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A Lei nº 5692/71 estabeleceu no artigo 4º, que o currículo pleno do ensino de 1º e 2º graus seria dividido em duas partes: o núcleo comum, obrigatório em todo o território nacional e com as disciplinas definidas pelo CFE, e a parte diversificada ficaria a critério dos Conselhos Estaduais de Educação e dos próprios estabelecimentos de ensino definirem quais as disciplinas que melhor atendiam as suas necessidades, uma vez que se tinha liberdade de escolha. Além das disciplinas do núcleo comum e da parte diversificada, foram incluídas, obrigatoriamente, no currículo pleno, as disciplinas Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde, conforme o artigo 7º da Lei nº 5692/71.

O Parecer do CFE nº 853/71 definiu os princípios norteadores das disciplinas do núcleo comum e estabeleceu aquelas, que, logo após, foram fixadas pela Resolução do CFE nº 8/71. Assim, essa Resolução fixou as seguintes disciplinas para o núcleo comum: Comunicação e Expressão, cujo conteúdo específico era a Língua Portuguesa; Estudos Sociais, com as disciplinas Geografia, História e OSPB; Ciências, composta por Matemática, Ciências Físicas e Biológicas.

A Lei nº 5692/71 atribuiu muita importância às disciplinas escolares, como um meio de reprodução ideológica. Tanto que as disciplinas EMC, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde se tornaram obrigatórias no currículo. Mas a necessidade de utilizá-las para desviar a atenção dos alunos pelos assuntos sócio-políticos era tão forte, que os militares não se contentaram com a forma um pouco desinteressada com que essas disciplinas eram tratadas na escola. Por isso, criticaram a maioria das escolas por não dar a devida importância ao seu ensino, e, para reforçar sua importância, criaram, em 1977, o Parecer do CFE nº 540/77. Esse parecer reorientou o objetivo e a função dessas disciplinas e apresentou orientações para cada uma. As disciplinas do artigo 7º da Lei nº 5692/71 deveriam “percorrer todas as ações educativas” (Parecer CFE nº 540/77) e ser integradas aos fins da educação.

Como o interesse desta pesquisa é revelar como acontecia a formação de alfabetizadoras no curso de Magistério por meio da disciplina Didática da Linguagem, faz-se necessário compreender como foram estruturadas as grades curriculares do ensino de 1º e 2º Graus quanto à disciplina Língua Portuguesa.

Com a Lei nº 5692/71, o direcionamento ao ensino de Língua Portuguesa mudou um pouco, o que não aconteceu com as demais disciplinas, que continuaram sob as mesmas

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orientações. Diferente da LDB nº 4024/61, que apresentou orientações específicas para a disciplina Língua Portuguesa, na nova Lei nº 5692/71, a disciplina Língua Portuguesa foi tratada apenas no artigo 4º e sem orientar quais aspectos deveriam ser valorizados, se só os lingüísticos, os literários, ou também os aspectos históricos: Assim está o texto da lei: “no ensino de 1º e 2º graus, dar-se especial relevo ao estudo da língua nacional, como instrumento de comunicação e como expressão da cultura brasileira.”(Lei nº 55692/71, art. 4º, parágrafo 2º). Por esse artigo, pode se perceber a dimensão da disciplina Língua Portuguesa no projeto político que estava se instalando no país, pois a linguagem escrita era um veículo de comunicação a mais à disposição do governo militar, e era importante que um número elevado de brasileiros adquirissem a linguagem escrita para facilitar a disseminação da ideologia do grupo militar.

A disciplina Língua Portuguesa, sob a denominação Comunicação e Expressão, só foi mencionada na Lei nº 5692/71 como sendo importante estudar a língua nacional, mas, ainda no ano de 1971, dois pareceres trataram do assunto: o Parecer do CFE nº 853/71 e a Resolução do CFE nº 8/71, a fim de especificar os pormenores do ensino dessa disciplina, inclusive, quanto à mudança de nomenclatura e às orientações curriculares.

Com relação à Língua Portuguesa, o Parecer do CFE nº 853/71 prescreveu: “a disciplina Comunicação e Expressão deve ser um instrumento por excelência de comunicação” (Parecer do CFE nº 853/71), no sentido de transmissão e compreensão de ideias. O Parecer também ressaltou a importância da Comunicação e Expressão no sentido de ser a “expressão da cultura brasileira”, devendo enfatizar a literatura. A Língua Portuguesa, com o ensino da comunicação oral e da literatura brasileira, era o elo de integração entre a língua materna e os estudos sociais, que foi um conteúdo muito importante para alcançar a hegemonia. Para ideologizar a população, usou-se da valorização da cultura nacional e da língua materna, para disseminar idéias patriotistas e deslocar a atenção dos fatos reais.

A disciplina Língua Portuguesa passou por uma mudança de denominação e de objeto de ensino. Com a LDB n º 4024/61, a disciplina recebia a denominação Leitura e Linguagem Oral e Escrita no curso primário e Português no ensino médio (secundário e técnico). Já na Lei nº 5692/71, mudou-se a denominação para Comunicação e Expressão. O objeto de ensino que, anteriormente, era voltado para o estudo de textos, passou a ser centrado no estudo de frases, apesar de o Parecer do CFE nº 853/71 ressaltar que se deveria enfatizar a literatura, vários estudos (VENTURI (2004); LÉLIS (1996); GONÇALVES e PIMENTA (1990)) demonstraram que os textos eram usados como pretexto para aprender gramática e com o objetivo de desenvolver a comunicação.

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A Resolução do CFE nº 8/71 apresentou denominações e orientações específicas para a disciplina Comunicação e Expressão em cada nível de ensino. Nas séries iniciais do 1º grau, a Comunicação e Expressão era tratada como atividade, da 5ª a 8ª série, sob a denominação Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa, era tratada como uma área de estudo, no ensino de 2º grau era denominada Língua Portuguesa e Literatura Brasileira e tratada, predominantemente, como disciplina. O Parecer do CFE nº 853/71 definia matéria como aprendizagens que se desenvolvem sobre experiências colhidas em situações concretas; as áreas de estudos eram formadas pela integração de conteúdos afins, equilibrando-se com conhecimentos sistemáticos. Essas orientações, colocadas aqui em caráter demonstrativo, apresentam bem a minuciosidade com que eram tratadas as disciplinas escolares nesse período. Os cuidados com o ensino se estenderam logicamente ao curso de Magistério, para garantir que se perpetuassem os ideais daquele período, conforme veremos a seguir.