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A postura do investidor individual face ao risco por ele enfrentado leva a determinar o seu grau de aversão ao risco, possibilitando com isso a construção do formato das funções utilidade. Através de questionários construídos por especialistas no assunto, é fácil avaliar o relacionamento existente entre o dinheiro e a sua utilidade para um dado investidor individual.

Essas funções utilidade propiciam ainda a visualização de cenários que tracem a atitude de determinada pessoa em relação ao risco; que, algumas vezes pode alterar-se ao longo do tempo, caso o indivíduo se torne mais prudente e modifique a sua escala de preferências em função das situações em que envolvam dinheiro e risco.

Para efetuar a escolha baseada na idéia de maximização, utiliza-se a função utilidade como representação das preferências. Assume-se como premissa, que os indivíduos possuam uma ordem de preferência, que pode ser representada por uma função de preferência V(•), que consiste de uma expectativa matemática de Von Neumann e Morgenstern relativa à distribuição de probabilidade (p). A hipótese de que esta função V(•) tome a forma de uma expectativa matemática equivale à condição de que seja linear em

probabilidades, isto é, corresponda à soma de pesos dos componentes de (p), ou seja \£u,p,].

Partindo das conjecturas anteriores, pode-se admitir três tipos de comportamentos de investidores individuais, a saber: os avessos, amantes e os indiferentes ao risco envolvido. Imagine a situação de um determinado jogo de loteria que visa pagar uma quantia de R$ 5.000,00 para se habilitar a receber como prêmio um os resultados prováveis expostos no quadro a seguir:

QUADRO 3.1: RENDAS PROVÁVEIS DE UM SORTEIO ALEATÓRIO DE LOTERIA

Rendas Prováveis (R$) Probabilidade Associada a Cada Resultado (p,)

2.000,00 %

4.000,00 %

6.000,00 %

8.000,00 1/4

A partir do quadro anterior, é possível observar que o preço cobrado para a loteria é; igual ao seu valor esperado E(R), que pode ser expresso da seguinte forma:

E(R) = 'Z R I-Pt (3.1)

i=1

Resolvendo a expressão anterior com base no quadro 3.1, encontra-se o valor esperado igual a:

CAPÍTULO III: A TEORIA DA UTILIDADE

Veja através do resultado encontrado anteriormente que não se trata de escolher a alternativa com base no princípio de maximização do valor esperado, mas sim, no princípio da máxima utilidade esperada associada aos prováveis retornos, sendo necessário, portanto, atribuir a cada retorno individual (Ri) o seu equivalente em utilidade para o agente da escolha.

No caso de investidores avessos ao risco, perder cerca de R$ 5.000,00 que são considerados certos para poder se habilitar a R$ 5.000,00 prováveis, que é o valor esperado da loteria, acaba não o motivando à realização da aposta. Para tal investidor, se o sorteio der em torno de R$ 2.000,00 como resultado, ele estará perdendo cerca de R$ 3.000,00 e com a mesma chance; mas se por um acaso, der R$ 8.000,00, ele ganhará cerca de R$ 3.000,00, os quais não apresentam uma satisfatória comparação ao juízo do decisor avesso ao risco. Para um investidor com essas características, a utilidade associada ao jogo ou equivalente certeza, deve ser maior do que a utilidade associada ao seu valor esperado.

Com base nesses argumentos de escolha, pode-se estabelecer uma função utilidade que caracterize esse tipo de investidor, apresentando uma função utilidade côncava em relação à origem dos eixos coordenados e onde os rendimentos marginais sejam decrescentes. Matematicamente, uma função utilidade de um investidor avesso ao risco pode ser vista como:

u(r) = Jr (3.2)

Onde R é o retorno do investidor individual em determinado período de planejamento. Para determinar se a utilidade marginal é crescente ou decrescente, normalmente avalia-se a inclinação da função utilidade ou o sinal da segunda derivada da função utilidade. Vale salientar, que para esse tipo de agente econômico, a função utilidade apresenta U’(R) > 0, para todo R > 0, e U”(R) <0, para todo R > 0, o que determina a condição de utilidade marginal decrescente para níveis crescentes de retorno esperado.

Genericamente, uma função utilidade apresenta esse tipo de comportamento côncavo quando, para cada dois valores possíveis deX-, e X2, e, para todo 0 < a < /, tem-se que:

U[aX, + ( 1 - a)X2]> aü(X ,)+ (1 - a)U{X2) (3.3)

Graficamente, a expressão (3.3) mostra, que para um segmento de reta que una os pontos U(Xi) e U{Xi) e fique abaixo da curva de utilidade, pode ser caracterizado como função utilidade de investidor avesso ao risco. Logo, indivíduos com tais características preferirão manter a sua riqueza inicial (l/Vb), a aplicarem em investimentos que propiciem a mesma probabilidade de ganhar ou perder um mesmo valor, já que a perda de utilidade ocorrida com um resultado desfavorável é maior do que o ganho de utilidade de um resultado favorável; ou seja, U{W0) > E[U(W0)]. Veja através da figura 3.1 o formato da curva de um investidor individual avesso ao risco face às incertezas de prováveis rendimentos de determinada loteria.

CAPÍTULO III: A TEORIA DA UTILIDADE

FIGURA 3.1: FUNÇÃO UTILIDADE-RENDA DE UM INVESTIDOR AVESSO AO RISCO

Contrariamente, um investidor que é amante do risco possui uma função utilidade caracterizada por ser convexa em relação aos eixos coordenados. Reportando-se aos resultados encontrados a partir do quadro (3.1), observa-se que o fato do preço da opção do investidor pelo jogo ser igual ao seu valor esperado, deixando como ganho em utilidade, todo o incentivo moral ao respectivo jogo. Para esse tipo de agente, a utilidade associada ao jogo ou equivalente certeza é maior do que a utilidade associada ao seu valor esperado. Assim, o investidor amante do risco compraria a opção de jogo de loteria por R$ 5.000,00.

Para FRANCIS & ARCHER (1979, p. 260), os casos de tendência ao risco e de indiferença ao risco são casos problemáticos, que comumente são

apresentados apenas como curiosidade científica, e que na realidade não podem ser considerados como um comportamento rotineiro.

Uma função utilidade específica que melhor descreve o comportamento desse tipo de jogador frente ao risco envolvido, pode ser visualizada como segue:

U (R )=R 2 (3.4)

Veja que a expressão (3.4) é simétrica à verificada na expressão (3.2) que descreve o comportamento de um investidor avesso ao risco. No caso de indivíduos amantes do risco, a utilidade marginal se eleva com o crescimento da riqueza. Os rendimentos marginais para a função utilidade do agente econômico amante do risco são crescentes, sendo que a primeira e segunda derivada da função utilidade de tal investidor será maior do que zero, ou seja, IJ{R) > 0 e U"{R) >0, indicando a existência de um mínimo na respectiva função. Tais indivíduos são atraídos a jogos justos, cujo valor esperado é igual a zero. Graficamente, o formato da curva de utilidade do investidor que assume tais características pode ser visto da seguinte maneira:

CAPÍTULO III: A TEORIA DA UTILIDADE

FIGURA 3.2: FUNÇÃO UTILIDADE-RENDA DE UM INVESTIDOR AMANTE DO RISCO.

Genericamente, a função ' será convexa quando para cada par de possíveis valores de (X i) e (X

2

) e, para todo 0 < a < 1 tem-se que:

U[aX, + (1 - a)X2] < a U {X ,)+ (l- a)U{X2) (3.5)

No caso anterior, a expressão (3.5) que caracteriza um amante do risco obedece à definição de que LF(X) > 0 e U"(X) s 0 para alguma faixa de valores de (X). Finalmente, esse indivíduo se disporá a assumir um risco sempre que aumenta em forma correlativa a esperança matemática do benefício. Daí a possibilidade de se traçar uma curva de indiferença entre a esperança matemática dos resultados e a variância que representa

0

risco vinculado à tomada de uma determinada decisão.

Em contraponto às características descritas para o tipo de investidor mencionado anteriormente, para os indiferentes ao risco, a decisão segundo o princípio da máxima utilidade esperada segue a decisão tomada segundo o princípio do máximo valor esperado, pois a sua função utilidade é vista como linear.

Reportando-se ainda ao quadro (3.1), pode-se inferir que, como o preço da opção da loteria é igual ao seu valor esperado, para este investidor, será indiferente jogar na loteria esportiva ou reter os R$ 5.000,00 em seu poder. Para esse tipo de investidor caracterizado como neutro em relação ao risco assumido, uma função utilidade específica que melhor descreve o seu comportamento pode ser visto como segue:

U(R) = E(R) (3.6)

A expressão anterior representa uma reta passando pela origem dos eixos coordenados. A taxa de substituição de riqueza por unidade de risco para esse tipo de investidor será constante, caracterizando-se por um investidor que dá atenção ao risco. Além disso, o investidor indiferente ao risco sempre tentará maximizar a riqueza esperada, dado que a sua função é linear e, portanto, U"{R) = 0. A figura 3.3 evidencia o comportamento desse tipo de investidor em função do seu nível de aversão ao risco assumido no mercado.

CAPÍTULO III: A TEORIA DA UTILIDADE

FIGURA 3.3: FUNÇÃO UTILIDADE-RENDA DE UM INVESTIDOR INDIFERENTE AO RISCO.

Considerou-se nas expressões (3.2), (3.4) e (3.6), o fato de que o domínio dos retornos seja maior ou igual à zero, ou seja, (R > 0), limitando as respectivas expressões pela definição de utilidade de cada agente individual. Logo, para um resultado esperado igual a zero, a utilidade será nula e, para um resultado encontrado igual a 100%, tem-se um agente avesso ao risco atribuindo-se 1/(100) que é igual a 10 úteis6, tomando-se como base a expressão 3.2.

Assim, para o caso de um agente amante do risco, basta calcular a utilidade do investidor atribuindo-lhe U{ 100) que é igual a 10.000 úteis, tomando-se como base a expressão 3.4 e, no caso de um agente indiferente ao risco, basta atribuir 1/(100) tendo como resultado 100 úteis tomando-se como base para efetuar as manipulações algébricas a expressão 3.6, ficando

6 Para VARIAN (1994), o útil é uma medida de utilidade designada petos economistas da escola marginalista, onde procuram mensurar a magnitude de desejo que alguém atribui a alguma coisa.

desta forma, estabelecidas as escalas de utilidade de cada investidor individual. Estas podem ainda ser associadas a possíveis rendimentos entre 0 e 100, além de serem alocadas por interpolação.

Retornando ao quadro (3.1) e calculando-se a partir das probabilidades mensuradas de cada resultado, das rendas prováveis e dos valores esperados, a utilidade esperada para os três diferentes tipos de investidores individuais, face ao nível de aversão ao risco por ele assumido, será:

QUADRO 3.2: RENDIMENTOS PROVÁVEIS E UTILIDADE ASSOCIADA AOS RESULTADOS Rendas Prováveis (R$) Probabilidade Associada a cada Resultado Valor

Esperado UTILIDADE ESPERADA SEGUNDO AS

FUNÇÕES UTILIDADE DO INVESTIDOR

R i ( P i) E ( R ) - R i - P i Avesso ao Risco' u(r ) = 4r Amante do Risco U ( R ) = R 2 Inçfiferente a Risco u{r ) = e (r ) 2.000,00 y* 500,00 44,72 X % 4.000.000 x% 500,00 4.000,00 Vi 1.000,00 63,25 x 1/4 16.000.000 x 1/4 1.000,00 6.000,00 1/4 1.500,00 77,46 x % 36.000.000 x 1/4 1.500,00 8.000,00 % 2.000,00 89,44 X % 64.000.000 x % 2.000,00

I - 5.000,00 68,72 úteis 30.000.000 úteis 5.000,00 úteis

Uma vez que a utilidade que é associada aos possíveis resultados da loteria para o investidor avesso ao risco é igual a 68,72 úteis, pode-se também calcular a renda esperada que proporciona este nível de utilidade para tal investidor da seguinte forma: U(R) = V fr ou, explicitando o retorno em função da utilidade, obtêm-se a seguinte expressão: R = [u(R)f

.

Assim, fazendo R = (68,72)2 = R$ 4.722,44, obtêm-se um preço que é inferior ao preço da opção pelo jogo que foi igual a R$ 5.000,00. Logo, o valor

7 O cálculo da utilidade para um investidor avesso ao risco se processa da seguinte forma: U(2.000) = V2.000 - 44,72 x 'A = 11,18 úteis. Para um investidor que é amante do risco o cálculo da utilidade será:U (2.000) = (2.000) = 4.000.000 x 'A = 1.000.000 úteis. Já o cálculo para um investidor indiferente ao risco pode ser feito da seguinte forma: U (2.000) = 2.000 x 'A = 500,00 úteis.

CAPÍTULO 111: A TEORIA DA UTILIDADE

de R$ 4.722,44 seria o máximo que o agente econômico estaria disposto a pagar para aceitar o risco da aposta. Comparando-se com o resultado encontrado anteriormente e fazendo a operação matemática inversa, observa- se que a utilidade do valor esperado 1/(5.000) é igual a 70,71 úteis que é maior do que a utilidade esperada do jogo de loteria. Logo, o agente avesso ao risco não aceitaria jogar a este preço.

Para o investidor amante do risco, a utilidade esperada associada ao jogo; ou seja, cerca de 30.000.000 úteis é maior do que a utilidade associada ao valor esperado U(5.000) que é igual a 25.000.000 úteis, o que leva o agente a aceitar tal jogo. Já o investidor indiferente ao risco, o preço de R$ 5.000,00 que ele deveria pagar.pela opção de jogar, acaba provocando uma desutilidade igual à utilidade esperada associada ao respectivo jogo. Assim, a expectativa do investidor com relação a esta escolha é de um resultado líquido nulo sendo, portanto, indiferente entre jogar na loteria ou não jogar.

Cabe salientar que a condição de racionalidade do agente investidor fica estabelecida através das preferências por mais utilidade do que por menos em suas escolhas, e pelas habilidades em fazer associações entre os retornos possíveis acerca de determinado evento, de tal forma que possa refletir sobre as suas utilidades esperadas:

Outrossim, a teoria da utilidade ainda constitui um sistema normativo a partir do qual esse agente de decisão pode codificar essas preferências, destacá-las de um sistema complexo, transformando finalmente tais preferências, numa estrutura numérica de utilidades adequada para ser processada através de um algoritmo de otimização.

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