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2.1 MARTEL E O NUEVO CINE ARGENTINO

2.1.2 O nuevo cine argentino

Embora a Ley del Cine possua traços corporativistas20, tendendo a favorecer projetos nacionais encabeçados por grandes conglomerados da comunicação, seu texto reservava, em menor escala, incentivos às produções independentes que estavam tentando ingressar no circuito. Este apoio manifestou-se não só pela concessão de uma maior verba ao INC, como também pela ampliação de sua autonomia enquanto instituição, tendo em vista que a partir desta lei o instituto passou a ser o INCAA (Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales). Tal cenário favorável conferiu a este órgão o acesso aos recursos necessários e a possibilidade de aplica-los no desenvolvimento de ações que oportunizaram a realização de projetos cinematográficos, que do contrário, dificilmente sairiam do papel. “(...) O INCAA pode oferecer empréstimos e subvenções para os filmes, estabelecer associações financeiras com produtores e conceder prêmios” (CAMPERO, 2009, p. 30).

20 Sobre este aspecto CAMPERO (2009), comenta: “A la luz de la historia, la ley terminó favoreciendo a las

corporaciones. Se creó un consejo asesor formado por sindicatos, organizaciones de directores y organizaciones de productores. Estas corporaciones nombran a los comités que evalúan y aprueban el presupuesto y los proyectos a financiar. Los miembros de los comités no están por méritos propios sino por representar a entidades, y esas entidades son las que deciden qué financiar. Es decir, se financian a sí mismas.

Foi neste contexto que surgiu o filme Histórias Breves (1995), também considerado uma produção determinante no delineamento dos contornos do cinema argentino contemporâneo, sobretudo, na visão da crítica especializada, como veremos a seguir. A obra em questão é o resultado de um concurso de roteiros para curtas-metragens, promovido pelo INCAA em 1994, que proporcionou aos oito vencedores, entre eles Lucrecia Martel, a realização de seus projetos. O filme, portanto, consiste em uma coletânea21 que se destaca pela inovação produtivo-estilística proposta por todos os curtas que a compõe. Tal ímpeto de transgressão ao cinema que vinha sendo feito, o qual já dava seus primeiros sinais em “Rapado”, é acolhido pela crítica que passa a movimentar e a difundir a ideia de o início de um novo ciclo contemporâneo no cinema Argentino.

O número 40 da El amante, correspondente a junho de 1995, e logo após a estreia de No te mueras sin decirme a donde vas (Eliseo Subiela, 1995) e de

Histórias breves, intitulou em sua capa: “O Mal” (debaixo da foto do filme

de Subiela) – “O Novo” (debaixo de uma foto de histórias breves). A capa “O Mal – O Novo” resumia uma tomada de posição radical contrária ao cinema daquele momento (um filme que resumia os vícios do velho cinema, um diretor consagrado, prestigiado e festejado, produção de um grande grupo midiático e financiamento a cargo do estado argentino) e uma aposta por propostas estéticas inovadoras, arriscadas e cinematograficamente rigorosas de um grupo de jovens cineastas desconhecidos e sem compromissos (CAMPERO, 2009, p. 28).

O filme, além de demarcar o início deste Nuevo Cine, marco estabelecido pela crítica especializada e acolhido por grande parte dos pesquisadores do Cinema Argentino (CAMPERO, 2009; AGUILAR, 2006; VERARDI, 2010), também foi responsável por deslanchar a carreira de vários jovens cineastas considerados hoje como figuras emblemáticas no contexto do cinema contemporâneo, à exemplo de Martel. Na época, ainda estudante de cinema, Lucrecia tinha feito alguns poucos curtas-metragem em um sistema arcaico e colaborativo, sem nenhum incentivo do governo ou da própria escola que frequentava, uma vez que neste período o país sofria as mazelas de uma forte crise econômica, como vimos anteriormente. Neste sentido, seus primeiros filmes não alcançaram uma visibilidade suficiente para que a cineasta pudesse desenvolver projetos mais audaciosos. Foi, portanto, a participação de seu curta Rey Muerto (Lucrecia Martel, 1995) na coletânea Histórias breves, que a tornou conhecida e requerida no meio audiovisual, sobretudo, pelo fato do filme ter

21 Curtas-metragens e respectivos diretores que integraram o projeto Historias breves: La ausencia, de Pablo

Ramos; Niños envueltos, de Daniel Burman; Ojos de fuego, de Jorge Gaggero y Matías Oks; Guarisove, los

olvidados, de Bruno Stagnaro; Dónde y como Olivera perdió a Achala, de Andrés Tambornino y Ulises Rosell; Noches áticas, de Sangra Gugliotta; Rey muerto, de Lucrecia Martel y Cuesta abajo, de Adrián Caetano.

alcançado uma circulação significativa22 graças à mobilização dos próprios diretores (BARRENHA, 2011).

A trama relata a tentativa de fuga de uma mulher, junto com seus três filhos, do pequeno povoado onde mora, Rey Muerto, por conta da vida de maus tratos que leva ao lado do marido. No entanto, o homem não aceita o livre arbítrio da esposa e tenta a impedir de ir embora, provocando a reação da mulher, que tendo conseguido uma arma em seu caminho, atira contra os olhos de seu carrasco, conseguindo, assim, partir. A participação deste curta em um projeto eleito como pioneiro na definição do que seria o cinema contemporâneo Nacional dali para frente, automaticamente ligou o nome de Martel ao NCA23. No entanto,

Rey Muerto, apesar de notoriamente compartilhar um modos operandi, e certas predileções

temáticas e estéticas, com os outros curtas, também já apresenta algumas indicações da particularidade estilística que virá a permear os próximos longas-metragens da diretora. De modo a tornar mais tangível este contraponto, vejamos alguns pontos de aproximação e distanciamento entre o filme e a tendência que o permeia.

Ao analisarmos o curta é possível identificar aspectos desta Nueva onda que se consolidarão enquanto recorrências definidoras do movimento ao logo de seu processo de estabilização. Como exemplo, podemos citar o motivo temático que relata uma história de potência social, porém relatada dentro de um âmbito cotidiano e particular, qual seja, a da mulher sufocada pelo domínio machista do esposo que foge desta situação sem nos dar a conhecer nada além do seu instante de fuga. Além disso, é possível apontarmos a exploração de uma narrativa não linear, e a quebra do verbocentrismo (CHION, 2011)24 em detrimento de uma valorização da emanação da fala, como aspectos recorrentes na caracterização da cinematografia contemporânea Portenha já presentes em Rey Muerto. O Marido violento é verborrágico, mas o conteúdo dito por ele nos revela menos sobre a atmosfera e o discurso do filme do que a maneira com que literalmente ele cospe e esbraveja as palavras.

22 De acordo com Barrenha (p. 26, 2011): “Historias Breves logrou uma importante repercussão em crítica e

público: 12 mil espectadores (pode parecer um número pequeno, mas era uma surpresa pelo fato de que a presença de curtas no circuito comercial era – e é – quase nula)”.

23 Sigla convencionalmente utilizada nas pesquisas que se debruçam sobre o Nuevo Cine Argentino. Em alguns

momentos do texto adotaremos esta nomenclatura para nos referirmos a este movimento.

24 Trata-se de um conceito o qual problematiza a ideia de que a linguagem cinematográfica hegemônica

centraliza a produção de sentido dos filmes nos textos dos diálogos, proferidos pelas vozes, em detrimento dos outros elementos da banda sonora. Neste sentido, se em um primeiro momento de sua conceituação, Chion (2011) fala de um vococentrismo, como uma referência a centralidade da voz nos filmes, logo ao desenvolver seu pensamento, o autor chega à conclusão de que o que de fato é hipervalorizado na condução das tramas fílmicas é o texto, o verbo enunciado de forma inteligível, e não as propriedades específicas da voz (timbre, tom, potência, emanação etc.), aspectos notoriamente secundários nas produções que seguem os padrões clássicos.

No entanto, em meio a este amálgama de coincidências, é possível identificar especificidades deste filme determinantes para a composição do estilo peculiar de Martel, o qual irá se desenvolver em seus próximos projetos, tais como a valorização dos sons do mundo enquanto componentes centrais nos engendramentos de sentido da diegese, e a criação de um universo ficcional reconhecível, porém estranho, a partir de atuações não naturalistas. Embora apareçam aqui de maneira ainda intuitiva, esses recursos estilísticos já sinalizam a formação de uma cinematografia de potência autoral. Após mapearmos ao longo do presente texto as características consideradas como definidoras do movimento ora problematizado, voltaremos a este paralelo entre a diretora e o NCA.

Retomando a análise sobre o processo de retomada do cinema argentino a partir de meados da década de 1990, após quase uma década de forte recessão, destacamos o fato de ele ter sido impulsionado, em grande medida, pelo fortalecimento dos canais de apoio à produção independente, que por sua vez, foi possibilitado pela atenuação da crise econômica que vinha estagnando o desenvolvimento do país desde a redemocratização. Dessa maneira, foi neste cenário de prosperidade, que o Nuevo cine começou a tomar os contornos de um movimento, sobretudo, a partir da promulgação da Ley del Cine, como vimos no tópico anterior.

No entanto, transformações no âmbito da exibição também foram determinantes para que esses novos filmes, convencionalmente colocados à margem do circuito comercial, pudessem ser assistidos pelo grande público. Dentro desta perspectiva, os festivais de cinema, nacionais e internacionais, foram de suma importância para que essas produções independentes, as quais rejeitavam tanto convenções de linguagem do cinema hegemônico, quanto sua perspectiva primordialmente mercadológica, conquistassem espaço e visibilidade. Foi neste contexto de circulação que ganharam notoriedade dois filmes os quais são considerados, por críticos e pesquisadores, como os responsáveis pela consolidação da Nueva

onda que já vinha se formando desde Rapado (1992) e que já apresentou contornos mais

O Prêmio Especial do Jurado concedido à Pizza, birra, faso de Adrián Caetano e Bruno Stagnaro no Festival internacional de Cinema de Mar del Plata de 1997, e os prêmios de melhor diretor e melhor ator conquistados por Mundo Grúa, de Pablo Trapero, no Festival de Cinema Independente da cidade de Buenos Aires, em 1999, somados ao interesse do público, contribuíram para consolidar e promover o nuevo cine argentino. Desta maneira, e apesar do panorama de exibição gerar alguns obstáculos para a circulação dos filmes do novo cinema, este conseguiu se introduzir no campo cultural da argentina dos anos 90 e lentamente foi se afirmando como um dos fenômenos mais significativos da cena artística Nacional (VERARDI, 2010, pp. 70-71).

O filme de estreia de Pablo Trapero, um dos cineastas mais reconhecidos como integrante do NCA, foi feito com recursos limitados, em um formato de realização colaborativa entre amigos da cena independente, onde a improvisação para driblar os obstáculos da falta de financiamento fazia parte do rústico sistema produtivo. Mundo Grúa

(Pablo Trapero, 1999), só recebeu um mínimo aporte público quando já estava praticamente

pronto, de modo que a verba do INCAA serviu basicamente para pagar as dívidas contraídas durante a fase de execução e finalização do projeto (CAMPERO, 2009, p. 38). Além de seguir a linha produtiva independente que caracteriza a Nueva onda, a obra também compartilha de outros aspectos cruciais desta cena contemporânea. Vejamos.

A história é de natureza íntima e se desenrola a partir das ações triviais do protagonista. “Rulo” é um homem de meia-idade, solteiro, com uma saúde debilitada pelos maus hábitos, que vive em uma quitinete na capital, e conta com a ajuda de um amigo dos tempos juventude, época em que tinha uma banda e sonhava em ser famoso, para arrumar um emprego e, assim, poder se sustentar. No entanto, à falta de preparo para o mercado de trabalho, e a áurea de estagnação que o permeia, trazem dificuldades para que ele tenha sucesso nesta empreitada. Assim como os personagens de Rapado e Pizza, birra e faso (Bruno Stagnaro e Israel Adrián Caetano, 1997), Rulo é um homem simples, prosaico, sem nenhuma propensão a herói ou vilão, que almeja o básico para seguir sua vida: um emprego.

Nesse sentido, o filme reitera a fórmula da história mínima, presente nos filmes supracitados e em outros títulos desta onda de 1990, contrapondo-se assim diretamente ao modelo hegemônico da narrativa clássica hollywoodiana, adotado veementemente pelo cinema comercial Portenho, que se baseia em tramas mirabolantes construídas a partir de grandes acontecimentos de perspectivas universais e repleta de personagens estereotipados, cujos caráteres e contornos da personalidade geralmente são explícitos e de fácil identificação. Tudo que sabemos sobre Rulo vem da banalidade do seu dia-a-dia, durante este breve período

da sua vida que acompanhamos. A narrativa nos oferece o presente da diegese, e isso é o mais precioso que temos para fruir o filme.

A subversão ao verbocentrismo (CHION, 2011), já notável tanto nos curtas de

Histórias Breves, como em Rapado, também é uma aposta narrativa de Mundo Grúa. O filme

é repleto de diálogos, no entanto de conteúdo mínimo, corriqueiro, assim como a trama que os contém. As falas repletas de informações de enredo, meticulosamente estruturadas em um roteiro clássico que é tido como o “senhor” da história, são substituídas por conversas triviais, sem dados reveladores, as quais se afastam das normas do discurso e se aproximam de um despojamento típico da oralidade informal. Ademais, o filme não possui um desfecho, pois vemos apenas “Rulo” voltando para casa depois de mais uma experiência laboral frustrante, sem que isso signifique o fim da sua história. O que ocorre nesta forma de narrativa, fluída e aberta, é uma desconstrução da ideia de princípio e conclusão. O filme começou em um ponto qualquer, e é assim também que vai terminar. Tal formato, vale salientar, não era bem-vindo na tradição clássica onde o encadeamento ordenado, e, primordialmente, cronológico das ações, é uma convenção pouco desafiada.

A predileção destes cineastas de 1990 por histórias mínimas, não traz consigo a negação de uma abordagem do coletivo, pelo contrário, a reflexão acerca da realidade social reverberava, com intensidades diferentes, em seus filmes. Em Rapado e Pizza, birra, faso é abordada a questão de uma juventude ociosa e sem perspectivas de futuro, desesperançada pela crise Nacional, e que vê nos maus hábitos e na violência uma forma de se movimentar.

Rey Muerto constrói um discurso feminista, de aversão ao machismo social que assombra a

Argentina há décadas. Já Mundo Grúa toca nos pontos do desemprego e da exploração trabalhista. No entanto, tal reflexão acerca da problemática coletiva é suscitada a partir de histórias particulares, em uma proposta de individualização do drama social.

Nesta altura do texto, nos parece interessante retomar um sucinto contraponto entre os

nuevos cines de 1960 e 1990. Já trouxemos a ideia de que ambas as gerações compartilhavam

de um desejo de renovação das cenas cinematográficas antecessoras, quais sejam, as cenas de 1950 e 1980, cujas produções refletiam os formatos e conteúdos de um cinema comercial clássico e hegemônico. Tal renovação, em um espectro mais amplo, se expressava pela proposta de ressignificar o cinema nacional, explorado enquanto produto do mercado do entretenimento, para transformá-lo em um veículo comunicacional e artístico capaz de problematizar a realidade a qual pertence. A partir desse ponto maior em comum, estes

nuevos cines também se aproximam nas maneiras de combater a lógica dominante que os

Nesse sentido, ambos pertenceram às cenas independentes de suas épocas, apostando em meios alternativos de realização e circulação para os filmes, além de compartilharem de uma temática Nacional, que negando abordagens universais, se voltava para a realidade social e cultural do povo argentino. Podemos ainda acrescentar, um semelhante ímpeto de transgressão à linguagem narrativa clássica, expressado, sobretudo, pelo enfraquecimento do roteiro em detrimento de uma valorização da mise-en-scène, tanto visual, quanto sonora; pelo embate ao verbocentrismo; pela predileção por uma condução narrativa não linear e de finais abertos; pela saída dos estúdios e adoção da cidade de Buenos aires como locação principal.

Para Verardi (2010), o fato de pertencerem a distintos contextos sócio-político- econômicos, traz à tona diferenças entre esses movimentos, como o fato da geração de 1990 gozar de um profissionalismo e de um conhecimento técnico mais sistêmico, uma vez que diferente da de 1960, teve acesso às escolas, universidades e cursos de cinema que só começaram a existir no contexto Portenho a partir da década de 1970. Além disso, a cena contemporânea contou com subsídios do governo, enquanto que a vanguarda moderna era ignorada e rechaçada pelo Estado ditatorial, o que inclusive foi determinante para o completo desaparecimento do movimento, como vimos anteriormente. No entanto, segundo a autora, o mais sintomático para este paralelo entre os nuevos cines, é o fato de o movimento atual ter resgatado uma atitude crítica e ativa adotada pelo cinema moderno portenho, de conceber o filme em um diálogo permanente com as questões do seu tempo.

De fato este resgate aconteceu, porém, permeado pela distância contextual das referidas épocas. Em meio à situação política extrema de uma sucessão de ditaduras, o nuevo

cine de meados do século adotou uma postura militante, partidária, fazendo de seus filmes

veículos de uma ideologia contra o estado das coisas, seguindo assim toda uma lógica do transgressor movimento moderno ocidental. A mensagem política era explícita e circundada de motivos revolucionários. Já o novo cinema contemporâneo se constrói em meio a uma democracia ainda em consolidação, assombrada pelas pesadas heranças dos sucessivos períodos de estado de sítio, que luta para se estabilizar politicamente e economicamente, e que, portanto, traz suas próprias mazelas sociais.

O indivíduo não sofre mais uma opressão direta e explícita que o instigue a reagir, mas sim sofre frustrações pontuais e reiteradas, consequentes de problemas sociais mascarados, que vão lhe minando à vontade de mudar o que parece sem solução. É nesse contexto, que o

nuevo cine de 1990 encontra como meio de expressão a particularização da problemática

coletiva, tocando de forma sútil e sugestiva na questão social, propondo ao espectador, muitas vezes por meio de simbolismos e metáforas presentes em enredos intimistas, uma reflexão, e

não uma militância, frente à realidade a qual pertence. “Essa geração filma conflitos pessoais, da esfera do indivíduo, pequenas histórias da geografia íntima, nas quais sentimos o impacto da crise nacional, e quase sempre a apatia e a perplexidade em que ficou imersa a população (...)” (MOLFETTA, 2008, p. 177 apud BARRENHA, 2011, p. 35).

Mundo Grúa, como vínhamos analisando, sintetiza bem esta nova maneira do cinema

de lidar com a realidade tangível, sendo considerada uma película emblemática para pensarmos a cena contemporânea portenha, e não apenas por isso, mas por uma confluência de fatores: reúne as características básicas de produção, linguagem e conteúdo de seus antecessores do NCA, e as difunde no contexto cinematográfico Nacional e Internacional ao vencer categorias importantes (melhor diretor e melhor ator) do I BAFICI (1999), e a partir daí alcançar uma circulação bastante expressiva25. Assim, o filme fecha o ciclo de formação, iniciado com Rapado (1992) e levado adiante por Histórias Breves (1995), Pizza, birra e faso (1997), para citar os mais relevantes, do que viria a ser o cinema contemporâneo Portenho do século XXI.

A premiação de uma obra ícone para o Nuevo Cine Argentino na primeira edição do

Buenos Aires Festival Internacional de Cine Independente – BAFICI, sinaliza a importância

do evento para a difusão e amadurecimento desta cinematografia. Ao longo da era 2000 o BAFICI exibiu centenas de filmes que traziam as características narrativas e estéticas definidoras deste cinema contemporâneo Nacional, funcionando como um compilador do movimento. Surgido em um contexto favorável para a subversão de antigos formatos, o festival abriu suas portas para o cinema independente e se propôs a ir de encontro ao esquema turístico, glamoroso, elitista e comercial que caracterizava os eventos de cinema na Argentina. Dessa maneira, movimentou a cena cinematográfica de seu tempo ao apoiar o novo.

A combinação escolas\universidades de cinema e arte e seus milhares de estudantes, a nova crítica, o teatro independente, as novas tecnologias e a “ampliação da quantidade de telas” permitiu o início e a multiplicação dos efeitos do BAFICI. Ele formou a cinefilia dos novos cineastas, facilitou a exibição no exterior do cinema independente argentino, alimentou e ampliou a nova crítica, multiplicou os espectadores, concedeu a possibilidade de exibição de obras que de outra forma jamais teriam sido realizadas, e por isso disponibilizou um quadro estimulante para a criação a partir de apostas alternativas às habituais. Excelentes filmes tem o BAFICI como único horizonte possível (CAMPERO, 2009, p. 46).

25

A era 2000 é palco de um período próspero para o Nuevo cine, uma vez que a cena independente passou a contar com maiores aportes do governo. Durante a década de 1990, a gestão do INCAA foi, primordialmente, filiada à política Neo-liberal do Presidente Carlos