• Nenhum resultado encontrado

O modelo de pedagogia do argumento de Fahnestock e Secor: os tipos

3 UM MODELO DE APLICAÇÃO PARA UMA PEDAGOGIA DO ARGUMENTO

3.1 O modelo de pedagogia do argumento de Fahnestock e Secor: os tipos

Eu gostaria de possuir conhecimento reflexivo e pensamento estratégico não apenas sobre manipulação ou persuasão, mas também sobre

cooperação, por exemplo. Portanto, eu proporia a

palavra influência – de que forma se pode influenciar outra pessoa. Acho que isso abre um espaço mais amplo para consideração retórica.

Charles Bazerman

Neste capítulo, apresentaremos o desenho de um modelo de aplicação que comporta o trabalho com a construção do argumento. Trata-se de uma proposta baseada em uma visão geral que envolve nossas premissas acerca do que entendemos por construção do argumento, já exposta nos capítulos anteriores. Ao propor tal modelo, enunciamos os princípios pedagógicos para a abordagem do argumento na sala de aula, visando à busca de melhores ideias para responder a um acontecimento no mundo. Procuramos, assim, construir um quadro geral de referência para o professor.

3.1 O modelo de pedagogia do argumento de Fahnestock e Secor: os tipos de argumentos

Fahnestock e Secor (1983) apresentam uma pedagogia do argumento, bastante elaborada, no que concerne a um protocolo que segue o desenrolar da construção de um argumento. Essa proposta tem como produto final a materialização de um texto escrito. As autoras desenvolveram e aplicaram esse modelo de pedagogia do argumento na Penn State University20, tendo como alvo o desenvolvimento dos

“tipos de argumentos” com foco na escrita de textos do gênero discursivo ensaio argumentativo.

Segundo Fahnestock e Secor (1983) o auge de muitas aulas de produção textual está focado no ensaio argumentativo, tarefa considerada muito difícil para o docente. Um argumento escrito eficaz exige todas as habilidades expositivas que os

alunos aprenderam e, ainda mais, pede uma voz de autoridade e certeza que, muitas vezes, é bastante nova para eles. Conscientes da dificuldade e da importância que tem o argumento, muitos cursos relacionados a programas de produção textual estão dedicando mais tempo para atingir este objetivo.

Para estas autoras, a argumentação reúne todas as outras habilidades de escrita e prepara os alunos para os tipos de tarefas dessa modalidade exigidas em cursos e carreiras dentro da universidade. Na Penn State, por exemplo, os cursos de produção textual ministrados por elas são totalmente pautados a partir da construção de argumentos escritos.

O modelo de Fahnestock e Secor (1983, p. 2 ) parte do princípio de que “o professor de produção textual que se propôs a dar um curso sobre a construção de argumentos dispõe de três abordagens básicas para escolher: (1) a lógica / analítica, (2) a de conteúdo / resolução de problemas e, por último (3) a retórica/ gerativa”21.

Para as professoras, todas as três abordagens ensinam ao aluno algo sobre argumento, mas todas têm problemas. O objetivo delas, então, é defender a abordagem retórica/gerativa como a que atinge seu objetivo de forma mais direta e confiável.

A aula baseada na abordagem lógica / analítica, na verdade, é uma aula sobre lógica, que leva em conta toda uma terminologia, e apresenta conceitos de oposição, os silogismos categóricos e hipotéticos, o entinema, as falácias, a indução e a dedução. No entanto, não foi demonstrado que a lógica formal passa pelo argumento escrito. A lógica formal, como a chamaram Perelman e Toulmin, não tem simplesmente a mesma lógica do discurso. Os alunos que aprendem a manipular declarações baseadas em silogismos e diagramas de Venn22 ainda podem não ter

ideia de como construir um argumento escrito por conta própria.

Segundo Silva (2018), o diagrama de Venn é um método de organização de conjuntos que consiste em agrupar seus elementos dentro de figuras geométricas. Por meio de estudos relacionados à lógica, John Venn criou uma diagramação

21 The composition teacher setting up a course in argument has three basic approaches to choose

baseada em figuras no plano. Esse método consiste basicamente em círculos que possuem a propriedade de representar relações entre conjuntos numéricos. Também pode ser utilizado no estudo da Estatística a fim de organizar e analisar dados colhidos em pesquisas de opinião.

Nesta abordagem de ensino, outro suposto empréstimo da lógica é a distinção entre indução e dedução como formas de raciocínio e, portanto, como formas distintas de argumento escrito. A indução e dedução, às vezes, são vistas de forma muito diferentes, de modo que a indução vem a ser uma generalização de particularidades, e a dedução, a afirmação de algo particular de uma generalização. Na verdade, a distinção exata entre as duas é uma questão de controvérsia. Copi (1978), define as duas formas de raciocínio não como complementares, mas como raciocínio para uma conclusão (dedução) e raciocínio para uma conclusão provável (indução). Já Popper (1963), oblitera a distinção, mostrando que a indução, como tradicionalmente definida, não é válida.

Para Popper (1963), as observações que supostamente levam a uma conclusão são, de fato, controladas por uma conclusão anterior. Não existe uma forma pura de raciocínio que seja "exemplo + exemplo = conclusão", como é representado em muitas retóricas. O raciocínio subjacente a tal argumento não brota do particular para o geral, mas procede de uma suposição de tipicidade e provas particulares. Este processo não é essencialmente diferente da dedução. Vejamos o que Fahnestock e Secor (1983, p. 2) asseveram sobre isso:

Os alunos estão enganados se pensam que suas mentes funcionam em duas marchas: uma indutiva para frente e outra dedutiva para trás, ou se acreditam que é possível argumentar puramente a partir de evidências sem fazer uso de pressupostos. Mas os alunos que reconhecem a necessidade de provas típicas podem considerar fecundamente se o público aceita suas provas como representativas ou se devem argumenta-las como representativas explicitamente. (tradução nossa).23

A abordagem de conteúdo / resolução de problemas pressupõe que os alunos absorverão os princípios e métodos de argumento escrito simplesmente

23 Students are misled if they think their minds work in two gears, inductive forward and deductive

reverse, or if they believe it is possible to argue purely from evidence without assumptions. But students who recognize the necessity for typical evidence can fruitfully consider whether their audience will accept their evidence as representative or whether they must explicitly argue that it is.

resolvendo problemas, expostos a situações de sala de aula. Aqui os alunos escrevem "teses" que vão se construindo naturalmente fora em suas leituras ou são sugeridas pelo professor. Outra variedade desta abordagem é o método de resolução de problemas, como exemplificado por Field e Weiss (1979), que molda as atribuições não apenas especificando temas, mas também definindo situações retóricas. Os alunos escrevem o caminho para sair dos problemas, argumentando por meio de cartas, memorandos, relatórios e artigos breves.

A abordagem de conteúdo/solução de problemas se aproxima efetivamente das situações de escrita da vida real que fornecem propósito e conteúdo. Além disso, um curso que ensina a escrever dessa maneira é atraente, porque o professor pode apresentar para discussão um corpo coerente de material da filosofia, sociologia, psicologia ou mesmo literatura. Se tudo der certo, a invenção não é um problema, porque os alunos são diretamente estimulados pelo conteúdo e praticam argumentos de escrita. Na melhor das hipóteses, os estudantes podem aprender um método de resolução de problemas para aplicar a outras situações de escrita, quando não são mais sugeridos tópicos, nem a invenção estimulante de leitura controlada. Neste caso, o professor de produção textual também é reduzido a um supervisor do processo de revisão, “um policial com um lápis vermelho” (FAHNESTOCK; SECOR,1983, p. 10).

Por fim, Fahnestock e Secor (1983, p. 10) apresentam uma abordagem para a construção de argumentos focada na produção textual, fundada em argumentos que não se organizam em torno de um corpo de conteúdo. Por meio da abordagem retórica / gerativa o professor pode ensinar, explicitamente, a invenção. Esta abordagem dedica-se inteiramente ao processo argumentativo que recorre a fontes clássicas, mais precisamente à Teoria da Stasis, que forma um esquema de invenção puramente voltado para a discussão de um acontecimento. Fahnestock e Secor (1983) dividem essas fontes em: definição; comparação (qualidade); causa e efeito; e proposta (política). Essas fontes têm como base as fontes da Teoria da Stasis clássica, ou seja, a proposta dessas autoras passa a ser uma visão contemporânea da Teoria da Stasis. Essas fontes, conforme já mostramos no Capítulo 2, na seção que trata sobre a Teoria da Stasis, ajudam os alunos a encontrar premissas para propostas e avaliações que costumam surgir no momento de gerar teses para argumentos.

Para Fahnestock e Secor (1983) estas fontes são pouco úteis quando os alunos precisam dar um passo para trás afim de apoiarem as próprias ideias geradas pelas fontes. Por exemplo, o aluno que quer argumentar que "o governo federal não deve subsidiar as companhias aéreas" é levado a pensar que a fonte de definição pode render uma premissa como "por que os subsídios das companhias aéreas são uma forma de socialismo?", ou que uma fonte de causa e efeito pode render uma premissa como "porque, uma vez que uma indústria é subsidiada, a qualidade do seu serviço deteriora-se". No entanto, é preciso ir além e perguntar: como essas premissas são sustentadas? Como alguém realmente argumenta por uma categorização, como a primeira, ou uma relação de causa e efeito, como a segunda? Mostrar ao aluno a reaplicação contínua das quatro fontes é algo bastante desanimador. Assim, enquanto as fontes clássicas são auxílios poderosos à invenção nos argumentos em larga escala quando as avaliações e as propostas exigem, elas não ajudam os alunos a construir argumentos de suporte de menor escala.

Para estas autoras, é possível dar aos alunos uma ajuda mais específica para construir argumentos se começarmos distinguindo os tipos básicos de argumentos e as estruturas características de cada um. Para elas, seria mais fácil partir de quatro grupos principais que respondem às perguntas do tipo: 1. "O que é isso?” (Definição); 2. "O que causou ou que efeitos ele tem?" (Causa e feito); 3. "É bom ou ruim?” (Qualidade); e 4."O que deve ser feito sobre isso?” (Proposta). As propostas que respondem a essas perguntas são: 1. proposições categóricas; 2. declarações causais; 3. avaliações; e 4. propostas. A tese de qualquer argumento se enquadra em uma dessas categorias. Se levarmos em consideração esses quatro tipos de argumento, desde a proposição categórica mais simples até a proposta mais complexa, teremos uma lógica coerente para organizar aulas de escrita baseadas em argumentos, asseveram as autoras.

Considerando, assim, com algumas ressalvas, o princípio geral desse modelo, apresentaremos, a seguir, um modelo focado em um processo por meio do qual se segue um protocolo para a construção do argumento.

Adiantamos, outrossim, que o nosso modelo para uma pedagogia do argumento, primeiramente, não tem como produto final a produção de um texto escrito. Segundo, quando nos basearmos na Teoria da Stasis, tomaremos enquanto

modelo as fontes clássicas de Crowley e Hawhee ([1943] (2012), e não as fontes contemporâneas de Fahnestock e Secor (1983), pois acreditamos que as diferenças são ínfimas, apenas trocamos a fonte causa/efeito pela de fato. No mais, quando as autoras lançam uma preocupação, conforme dito anteriormente “[...] estas fontes são pouco úteis quando os alunos precisam dar um passo para trás para apoiarem as próprias ideias geradas pelas fontes [...]”, isso não será preocupação, a posteriori, para nós, pois, como trabalharemos com um processo, teremos uma fase específica para revisão e textualização dos argumentos, por meio da qual, o problema levantado por estas autoras será sanado.

No mais, acrescentamos que tanto a Teoria da Stasis Clássica, representada em nossa pesquisa por Crowley e Hawhee ([1943] (2012), quanto a Teoria da Stasis Contemporânea, representada, em nosso trabalho, por Fahnestock e Secor (1983), são “aplicadas” em livros didáticos americanos enquanto forma de elaborar argumentos com o intuito de se produzir um texto escrito. Em nossa pesquisa, asseveramos que utilizaremos essa Teoria enquanto base para nossas propostas e não enquanto aplicação teórica.

Documentos relacionados