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Intervenientes no fornecimento de explicações: empresários e explicadores Com o desenvolvimento exponencial do mercado das explicações, a tradicional explicação particular, de caráter informal, deu lugar a negócios de maior dimensão, onde se incluem pequenas redes de centros de explicações com diferentes localizações e franchisings dominados por grandes grupos económicos que, para além das explicações podem gerir outros serviços educativos como, por exemplo, escolas privadas (Bray, 2011, p. 39; Bray & Lykins, 2012, p. 30; Costa et al., 2008, p. 55; Davies & Aurini, 2006, p. 123). Neste enquadramento, esta atividade pode ser desenvolvida por uma variada gama de empresários empreendedores que, independentemente da sua formação e área académica, veem nas explicações uma oportunidade de negócio lucrativo.

No que diz respeito ao franchising como modelo de negócio, Davies & Aurini (2006, p. 124) referem a sua emergência na educação e identificam as implicações que lhe estão subjacentes. De acordo com estes autores (ibidem), no Canadá, a atividade das explicações não compete diretamente com a escola pública, aparecendo antes como um complemento para uma franja de alunos que procura apoio adicional. No entanto, com a adoção do modelo de franchising, a atividade das explicações no Canadá cresceu mais rapidamente, ganhando uma dimensão supra nacional, tal como aconteceu com algumas cadeias de restaurantes que hoje estão espalhadas por todo o mundo.

Segundo estes autores (ibidem), este modelo de negócio apresenta dois impactos que não devem ser descurados, quando aplicados à atividade das explicações. Por um lado, a adoção de um contrato de franchising permite a estandardização do

22 produto/serviço que é oferecido, que é altamente controlado pelo franchisador no sentido de ver mantida ou melhorada a reputação da marca, e, por outro lado, o franchisador garante a expansão dos seus produtos/serviços oferecidos podendo em simultâneo alargar a sua oferta a outros produtos/serviços noutros mercados, para além desta estratégia poder funcionar na fidelização dos clientes. Neste quadro, também o franchisado ganha vantagens em relação ao negócio, nomeadamente porque o contrato prevê que o franchisado beneficie de apoio na sua gestão. É neste contexto que surgem os centros de aprendizagem que agregam uma variedade de serviços educativos, que se diferenciam dos tradicionais centros de explicações, de que a Kumon8 é um expoente máximo mundial.

Nesta atividade, os explicadores (homens ou mulheres) podem ser estudantes ou professores, trabalhadores que ficaram desempregados, se reformaram ou que se encontram a exercer a sua atividade profissional como trabalhadores independentes ou como trabalhadores por conta de outrem, trabalhando a tempo inteiro ou em part- time, como atividade principal ou secundária (Bray, 2008, pp. 20-21; 2011, p. 39; Costa et al., 2008a, p. 37; Glasman & Besson, 2004, p. 53; Silveirinha, 2007, p. 71). Do ponto de vista pedagógico, os explicadores podem ou não estar habilitados para o exercício da atividade, dependendo da sua qualificação profissional. Segundo Bray (2011, p. 41), quando nos encontramos perante um explicador que é qualificado para a profissão docente, esta questão não se coloca. No entanto, existem explicadores que não detêm qualquer habilitação para a docência nem realizaram qualquer formação pedagógica, o que os pode colocar numa situação de incapacidade para lidar com os diferentes níveis de aprendizagem e capacidades dos alunos a quem ministram as explicações.

Relativamente às abordagens utilizadas pelos explicadores durante as sessões de explicação, Bray (ibidem) refere que quando os explicadores são professores que em simultâneo trabalham no sistema formal de ensino, e têm grandes grupos de alunos nas sessões de explicação, estas tendem a seguir o mesmo formato de uma aula

8 A Kumon é “provavelmente a maior empresa de explicações do mundo”(Costa et al., 2008, p. 59). Esta

empresa foi criada no Japão há mais de 50 anos estando presente em 43 países (http://www.kumon.com).

23 normal. Não obstante, quando os grupos são mais pequenos, os professores adotam estratégias diferenciadas, podendo ser mais orientadas para o cliente sempre que se trate de explicações individuais. Para além disso, “estes professores podem dar

explicações a alunos pelos quais não têm nenhuma responsabilidade, ou podem fazê-lo a alunos a quem dão aulas na escola formal” (ibidem, 2008, p. 11) Neste contexto,

existem questões de ética que se podem revelar bastante problemáticas, nomeadamente quando os professores mudam a sua atitude perante o sistema de ensino formal e de forma deliberada reduzem o seu desempenho nas atividades diárias nas suas turmas, reservando, de forma premeditada, as suas energias e empenho para as sessões privadas de explicações (ibidem).

Intervenientes na procura de explicações: as famílias

Se, por um lado, seria de esperar que quem procura explicações o faz porque sente dificuldades no seu percurso académico e pretende melhorar o seu desempenho, por outro lado, o que acontece em muitas partes do mundo sugere que as explicações são procuradas por alunos que pertencem a grupos socioeconómicos privilegiados que já têm sucesso académico, mas que procuram uma vantagem competitiva adicional, sobretudo em momentos decisivos de transição no sistema educativo (Bray, 2011, pp. 33-35), no que Davies (2002) afirma ser uma cultura difusa de competição educacional. Para este autor (ibidem), numa referência ao fenómeno no Canadá, o rápido crescimento do mercado das explicações, associado à procura generalizada de competências educacionais, demonstra que existe uma preocupação crescente com o desempenho académico dos alunos desde tenra idade.

Neste caso, as famílias de maiores recursos financeiros são as mais bem posicionadas para garantir o sucesso académico dos seus filhos, podendo não só recorrer a mais explicações, mas também aos melhores explicadores. Esta condição permite-lhes ganhar vantagem competitiva adicional relativamente aos alunos que, pela sua baixa condição socioeconómica, não conseguem usufruir deste suplemento educativo privado (Bray, 2011, p. 35).

A este respeito, encontramos na citação de Neto-Mendes (2008, p. 89) uma das maiores preocupações em relação aos impactos negativos das explicações, que se

24 prende com questões de equidade e de igualdade de oportunidades, opinião que é corroborada por diferentes investigadores em diferentes contextos (Bray, 2011; Costa et al., 2008a; Dang & Rogers, 2008; Davies, 2002; Gouveia, 2012; Heyneman, 2011).

“A proliferação das modalidades de oferta de explicações (…) produz dois efeitos em que a contradição é difícil de iludir: se, por um lado, aumenta a diversidade da oferta e, assim, alarga exponencialmente as possibilidades de escolha dos clientes, por outro lado não se pode escamotear que aumenta o potencial de produção de desigualdades ao associar-se o mérito escolar à capacidade aquisitiva das famílias, consequência “natural” e desejada da frequência de explicações” (Neto-Mendes, 2008, p.89).

Sobre este assunto, Dang & Rogers (2008, pp. 166-169) afirmam que para que os decisores políticos dos vários países possam projetar políticas efetivas, devem compreender os efeitos da equidade e da produtividade deste setor, identificando e compreendendo os fatores que conduzem à crescente procura das explicações a dois níveis distintos. Por um lado, ao nível macro, através da parcela de orçamento público que é alocada à educação pública, das características do sistema educativo e do mercado de trabalho e dos valores culturais nacionais. Ou seja, a este nível, os autores (ibidem) referem que as razões que conduzem ao aumento da procura e da oferta das explicações se justificam através: (1) da transição para uma economia de mercado, que conduziu à emergência do fenómeno em países onde este não existia; (2) das ligações estanque entre o sistema de educação e o mercado de trabalho, das quais resulta um aumento de competição por mais educação; (3) da baixa qualidade do deficiente sistema público de ensino, que conduz à procura das explicações como compensação; (4) dos valores culturais existentes em cada país.

Por outro lado, ao nível micro através das características dos indivíduos, das famílias, das escolas e das comunidades, associadas a variáveis como os orçamentos familiares, níveis de escolaridade dos pais, preferência pela educação, expectativas sobre o retorno da educação e localização geográfica (urbana/rural).

25 RAZÕES DA PROCURA DAS EXPLICAÇÕES

As razões pelas quais as famílias procuram explicações para os seus filhos são variadas e distintas. Para alguns autores (Bray, 2011, pp. 35-38; Bray & Lykins, 2012, pp. 23-29; Costa et al., 2008a, p. 35) estas razões têm que ver sobretudo com (1) a existência de exames nacionais, em momentos decisivos de transição no sistema de ensino, como por exemplo os que antecedem os exames de acesso ao ensino superior, (2) a sobrecarga do currículo do ensino formal, intimamente relacionada com o sistema de exames vigente e com a (falta) de capacidade ou disponibilidade dos pais para apoiar os seus filhos nos trabalhos de casa, (3) com a cultura existente, (4) com a (falta de ) qualidade da escola no sistema público de ensino e (5) com outros motivos não académicos, em que o serviço de apoio à família é identificado como principal motivo. Quer pela necessidade que os pais têm de garantir que alguém cuida dos seus filhos, enquanto estes se encontram a trabalhar, quer pela necessidade de manter os filhos ocupados em períodos de férias escolares, sobretudo nas férias de verão, as explicações associadas “a serviços de ocupação de tempos livres são vitais para uma

família nuclear cada vez mais restrita e com elevados índices de ocupação laboral fora da esfera doméstica” (ibidem). Para além destes motivos, no que diz respeito aos

alunos mais velhos, Bray (2011) identifica ainda o desejo de agradar aos pais, conhecer amigos ou de integrar grupos de pares.