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O impacto das experiências pessoais no desenvolvimento do

Capítulo I: Enquadramento Teórico

2. O Psicoterapeuta em Desenvolvimento

2.1. O desenvolvimento profissional

2.1.3. O impacto das experiências pessoais no desenvolvimento do

vir a ser um fator imprescindível para a eficácia da terapia (Corbella & Botella, 2003).

No entanto, também o facto de nos preservarmos (e.g., evitando questões contratransferenciais) e conseguirmos fazer a separação do trabalho não o levando para casa, revela-se essencial para nos mantermos “verdadeiramente empáticos, compassivos e úteis para com estes” (Rothschild, 2009, p. 14). Pois, podemos considerar que o trabalho psicoterapêutico causa efeitos que passarão para além das paredes do consultório, vindo a influenciar os comportamentos e atitudes destes profissionais (Tavares, 2008). E esta é a principal estratégia a que o psicoterapeuta deve recorrer para evitar situações de insucesso, as quais podem levar ao já anteriormente referido burnout.

Por outro lado, Astin (1997, citado por Fernandes & Maia, 2008) considera que “ouvir os outros colegas que também ouvem histórias de trauma pode ser uma das formas mais poderosas de lidar com o seu impacto” (p. 56), como também partilhar e sentir-se escutado e compreendido.

2.1.3. O impacto das experiências pessoais no desenvolvimento do psicoterapeuta

Quando falamos em experiências pessoais, rapidamente nos remete para a imagem de família e outras relações interpessoais do meio mais pessoal do profissional. No entanto, estas experiências podem ir mais além dos relacionamentos interpessoais que este pode estabelecer no seu dia-a-dia. Assim, o verdadeiro intuito deste ponto, é perceber que tipo de experiências pessoais poderão influenciar o desenvolvimento do psicoterapeuta.

Devemos começar por ressalvar que todo o tipo de situação que possa afetar a vida do terapeuta, estará a influenciar o trabalho clínico desempenhado, inclusive a relação terapêutica (Luz, Keidann & Zot, 2006). E é neste sentido que os mesmos autores aludem o conceito de contratransferência que, desde que surgiu, já sofreu várias mudanças quanto ao seu significado, sendo visto nos dias de hoje como uma importante ferramenta no trabalho do terapeuta ao invés de um problema (Luz,

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Keidann & Zot, 2006). E uma vez entendido o conceito de contratransferência7 ao nível

da interação terapeuta-paciente, estamos aptos a considerar “a pessoa real do terapeuta” e, por isso, o desenvolvimento do processo terapêutico pode estar também sob a influência das suas questões pessoais, tal como referido inicialmente (Luz, Keidann & Zot, 2006, p. 270).

Já conseguimos perceber anteriormente que são muitos os fatores que influenciam negativamente a vida do psicoterapeuta elevando o risco de acabar com as suas reservas emocionais e psíquicas (Guy, 1995). Fatores esses derivados “do isolamento físico e psicológico, do vazio emocional e do desapego, a contínua tendência de ler o psicológico, a falta de espontaneidade, a vida indireta, as prioridades conflituosas, a exaustão física e o agitado horário de trabalho” (Guy, 1995, p. 425). Assim, de acordo com Corveleyn (1998), por vezes o trabalho de psicoterapeuta “exige muito de si mesmo, chegando inclusive a comprometer a vida pessoal” deste (p. 28). E, não nos esqueçamos que acima de tudo, o psicoterapeuta também é uma pessoa com uma história (Fernandes & Maia, 2008). No entanto, neste ponto a questão que se ressalva é se o inverso também se verifica.

Como abordado anteriormente, percebemos também que a contratransferência consiste em muitos fatores provenientes da vida psíquica do paciente, como também da vida emocional do psicoterapeuta, e assim, “sabemos também que a análise pessoal do psicoterapeuta não oferece imunidade nem garantias eternas, pois a vida é dinâmica e o futuro, incerto” (Favalli, 1999, citado por Luz, Keidann & Zot, 2006, p. 273).

Enquanto o processo terapêutico decorre, o que se destaca como mais importante é, sem dúvida, os resultados visíveis no cliente, ou seja, as mudanças resultantes do seu trabalho (Corveleyn, 1998).

Todavia, também as características pessoais do terapeuta se manifestam como influenciadores dos resultados que consegue alcançar com os seus clientes, ainda que “o impacto desse trabalho não tenha significado para o terapeuta” (Corveleyn, 1998, p. 38). Porém, segundo o mesmo autor, nem tudo o que é considerado influência para os resultados terapêuticos são especificados como consequências negativas para os psicoterapeutas, pelo contrário, “são fatores subjetivos que fazem parte das próprias condições deste trabalho e que podem ser chamados de inevitáveis porque estão

7 Segundo Luz, Keidann e Zot (2006), a contratransferência, permite “abranger a totalidade da resposta

do psicoterapeuta frente ao paciente”, ou seja, “a totalidade dos sentimentos despertados no terapeuta pelo paciente” (p. 270).

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intrinsecamente ligados à natureza do trabalho psicoterapêutico” (Corveleyn, 1998, p. 38).

Neste seguimento está claro que também as características pessoais do psicoterapeuta se tornam imprescindíveis para o desenvolvimento do processo terapêutico (Borges, 2009). Sabe-se também que uma prolongada prática psicoterapêutica influencia a personalidade do terapeuta e, parte-se assim do pressuposto que esta influencia consideravelmente as relações interpessoais do profissional, i.e., as relações do terapeuta com a família e os amigos (Guy, 1995).

Têm sido vários os estudos que têm vindo a comprovar que “a psicoterapia tem influência positiva sobre a vida e o funcionamento interpessoal do paciente” (Guy, 1995). Porém, será que se pode verificar como as suas relações interpessoais podem influenciar o desenvolvimento do psicoterapeuta?

Anteriormente fora referido que as diferentes orientações teóricas do psicoterapeuta podem influir este na forma de vivenciar e de estar nas suas relações pessoais (Heinonen, 2014). Contudo, segundo Corbella e Fernández -Álvarez (2006, citado por Corbella et al., 2009), uma vez membro de família, o psicoterapeuta consegue ao longo da sua experiência de vida pessoal – e profissional – vivenciar uma diversidade de relações que, ao fim e ao cabo, lhe permitem “configurar a sua posição relacional e as suas características pessoais que lhe criam identidade e que incutem a conceção e desenvolvimento da sua atividade profissional” (p. 129). Neste sentido, “a interação que ocorre desde o início entre a pessoa do terapeuta e o seu ambiente relacional (como o contexto familiar) influencia fortemente o desenvolvimento de diferentes níveis da Teoria da Mente8 que são especialmente importantes para os

psicoterapeutas” (Corbella et al., 2009, p.129).

No entanto, para além da pessoa em que se torna, existem outros fatores envolventes na sua vida pessoal que, de certo modo, podem influenciar o processo terapêutico. Estamos a falar de questões do seio familiar como uma gravidez, divórcio, doença, entre outros motivos.

Porém, a vida pessoal atual do terapeuta não é o único meio influente, pois o DP do terapeuta começa muito antes deste se tornar profissional. Devemos ter em conta também as experiências pessoais que poderão ter motivado o percurso e os primórdios de carreira, mas igualmente relevantes na abordagem deste ponto.

8 De acordo com Baron-Cohen (2001, citado por Lopes, 2009), a Teoria da Mente define-se como sendo

a “habilidade de atribuir estados mentais a si próprio ou a outras pessoas sendo a principal forma pela qual compreendemos ou predizemos o comportamento do outro” (p. 61).

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No fundo, ambos os últimos tópicos – o impacto do insucesso e das experiências pessoais no desenvolvimento do terapeuta – estarão correlacionados, uma vez que as experiências pessoais têm um grande peso na pessoa do terapeuta que, por sua vez vem refletir-se no seu desempenho profissional.

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