Internet e pelas redes sociais. Esta interligação originou uma sociedade constituída por indivíduos conectados pela tecnologia, “na sua grande maioria, inovadores que criam e usam tecnologias de nova vaga” (Kotler et al., 2011: 32) e que acabam por lhes conferir o papel de formadores de opinião num ambiente em que o conhecimento é livre e não é necessário atingir nenhuma posição hierárquica para se expressar uma opinião. Assim, a Internet tornou-se o principal meio de comunicação da era digital, numa altura em que o conceito de comunicação livre significa uma prática subversiva que “desafia o poder de relações embutidas nas instituições e organizações” (Castells, 2013: xxi).

Com a evolução das novas tecnologias da informação, também a credibilidade de marcas e produtos sofreu alterações, na medida em que a convencional mensagem publicitária já não produz os mesmos efeitos (Kotler et al, 2011: 42), muito pelo contrário. Hoje, a comunicação concisa e direta e propensa à transparência é mais susceptível de atingir os consumidores. Aqui, é necessário compreender que a Internet une o mundo digital na nova era da informação e, em contraste à sua grandeza e superação de barreiras geográficas, permite a manifestação da individualidade de cada utilizador, os seus gostos opiniões e necessidades. Esta tendência broadcast yourself tem o potencial de atingir desde a rede mais restrita até milhões de utilizadores em todo o mundo, numa realidade em que menos é mais e o individual e criativo ocupam o lugar do massificado e dispendioso (Adolpho, 2012: 27). Embora a massificação ainda seja a tendência, não permite conhecer o consumidor, a sua opinião, respeito pelo produto ou preferência por determinados serviços ou marcas. Agora, um indivíduo tem a capacidade de se expressar e ser ouvido por multidões, graças às mais recentes evoluções tecnológicas. Aqui, quanto maior a interatividade da tecnologia, “maior a probabilidade dos utilizadores se tornarem produtores dessa tecnologia na sua prática” (Castells et al, 2007: 2). O foco deslocou-se do macro para o micro e agora o indivíduo, a parte outrora mais pequena da cadeia organizacional, é a parte mais poderosa (Adolpho, 2012: 27). Daí que seja apenas natural que a comunicação mais valorizada, entre os consumidores, seja a de outros consumidores. A comunicação digital “veio alterar profundamente a comunicação das marcas, exigindo dos gestores uma nova visão do processo de comunicação e abrindo novas

oportunidades de diálogo e interação com os consumidores” (Dionísio et al, 2009: 201). Atualmente, a mensagem real, e a coprodução entre a marca e o consumidor na criação da mensagem, tem mais impacto que a mensagem idealizada, comum na comunicação publicitária, que é agora encarada de forma desconfiada pela sociedade moderna. A informação está disponível ao consumidor para se informar sobre a marca e o produto, e este já não necessita confiar cegamente na mensagem publicitária pois dispõe dos meios de formar a sua própria opinião (Kotler et al, 2011: 42). A sociedade começou, com as novas tecnologias digitais, a desenvolver a sua opinião crítica sobres os produtos, e, por vezes, a contestar a sua legitimidade (Kotler et al, 2011: 42-44). A tendência é para desconfiar do sistema financeiro, do governo, da publicidade e da honestidade e integridade das pessoas, tornando-se essencial para o sucesso da empresas retomar a confiança dos seus consumidores através de um marketing personalizado, movido a valores, que procura proporcionar a melhor experiência aos consumidores (Kotler et al, 2011: 44).

Neste contexto, e mais que nunca, a segmentação é a melhor ferramenta de marketing. Na nova economia, independentemente do nicho, a ligação à Internet possibilita à empresa uma audiência e mercado global, na medida em que “os nichos transformam-se nos novos mercados” (Adolpho, 2012:45). O público de um jornal ou revista pode ser mulheres, entre os 40 e 45 anos, grávidas e solteiras. Enquanto no meio tradicional esse público transmite-se num mercado muito reduzido e limitado, nos novos meios de comunicação o mercado é global – os nichos transformam-se, assim, em massa com a quebra das barreiras geográficas. Contudo, a par com o aumento da audiência, também se verifica o aumento da concorrência num mercado mais competitivo em que uma nova oferta está à distância de um clique e não existem barreiras de tempo e espaço como nos meios tradicionais. Como tal, a primeira interação com o consumidor é essencial para assegurar a sua retenção e retorno. Muitas vezes, essa primeira interação é levada a cabo através do website da marca e dela depende todo o sucesso da experiência, desde a facilidade de navegação dentro do website aos conteúdos disponibilizados. Deverá, ainda, transmitir uma coesão entre o website e a marca, pelo que um domínio de Internet com o nome da marca é fundamental na construção da mesma (ibid.: 52-53). Além do domínio identificador, o website deverá, ainda, possuir uma navegação intuitiva, layout agradável, links funcionais e linguagem acessível. Também é fundamental que disponibilize botões de

partilha nas redes sociais, servindo, assim, como uma ferramenta de relacionamentos e interatividade que usufrui do consumidor e da sua rede pessoal para divulgação (ibid.: 85).

Embora o novo contexto digital apresente desafios ao marketing, na medida em que uma opinião negativa pode alcançar proporções gigantescas e a concorrência é globalmente maior, os novos meios de comunicação permitem também uma maior monotorização da parte do marketing das empresas, e uma abordagem diretamente ao consumidor, de forma personalizada, “provocando a ação imediata” (Dionísio, 2009: 292). As empresas conseguem, agora, um feedback em tempo real dos seus produtos e serviços, através do user generated content – a empresa oferece ao consumidor a oportunidade de dar a sua opinião e de contribuir para o desenvolvimento do produto/serviço e, munida dessa informação, os marketeers poderão adaptar a sua abordagem ao mercado com uma comunicação mais eficaz (ibid.:293). Contudo, e uma vez que este feedback é em tempo real, é expectável uma resposta rápida da empresa, uma vez que a velocidade de circulação da informação no meio digital, e o conhecimento ser gerado à escala global, resultam no facto de que “o risco de obsolescência do produto, do serviço, ou do negocio seja elevado” (ibid.: 294). Este problema toma proporções maiores no mercado dos jornais, na medida em que as informações viajam cada vez mais depressa e as notícias são entregues quase em tempo real, e a demora na oferta de conteúdo novo, atualizado e atrativo para o consumidor pode resultar na sua procura pela concorrência ou, até, na disponibilização do seu próprio conteúdo, o user generated content (ibid.: 296). As novas tecnologias permitem a circulação quase imediata da informação, tornando qualquer indivíduo com capacidade de criar e partilhar conteúdo num jornalista amador (ibid.:299). Não só a economia digital identificou a necessidade pela velocidade da informação, como também atribuiu um papel mais ativo ao consumidor que, por vezes, é quem dita as regras (Adolpho, 2012: 76). Não só se junta com outros consumidores para defender causas, marcas e ideias, como necessidade de perceber que está a “conquistar mais valor do que o preço pelo qual está a pagar” (ibid.: 77), pelo que quanto mais exposição positiva a marca obter com o utilizar, maior será o seu valor percebido. Uma opinião de um indivíduo pode influenciar drasticamente o sucesso de uma empresa, e a organização que não monitorizar esta atividade arrisca-se a encontrar o seu fim. Neste contexto, a Internet possibilita grandes vantagens ao marketing, na medida em que a informação disponibilizada sobre o consumidor é, também ela, muito maior, permitindo aos marketers a utilização dessa

informação em benefício da empresa. Esta monotorização torna-se ainda mais relevante quando o consumidor partilha a sua opinião sobre a marca nas redes sociais. Estas, permitem uma disseminação em larga escala da mensagem, valores, produtos e serviços da empresa, através da sua rede ou da rede pessoal dos seus consumidores. As redes sociais como Facebook ou o Twitter tornaram-se, “pela adesão que têm tido nos tempos recentes, não só um suporte de publicidade como um meio que permite comunicar de forma cada vez mais profissional marcas e produtos” (Lendrevie et al, 2010: 70). Esta organização em rede potencia a partilha viral de conteúdos, permitindo às marcas “atingirem rapidamente um elevado número de pessoas por propagação” (Dionísio et al, 2009: 197), tal como potencia novos comportamentos sociais e uma comunicação mais rápida e eficaz. As redes sociais permitem, tanto às marcas como ao indivíduo, contactos de grande dimensão em que o passa-a-palavra toma uma velocidade e dimensão que não seriam possíveis nos meios tradicionais. A função do marketing é, agora, explorar estas novas capacidades comercialmente (ibid.: 298-299).

Para o futuro, prevê-se que o papel do consumidor será, cada vez mais, completo e exigente. Este, estará mais atento à relação qualidade/preço e a um conjunto de valores como: defesa do ambiente, cultura e causas sociais, qualidade de vida e valores simbólicos, cuidado com saúde e segurança. Será, ainda, abordado por uma maior variedade de meios de comunicação, com espaço no mercado para desenvolvimento de novos media (Nunes e Cavique, 2008: 55).

Com o foco do presente estudo de caso na compreensão da adaptação digital da imprensa ao meio digital online, particularmente o Jornal i, o enquadramento teórico dos desenvolvimentos do marketing nesta nova realidade torna-se da maior importância. Este enquadramento aplica-se diretamente ao estudo em mão na medida em que contextualiza o novo contexto social e tecnológico em que o jornal opera, e as adaptações que o marketing do mesmo deverá prosseguir de modo a, não só responder às novas necessidades do consumidor, como também interagir com o mesmo, num regime de cocriação. O Jornal i insere-se, assim, numa série de marcas e produtos que necessita, urgentemente, de conseguir tanto conciliar o seu produto tradicional, o papel, com o produto digital, através do blended marketing, como originar uma maior e melhor percepção de valor daquele que é o seu bem imaterial mais valioso – a informação.

2. Caso de estudo

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