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O blues

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CAPITULO I − TRABALHO, ARTE e MÚSICA

1.6 O blues

O blues sempre esteve profundamente ligado à cultura afro-americana, especialmente aquela oriunda do sul dos Estados Unidos da América, dos escravos das plantações de algodão que usavam o canto, posteriormente definido como blues, para embalar suas intermináveis e sofridas jornadas de trabalho. As raízes na cultura africana são evidentes tanto em seu ritmo, sensual e vigoroso, quanto na simplicidade de suas poesias que basicamente tratam de aspectos populares típicos, como religião, amor, sexo, traição e trabalho. Com os escravos levados para a América do Norte, no início do século XIX, a música africana moldou-se ao ambiente frio e doloroso da vida nas plantações de algodão. O conceito de blues, no entanto, só se tornou conhecido após o término da guerra civil norte-americana quando sua essência passou a ser como um meio de descrever o estado de espírito da população afro-americana. Trata-se de um modo

3 Trata-se um cilindro giratório coberto com cera (ou cobre) no qual são gravadas, por uma agulha, as vibrações de um som emitido e afunilado em uma corneta, interligada a uma lâmina (membrana) que sustenta a agulha.

mais pessoal e melancólico de expressar seus sofrimentos, angústias e tristezas. Uma cena, que acabou por tornar-se típica nas plantações do delta do Mississipi, ressalta Macêdo (2003) cantando o blues.

O blues é um gênero musical maior, que inicialmente exerceu grande influência na música popular norte-americana e posteriormente a música pop mundial. Parte fundamental da música negra tradicional, abrange diversos subgêneros, que podem ser localizados histórica e geograficamente.Macêdo (2003) afirma que os negros trouxeram sua expressão vocal básica, os hollers (gritos). Os gritos eram também ouvidos nas ruas das cidades, onde vendedores ambulantes anunciavam seus produtos ou serviços por meio de um pungente canto rítmico, que também era utilizado para anunciar a chegada e a partida dos trens nas estações. Essa marca individual projetou-se também no blues.

A esse respeito, Pellegrini (2004) esclarece:

O blues é um tipo de música que determina uma dualidade constante, nascida das dúvidas e angústias que povoavam a cabeça do negro no novo país para o qual ele fora levado. Ele retratava a ansiedade entre o ser e o não ser, entre o ter e o não ter, entre a felicidade e a tristeza, entre o amor e o ódio, entre o campo e a cidade, entre a escravidão e a liberdade, entre o negro e o branco e entre o homem e a mulher (p. 86).

O blues não é um gênero de jazz, mas possui a estrutura básica do jazz. De uma forma ou de outra, o blues está presente em toda e qualquer música de jazz, tanto de uma forma explícita – quando o ouvinte que conhece o blues pode perceber claramente o seu compasso tradicional − como de uma forma implícita, ser encontrado em uma harmonia moderna ou um estilo de vanguarda, afirma Pellegrini (2004).

Há várias versões sobre a primeira composição típica de blues, assim como seu primeiro idealizador. O mais correto porém, é dizer que o blues surgiu de uma forma mais ambiental e progressiva do que de uma única canção. De fato, a instrumentalização das work songs (canções de trabalho) foi o marco inicial para o surgimento do blues como estilo de música, (Macêdo, 2003).

Conforme Pellegrini (2004), paralelamente, o blues também foi sofrendo algumas transformações, apesar de manter inalterada a mesma estrutura do blues original: surgiu o estilo classic blues, mais adaptado ao refinamento do jazz, ao qual foi acrescentada certa riqueza na letra e na linha melódica. O contry blues, que manteve os

elementos originais do blues, também sofreu modificações, o que deu origem a outros ritmos negros no decorrer do século XX.

Os textos do blues refletem o que é importante para o cantor de blues: o amor, a discriminação racial, a prisão e a polícia, as enchentes, os desastres, a previsão do cigano, o pôr-do-sol, o lírico e o trágico, tudo dito de forma tão direta e real como não se conhece em nenhum outro tipo de manifestação literária popular. O texto de mais da metade dos blues comenta o amor, feliz ou infeliz, realizado, ou irrealizado, declara Macêdo (2003).

A guitarra elétrica tornou-se unanimidade absoluta no blues, no início dos anos 1940, porém, nenhum outro nome consagrou tanto a guitarra solo como elemento central do blues quanto B.B. King, que surgiu um estilo único e quase inigualável de frasear o instrumento, de forma pura e melódica como poucos conseguem. Influenciando praticamente todos os guitarristas que vieram posteriormente, é proclamado o rei do blues, e de fato, blues e B. B. King, atualmente, são termos quase inseparáveis, conforme Pellegrini (2004).

Um dos momentos mais marcantes do blues foi apresentação de Muddy Waters, em Londres, no início dos anos 1950. O reconhecimento do blues na Inglaterra nos anos 1950 provocou uma revolução na história da música ocidental, e da fusão do blues, com uma nova vertente, o rock, nasceu um gênero que marcou em essência toda a nova geração de músicos que despertava no cenário mundial. Tratava-se do blues-rock, salienta Pellegrini (2004).

Durante os anos 1970, o blues, como forma predominante musical, que havia influenciado o surgimento de diversas outras tendências, foi perdendo espaço cada vez mais para os novos gêneros que surgiram. Até meados dos anos 1980 o blues quase inexistia como estilo musical. As aparições dos músicos clássicos de Chicago eram cada vez mais esporádicas. A própria nova moda rejeitava a sua tendência não-comercial contrastante com a fase dancing dos anos 1980 (Macêdo, 2003).

Segundo Macêdo (2003), o desaparecimento gradativo do blues no cenário mundial nos anos 1990, coincidiu com a queda de praticamente todas as vertentes musicais expressivas, que foram cedendo espaços a estilos comerciais voltados para a mídia, pouco preocupados com uma expressão artística e cultural, o que levou a uma queda acentuada na qualidade artística das composições musicais. Novos músicos de

blues ainda surgem no cenário musical, mas estão longe de serem expressivos e significativos como já o foram.

Enfim, para os trabalhadores do mundo artístico, nem sempre existe o sucesso de uma minoria. Dentre as dificuldades financeiras, sociais, afetivas e econômicas, há sobrecarga de trabalho, ainda mais se o músico alia o trabalho artísitco a uma outra atividade paralela que lhe garanta recursos financeiros para a sobrevivência.

Na psicodinâmica do trabalho, o trabalho é estudado de modo a verificar não somente o impacto de sua organização no funcionamento psíquico dos trabalhadores, mas os sentidos do trabalho para os músicos, o que torna a teoria escolhida adequada para esta pesquisa.

O próximo capítulo tem como o objetivo apresentar a psicodinâmica do trabalho, a abordagem que embasou teoricamente o estudo em questão, seus principais conceitos, o itinerário histórico e suas categorias mais importantes.

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