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O município de Eusébio: da criação à inserção no contexto metropolitano

Quando a Região Metropolitana de Fortaleza foi oficialmente instituída (1973), Eusébio constituía-se um distrito pertencente ao município de Aquiraz37, que experimentava um intenso processo de parcelamento das suas terras para as práticas de veraneio, notadamente voltado à população residente em Fortaleza. Após a sua emancipação e elevação à condição de município, Eusébio, especialmente a partir da década de 1990, passou por um acelerado processo de transformações socioespaciais. Nesse período, Eusébio atinge um novo patamar de reprodução do capital, atendendo interesses de novos grupos e agentes econômicos que passaram a atuar em seu território. Tais mudanças refletiram as rápidas transformações em seus indicadores econômicos e demográficos.

Entende-se que os fatores de crescimento econômico e demográfico e as metamorfoses espaciais em Eusébio vinculam-se, estreitamente, ao processo de metropolização e expansão de Fortaleza. A expansão do tecido urbano metropolitano da cidade polo em direção ao município revela as tendências de deslocamento de atividades de produção e consumo, apresentando como dois principais vetores a CE-040 e a rodovia BR- 116 (conforme apresentados no tópico anterior).

Atualmente pode-se identificar como principais fatores de transformação espacial no município o crescimento da área edificada com a implantação dos condomínios e loteamentos fechados, voltados para segmentos de média e alta renda, e o crescimento de indústrias de transformação e empresas do setor de serviços. Os novos investimentos convivem no mesmo território municipal em que ainda se encontram paisagens típicas de áreas rurais, com grandes terrenos destinados à produção agrícola e atividades pecuárias, denotando a coexistência de diferentes espacialidades, também associadas a momentos diferenciados das relações Eusébio-Fortaleza.

A seguir, serão apresentadas algumas características do processo de parcelamento das terras no período em que Eusébio despontava como município de atributos ideais para lazer e veraneio da população da capital. Nesse contexto, a mercantilização de suas terras e os processos de especulação imobiliária toma forte impulso. Posteriormente, expõe-se as

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O distrito foi oficialmente criado em 1933. Fonte: www.ibge.gov.br/cidadesat/topwidow, acessada em 22/06/2010.

transformações pós-emancipação, em especial sua conversão em área de expansão das atividades imobiliárias formais da metrópole.

2.3.1 Características do parcelamento das terras e as práticas de veraneio (décadas de

1970 e 1980)

Na segunda metade do século XX, Eusébio passou a se consolidar como uma das áreas preferenciais para a implantação de segundas residências em sítios de habitantes de Fortaleza, aparecendo como opção de lazer e descanso dos problemas da cidade nos fins de semana, prática intitulada por Dantas (2009) veraneio rural.

A proximidade com a cidade de Fortaleza e com as praias do litoral leste, o clima ameno, a presença de lagoas e áreas verdes compondo uma paisagem bucólica, associada à disponibilidade de grandes terrenos, certamente constituem fatores que contribuíram para a implantação de segundas residências em Eusébio (assim como ocorreu em outros setores do município de Aquiraz), formando espacialidades vinculadas ao lazer e recreação a leste/sudeste da capital. Além de casas de veraneio, foram instalados em Eusébio outros equipamentos de lazer, como o haras – para práticas de equitação –, o autódromo internacional Virgílio Távora (1969) e casas de show.

A partir das análises das plantas de loteamentos fornecidas pela prefeitura municipal, foi possível identificar um intenso processo de parcelamento das terras no território de Eusébio nas décadas de 1970 e 1980. É nessas décadas, principalmente, que empreendedores imobiliários38 fragmentam grandes glebas e terrenos anteriormente destinados à produção agrícola, objetivando sua comercialização, sobretudo para construção de sítios e chácaras.

A crescente mercantilização de terras nesse período fica evidente em um estudo científico de 198339, em que a esterilização das terras agricultáveis e sua conversão em loteamentos ganha destaque, assim como o crescente processo de especulação imobiliária que se instalou no município desde então:

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Os empreendedores imobiliários são entendidos como os indivíduos ou instituições que compram um terreno e concebem um programa sobre ele, seja loteamento, ou mesmo construção. Segundo o projeto de Lei nº 3057 de 2000 os empreendedores imobiliários são os responsáveis pelo parcelamento do solo para criação de loteamentos, desmembramentos ou implantação de condomínios.

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Convênio Universidade Estadual do Ceará/SUBIN. Contribuição ao estudo integrado da paisagem dos ecossistemas de áreas do município de Aquiraz/Ceará; relatório final. Fortaleza, UECE, 1883.

Apesar de dizermos que Eusébio faz parte do ‘cinturão verde’, o setor agrícola está perdendo espaço em consequência do loteamento desmedido que está se processando. Como a agricultura já não rende tanto, e há especulação imobiliária, os nativos vendem suas terras para imobiliárias que revendem em forma de loteamento, reduzindo em fragmentos as propriedades anteriormente produtivas. (p. 557). O estudo ainda ilustra tal situação com o depoimento de um antigo morador, que revela sua percepção sobre as transformações ocorridas no município, naquele período. A citação confirma que o principal objetivo do parcelamento das terras era sua venda para a população residente em Fortaleza, fato que trouxe implicações nas formas de sociabilidade no município.

[...] esse lugar era um local pacato, onde as pessoas se conheciam, tinham os costumes simples do sertão e viviam uma vida pastoril e de agricultura, e agora é avalanche de gente que vem de Fortaleza para cá no fim de semana. Fazem muito barulho, festas, onde acontecem muitas brigas. Eles vêm descarregar aqui o que eles acumulam em Fortaleza [...] (p. 577).

Pelas plantas de aprovação de loteamentos, se pode identificar algumas características do processo de fragmentação das terras do atual recorte político-territorial do município de Eusébio. Grosso modo, os loteamentos da década de 1970- 1980 e início da década de 1990 foram implantados de maneira descontínua, ladeando os principais corredores viários do distrito e, frequentemente, avizinhando grandes terrenos não parcelados. Em geral, os projetos de loteamento possuíam entre 100 e 200 lotes, com tamanhos que variavam (em média) entre 300 e 600 metros quadrados. Em algumas plantas da década de 1970 era possível encontrar vendas de quadras inteiras, com tamanhos entre 5.000 e até 7.000 metros quadrados, nas proximidades da Estrada do Fio e da antiga CE-004 (CE-040).

No atual setor norte do município (correspondente às localidades Mangabeira, Cararu e Precabura) ocorreu uma concentração de projetos de loteamentos nos arredores de recursos hídricos (Rio Pacoti e Lagoa da Precabura), próximos à estrada da COFECO (via de ligação ao litoral de Aquiraz) e da estrada Eusébio-Mangabeira. As figuras 2 e 3 apresentam alguns exemplos de loteamentos voltados para as práticas de veraneio nesse setor.

Em virtude da sua proximidade com as praias do litoral leste (Sabiaguaba, Porto das Dunas, Prainha), existiam nesse setor, na década de 1970-1980, projetos de loteamentos associados a práticas de veraneio litorâneo. Os nomes dos loteamentos que remetem ao litoral são emblemáticos: Cidade Mar e Sol (1978); Parque Brisa Mar (1975); Rota da Praia (1977); Caminho da COFECO (1984). Outros, destinados a sítios, possuem nomes associados

aos recursos naturais do município: Sítio Precabura (1982); Novo Planalto Lagoa (1976); Lagoa Precabura (1985).

Nesse período, ocorreu igualmente uma concentração de loteamentos voltados para residências e sítios ao longo da Estrada do Fio, assim como nas proximidades da CE- 004, duas vias que ligam Eusébio diretamente à Fortaleza. Na figura 4, retirada dos classificados de um jornal da década de 1980, observa-se o anúncio à venda de lotes, enfatizando a proximidade de Eusébio com a capital do Estado, certamente um fator de valorização dos imóveis.