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O ASYLO DE ORPHANS: UM IMPERATIVO EMERGENTE

A cidade, uma monotonia em seu abandono, entregue a devastação da peste e sitiada pe- la morte, adquiriu um aspecto lúgubre. As ruas despovoadas os edifícios fechados, o commércio paralysado, tudo contribui para o desânimo geral, tudo indica o estado de a- niquilamento desta população laboriosa e activa. Aqui e ali crepitam, sob a espessa nu- vem de fumaça negra, fogueiras de alcatrão. A cidade assemelha-se a uma enorme câma- ra mortuária. Os carros fúnebres em desusada fúria, conduzem os despojos da peste a es- te pavoroso sorvedouro, - o cemitério, que dia a dia insaciavelmente abrindo espaço as victimas do flagello. Os enterros de classe, como os dos indigentes, não têm acompa- nhamento. As grandes calamidades não têm acompanhamento (3/4/1889) 74.

Em 1889, eclodiu em Campinas a terrível epidemia de febre amarela, transmitida pelo mosquito “Stegomya fasciata75”. A crônica da cidade mencionou o nome de quem trouxera a doença a Campinas: Rosa Beck, professora de francês, de 24 anos, suíça, sol- teira, contaminada no porto de desembarque, talvez Santos ou Rio de Janeiro, e como pretendia empregar-se, em Campinas, para exercer a função de professora,aqui perma- neceu no período de incubação na casa do Sr. Baenninger, espalhando o mal, vindo a falecer em 02 de fevereiro de 1899. O Diário de Campinas de 15 de fevereiro de 1889 noticiava que:

“A fallecida era de nacionalidade alemã e viera para esta cidade no intuito de empregar- se como professora”.76

O Sr. Baenninger, dono da Padaria Suíça e seu filho , dentre outros contamina- dos, também faleceram, entrando a cidade em processo de mortes sucessivas. Como a Padaria Suíça fornecia pães para as alunas do Colégio Florence, temendo contaminação das suas alunas, decidiu fechar temporariamente as portas do colégio, chamando os res- ponsáveis por telegrama, o que teve repercussão na imprensa:

Por causa da febre amarella que se tem dado em Campinas, diversos casos, a exma sra. d. Carolina Florence, directora do acreditado Colégio Florence, resolveu fechar por al- gum tempo o referido collégio, fazendo recolher as alumnas a casa de seus paes. Essa prudente deliberação é digna de applausos e demonstra o cuidado que a exma directora

74 O editorial do Jornal O Diário de Campinas de 03 de março de 1889 revelava o estado de calamidade pública que reduziu Campinas a um imenso sepulcro, como cita Ribeiro (1996, p. 153).

75 Informações colhidas em SANTOS FILHO, Lycurgo de C. A febre amarela em Campinas 1889-1900. Campinas Centro de Memória – Unicamp, 1996, p.39 (Coleção Campiniana).

possue pela saúde de suas alumnas (O Diário de Campinas, 8/3/1889)77

O irmão de Carolina Florence, o Cônsul Francisco Krug, faleceu de febre amare- la e o próprio filho da directora, Jorge Florence, farmacêutico, contaminou-se. Em fins de março a estatística apontava o número de 467 óbitos mensais, só declinando quando o forte calor foi abrandando. Mesmo assim, o Colégio Florence, que nessa cidade atuou por vinte e cinco anos, temendo que a epidemia pudesse voltar, não mais retomou suas atividades educacionais em Campinas, transferindo-se para Jundiaí, onde havia muitas famílias de suas alunas e o clima mais frio favorecia tal transferência. Carolina Florence reabriu a instituição no mês de agosto de 1889, levando consigo a viúva de seu irmão Francisco Krug, sua cunhada para a administração do novo colégio.

O Colégio Internacional também foi atingido pela epidemia de 1889, como relata Bencostta (1996, p.106):

O ano de 1889, além do evento político do advento da República que encerra em defini- tivo as barreiras legais a respeito da liberdade religiosa, foi marcado pelo fantasma da epidemia da febre amarela que aterrorizou no início daquele ano a cidade de Campinas [...] Os colégios da cidade, as escolas primárias particulares e do Estado tiveram que ti- veram que suspender suas atividades a fim de preservar a saúde de seus alunos a transfe- rir as responsabilidades pela vida destes para as suas respectivas famílias. O Internacio- nal, assim como os demais, sofreu com a epidemia. No início daquele ano ele tinha ma- triculado cerca de quarenta alunos, sendo este número reduzido à metade no ano seguin- te.78

E, realmente, a devastadora febre amarela permaneceu de forma endêmica, res- surgindo em surtos epidêmicos, na década de 1890.

Forçoso pontuar, em retrospecto, que a primeira superiora da Escola Asilo de Ór- fãs, a irmã Ana Felicité del Carreto, deixou o cargo de Campinas em junho de 1880, para submeter-se a um tratamento de saúde, na Europa, retornando em 1885 para assumir a direção de um colégio em São Paulo. Por esse tempo, a febre amarela já fazia suas víti- mas em algumas regiões do Brasil, em razão das precárias condições de higiene, de á- guas insalubres, assunto largamente explorado em Santos Filho (1996). Lamentavelmen- te, no transcorrer da viagem, a Irmã Ana Felicité, ao passar pela Bahia, contaminou-se com a febre amarela, cujo estado agravou-se, vindo a falecer ao chegar ao Rio de Janei-

77 As informações sobre as iniciativas de prudência e tranferência do Colégio Florence de Campinas, face à epidemia de febre amarela foram colhidas no último capítulo de RIBEIRO, Arilda Inês Miranda. Educa- ção feminina durante o século XIX: O Colégio Florence de Campinas 1863-1889.Campinas: CMU/UNICAMP, 1996.

ro, em 15 de junho de 1885, perda muito sentida pela congregação, primeiramente, pelas condições como ocorrera, e ainda pelo status que detinha por ter pertencido à nobreza de seu país, como Condessa del Carreto, embora tenha abdicado dessa honraria para servir a Deus, e, nessa missão, ter encontrado a morte por febre amarela.

A epidemia de 1889, considerada a pior delas, provocou êxodo geral. Os mais a- tingidos pelo terrível mal foram os integrantes da classe média e da classe baixa, pois a classe alta, incluindo muitos médicos e os titulares do Império que residiam em Campi- nas partiram e, alguns jamais retornaram. Os fazendeiros deixaram suas casas da cidade para se refugiarem nas fazendas; moradores menos favorecidos, apavorados, abandona- ram os lares e pertences, fugindo de trem ou a pé, reduzindo-se a menos da metade a população urbana, estimada em torno de dez mil habitantes.

Nem todos os da classe alta deixaram a cidade, pois dos vinte e um médicos que clinicavam na cidade, apenas poucos permaneceram, com dedicação ininterrupta, como Dr. Costa Aguiar, Dr. Ângelo Simões, Dr. Germano Melchert, e Dr. Alves do Banho. Conforme Santos Filho (1996, p. 151), mereceu destaque a atuação de José Paulino No- gueira, homem de negócios, grande fortuna e prestígio, que jamais cogitou de abandonar Campinas, “desdobrando-se em atendimento à cidade flagelada”, com todo o tipo de auxílio, desde roupas, medicamentos, até a implantação de “enfermarias municipais na Escola Correia de Melo, supervisionando a remoção dos doentes das casas para os hos- pitais, fornecendo condução gratuita aos médicos, contratando farmácias para a distribu- ição , por conta da Câmara.” José Paulino Nogueira contaminou-se com a febre amarela, guardou o leito e conseguiu superar o mal.

O comércio, açougues, hotéis, Fórum fecharam as portas. As escolas encerraram as atividades. A morte instalara-se impiedosamente, e um caminhão percorria as ruas da cidade, à tarde, para recolher corpos, a fim de agilizar os sepultamentos, que se davam à noite, para evitar contágio. Todos os colchões e pertences dos mortos eram incinerados.

“A doença se instalava subitamente, com náusea, febre altíssima, vômitos com sangue, comprometimento cardíaco e total prostração, levando, na maioria dos casos, à morte” (NEGRÃO, 1997, p. 20).

A Santa Casa de Misericórdia foi a primeira a providenciar uma enfermaria espe- cífica, e um hospital ambulante aberto. Dentre os integrantes dessa medida emergencial que contraíram a doença, faleceu uma das Irmãs, a Irmã Maria dos Seraphins Favre, cujo nome foi dado a uma rua, muito próxima à Santa Casa: a rua Irmã Serafina. Está trans- crito no Livro de Óbitos número um do Cartório de Santa Cruz de Campinas, o registro 441 (quatrocentos e quarenta e um):

Maria dos Seraphins Favre – Aos 15 de abril de 1889, neste Distrito de Paz da Paróquia de Santa Cruz, município de Campinas, província de São Paulo, compareceu em meu cartório Antônio Exel, exibindo atestado do Dr. Ângelo Simões, declarou que hontem, pelas 9 horas da noite, na Santa Casa de Misericórdia, faleceu a Irmã de Caridade Maria dos Serafins, de 44 annos de edade, religiosa de São José.

O dedicado médico Dr. Costa Aguiar também não poupava sacrifícios para mi- nimizar o sofrimento dos atacados pelo terrível mal, tendo trabalhado intensa e gratuita- mente, dirigindo a enfermaria “do Circolo Italiani Uniti de 4 de abril até meados de maionecessitando afastar-se por ter-se contaminado fatalmente, vindo também a falecer, em 19 de maio, na fazenda de seu sogro, em Itu” (SANTOS FILHO, 1996, p.77-79). Sua memória ficou perpetuada com o seu nome atribuído a uma rua central de Campinas. Outras Sociedades Filantrópicas em prol dos amarelentos79

Várias iniciativas filantrópicas, advindas de pessoas de reconhecida influência, emergiram no surgimento da febre amarela e foram muito profícuas por expressarem um esforço coletivo de solidariedade para colaborar, confortar, aliviar o sofrimento dos con- taminados, bem como criar serviços de assistência para suprir a alimentação deficitária da população carente.

A Sociedade Protetora dos Pobres foi fundada pelo médico dr. Alberto Sarmento e pelo Cônego Cipião Junqueira, no inicio de “mês do terror”, justamente a 7/4/1889 às 13:00h da tarde, no consistório da Matriz Nova (hoje Catedral), cuja finalidade benefi- cente consistia em coletar donativos para viabilizar a distribuição de gêneros alimentí- cios à população de poucos recursos, os quais ficariam armazenados no Coliseu, casa de

espetáculos com um parque de patinação, construído em 1878, situado na esquina da rua César Bierrembach com a avenida Irmã Serafina.80. A diretoria dessa Sociedade tinha como presidente, Cônego Cipião Junqueira – vigário da Matriz Nova; como tesoureiro, Alberto Muller – Delegado de Polícia, posteriormente, falecido, vítima da febre amarela; como primeiro secretário, Padre João Batista Correa Néri, depois primeiro bispo de Campinas; e como segundo secretário, Dr Joaquim Gomes Pinto – bacharel em Direito, pertencente a uma família portuguesa de destaque na cidade. A 14 de maio, a Sociedade Protetora dos Pobres comunicou já haver doado milhares de rações. No dia seguinte, o Cônego Cipião informou que totalizavam 2.100 as famílias cadastradas que haviam re- cebido os cartões, e que 35.000 rações semanais eram concedidas a 5.000 pessoas, ca- bendo sete rações a cada uma.

Pode-se inferir que a ação filantrópica mobilizou a sociedade campineira para angariar os recursos necessários a tão significativa distribuição. No entanto, em razão de contaminação pela febre amarela culminando com a morte de três de seus membros as- sociados, Alberto Muller, Francisco José de Carvalho e Cipriano Rosa de Andrade, a Sociedade Protetora dos Pobres pouco durou, um mês e vinte e três dias, encerrando suas atividades em 31 de maio, e uma placa de mármore de carrara e bronze, com o no- me dos beneméritos foi fixada na parede externa, ao lado da porta lateral da Catedral, na rua Treze de Maio, em reconhecimento aos serviços filantrópicos prestados na epidemia de febre amarela de 1889.

Como, no irrompimento da epidemia da febre amarela de 1889, era grande a co- lônia italiana em Campinas, tanto na cidade como nas fazendas circunvizinhas, outra louvável iniciativa altruísta deveu-se aos italianos, dentre eles, Fernando Balletero, Hugo Rizzi, Benjamin Taglietti, Pedro Semmi, Francesco Fachini, Luis Galgano, que criaram a Sociedade Cruz Verde, em 18 de março de 1889, verdadeira ação concreta em favor

79 Os dados coletados sobre as demais iniciativas estão fartamente descritos por Lycurgo de Castro Santos Filho, que por ser também médico em Campinas, debruçou-se, incansavelmente na investigação das epi- demias de febre amarela, sendo a fonte mais eficaz, através de sua obra- A Febre Amarela em Campinas

1889-1900, referencial a todos os que desejam conhecer a intensidade do terrível mal. Recomenda-se a

leitura das páginas 155-159.

80 Em que pese o autor Lycurgo de Castro Santos Filho ter nomeado a Av. Irmã Serafina, sabe-se que tal avenida passou a denominar-se avenida Irmã Serafina, em homenagem póstuma à Irmã Serafina, da Con- gregação de São José de Chambéry, contaminada fatalmente pela febre amarela, na Santa Casa de Miseri- córdia de Campinas, durante a epidemia de 1889.

dos enfermos do terrível mal. Na sede do jornal Il Tevere, editado por Luis Galgano deu- se a reunião de fundação da Cruz Verde, a qual funcionou no próprio Circolo Italiani Uniti de Campinas, com esmerado atendimento nas enfermarias aos italianos carentes contaminados, e auxílio às suas famílias com gêneros alimentícios. Também a Sociedade Portuguesa de Beneficência, idealizada por um grupo de comerciantes portugueses radi- cados em Campinas para atendimento médico-hospitalar à colônia lusa, por ocasião da febre amarela abriu suas portas aos portugueses amarelentos, ficando demonstrado o espírito congregatório e filantrópico entre os integrantes das colônias estrangeiras radi- cadas em Campinas.

Atuação da Imprensa Fluminense

“As notícias do sofrimento de Campinas devastada em abril pela epidemia, leva-

ram os órgãos da imprensa da Corte, em manifestação inédita, a se congregarem e a lan- çarem uma intensa campanha em benefício da população campineira”(SANTOS FILHO, 1996 p. 60).

Vale relembrar que Campinas gozava de grande prestígio perante a Corte, inclu- sive por já ter regiamente recebido as visitas do Imperador D. Pedro, o qual além de cumprir intenso programa, era recepcionado pela sociedade oligárquica de Campinas, tendo-se hospedado no suntuoso sobrado do Conde de Três Rios, localizado no largo da Catedral, na esquina das atuais rua Costa Aguiar com avenida Francisco Glicério:

A chegada a Campinas do casal imperial e comitiva deu-se no dia 28 de outubro de 1886 às 15h30, onde, mais de dez mil pessoas os esperavam nas cercanias da estação, forman- do alas pela rua principal (possivelmente a atual 13 de Maio), que se encontrava enfeita- da com arcos, bandeiras, flâmulas, festões de flores e folhas e as janelas das casas com lindas colchas, até o sobrado do Conde, depois Marquês de Três Rios – Joaquim Egídio de Souza Aranha –preparada para residência imperial durante a permanência do Impera- dor na cidade. Tratava-se de uma ampla e luxuosa casa, que já hospedara , em 1884, a Princesa Dona Isabel e o Conde d´ Eu Em suas viagens, a comitiva imperial era sempre acompanhada por uma delegação de jornalistas do Rio e de São Paulo. Esses jornalistas foram hospedados pelo Barão Geraldo de Rezende e pelo Barão de Ataliba Nogueira. Reunindo também representantes da imprensa local, Geraldo de Rezende ofereceu um banquete, no qual trocaram vários brindes (LAPA,1995, p. 89-90).

A mobilização da imprensa fluminense em conclamar a população carioca em prol de Campinas, assolada pela impiedosa epidemia, provavelmente, encontrou eco face a esse estreitamento de laços – oligarquia campineira, imprensa local, do Rio de janeiro

e de São Paulo, e Corte - gerando resultado imediato. A sociedade carioca disponibilizou vultosa coleta de recursos, roupas e alimentos, demonstrando a força persuasiva da im- prensa fluminense em, não somente comover corações, mas conseguir promover a ação concreta filantrópica por Campinas, ressalte-se, uma distante cidade vitimizada, não per- tencente ao estado do Rio de Janeiro.

Criada uma “Comissão Central da Imprensa Fluminense”, inúmeras providências emergenciais foram implementadas, em destaque, o envio para Campinas, em 20 de a- bril, de uma equipe de Socorro, integrada pelos dr. Clemente Ferreira, renomado clínico pneumologista; dr. João M de Azevedo Correia; farmacêuticos, enfermeiros, auxiliares; e ainda uma ambulância equipada com medicamentos e material de urgência (SANTOS FILHO, 1996, p. 102-129). O Jornal A Tribuna Liberal de 17/04/1889 publicou a carta de voluntariado beneficente dos referidos médicos:

Rio, 14 de abril de 1889. Ilmos Srs. Membros da Comissão de Imprensa.

Acudindo ao apelo da imprensa, cujos membros se reúnem para deliberar sobre a orga- nização de socorros e de auxílios à população de Campinas, vitimada pela epidemia, e convencidos de que os recursos médicos representam um papel saliente entre os auxílios que devem ser concedidos em semelhantes circunstâncias, resolvemos pôr à disposição da Comissão da Imprensa os nossos serviços, a fim de serem utilizados, se assim julga- rem necessário, em benefício dos indigentes enfermos dessa localidade. Satisfeitos de assim evidenciar a parte que tomamos na grande obra da caridade que tão nobremente tentais promover, nos assinamos

De VV.SS. atentos veneradores e criados obrigados Dr. Clemente Ferreira

Dr. João M. de Azevedo Correia.

Por três meses, em Campinas, permaneceu a equipe, com incansáveis trabalhos, retornando ao Rio no final de junho, tendo-lhe a Comissão de Imprensa Fluminense ofe- recido um lauto banquete no Hotel do Globo, como reconhecimento pela benemerência prestada a Campinas.

Bandos precatórios: “As juvenis alegrias suavizam agonias”

Merece destaque a dimensão tomada pela epidemia de febre amarela de Campi- nas a motivar ainda outras iniciativas não só no Rio de Janeiro, mas em várias cidades, mesmo distantes, onde as pessoas se agrupavam e percorriam as ruas em cortejo, reco- lhendo donativos em benefício dos contaminados.

Um artigo do jornal A Tribuna Liberal de 23 de abril descreve em detalhes o cenário urbano receptivo aos esmolantes:

Bando Precatório de São Cristóvão- Realizou-se ontem o Bando Precatório organizado pelo Grêmio Literário Otaviano Hudson, composto de alunos do Colégio Americano, a fim de angariar socorros para as vítimas da epidemia de Campinas. Foi uma festa muito modesta, mas muito significativa e digna de ser imitada.O Bando saiu às 4 horas da tarde e ia assim composto: na frente a banda de música militar da Polícia da Corte; seguia-se uma fila de alunos do colégio, alguns dos quais levavam pequenas bandeirolas triangula- res de cores branca e encarnada, com dísticos diversos, entre os quais, liam-se os seguin- tes: “As juvenis alegrias suavizam agonias” – “Pátria e caridade”, e outros.

Vinha em seguida um carro com as meninas Juanita Leite e Leopoldina Guimarães tra- jando vestuário simples mas apropriado ao ato, com capacetes nos quais se liam as pala- vras “Rio de Janeiro e Campinas”. Uma delas levava um estandarte encarnado com uma cruz branca onde se lia o dístico –“Para as vítimas de Campinas”. Seguia esse carro ou- tro grupo de meninas na mesma ordem que o precedente grupo, ao lado do qual ia o dire- tor do colégio, o sr. Dr. Sá de Meneses, que ontem fazia anos e assim entendeu que seus alunos celebrassem a festa. Fechava o préstito um landau generosamente concedido por um distinto cavalheiro, em que iam, por parte da Comissão Central da Imprensa, Roberto de Mesquita e Afonso Montauri. No pequeno número de ruas percorridas, a comissão escolhida para angariar donativos, e compostas das gentis meninas Maria José Cezimbra, Maria Valente de Sá Meneses, Emerenciana Ferreira, se conseguiu obter a soma de 137$460, que foi entregue aos representantes da Comissão Central, dela deduzida a quantia de 13$000 para despesas do carro do estandarte.

Indubitavelmente, um gesto caritativo gerava outro, e sucederam-se os bandos precatórios, em parceria com a imprensa, pela causa de Campinas: em Niterói, Guaratin- guetá, Lorena, Cachoeira, Iguape, todos eles noticiados pela imprensa. Na realidade, nos gestos da filantropia existia uma via de mão dupla, pois a misericórdia promovida , em contrapartida noticiava as personalidades que, publicamente, faziam a caridade. Todavia, tudo com foco em Campinas.

A campanha promovida pela Imprensa Fluminense envolveu vários segmentos da sociedade, com inúmeras adesões de colégios, de estabelecimentos comerciais, indús- trias, associações:

Uma oferta inusitada foi a de Guilherme Guimarães Júnior, no Rio de Janeiro: “60 cha- rutos higiênicos para serem utilizados pelas pessoas que tratam de enfermos em Campi- nas”.

O Grande Oriente do Brasil, da maçonaria do Rio de Janeiro, destinou 700$000 às víti- mas campineiras (SANTOS FILHO, 1996, p.164).

Consolidação do Asilo de Órfãs, em regime de internato

Embora desde 1878, estivesse funcionando na Santa Casa um Asilo de Órfãs, na realidade, era tão somente uma escola para alunas externas. Portanto, a epidemia de fe-

bre amarela, tendo ceifado, dentre outras, vidas de imigrantes desafortunados, colonos e

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