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2 UM LONGO CAMINHO DE DIFICULDADES ATÉ A CONQUISTA DOS

2.3 A curta experiência democrática (1946-1964)

2.3.4 O governo de João Goulart (1961-1964)

Jango assumiu a presidência do Brasil em meio a uma crise econômica e política, tendo que enfrentar a resistência dos militares, que não aceitavam a sua posse após a renúncia de Jânio (era seu vice-presidente eleito).

Diante deste cenário, o país assistiu a uma ascensão do sindicalismo como jamais se presenciara. Os sindicalistas lutavam contra a desvalorização dos salários e por melhores condições de vida dos trabalhadores. Eles contavam com um ambiente favorável a suas reivindicações, tendo em vista João Goulart sempre ter apoiado as causas trabalhistas, desde a época em que fora Ministro do Trabalho durante o segundo mandato de Vargas.

houve um aumento do número de greves, comícios, passeatas e congressos sindicais; ampliou-se o esforço de organização de intersindicais, que culminou no surgimento do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT); e os problemas enfrentados pelos trabalhadores rurais e por uma crescente massa de assalariados urbanos foram associados a questões políticas e econômicas mais gerais, que progressivamente se tornaram o principal eixo da atividade sindical, sem que isso implicasse o abandono das reivindicações econômicas dos trabalhadores (OLIVEIRA, 2002, p. 138).

Entre 10 e 14 de agosto de 1960, foi realizado no Rio de Janeiro o III Congresso Sindical Nacional, que pregava a liberdade e autonomia sindicais, a reforma sindical de acordo com os parâmetros da Constituição (1946), o fim da intervenção estatal nos sindicatos e a aprovação do direito de greve.

Durante o governo Jango, os sindicatos aprimoraram sua capacidade de se manifestar e negociar o cumprimento de suas reivindicações, sem necessariamente ter que recorrer a greves para isso. De acordo com Salvador Sandoval,

primeiro, ao se engajarem em greves de massa, os sindicatos demonstraram aos empregadores sua capacidade de mobilizar os trabalhadores e parar a produção. Segundo, através de sua associação com as organizações trabalhistas militantes em nível regional e nacional, os sindicatos foram capazes de pressionar os empregadores locais a se apresentarem tanto à mesa de negociações quanto aos Tribunais do Trabalho, com assistência política, jurídica e técnica fornecida pelas organizações de maior porte. Por fim, a receptividade do governo com relação às reivindicações econômicas durante as greves de massa, especialmente com relação ao aumento do salário mínimo, atenuou o conflito entre empregados e empregadores, pelo menos em nível local (1994 apud OLIVEIRA, 2002, p. 141).

As principais greves que ocorreram durante o governo João Goulart foram: a) greve da crise de sucessão (agosto e setembro de 1961), para garantir a posse de Jango devido à renúncia de Jânio Quadros; b) greve geral da crise do gabinete (julho de 1962), com a finalidade de garantir a formação de um gabinete mais favorável a reformas de base, em oposição a um gabinete conservador; c) greve geral pelo plebiscito (setembro de 1962), a fim de que fosse realizado plebiscito para decidir o tipo de governo, se parlamentarista – como era à época – ou presidencialista, plebiscito este que acabou ocorrendo em 6 de janeiro de 1963, em que acabou vitorioso o presidencialismo; d) greve dos 700 mil em São Paulo, (29 de outubro de 1963), envolvendo 15 categorias profissionais, 80 sindicatos e 4 federações; e e) a tentativa de greve geral em resistência ao golpe de 1964, fracassada pela pequena adesão dos sindicatos (OLIVEIRA, 2002, p. 147).

O governo que antecedeu à junta militar que governaria o país por longínquos 21 anos presenciou o crescimento dos movimentos sindicais, inclusive com a formação de intersindicais, proibidas deste 1954 (Portaria nº 129, de 23 de agosto). A mais importante

destas entidades à época foi certamente a CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), criado a partir do Comando Geral de Greve durante o IV Encontro Sindical Nacional, entre 17 e 19 de agosto de 1962, em São Paulo. O GCT participou ativamente de diversas greves, dentre elas a tentativa frustrada de resistência ao golpe de 64, conforme descrito acima.

Dentre as leis promulgadas no período analisado neste tópico, destacam-se: a lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, que instituiu a Gratificação de Natal para os trabalhadores, mais conhecida como 13º salário (BRASIL, 1962); o Estatuto do Trabalhador Rural, por meio da lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, que tratava da proteção deste tipo de trabalhador e das relações trabalhistas no campo (BRASIL, 1963a); e a lei nº 4.266, de 3 de outubro de 1963, instituindo o salário-família, devido a todo empregado na proporção do respectivo número de filhos, qualquer que fosse o valor e a forma de sua remuneração (BRASIL, 1963b).

No mês de março de 1964, vários acontecimentos precipitaram o golpe, programado a princípio para o dia 2 de abril. Dentre eles, pode-se citar o comício do dia 13, com a presença do presidente, o qual realizou um discurso populista e assinou dois decretos, o mais explosivo deles tratava da desapropriação de terras às margens de ferrovias e rodovias federais e de barragens de irrigação (CARVALHO, 2002, p. 142). O decreto nº 53.700, assinado durante o comício, declarava

de intêresse [sic] social para fins de desapropriação as áreas rurais que ladeiam os eixos rodoviários federais, os leitos das ferrovias nacionais, e as terras beneficiadas ou recuperadas por investimentos exclusivos da União em obras de irrigação, drenagem e açudagem, atualmente inexploradas ou exploradas contrariamente à função social da propriedade [...] (BRASIL, 1964a).

Além deste comício no Rio de Janeiro, em São Paulo, no dia 19, foi organizado um comício em protesto ao do dia 13, “promovido por organizações religiosas, sob inspiração de um padre norte-americano e financiado por homens de negócio paulistas”. O comício “centrou sua retórica no perigo comunista que se alegava vir do governo federal” (CARVALHO, 2002, p. 142).

Outro acontecimento considerado a “gota d’água” para os militares foi a presença do presidente, no dia 30 de março, numa reunião de sargentos da Polícia Militar do Rio de Janeiro, ocasião em que Jango fez um discurso radical, transmitido para todo o país (CARVALHO, 2002, p. 142).

Em 31 de março de 1964, forças políticas conservadoras projetaram “suas sombras sobre o país por longos anos” (OLIVEIRA, 2002, p. 148).