• Nenhum resultado encontrado

2 O TRABALHO E SUAS REPERCUSSÕES SUBJETIVAS

2.5 O capitalismo flexível, a universidade pública e a atuação do professor

Antes que se aborde acerca de como o capitalismo alcança a academia a ponto de alguns autores chegarem a propor a expressão “capitalismo acadêmico”, parece importante compreender de que forma, em que circunstâncias e sob quais condições as organizações públicas, de um modo geral, as quais não têm fins lucrativos, têm suas rotinas e práticas alinhadas, e por que não dizer submetidas à lógica mercantilista neoliberal.

Trata-se, indubitavelmente, de um processo construído historicamente, que tem suas raízes fincadas no auge no modo de produção capitalista que foi, gradativamente, fortalecendo a ideia da propriedade privada, reduzindo o sentido do trabalho a emprego e à carreira, tendo como centro da sociedade e do capital, a figura das empresas.

Ao tratar das consequências da reestruturação econômica na estrutura de propriedade dos Estados Unidos, Gaulejac (2007) ressalta que a principal delas foi a conversão da sociedade, ou pelo menos de uma grande parte dela, em uma sociedade de empresa.

Nesse sentido:

A empresa, e suas necessidades, começam a ditar as prioridades, os valores e as imagens ideais da nova subjetividade da classe média. E ancorada em uma dupla raiz: na dependência econômica dos indivíduos e, mais revelador, em sua dependência psíquica e social (empresa: lugar de pertencimento e espaço de convívio) (GAULEJAC, 2007, p. 14-15).

E eis que se pode dizer que se tem, desde esse momento, um culto à valorização das organizações privadas, as quais ganharam cada vez mais visibilidade com a implementação de métodos racionais de trabalho, já apontados ao longo desse capítulo, traduzindo-se, portanto, em sinônimo de eficiência, produtividade, qualidade, etc.

Com a globalização, o surgimento das novas tecnologias e a reestruturação produtiva, que vão demarcando o início de uma nova era do capitalismo, qual seja a acumulação flexível, acentuam-se a valorização das práticas, modelos de gestão e métodos de trabalho utilizados nas empresas privadas, ditas mais enxutas, menos onerosas e mais flexíveis, ao passo que as organizações públicas são rotuladas como ineficientes e incapazes de oferecer bons serviços à população.

Deste modo é que se abre espaço para a aplicação no setor público, das mesmas filosofias e práticas implementadas nas fábricas e empresas em geral, a partir do toyotismo, quais sejam: redução de gastos e enxugamento a qualquer custo, flexibilização das relações de trabalho e desregulamentação de direitos, além do questionamento acerca do papel do próprio Estado e das suas atribuições e responsabilidades, passando a ser defendida a ideia de um Estado mínimo, que deve intervir minimamente nas leis de mercado, compreendidas, erroneamente, como naturais.

Tal como retratam Ribeiro e Mancebo (2013, p. 195):

Todo esse receituário das mudanças no mundo do trabalho, acompanhado de perto por um discurso que advoga a necessidade de enxugamento também das funções até então atribuídas aos Estados, atingem, profundamente o serviço público. Na realidade, ocorrem, em muitas situações e países, uma desmontagem do setor produtivo estatal, ondas de privatização que retiram setores, antes considerados estratégicos, da mão dos Estados nacionais.

Nesse bojo, alguns dos direitos duram e, tardiamente conquistados do Brasil, mediante lutas e resistências, como é o caso dos direitos trabalhistas, são considerados entraves ao desenvolvimento do capital, haja vista a velocidade das demandas e das mudanças no mercado. Outros tantos, por exemplo, educação, saúde e segurança, nem minimamente garantidos aos cidadãos, são rebaixados à categoria de serviços a serem consumidos, portanto, somente acessíveis a quem puder comprá-los.

Para compreender melhor esse processo, necessário se faz remeter-se às transformações ocorridas no setor público nos últimos anos, notadamente aquelas decorrentes da implementação da Reforma do Estado no Brasil, a partir de 1995.

Sob o lema capitalista de que a competição acirrada e o imperialismo das leis de mercado é que geram qualidade e eficiência nos serviços:

O projeto de Bresser Pereira, no Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), no governo Fernando Henrique, era deixar poucas áreas nas mãos do Estado criando o neologismo do “serviço público não estatal” para designar setores que seriam privatizados ou funcionariam sob a lógica do mercado e a abertura da competição entre empresas públicas e estatais por recursos públicos. Para tal desiderato era imprescindível “reformar” a legislação pertinente, no tocante à relação entre o trabalho e o capital existente, fazendo o pêndulo da balança pender favoravelmente para o capital (FERREIRA; LIMA, 2013, p. 5-6).

Nessa perspectiva, está-se diante de uma tendência em que a linha entre as esferas pública e privada se torna bastante tênue, no sentido de que as regras (de mercado) aplicáveis a um contexto, serão aplicadas ao outro. Além disso, sob a égide do paradigma neoliberal, começa a se estabelecer uma relação de “parceria” entre os dois setores, notadamente, onde as verbas públicas são destinadas para reverter a crise do capital, e para tanto, será necessário sacrificar os cidadãos, sob um retórica de que estes agora podem ter a liberdade de escolher entre serviços privados mais eficientes, como o que supostamente teria acontecido no caso das telecomunicações.

Quanto a este aspecto, Chauí (2014, p. 88) esclarece:

O neoliberalismo, portanto, não é a crença na racionalidade do mercado, o enxugamento do Estado e a desaparição do fundo público, mas a decisão de cortar o fundo público no pólo do financiamento dos bens e serviços públicos – ou dos direitos sociais – e maximizar o uso da riqueza pública nos investimentos exigidos pelo capital, cujos lucros não são suficientes para cobrir todas as possibilidades tecnológicas que ele mesmo abriu. O neoliberalismo é o encolhimento do espaço público dos direitos e o alargamento do espaço privado dos interesses de mercado. Instaura-se um modelo de desenvolvimento no qual a educação e o conhecimento são postos como centrais, sobretudo, uma educação adestradora e em conformidade com as necessidades de mercado; portanto, para atender especificamente as demandas deste. E assim sendo, o ensino superior, enquanto permitindo uma leitura crítica da realidade, não será foco; as regras e metas a serem cumpridas, em termos de educação, sobretudo, pelos países latino- americanos, são estabelecidas por órgãos internacionais como Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, especificamente:

O receituário neoliberal foi universalizado principalmente nos países do Terceiro Mundo e as recomendações foram a descentralização da capacitação em serviço, livros didáticos, guias curriculares, educação à distância, prioridade no ensino

primário, assistencialismo e privatização dos demais níveis de ensino (SILVA, 2015, p. 57).

Deste modo, o que já tinha acontecido outrora com o ensino médio – o desmantelamento da sua qualidade através de práticas diversas e, sobretudo, do corte de verbas – viria ocorrer com o ensino superior. Se antes tinha algumas escolas públicas como uma referência, como é o caso, por exemplo, dos Liceus, onde se diplomaram grandes poetas e estudiosos no início do século XX, o que ocorreu foi um desmantelamento, validado e sustentado pelo Estado, desse nível do ensino público, a fim de abrir espaço para a educação privada, tal como demonstrado por Chauí (2014, p. 97) no trecho que segue:

[...] durante a ditadura, a classe dominante, sob o pretexto de combate à subversão, mas realmente para servir aos interesses de uma de suas parcelas (os proprietários de escolas privadas), praticamente destruiu a escola pública de primeiro e segundo graus. Por que pode fazê-lo? Porque nesse país educação é considerada privilégio, e não um direito dos cidadãos. Como o fez? Cassando seus melhores professores, abolindo a Escola Normal na formação dos professores do primeiro grau, inventando a licenciatura curta, alterando as grades curriculares, alterando as grades curriculares, inventando os cursos profissionalizantes irreais, estabelecendo uma política do livro baseada no descartável e nos testes de múltipla escolha e, evidentemente, retirando recursos para manutenção e ampliação das escolas e, sobretudo, aviltando de maneira escandalosa o salário dos professores.

Na educação superior, todo um aparato governamental e legal é construído, a fim de assegurar um contraditório processo que se traduz no incentivo e financiamento da educação privada através do uso de recursos de origem pública, em paralelo à desestruturação e privatização interna das universidades públicas, e ainda no uso do saber universitário em prol de questões mercadológicas. A título de exemplo, conforme esclarecem Leda e Mancebo (2009) podem ser citados:

a) A própria vinculação das universidades públicas federais e estaduais, respectivamente, ao Ministério do Planejamento e aos órgãos correspondentes na governança estadual, e não mais ao Ministério da Educação, numa clara evidência de que estas devem estruturar-se segundo o modelo da grande empresa privada que “[...] tem o rendimento como fim, a burocracia como meio e as leis do mercado como condição” (CHAUÍ, 2014, p. 70);

b) A criação de leis regulamentando trocas mercantis entre a universidade e o mercado, tais como a Lei de Inovação Tecnológica, nº 10.873/2004 e a denominada Lei de Parceria Público-Privada, nº 11.709/2004 (BRASIL, 2004). A primeira, que dentre outras deliberações: dispõe tecnologias produzidas nas universidades e centros de pesquisas públicos para empresas privadas, permitindo, por decorrência, que os centros recebam lucros advindos

de tal parceria; permite que a estrutura das universidades públicas possa atuar como incubadora de pequenas empresas, contribuindo, assim, para distanciar a universidade do seu verdadeiro papel social. E a segunda, que permite, sob a alegação da falta de recursos públicos, que a iniciativa privada possa financiar, construir e operar certos empreendimentos e serviços (inclusive os sociais, como educação, saúde, transporte, etc.), que são posteriormente comprados pelo Estado, nas suas diversas instâncias (federal, estadual ou municipal);

c) A criação de leis beneficiando a expansão do ensino superior privado, que teve como marco legal primeiro, a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em 1996, avançando com o Plano Nacional de Educação (PNE) em 2001.

Por outro lado, como contraponto para mascarar o real intento de privatização do ensino superior, não se pode deixar de citar a aprovação do Decreto Presidencial nº 6.096, de abril de 2007, que institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) que, na prática, seguindo a perspectiva gerencialista e mercadológica, vincula o recebimento de verbas ao cumprimento de metas contratuais relacionadas à diminuição da evasão e dos custos por aluno, criação de cursos noturnos, flexibilização de currículos e outros tantos critérios apenas associados ao lema “fazer mais, com menos”.

Mais recentemente, teve-se, para citar só alguns exemplos: a aprovação da Lei nº 12.550 de dezembro de 2011, Brasil (2011), que permitiu a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBESERH), sob regime jurídico de direito privado e que claramente terceiriza os serviços dos hospitais universitários; o PNE aprovado pelo governo Dilma em 2014, o qual, sob o discurso ideológico da acessibilidade ao ensino superior, desvia recursos públicos para as instituições privadas através do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (PROUNI), Lei nº 11.096/2005 (BRASIL, 2005).

Teve-se, ainda: os cortes de orçamento estabelecidos em 2015, no qual o ensino superior foi um dos mais afetados; a sanção, pela então presidente, em janeiro de 2016, da Lei 13.243/2016 (BRASIL, 2016), que define o marco regulatório, isto é, os termos legais que passam a reger a produção brasileira no campo da ciência, da tecnologia e da inovação, submetendo-a ao mercado nacional e internacional; e por fim, para apresentar só mais um exemplo, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que sob o discurso de conter a crise econômica no país, estabeleceu o congelamento dos gastos públicos por até 20 anos, implicando um freio nos já limitados e insuficientes recursos de manutenção e investimento na garantia de diretos como saúde e educação.

Nesse contexto, com relação aos cortes de verba e as mudanças a que tem sido submetido o ensino superior no Brasil, sob as linhas mestras do modelo político-econômico vigente, é oportuna a fala de uma participante da pesquisa, ao referir-se à justificativa de falta de recursos para realizar concurso público para professores efetivos:

[...] tem uma conjuntura [por trás dessas justificativa]; o próprio reitor: vai perguntar pra ele por que não faz concurso, ele vai ter uma resposta; é uma resposta que inclusive te convence: “porque não tem recurso”. Ah, não tem recurso pra fazer concurso pra professor, mas tem recurso pra fazer outra coisa. Eu acho que a gente deve sempre ter esse olhar da estrutura, do todo (PARTICIPANTE 4).

E esse “olhar do todo”, que abarque uma análise crítica, menos rasa, por vezes somente vem a ser estimulado, senão permitido e possibilitado, exatamente dentro da universidade, o que talvez explique o fato dela também ser alvo de precarização, refletida no não oferecimento das condições mínimas para garantir seu funcionamento, em conformidade com a proposta de integração e interdependência entre ensino, pesquisa e extensão.

Outro depoimento, dessa mesma professora durante uma das sessões, ao relatar sobre a sua identificação com o papel do professor universitário, retrata um pouco desse caráter de formação de pensamento crítico que pode se dar, mais autonomamente, numa instituição de ensino superior pública:

[...] o que me motiva a ser professora, dada toda essa conjuntura de desvalorização, de precarização, inclusive passar por toda essa experiência de professor substituto precarizado, que é relevante, contraditório... mas é o fato de também poder possibilitar essa discussão e esse acesso à produção do conhecimento mundial, ao que já foi produzido. E de preferência, que a gente também faça um acesso crítico do que dispõe (PARTICIPANTE 4).

Nessa linha de raciocínio, para compreender criticamente a situação atual das universidades e o trabalho docente, nas suas várias nuances e implicações, portanto, numa perspectiva dialética, necessariamente há que se perpassar por outro momento deste mesmo processo, historicamente anterior ao que se tem descrito, qual seja a primeira versão da Reforma universitária, realizada a partir de 1968.

Segundo Chauí (2014), tal movimento surge no Brasil com o objetivo de “democratização” da universidade, considerada pela classe média da época como excessivamente celetista. Na verdade, ressalva a autora, tal Reforma teve por objetivo silenciar o movimento de rebeldia e de crítica que saía do espaço universitário e alcançava as ruas contra a ditadura e o Golpe de Estado de 1964 e, por outro, lado, tal como ocorrera na Europa, sob imposição econômica, atuar retoricamente no sentido de reafirmar a ideologia da igualdade

educacional, que apenas mascara as contradições e o caráter excludente inerente ao sistema capitalista.

Nesse sentido:

Momentaneamente convertida em problema político e social prioritário, a universidade será reformada para erradicar a possibilidade de contestação interna e externa e para atender às demandas de ascensão e prestígios sociais de uma classe média que apoia o golpe de 1964 e reclamava por sua recompensa (CHAUÍ, 2014, p. 63).

Num breve resgate, apenas para fins de contextualização, convém ressaltar que, segundo a mesma autora, a primeira versão da Reforma universitária, em 1968, trouxe como principais modificações: a departamentalização, a matrícula por disciplina, a invenção do curso básico, a unificação do vestibular por região e ingresso por qualificação, a fragmentação da graduação e a institucionalização da pós-graduação que, para Chauí (2014, p. 65), “[...] ao recuperar a verticalidade do ensino universitário, repõe a discriminação socioeconômica que fora abrandada na graduação”, e traduz o caráter excludente próprio do modo de produção capitalista, mascarado sob a forma da ideologia da competência.

A partir desses elementos, ficam evidentes as linhas mestras gerais que, não obstante as especificidades do país, são norteadoras de uma lógica mundial na qual se estão inseridos e que traduzem a construção histórica do discurso hegemônico que justifica, por exemplo, a exclusão, o desemprego, a submissão ao trabalho precarizado como algo decorrente apenas da falta de qualificação. Nesse sentido, tem-se um mascaramento da conjuntura política, social e econômica que delineia as condições de precarização, mais ou menos intensa, a que todos estão submetidos, seja a precarização do trabalho, das relações, da saúde, etc.

E é nesse contexto, ao longo desse processo, que o capitalismo flexível vai se instalando gradativamente também na universidade pública, trazendo consigo todos os elementos de precarização que lhe são típicos: intensificação do trabalho, flexibilização, supressão de direitos, terceirização, contratações por tempo determinado, adoecimento, etc.

Conforme Aquino (2014, p. 179), especificamente:

[...] podemos nos referir ao processo de precarização do trabalho docente nas Instituições de Ensino Superior (IES) do Brasil (Bossi 2007), pela perda e debilidade gradual de direitos e garantias conquistadas em momento anterior e pela ampliação da norma de emprego própria da profissão.

Neste sentido, a precarização que se traduz em perda de direitos conquistados outrora, adentrou a esfera pública e por decorrência à universidade. Inicialmente, pela via dos professores de carreira, quando, na década de 90, entre os governos de Fernando Collor e Fernando Henrique, desenharam-se através de Medidas Provisórias (MPs), uma série de mudanças nas regras para aposentadoria, tais como a alteração na forma de incorporação de funções gratificadas, cargos de direção ou assessoramento em Brasil (1995), MP nº 831/1995 e extinção da licença prêmio, que poderia ser incorporada ao tempo de serviço, e das vantagens para aposentadorias integrais (MP nº 1.522/1996), Brasil (1996), para citar apenas algumas.

Tais mudanças consolidaram-se efetivamente, de modo que as medidas provisórias foram transformadas em leis, mudando as regras para a aposentadoria e dando margem para um processo que na época ficou conhecido como “a fuga dos cérebros”, representando a antecipação dos pedidos de aposentadoria dos docentes, com o propósito de preservar alguns dos direitos que seriam perdidos a partir desse primeiro momento da reforma previdenciária e de buscar outras formas de renda como, por exemplo, através da migração para o ensino superior privado, após aposentados. Atualmente, vive-se sobre a iminência de mais uma Reforma, a previdenciária, que mais uma vez deve afetar a vida os professores de carreira em vias de aposentar-se.

Em convergência com a política neoliberal de corte nas verbas públicas e enxugamento de pessoal, a realização de concursos públicos para reposição destes profissionais definitivamente não se colocou como alternativa primeira, tendo sido necessário, em conformidade a pauta vigente, lançar mão de mecanismos legais de flexibilização das relações de trabalho que pudessem atender à demanda do momento, em conformidade com a premissa de um Estado enxuto.

Vale ressaltar que, mesmo quando eram abertas vagas para efetivo, via concurso público, estas não conseguiam suprir a necessidade, haja vista que outro elemento também contribuía para as vacâncias, qual seja a saída de muitos professores efetivos através de licença, para fins de qualificação, haja vista as exigências quanto ao doutoramento (RATES, 2015).

Tal aspecto pôde ser observado na constatação de Bosi (2007, p. 1.509), ao analisar a caracterização do corpo docente e dos contratos de trabalho no ensino superior brasileiro num dado período, conforme dados do Ministério da Educação (MEC)/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP):

No que se refere às instituições federais de ensino superior (IFES), o aumento de docentes [em regime de tempo integral] entre 1980 e 2004 foi raquítico, progredindo de 42.010 para 50.337, o que significou um acréscimo de pouco mais de 8.000 docentes em 24 anos [...].

Assim, a principal saída vai ser colocada em termos de flexibilização, ou seja, ampliação da norma de emprego própria da profissão (AQUINO et al., 2014).

Inicialmente, o amparo legal encontrado pelas instituições federais para sustentar a contratação daqueles que foram denominados professores substitutos, foi a Lei nº 8.745/93, em Brasil (1993), que já previa, genericamente, a contratação de mão de obra por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público.

É importante ressaltar que se encontra na literatura o caso de uma universidade pública brasileira que, até mesmo antes disso, já em 1991, através de portaria, regulamentou a contratação de professores substitutos, mediante contrato de locação de serviços, em regime de 20 ou 40 horas, por um prazo de 12 meses, sujeito a renovação, já assinalando para um desmantelamento da carreira docente e precarização da relação de trabalho (AQUINO et al., 2014).

Em 2012, através da Lei nº 12.772/2012, em Brasil (2012), entende-se que se efetiva o reconhecimento de tal desmantelamento, na medida em que o professor substituto é referido dentro da trajetória da carreira do magistério superior, ficando estabelecido que sua contratação, devendo ser autorizada pelo dirigente da instituição, condicionada à existência de recursos financeiros e sob regime de trabalho de 20 ou 40 horas.

Nada obstante, ao contrário do que ocorreu na década de 90 e até em meados dos anos 2000, quando em algumas instituições federais, em determinados cursos, o índice de professores substitutos tenha chegado há cerca de 50% do quadro de docentes, nos últimos anos tem-se assistido a alteração dessa realidade:

No que diz respeito à figura dos substitutos, pelo menos, passou a ser restringida como política de contratação, chegando, tal como afirma a redação do §2, do Inciso VII da Lei 9.849 de 1999, a um máximo de 10% do total do quadro docente e com critérios muito mais claros de sua utilização como política de contratação laboral (AQUINO et al., 2014, p. 181).

Talvez seja fato que, comparativamente ao final do século XX e primeira década do século XXI aos dias atuais, tenha havido alguma mudança em termo do índice de professores