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O Espaço Físico das Creches Municipais e a Legislação

No documento O espaço da creche: que lugar é este? (páginas 51-56)

Minha intenção ao trazer a legislação é de socializá-la, dispondo-a à população, informando seu conteúdo como instrumento de luta e abrindo reflexões sobre a mesma. Milton Santos (1998, p.131) nos fala: “as pessoas a quem o planejamento se destina raramente têm acesso aos documentos finais, e ainda muito menos aos documentos de base”. Sei também da importância das legislações na configuração e definição do prédio da instituição. Para Frago (1998, p.81), a escola (abranjo aqui a creche), é um “espaço demarcado, mais ou menos poroso, no qual a análise de sua construção, enquanto lugar, só é possível a partir da consideração histórica daquelas camadas ou elementos envolventes que o configuram e definem”.

As legislações que tratam do espaço físico das instituições de educação infantil no Brasil são, em âmbito municipal, a Resolução n°003/99, na esfera estadual a Resolução nº004/99, em âmbito nacional, apresentam-se apenas como referência os

Subsídios para Credenciamento de Instituições de Educação Infantil (1998 Vol I, p. 36).

idênticas. Trarei aqui a resolução municipal, já que é essa instância a responsável pela educação infantil.

A Resolução n°003/99 fixa as normas para a educação infantil no município de Florianópolis. Aprovada em agosto de 1999, trata no seu capítulo V do espaço, das

instalações e dos equipamentos:

Art. 14 - Os espaços serão projetados respeitando as necessidades e características

para o atendimento de zero a seis anos.

Parágrafo único – Em se tratando de turmas de educação infantil, em escolas de

ensino fundamental e/ou médio, alguns desses espaços deverão ser de uso exclusivo das crianças de zero a seis anos, podendo outros ser compartilhados com os demais níveis de ensino, desde que a ocupação ocorra em horário diferenciado, respeitando a proposta pedagógica da escola.

Art. 15 - Toda construção, adaptação, reforma ou ampliação das edificações destinada à

educação infantil pública ou privada, dependerá de aprovação pelos órgãos oficiais competentes.

§ 1º - Os materiais das obras deverão adequar-se ao fim à que se destinam atender, no

que couber, às normas e especificações técnicas da legislação pertinente.

§ 2º - Em todas as obras deverão ser garantidas condições de localização, segurança,

salubridade e saneamento em total conformidade com a legislação que rege a matéria.

Art. 16 - Os espaços internos deverão atender as diferentes funções da instituição de

educação infantil e conter uma estrutura básica que contemple:

I - espaços para recepção, administração e apoio;

III - salas para atividades das crianças, com boa ventilação e iluminação, e visão

para o ambiente externo, com mobiliário e equipamentos adequados;

IV - instalações e equipamentos para o preparo de alimentos, que atendam às

exigências de nutrição, saúde, higiene e segurança, nos casos de oferecimento de alimentação;

V - instalações sanitárias suficientes e próprias para uso das crianças e dos

adultos;

VI - berçário, se for o caso, provido de 50% de berços individuais e 50%de

colchonetes (de acordo com o nº de crianças), área livre para movimentação de crianças, locais para amamentação e para higienização, com balcão trocador, pia, chuveiro, e espaço específico para o banho de sol das crianças na instituição.

Parágrafo único – Recomenda-se que área coberta mínima para as salas de atividades

das crianças seja de 1,30m² por criança atendida.

Art. 17 - As áreas ao ar livre deverão possibilitar as atividades de expressão física,

artística e de lazer, contemplando também áreas verdes.

Compreendo que o espaço revela a pedagogia adotada, então, é de fundamental importância que as instituições possam pensar seus espaços, materializando assim, suas concepções, num processo que envolva todos os segmentos, crianças, profissionais e familiares, considerando seu contexto e levando em conta suas especificidades culturais e sociais. O artigo 14 prevê apenas que esses espaços sejam “projetados respeitando as necessidades e características para o atendimento de zero a seis anos”, não prevendo nenhum dos procedimentos antes relatados, deixa margem para que não ocorra uma efetiva participação dos envolvidos com a creche.

A previsão no parágrafo único da ocupação em tempos e espaços diferenciados pelas crianças da educação infantil e as do ensino fundamental é limitadora do encontro, redutora do enriquecimento dos repertórios infantis. Esse procedimento tem como raiz a preocupação com a segurança das crianças menores, preocupação esta pertinente, mas temos de pensar em outros meios de tratá-las sem negar-lhes o convívio/confronto entre as diferentes idades, contrapondo-se à separação e à divisão.

Saliento a importância de o artigo 15 definir que construções, adaptações e reformas, sejam reguladas pelos órgãos competentes nas diferentes iniciativas, sejam elas públicas ou privadas, para que possamos garantir um espaço que respeite todas as crianças, pobres ou ricas. Deve ainda ampliar do termo construção para o termo

imóvel ou prédio, assim abrangeremos mais, não incorrendo no risco do não-

enquadramento de muitas instituições existentes nas legislações vigentes, se não solicitarem reforma, adaptação ou ampliação.

No artigo 16, inciso I, está previsto espaço para recepção de quem chega à instituição, fundamental para acolher e abrigar crianças, profissionais, familiares e visitantes que a freqüentam, mas em todos os modelos mapeados não encontrei espaço projetado para recepção. No inciso II, a previsão da sala dos professores deverá conter especificidades quanto a sua capacidade de abrigar o encontro, estudo e descanso para esses profissionais. Na caracterização da rede não encontrei nenhum projeto que previsse um espaço para os serviços pedagógicos previsto na resolução, que compreendi serem os espaços para coordenação pedagógica.

Quanto ao inciso III, gostaria de ressaltar que no padrão A as salas são bem ventiladas e iluminadas, com as janelas na altura das crianças. Nas salas das crianças menores, Berçário e Maternal I as janelas poderiam ser rebaixadas, facilitando assim a visualização externa dos pequenininhos. Quanto ao mobiliário, senti a necessidade de estantes baixas e móveis, de fácil manuseio por crianças e adultos, para dividir ambientes e como suporte para objetos e brinquedos.

Nos banheiros, senti falta de chuveiros na altura das crianças e no dos menores, Berçário e Maternal I, poderia haver um rebaixamento na pia, saboneteira e suporte da toalha, facilitando assim o manuseio dos pequenininhos, reafirmando o previsto no inciso V, pelo qual as instalações sanitárias têm de ser próprias para uso das crianças. Também senti falta de espaços específicos para amamentação, previstos no inciso VI, não os encontrando em nenhuma das plantas baixas mapeadas.

O artigo 17 prevê que áreas verdes sejam contempladas nas instituições de educação infantil, garantindo assim o contato com a natureza a que as crianças têm direito; mas a realidade da creche pesquisada e de outra revelada na pesquisa de Oliveira (2001), demonstra que este é um ideal a ser perseguido.

Na resolução estadual e nos subsídios em âmbito federal, encontrei a previsão do refeitório, que não foi previsto na resolução municipal. Esse espaço é de fundamental relevância para que o direito das crianças a uma alimentação saudável, tranqüila e agradável se efetive. A ausência desse espaço nas creches e pré-escolas obriga que as refeições sejam feitas nas salas ou nos espaços coletivos, fazendo com que sejam tomadas saídas paliativas que disponibilizam espaços inapropriados às crianças e adultos.

A resolução municipal não prevê ainda área coberta externa, prevista na resolução estadual e nos subsídios, que abriga das chuvas e do sol, garantindo o direito das crianças aos movimentos amplos em dias de chuva, sombra e frescor para os dias quentes.

O texto da resolução municipal que fixa as normas para os espaços físicos das instituições de educação infantil é bastante genérico, abrindo um leque muito grande de interpretações e deixando margem para que tenhamos espaços que não garantam os critérios mínimos de uma educação respeitosa das crianças pequenininhas.

No próximo capítulo apresento a creche pesquisada, suas configurações e a forma como vem se transformando em lugar pelas relações que nela são travadas entre as crianças, seus pares e os adultos e entre esses últimos, profissionais e famílias, acreditando como Galardini (1996, p.8) 31 que:

Um espaço e o modo como é organizado é sempre o resultado de idéias, de escolhas, de saberes das pessoas que o habitam. Por isso o espaço de um serviço para crianças reflete a cultura dos adultos que o organizam, é potente mensagem do projeto educativo para aquele grupo de crianças.

No documento O espaço da creche: que lugar é este? (páginas 51-56)

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