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O Feminismo de Segunda Onda e Suas Repercussões No Brasil

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1 AS MULHERES NA HISTÓRIA

1.5 O FEMINISMO NA AMÉRICA LATINA E NO BRASIL

1.5.2 O Feminismo de Segunda Onda e Suas Repercussões No Brasil

A segunda fase do feminismo (segunda geração ou segunda onda) ressurge nas décadas de 1960 e 1970, em especial nos Estados Unidos e na França. As feministas americanas enfatizavam a denúncia da opressão masculina e a busca da igualdade, enquanto as francesas postulavam a necessidade de serem valorizadas as diferenças entre homens e mulheres, dando visibilidade, principalmente, à especificidade da experiência feminina, geralmente negligenciada. As propostas feministas que caracterizam determinadas posições, por enfatizarem a igualdade, são conhecidas como o “feminismo da igualdade”, enquanto as que destacam as diferenças e a alteridade são conhecidas como “o feminismo da diferença”. (NARVAZ e KOLLER, 2006, p. 649)

A segunda onda do feminismo é uma continuação esperada da primeira. As mulheres, então, queriam leis que garantissem sua cidadania e individualidade. Mulheres podiam trabalhar, mas também queriam que seus direitos de mães trabalhadoras fossem respeitados, ou então não querem ter filhos e desejavam que esse direito também fosse assegurado pelo Estado. A segunda onda, além de garantir a conquista desses os, assegurou sua manutenção. . (ASSUNÇÃO, 2014)

O traço particular que marca a trajetória do feminismo no Brasil é diferente de outros países, e diz respeito ao caráter dos movimentos sociais no Brasil em sua relação com Estado. Os primeiros vestígios do feminismo em nosso país nasceram no seio das camadas médias12.

No Brasil, o feminismo nasceu na luta da classe média, diferentemente do que ocorreu em outros países, mas com uma particularidades: a aproximação com as associações que lutavam por melhores condições de vida para as camadas populares. Chamado de “Movimentos de mulheres”, buscava a melhoria das condições de vida para a população mais pobre. (MARTINS e ALCANTARA, 2012, p. 105)

Outra característica importante é a ação dos movimentos sociais urbanos que organizaram-se em bases locais, enraizando-se nas experiências locais dos moradores das periferias, que buscavam se organizar para reivindicar temas de

12 Segmento social no qual se situavam as mulheres que tiveram acesso à educação

universitária e a estilo de vida propiciado pela modernização excludente, que caracterizou o desenvolvimento social e econômico brasileiro a partir da década de 1950. (SARTI, 2004, p. 39)

infraestrutura básica (água, luz, esgoto, asfalto e bens de consumo). E esses movimentos têm como parâmetro o mundo cotidiano da reprodução – a família, a localidade e suas condições de vida. (SARTI, 2004, p, 40)

Os grupos feministas alastraram-se pelo país. Houve significativa penetração do movimento feminista em associações profissionais, partidos, sindicatos, legitimando a mulher como sujeito social particular. (SARTI, 2004, p, 42)

O feminismo latino americano de “segunda onda” nasceu num contexto político e cultural desfavorável, a articulação do movimento feminista ocorreu no contexto de ditaduras militares como parte da luta de redemocratização.

De acordo com o pensamento de Stolcke (2004, p. 80), o feminismo na América Latina teve suas origens na década de 1960, a partir do feminismo de “segunda onda”, período bastante tumultuado pelas perseguições macartistas, Guerra Fria, movimento estudantil.

Os sonhos das mulheres começaram a se tornar reais com a publicação do livro de Betty Friedan, “A mística feminina”, publicado em 1963. Nessa obra, a autora discute a “crise da identidade feminina”, discutindo de forma incisiva e perturbadora a infelicidade das mulheres e suas insatisfações.

O movimento feminista denuncia a manipulação do corpo da mulher e a violência a que é submetida, tanto aquela que se atualizam na agressão física, espancamentos, estupros, assassinatos, quanto a que o coisifica enquanto objeto de consumo. Denuncia da mesma forma a violência simbólica que faz de seu sexo um objeto desvalorizado. Reivindica a autodeterminação quanto ao exercício da sexualidade, da procriação, da contracepção. Reivindica, também, o direito à informação e ao acesso a métodos contraceptivos seguros, masculinos e femininos. Propõe, principalmente, que o exercício da sexualidade de desvincule da função biológica de reprodução, exigindo dessa forma o direito ao prazer sexual e à livre opção pela maternidade. Neste sentido, advoga o aborto livre, e a ruptura com os moldes tradicionais em que o desempenho sexual da mulher vem sendo encerrado. (ALVES e PITANGUY, 1985, pp. 60-61)

As inquietações ultrapassavam qualquer limite de classe social, idade, credo. Buscar a causa dos problemas era o objetivo das insatisfações13.

13 Mas afinal, que problema sem nome era esse? Como esse problema era descrito pelas

mulheres que falavam a Friedan? O sentimento de estar vazia, sentir-se incompleta, ter impressão de não existir, sentir-se cansada e aborrecida, zangar-se facilmente com as crianças e o marido, chorar sem motivo aparente pontuava as angustia das falas. O problema acabava, muitas vezes, por desaguar nos consultórios de médicos, psicanalistas ou era temporariamente driblado com a ajuda de tranquilizantes. (DUARTE, 2006, p. 288)

Friedan sentia-se incomodada com os sentimentos das mulheres. As feridas começaram a ser tratadas na medida em que os problemas passaram a ser encarados, transformando transformar as inquietações femininas em soluções plausíveis14.

No Brasil, com o processo de abertura política, lenta e gradual do militarismo e a decretação da anistia política, foi possível a volta das exiladas ao Brasil. A experiência política na Europa durante o exílio foi importante para o fortalecimento do feminismo brasileiro. Entretanto, como salienta Sarti (2004), as exiladas trouxeram na bagagem não só experiências políticas anteriores, como também a influência de um feminismo atuante europeu.

De 1975, marco do movimento feminista no mundo e no Brasil, até 1979, quando o país dá os primeiros passos firmes em direção à democratização, com a anistia e a reforma partidária que terminou com o bipartidarismo [...] as mulheres de classe média, intelectualizadas, que estiveram nos Estados Unidos ou na Europa como exiladas, estudantes ou simples viajantes em busca de novas experiências, voltavam para o Brasil trazendo uma nova forma de pensar sua condição de mulher, em que o antigo papel de mãe, companheira, esposa não mais servia. Essas mulheres haviam descoberto seus direitos e, mais do que isso, talvez a mais desafiadora das descobertas havia descoberto os seus corpos, com sua mazelas e seus prazeres. (PINTO, 2003, p. 65)

Além disso, a própria experiência de vida no exterior, com uma organização doméstica distinta dos tradicionais padrões patriarcais da sociedade brasileira repercutiu decisivamente tanto em sua vida pessoal quanto em sua atuação política. (SARTI, 2004, p, 41)

Foi na década de 1980 que o movimento feminista foi consolidado no Brasil e, e junto com o processo de redemocratização no país, alastrou-se a ideia de que as mulheres viviam a opressão sob a égide da dominação masculina. A afirmação era que, no âmbito doméstico e nas relações interpessoais, a mulher era vitimada, o que levou uma série de mudanças, à implementação de políticas sociais e pessoais

14 [...] O problema não pode ser compreendido nos termos geralmente aceitos pelos cientistas

ao estudarem a mulher, pelos médicos ao tratarem dela, pelos conselheiros que as orientam e os escritores que escrevem a seu respeito. A mulher que sofre deste mal, e em cujo íntimo fervilha a insatisfação, passou a vida inteira procurando realizar seu papel feminino. Não seguiu uma carreira (embora as que o façam talvez tenham outros problemas); sua maior ambição era casar e ter filhos. Para as mais velhas, produtos da classe média, nenhum outro sonho seria possível. As de quarenta ou cinquenta anos que, quando jovens, haviam feito outros planos e a eles renunciado, atiraram-se alegremente na vida de donas-de-casa. Para as mais moças, que deixaram o ginásio ou a faculdade para casar ou passar algum tempo num emprego sem interesse, sendo este era o único caminho. Eram todas muito “femininas” na acepção. (FRIDAN, 1971, p. 27)

(MARTINS e ALCANTARA, 2012, p. 106), sendo necessário discutir um novo discurso feminista, pois estava em jogo era a discussão das relações de gênero.

Gênero refere-se ao discurso da diferença dos sexos. Ele não se refere apenas as ideias, mas também às instituições, às estruturas, às práticas quotidianas, como também aos rituais e a tudo que constitui as relações sociais. O discurso é um instrumento de ordenação do mundo, e mesmo não sendo anterior a organização social, ele é inseparável desta. Portanto, o gênero é a organização social da diferença sexual. Ele não reflete a realidade biológica primeira, mas ele constrói o sentido dessa realidade. A diferença sexual não é a causa originária da qual a organização social poderia derivar. Ela é antes uma estrutura social movente, que ser analisada nos seus diferentes contextos históricos. (SCOTT, 1998, p. 115)

Incorporada ao meio acadêmico, a categoria gênero passou a ser utilizada de diversas formas. Algumas vezes, como reconhecimento do caráter relacional implicado nos estudos sobre mulheres, outras vezes como sinônimo de mulheres. Por exemplo, muitos estudos sobre mulheres passaram a ser intitular como estudos de gênero, por ter uma conotação mais neutra e objetiva que, supostamente, teria maior legitimidade institucional. (ZANETTI, 2009, p. 22)

A década de 1980 ficou marcada pela redemocratização e a consolidação do feminismo no Brasil e também pela mudança nas relações sociais entre feminino e masculino. Nesse período, Santa Dica já não mais vivia em Lagolândia, pois já havia falecido. Contudo suas ações e liderança fizeram parte de contribuições culturais importantes para o distrito de Lagolândia, como, por exemplo, a praça central do distrito (FIGURA 1) que encanta os visitantes que chegam ao local, pela beleza, variedade de flores cultivadas e todo o capricho, pela limpeza, que é mantida pela

Associação Feminina de Lagolândia, herança deixada por santa Dica.

Figura 1: Busto de Santa Dica na Praça Central de Lagolândia, cujo nome é uma homenagem à fundadora do distrito de Lagolândia, Benedita Cipriano Gomes.

Fonte: Acervo fotográfico de Siqueira (2015).

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