• Nenhum resultado encontrado

2.2 O planejamento urbano em Natal

2.2.1 O Estatuto da Cidade e o Plano Diretor de Natal de 2007

Em 2007, durante o mandato de Carlos Eduardo Alves como prefeito de Natal e Wilma de Faria como governadora do Rio Grande do Norte, que o atual Plano Diretor de Natal foi concluído. Enquanto o Plano antecessor tinha sido o primeiro após a Constituição vigente, o atual foi o primeiro Plano Diretor após a promulgação da Lei federal nº 10.257, mais conhecida como Estatuto da Cidade.

O Estatuto da Cidade foi desenvolvido como uma lei complementar ao capítulo de política urbana da Constituição. Foram treze anos de embates no congresso para a sua formulação. O MNRU teve intensa participação no processo, porém, depois da promulgação da Constituição de 1988 passou a se nominar Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU), afim de se tornar um movimento suprapartidário. Assim, diminuiria a presença da influência do Partido dos Trabalhadores, ao mesmo tempo em que atrairia as organizações com forte estrutura nacional, para que houvesse mais facilidade de aprovação do que viria a ser o Estatuto da Cidade (AVRITZER, 2010).

Durante esse período surgiram 16 projetos de lei para a regulamentação do capítulo de Política Urbana da Constituição, alguns de iniciativa progressista e outros com tendências conservadoras. Em 1997, foi aprovado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio o Projeto de Lei nº 181 de 1990 do senador Pompeu de Souza. O projeto, originalmente, absorvia algumas propostas do FNRU como o direito coletivo à cidade, a coordenação do processo de ocupação da terra urbana, a função social da propriedade, a taxação progressiva da propriedade

urbana e a obrigatoriedade de Planos Diretores para as cidades com mais de vinte mil habitantes. O Projeto passou por outras comissões e entre uma comissão e outra, o projeto de lei era modificado, ora eliminando propostas progressivas e incorporando interesses imobiliários pelos políticos conservadores, ora reincorporando-as e adicionando outras pelos políticos de esquerda e pelo FNRU. Finalmente em 10 de julho de 2001, foi aprovado a Lei nº 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade (AVRITZER, 2010).

O Instituto Pólis de São Paulo ficou encarregado de editar e comentar um guia lançado pela Câmara dos Deputados para a implementação do Estatuto da Cidade pelos municípios. Segundo o Instituto Pólis, o Estatuto da Cidade possui três campos de inovação:

Um conjunto de novos instrumentos de natureza urbanística voltados para induzir – mais do que normatizar – as formas de uso e ocupação do solo; a ampliação das possibilidades de regulamentação das posses urbanas, até hoje situadas na ambígua fronteira entre o legal e o ilegal; e também uma nova estratégia de gestão que incorpora a ideia de participação direta do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade (BRASIL, 2001, p. 37).

A combinação entre os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, o Estatuto da Cidade e o texto da medida provisória nº 2.220/01, dão as diretrizes para a política urbana tanto nos níveis federais quanto estaduais e municipais.

Um dos mais importantes instrumentos do Estatuto da Cidade é a obrigatoriedade do Plano Diretor para os municípios com mais de vinte mil habitantes, como já era previsto na Constituição, tendo como novidade, a adição dos municípios situados em regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas, áreas de interesse turístico, ou em áreas sob influência de empreendimentos de grande impacto ambiental.

A partir da vigência do Estatuto da Cidade, as cidades que não cumprissem suas diretrizes e instrumentos, poderiam ser questionadas por via judicial. Portanto, as cidades que não tiveram seus Planos Diretores aprovados ou que não seguiam as normas da política urbana presentes na Constituição Federal, passaram a sofrer pressão para que se adequassem às normas do Estatuto da Cidade.

As diretrizes do Estatuto da Cidade, que estão presentes no capítulo I, servem para estabelecer parâmetros para orientar todas as instâncias de poder em relação à política urbana. São 16 diretrizes que orientam a política urbana dos municípios e

entre as suas principais orientações estão a garantia do direito a cidades sustentáveis; gestão democrática; cooperação entre governo, iniciativa privada e demais setores da sociedade; ordenação e controle do uso do solo; recuperação dos investimentos do setor público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos; audiências públicas; simplificação da legislação de parcelamento; regularização fundiária e urbanização de áreas levando em conta a situação socioeconômica da população e as normas ambientais. Seguindo as suas diretrizes, o Estatuto da Cidade traz vários instrumentos que devem ser usados no Planejamento Urbano como os Instrumentos de Indução do Desenvolvimento (IPTU progressivo no tempo, outorga onerosa do direito de construir, o direito de preempção e desapropriação para fins de reforma urbana), Instrumentos de Financiamento da Política Urbana, Instrumentos de Regularização Fundiária (zonas especiais de interesse social, concessão de uso especial para fins de moradia, usucapião especial de imóvel urbano) e Instrumentos de Democratização da Gestão Urbana (Órgãos colegiados de Política Urbana, Debates, Estudo de Impacto de Vizinhança, Gestão Orçamentária Participativa, Audiências e Consultas Públicas) (BRASIL, 2001).

Várias cidades já haviam antecipado alguns instrumentos presentes no Estatuto da Cidade, entre elas Natal, que em seu Plano Diretor de 1994 implantou: a Outorga Onerosa do Direito de Construir e de Alteração de Uso, Transferência do Direito de Construir, Concessão do Direito Real de Uso, Operações Urbanas, Zonas Especiais de Interesse Social e o Estudo de Impacto de Vizinhança.

No Plano Diretor de 2007, os princípios, objetivos e diretrizes se mantiveram inalterados. Porém, os mercados imobiliário e da construção civil continuaram a usar o seu poder dentro da política para que houvessem mais mudanças a seu favor. Talvez, a maior mudança tenha sido a substituição do critério de controle do uso do solo. O critério vigente desde 1994 segundo Dantas (2013, p. 56) era o da:

Densidade para uso residencial e o coeficiente de aproveitamento para os demais usos, cujo objetivo era favorecer o acompanhamento e monitoramento da implementação do Plano, pelo gestor público, dos requisitos mínimos para o cumprimento da função da propriedade urbana.

A partir de 2007 passou-se a adotar, como parâmetro de regulação do uso e ocupação do solo, apenas o coeficiente de aproveitamento, tanto para uso residencial quanto não residencial. Segundo Dantas (2013), a forma que foi definido os

parâmetros urbanísticos em 1994, com a densidade para uso residencial e o coeficiente de aproveitamento para os demais usos, sem um mecanismo de integração entre eles, contribuiu para a elevação do preço da terra em face da restrição do potencial construtivo, comprometendo o princípio da função social da propriedade e estimulando a especulação. Todavia, Dantas (2013) conclui que a mudança de parâmetros adotada no Plano de 2007 não serviu para resolver esse problema e sim para simplificar os processos de licenciamento o que gerou ganhos significativos para o setor da construção civil, ao mesmo tempo em que diminuiu a capacidade do poder público de regular o uso e ocupação do solo, de forma compatível com a infraestrutura urbana existente.

O Plano Diretor, atualmente, está em um novo processo de revisão, e se a tendência se mantiver as mudanças seguirão o tradicional caminho dos interesses econômicos de empresas e não as necessidades da população natalense. Ora, há uma clara falta de interesse da população pela coisa pública e os poucos grupos e movimentos que lutam por políticas públicas possuem pouco poder de pressão sobre os representantes do executivo e legislativo. São raros os casos em que a população se articulou e obteve vitória, pois a pressão precisa ser muito grande para passar por cima de interesses econômicos, que muitas vezes atravessam os caminhos legais e se fazem por meio de propinas e compadrios entre empresários e representantes públicos.

Um dos raros casos de participação popular com resultados favoráveis aos cidadãos comuns, foi a polêmica construção de edifícios na Vila de Ponta Negra. Depois das mudanças ocorridas após as revisões do Plano de 1994 em 2000, que sancionou o aumento do gabarito em Ponta Negra, o número de edifícios construídos no bairro cresceu vertiginosamente.

A construção de condomínios verticais não respeitou nem a Vila de Ponta Negra, mesmo sendo uma área de interesse popular e com situação viária imprópria para o aumento da circulação de veículos. Diante da pressão popular e do escândalo de corrupção na Câmara de Vereadores, o então prefeito, Carlos Eduardo Alves, revogou a licença dada para esse empreendimento e mais outros quatro empreendimentos que haviam projetos de construção nas imediações. Os responsáveis pela construção do Villet del Sol recorreram na justiça, porém não conseguiram obter ganho de causa. Atualmente a construção de edifícios na Vila de Ponta Negra se encontra proibida (RIO GRANDE DO NORTE, 2014).