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O ENSINO DESENVOLVIMENTAL

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CAPÍTULO 1 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO SEGUNDO A

1.5 O ENSINO DESENVOLVIMENTAL

Na visão da teoria histórico-cultural, nos primeiros períodos da idade escolar a principal atividade da criança é a atividade de aprendizagem (DAVYDOV, 1988). Como já mencionado, Davydov formulou, declaradamente com base nas idéias de Vygotsky e na teoria da atividade de Leontiev, uma teoria da atividade de aprendizagem. Idéias centrais dessa teoria são apresentadas na “Problems of developmental teaching”, tradução do russo para o inglês publicada nos Estados Unidos em 1988. Nela o autor defende a aprendizagem como a apropriação, pelo aluno, das capacidades desenvolvidas historicamente, e a reprodução, em si, dessas capacidades. O conceito de apropriação expressa as relações entre a experiência social,

cultural, histórica e a experiência individual de uma pessoa. Pela reprodução, o que o aluno realiza não é a atividade tal qual já foi realizada pelos outros, mas a atividade relacionada às capacidades humanas fixadas na experiência social. Por isso, afirma o autor, a educação e o ensino são as formas universais do desenvolvimento mental humano, uma vez que se constituem apropriação cultural, o que implica que apropriação e desenvolvimento humano são processos distintos, porém interdependentes.

A cultura contém as formas, os procedimentos histórica e socialmente construídos como instrumentos, como capacidades e habilidades humanas necessárias à atividade no mundo, à vida em sociedade. Assim, a cultura é um fenômeno social cuja riqueza situa-se nos padrões de capacidades e habilidades criadoras, essenciais para a produção das coisas objetivadas (materiais). É essa riqueza que deve ser apropriada.

No processo da aprendizagem, que é a atividade principal dos primeiros períodos da idade escolar, as crianças reproduzem não somente o conhecimento e habilidades correspondentes aos fundamentos daquelas formas de consciência social, mas também as capacidades construídas historicamente, que estão na base da consciência e do pensamento teóricos: reflexão, análise e experimento mental (DAVYDOV, 1988, p. 44)

O conteúdo da atividade de aprendizagem deve ser o conhecimento teórico científico, que unifica os processos mentais de abstração substancial, generalização e conceitos teóricos.

Davydov (1999) afirma, entretanto, que as crianças só podem apropriar-se de conhecimento e habilidades por meio da atividade de aprendizagem quando elas tiverem uma necessidade interna e motivação para fazê-lo. Por isso, uma organização adequada da atividade de aprendizagem deve apresentar como condição básica, indispensável, dois elementos. O primeiro é a necessidade de os alunos se apropriarem dos objetos de aprendizagem. Assim como não se pode forçar uma criança a brincar, também não se pode forçá-la a aprender. O segundo elemento é a formulação de tarefas que requeiram dos alunos a realização de experimentos com o objeto da aprendizagem. A atividade de aprendizagem escolar deve estruturar-se de modo correspondente ao procedimento de exposição dos conhecimentos científicos utilizado pelos pesquisadores na investigação que deu origem ao objeto. E isso corresponde ao procedimento de ascensão do abstrato ao concreto. Desse modo, na atividade de aprendizagem, o pensamento dos alunos percorrerá um caminho semelhante ao caminho do pensamento científico dos pesquisadores.

Todavia, ressalta Davydov (1988), são os motivos das ações de aprendizagem que impulsionam os alunos a assimilar o modo pelo qual se reproduzem os procedimentos mentais ligados a um conhecimento teórico. Ao cumprirem as ações de aprendizagem propostas pelo

professor, os alunos desenvolvem conhecimento novo para eles, mas desenvolvem, sobretudo, os procedimentos mentais ligados a esses conhecimentos. Enquanto a necessidade de aprender estimula o aluno a assimilar os conhecimentos teóricos, o motivo para aprender estimula o aluno a assimilar os procedimentos de reprodução destes conhecimentos, por meio das ações presentes nas tarefas de aprendizagem. Tarefa é aqui entendida, como a união do objetivo com a ação e com as condições para o seu alcance. Assim, a tarefa de aprendizagem que o professor formula e apresenta aos alunos deve exigir deles três procedimentos:

1) análise do objeto a fim de descobrir alguma relação geral, governada por uma lei e vinculada às manifestações ou relações particulares deste objeto. Ou seja, a construção da generalização e da abstração substantiva;

2) a dedução, baseada na abstração e generalização, das relações particulares do objeto e sua união (síntese) no objeto integral (inteiro), ou seja, a construção de seu “núcleo” e do objeto mental concreto;

3) o domínio, neste processo de análise e síntese, do procedimento geral de construção do objeto estudado.

No processo de realizar a tarefa, os alunos identificam a origem do “núcleo” do objeto estudado e, utilizando esta origem, reproduzem mentalmente o objeto. Ao resolver a tarefa, as crianças completam uma espécie de micro-ciclo de ascensão do abstrato ao concreto como meio de assimilação dos conhecimentos teóricos.

A tarefa escolar é importante “não apenas para o caso particular dado, mas para todos os casos do mesmo tipo” (DAVYDOV, 1988), pois faz o pensamento mover-se do geral ao particular.

Na identificação e assimilação do procedimento geral de solução de tarefas particulares, os escolares comparam os diversos procedimentos de solução de várias tarefas particulares e acabam identificando certo caminho geral. Por exemplo, para que os alunos assimilem o procedimento pelo qual um determinado tipo de tarefa de física é resolvido, o professor requer dos alunos que resolvam até 88 tarefas particulares; para a formação do procedimento geral, solução de um exercício de matemática, os livros didáticos às vezes propõem aos alunos que resolvam de 20 a 30 problemas análogos. Ao deparar-se com uma tarefa particular concreta, os alunos se empenham primeiro em analisá-la de modo a deduzir a conexão interna de seus dados, abstraindo com ela as peculiaridades. “Ao resolver a primeira tarefa concreta de um determinado tipo resolvem, por assim dizer, todas as tarefas daquele mesmo tipo”. (DAVYDOV, 1988).

Assim, considerando que crianças em situação de não-aprendizagem da leitura podem apropriar-se melhor do processo de ler mediante um ensino organizado de acordo com a proposta davydoviana, ou seja, de modo que a atividade de aprendizagem da leitura componha-se das ações formuladas por Davydov, procurei organizar este ensino desenvolvimental da leitura. Esta organização do ensino da leitura foi elaborada especificamente para a presente pesquisa, consistindo um experimento didático-formativo, considerando a importância da emoção e do desejo juntamente com o motivo do aluno para aprender, e procurando contemplar também a necessidade de aprendizagem. A característica principal deste experimento didático-formativo trata de uma organização do ensino com finalidade simultaneamente de ensinar e pesquisar. Assim, como pesquisador, pude observar a influência do tipo de ensino no desenvolvimento do pensamento do aluno. A realização deste experimento didático-formativo é descrita a seguir, no capítulo 2.

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