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O enriquecimento do projecto fruto do trabalho colaborativo

2.4. Análise dos resultados

2.4.1 Transformações nas práticas

2.4.1.3. O enriquecimento do projecto fruto do trabalho colaborativo

A segunda proposta obrigou à prática mais espontânea do desenho enquanto projecção e estruturação do pensamento, ainda um bocado negligenciado pelos alunos na resposta à primeira proposta que, apesar de requerer unicamente a elaboração de estudos, foi respondida em grande parte por apenas um "estudo-final". Verificaram-se algumas excepções, que não deixaram, contudo, de demonstrar insatisfação e incompreensão quanto à pertinência da entrega dos "efectivos" estudos, ou que apenas os exposeram quando mencionei a sua importância para o entendimento do processo. Este é encoberto a todo o custo, ou até evitado, talvez por não entenderem que "O desígnio do desenho, no processo de aprendizagem, subentende a

susceptibilidade de correr riscos e cometer erros. O grande adversário da aprendizagem é idealizar a facilidade com que se atingem os respectivos objectivos, é omitir a possibilidade de errar(...)(RODRIGUES, 2005:31)

Os "rabiscos" iniciais de tacteamento das ideias, as histórias abandonadas, as composições falhadas, desaparecem rapidamente do campo de visão e não tencionam constar para avaliação. Alguns comportamentos similares foram observados no seguimento do trabalho em grupo: "esta folha vai ser para apresentação? não está grande coisa.". Tornaram-se, porém, ferramenta

indispensável para a comunicação com os seus colegas, como foi passível de ser 10. Estudos - Prosposta 2. 11. Estudos - Prosposta 2.

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verificado aquando da partilha de ideias para a construção colectiva do objecto final. Inevitavelmente, as descrições verbais careciam da informação visual necessária para a demonstração da forma, dos volumes, das relações espaciais entre os elementos dos objectos.

O desenho enquanto estruturação do pensamento não foi, assim, tão explorado individualmente quanto colectivamente, sendo que, nesta aplicação última, é igualmente utilizado enquanto meio de comunicação. Outros resultados factuais que fundamentam a existência destas duas propostas dentro da mesma unidade didática, foram as reacções à complexidade acrescida da imbricação entre as duas, seja pelo entretecer das diferentes narrativas ou pela ideação da história bidimensional enquanto objecto ou fazendo parte de um: "temos que pensar como havemos de fazer a passagem de uma história para a outra, assim é uma mudança muito grande"; "como é que vamos juntar as histórias? os locais são diferentes...". O confronto e a unificação dos diferentes trabalhos individuais, exigiu assim uma reflexão sobre quais os recursos disponíveis e mais adequados para a coesão e objectivação das narrativas, obrigou-os a colocar questões e a enveredar por caminhos mais complexos que, respondendo unicamente a uma das propostas, dificilmente surgiriam.

A exigência comunicativa e a especificidade visual do trabalho a executar, impelem os alunos a desenhar o que pensam, e ao mesmo tempo possibilitam repensar sobre e reformular o que desenham, devido à provisoriedade atribuída pela natureza das suas funções. À margem de uma resposta a qualquer

solicitação formal por parte do professor, este tipo de desenho perscrutador que se verificou surgir mais abundantemente num âmbito colaborativo, reajusta proporções, estuda a composição dos elementos e isola-os para uma análise mais aprofundada das suas características, reformula estruturas, entre outras fórmulas de materializar o pensamento em algo mais concreto, consistente, que facilite a sua comunicação, revisão, remodelação e aperfeiçoamento.

Este tipo de processo, adoptado pela maioria dos alunos, faz juz ao que foi afirmado acima sobre a multimodalidade da comunicação, o desenho aparece acompanhado por apontamentos escritos, reforços, encadeamentos ou

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introduções verbais e gestos. Não me parece sensato inibi-los ou, até mesmo, não os incitar ao aproveitamento e desenvolvimento de uma melhor utilização desta miscigenação modal da comunicação - tão usual nos contactos

interpessoais quotidianos. Enriquecendo as mensagens e abrindo um campo de possibilidades de significação muito mais vasto, esta multimodalidade não desvirtua o desenho ao retirá-lo do seu isolamento, apenas o assume enquanto parte integrante do sistema comunicativo.

O trabalho colectivo impulsionou a partilha, a aceitação e o aproveitamento das semelhanças e dissemelhanças entre as subjectividades que davam corpo aos respectivos grupos. A partilha e o debate intragrupal sobre as suas narrativas visuais eram prática incontornável se pretendiam responder à equidade

participativa exigida pela actividade - todas as histórias deveriam estar

perceptivelmente presentes no produto final. Tal possibilitou a aferição da eficácia comunicativa dos trabalhos iniciais (que necessitaram de mais ou menos

explanações complementares), a verificação da heterogeneidade de soluções (que deveria ser aproveitada e reformulada mas não anulada), e o confronto, análise, revolução e reinscrição da matéria-prima (trabalhos da primeira proposta) até conseguirem reencontrá-las orientadas por uma directriz comum, que

possibilite a contrução de um objecto coerente, pela reunião e reconstrução das diferentes entidades e das respectivas histórias num todo único, perspectivado para uma finalidade comum. Esta proposta não visava uma homogeneização das respostas, pela conformação de todas as narrativas a um modelo predeterminado, mas antes uma percepção da coexistência de múltiplas possibilidades viáveis, que lhes permitisse sentirem-se agentes da sua própria aprendizagem e ao

mesmo tempo entenderem-na fruto da relação com o outro. Possibilitando, assim, uma transformação subjectiva, e não enformada, das indentidades dos alunos.

Segundo Hernández, não mais podemos entender um ensino direccionado para a normalização da resposta única, num mundo cada vez mais incerto, de subjectividades mutantes,

"(...) é importante a pluralidade face a homogeneização. Aproveitar as diferenças em vez de as considerar um problema. Daí a necessidade de as

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diversas vozes serem escutadas, as histórias individuais reconhecidas e a inventividade de todos e cada um valorizada" (HERNÁNDEZ, 2007:13)40 Este preceito educativo deve ser seguido pelos professores e igualmente fomentado nos alunos. Neste sentido, a construção colectiva de uma narrativa visual, pressupõe uma negociação e complementaridade entre as diferentes propostas individuais. Fomenta a revisitação dos ideais, das ideias e das práticas de cada um, para uma análise das suas qualidades e da sua efectiva pertinência, que lhes possibilite uma defesa eficaz dos seus posicionamentos pela

fundamentação das suas escolhas.