• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 1 – A avaliação das aprendizagens na prática docente: Uma perspectiva

1.2.3 O desempenho dos estudantes: Uma questão de medida?

O termo “avaliação das aprendizagens” é polissêmico e geralmente é interpretado como sinônimo de instrumentos avaliativos; como um conjunto de procedimentos utilizados por professores para verificarem o desempenho dos estudantes ou, ainda, como a análise dos resultados alcançados pelos avaliados. Quando usamos essa expressão para nos referirmos à fase de análise dos desempenhos dos estudantes nos questionamos se tal processo é uma questão de medição ou quantificação.

O uso da medida no processo de ensino-aprendizagem configura uma tentativa de constatar com exatidão as dimensões dos desempenhos dos alunos. Seu objetivo consiste em verificar a quantidade de informações que os estudantes assimilaram sobre determinado assunto. Essa perspectiva predominou durante décadas nos sistemas educacionais e, até os dias de hoje, ocupa lugar central nas avaliações nas escolas brasileiras (Romão, 2005, p. 72).

Inicialmente, as pesquisas da área educacional no campo da avaliação exerceram fortes críticas sobre a quantificação. O uso de provas como instrumento avaliativo e da nota como o indicativo de desempenho passou a ser visto como dimensões de uma prática avaliativa a ser descartada. Em contrapartida, surgem proposições marcadamente favoráveis a supremacia dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos, devendo estes

últimos, sempre que possível, serem desprezados. Criou-se, assim, um contexto de dualidade entre o caráter quantitativo e o qualitativo da avaliação.

Nosso debate não está centrado na idéia de que há um maniqueísmo entre os aspectos quantitativos e qualitativos da avaliação. Segundo Demo (2002, p.40), é possível indicar fenômenos qualitativos através de expressões quantitativas, desde que se tenha a devida consciência de tal reducionismo.

Diante disso, damos continuidade à discussão sobre a análise do desempenho escolar partindo do princípio de que a quantificação do desempenho é uma ação de extrema fragilidade quando realizada de forma assistemática. Ou seja, é fundamental ter clareza de que nem todas as tarefas escolares são organizadas de forma a resultarem em valores exatos.

Todavia, a noção de medida e quantificação no ambiente escolar ainda é confusa, como aponta Hoffmann (2005)

O que se percebe é que os professores não definem o termo medida com clareza. O que acontece é, então, a atribuição de graus numéricos a vários aspectos relacionados à vida do aluno na escola, indiscriminadamente. Decorre, desse equívoco, a atribuição de notas a aspectos atitudinais (comprometimento, interesse, participação) ou a tarefas deles que não admitem escores precisos (redação, desenhos, monografias). (HOFFMANN, 2005, p.40)

O que se pode perceber nas instituições de ensino é que muitos professores têm a compreensão de que tudo pode ser mensurado sem perceber que as notas são atribuídas de forma arbitrária. Na tentativa de superar tal arbitrariedade, algumas instituições alteraram seu regimento com relação à análise do desempenho dos alunos. Dentre as mudanças está a substituição da utilização de notas como indicativos de desempenho para a utilização de conceitos ou pareceres descritivos.

Segundo Hoffmann (2005, p.43), os conceitos passaram a fazer parte do regimento das escolas por influência do escolanovismo. A mudança teve,

principalmente, dois objetivos: o primeiro consistia em minimizar o privilégio dos escores finais do aluno obtidos em provas periódicas e, o segundo, visava encaminhar para análise os aspectos afetivos e psicomotores junto aos cognitivos, estes os mais privilegiados. Os conceitos foram adotados como expressões representativas do desempenho global dos alunos.

Podemos afirmar que a adoção de conceitos nas escolas alcançou alguns resultados significativos na medida em que estabelecia um abandono ao privilégio da mensuração. Todavia, se percebemos alterações quanto a forma de registrar e identificar o desempenho dos estudantes, em muitas circunstâncias não houve mudanças na intenção do que se fazia. Para Hoffmann (2004), esse distanciamento entre a forma e o sentido do que se faz deve-se a crença de que a mudança de normas e regimentos suscita uma imediata mudança na prática docente.

Recebo, para análise, inúmeros regimentos escolares. Os textos introdutórios ao capítulo sobre avaliação apresentam, em geral, intenções e justificativas altamente válidas e coerentes de uma avaliação contínua, em respeito às diferenças, etc. No que se refere a normas de sua efetivação, entretanto, apresentam-se tabelas numéricas, pesos, médias de aprovação, correspondência entre conceitos e percentuais, determinações sobre períodos de recuperação e outras tantas normas dissonantes do corpo teórico. (HOFFMANN, 2004, p. 147)

A situação descrita pela autora revela que a tentativa de ressignificar a análise do desempenho escolar ainda está arraigada de uma concepção de mensuração. Em muitas instituições, por exemplo, os conceitos são decodificados de escalas numéricas, o que reforça o reducionismo da avaliação à concepção de medida.

As práticas rotineiras de avaliação, a superficialidade teórica no tratamento dessas questões e as críticas de subjetividade possível inerente ao próprio processo, provocaram, na maioria das escolas, o retorno ao uso das notas nos sistema de classificação dos estudantes. (HOFFMANN, 2005, p. 44)

A dimensão da expressão do desempenho dos alunos é muito mais ampla e séria do que se definir por notas ou conceitos. Todavia, entendemos que o uso de conceitos evita o estigma da precisão, que, de ordinário, resvala para a classificação e a arbitrariedade decorrente do uso abusivo de notas nas escolas.

Na tentativa de superar a concepção classificatória da avaliação, algumas instituições de ensino, sobretudo aquelas que oferecem as séries iniciais do ensino fundamental, substituíram o uso de notas e conceitos pela utilização de pareceres pedagógicos. Esse indicativo funciona como uma espécie de diagnóstico, por escrito, construído pelo professor a partir da avaliação que realiza do desempenho de seus alunos durante um determinado período.

A preocupação em avaliar o desempenho dos alunos em sua totalidade faz com que as escolas – fundamentadas em perspectivas teóricas renovadas acerca da avaliação – reformulem os procedimentos para o registro e a divulgação desse desempenho. Porém, gostaríamos de ressaltar que os registros dos desempenhos– notas, conceitos e pareceres – não são o fim do processo de avaliação. Correspondem a indicativos que oferecem informações a professores e alunos sobre o processo de ensino-aprendizagem e, por isso, são eixos norteadores da prática docente.

Documentos relacionados