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Conforme já discutido nesse trabalho, a história de participação da universidade com espaços dedicados à educação de crianças pequenas emerge dos movimentos de lutas principalmente de mulheres por creches em seus locais de trabalho. É nesse contexto que surge o Núcleo de Educação Infantil Ipê Amarelo, nos anos de 1970 “(...) a partir de uma antiga reivindicação de pais, (Professores e Técnicos-adminstrativos) trabalhadores da UFSM, por uma creche na qual

50 Nos Apêndices há um demonstrativo dos Cenários nos quais atuam os Educadores

– Professoras Referência e Bolsistas -, a formação acadêmica de cada um, o tempo de permanência no NEIIA, bem como o número de crianças com os quais atuam.

pudessem deixar seus filhos com pessoas responsáveis pelo seu cuidado no período da jornada de trabalho que tinham” (PPP, 2009, p. 3).

Depois de intensas lutas por um espaço próprio desde 1973, em 24 de abril de 1989 inaugura-se a Creche e Pré-Escola Ipê Amarelo, vinculada à Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, que contava com recursos humanos cedidos pela sua mantenedora, os quais exerciam funções administrativas. Havia nesse período 38 profissionais de natureza eventual (terceirizadas) que atuavam como Pedagogas, Recreacionistas, Enfermeiras e Técnicas em Enfermagem. Conforme o PPP do NEIIA:

Em 1994, através de Concurso Público, a Creche foi contemplada com seis vagas para o Cargo de Técnico Administrativo em Educação-Recreacionista e duas vagas para Pedagogo, que substituíram pouco a pouco as funcionárias terceirizadas. Como o número de concursadas era insuficiente para suprir a necessidade da creche, passaram a ser contratadas Bolsista-estagiárias, as quais eram estudantes de Cursos ligados à Educação que realizavam estágios em convênio PRAE – CIEE (Centro de Integração Empresa e Escola). Desde então a denominação passou de “Creche” para Núcleo de Educação Infantil Ipê Amarelo (2009, p. 3).

Pode-se perceber que este espaço educativo constitui-se com pouca ou nenhuma legitimidade no que seria seu foco de trabalho: a educação das crianças. Somente em 1994 é que a Universidade remaneja algumas vagas que seriam para o Hospital Universitário para que fossem “ocupadas” no Núcleo de Educação Infantil Ipê Amarelo. Quando da entrada das pessoas concursadas saem as “recibadas” como eram chamadas as funcionárias que por 5 anos atuaram com as crianças.

É num período de grande efervescência das produções e lutas por uma Educação Infantil de qualidade, década de 1990, que a relação entre o NEIIA e o curso de Pedagogia da UFSM se intensifica. Com a presença de estagiárias, predominantemente do curso de pedagogia, no espaço educativo destinado à educação de filhos de funcionários da UFSM o Núcleo passa a depender, para seu funcionamento, de instâncias da universidade e fora dela que organizam a forma de ingresso e permanência das pessoas que ali desempenhavam suas atividades profissionais. Salienta-se que, tendo em vista a vinculação da maioria das pessoas ao NEIIA ser por estágios curriculares e extra-curriculares, a educação das crianças mostra-se restrita ainda a um trabalho pré-profissional.

Em seu estudo, Raupp (2002) contextualiza as produções sobre creches universitárias no Brasil focalizando os estudos que se dedicam a aspectos do cotidiano dessas unidades. A autora esclarece também a utilização de terminologia adequada em seu estudo sobre as unidades universitárias de educação infantil. Nesse estudo fica clara também a tendência de organização das creches como um todo o que caracteriza também as que se configuraram nos espaços universitários. Essa tendência segue as limitações de um contexto histórico e social em que não necessariamente se pensa na educação da criança de maneira a transcender o objetivo de que ela esteja assistida.

Em 1993, com a instituição do “auxílio pré-escolar” mediante decreto n. 977, de 10/11/1993 que em seu art. 7º dispõe sobre as modalidades de assistência pré- escolar para os funcionários federais, “houve a desobrigação da Instituição em oferecer a modalidade direta de atendimento às crianças de zero a seis anos de idade, filhas de seus servidores.” (PPP, 2009) Este contexto fica bem explicitado também na pesquisa de Raupp, quando discute a ausência do direito à creche no local de trabalho prevista na Constituição Federal:

Em dezembro de 1993, a lacuna foi preenchida com o Decreto nº 977, de 10/11/93 (Bobbio, 1993) e com a lei complementar, Instrução Normativa nº 12, de 23/12/93 (Bobbio,1993), emitida pela Secretaria da Administração Federal da Presidência da República, que disciplinam a assistência pré-escolar destinada aos dependentes dos servidores públicos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Caracterizam-se em dispositivos legais que surgem na contra-mão da expansão das unidades de educação infantil nestes órgãos federais. Instituem o auxílio pré-escolar como assistência indireta aos servidores para proporcionar atendimento aos dependentes, na faixa etária de 0a 6 anos, em creches e pré-escolas, mantêm as unidades integrantes da estrutura do órgão ou entidade federal existentes, proíbem a criação de novas unidades a partir da data desses dispositivos e mantêm os contratos ou convênios até o prazo final com instituições particulares ou com entidades públicas, vedando a prorrogação dos mesmos (2002, p. 24).

Depois do referido Decreto o NEIIA passa por uma reestruturação financeira e administrativa. O que se convenciona pela “modalidade indireta”, em que se subsidia o atendimento por contribuições dos pais usuários dos serviços prestados pelo Núcleo. Essas contribuições são administradas pela Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência (FATEC) e estão, naquele momento, sob a responsabilidade

da Coordenadoria de Qualidade de Vida do Servidor da Pró-Reitoria de Recursos Humanos (PPP, 2009, p. 4-5).

A década de 1990 marcou a história da Educação Infantil com debates e produções científicas que já vinham crescendo desde os anos 80. Esse crescimento se caracteriza pelas produções teóricas, de documentos e ordenamentos legais que mostram a necessidade de se “levar a sério” a educação de crianças pequenas.

Advoga-se por uma Educação Infantil pedagogicamente orientada por objetivos que visem o desenvolvimento e a aprendizagem da criança, destacando a função social da Educação Infantil como inserção da criança aos bens culturais e na capacidade de produção de uma cultura da e para a criança. Este ideário tensiona os modelos de educação em ambientes coletivos de até então, pois se sabe que as creches tinham marcadamente um viés higienista, restrito aos cuidados pautados no seguimento da legislação que previa que os pais trabalhadores tivessem um espaço para deixar seus filhos.

Ao mesmo tempo em que se dão essas discussões sobre o direito da criança a participar de espaços coletivos de educação, o NEIIA reestrutura sua Proposta Pedagógica e se estabelece numa luta para se vincular ao Centro de Educação. Esta luta consolida-se em 2002, quando, conforme o PPP:

(...) a Resolução 012/2002 foi aprovada pelo Conselho Universitário, do Gabinete do Reitor, e, em seu Art.1º determina „extinguir o Núcleo de Educação Infantil Ipê Amarelo da estrutura organizacional da Coordenadoria de Qualidade de Vida do Servidor da Pró-Reitoria de Recursos Humanos e transferir a sua infra-estrutura para o Centro de Educação onde suas atividades serão desenvolvidas na forma de projeto de ensino, pesquisa e extensão‟ (p. 4).

Dessa forma o NEIIA está ainda hoje ligado ao Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI) do Centro de Educação como um Projeto de Ensino, Pesquisa e Extensão conforme determina o Art. 9º, parágrafo 3º da Resolução 012/2002. Para tanto a Coordenação do responsabiliza-se pela apresentação de uma “Proposta de Modelo Didático/Pedagógico” que credencie o NEIIA como um núcleo educacional (PPP, 2009).

Entre os anos de 2002 e 2006 o Núcleo teve seu funcionamento garantido pelos constantes estágios curriculares e extra-curriculares que aconteciam na maioria de suas turmas. No ano de 2007 ocorreu a mudança na Coordenação NDI e do Projeto do NEIIA, o que se somando às modificações na estrutura curricular do

Curso de Pedagogia da UFSM – no qual os estágios estão alocados somente no final do curso e com um período de 150 horas – tomou-se a decisão de contratar uma professora formada para cada turma já que continuar contando com os estágios geraria uma rotatividade muito grande de adultos no atendimento direto às crianças. Assim, o NEIIA funciona hoje com uma equipe técnica do Núcleo, Professoras Referência que são contratadas pelo Projeto, via FATEC, Bolsistas dos Cursos de Pedagogia e com os Estagiários via Estágio Curricular Supervisionado dos cursos de Pedagogia e Educação Especial, “que desenvolvem atividades de cuidados e educação às crianças, filhos de servidores e estudantes da UFSM” (PPP, 2009).

Os dados atuais de organização do Núcleo permitem entender a complexidade que envolve sua estrutura e gerenciamento como espaço de atendimento educacional à infância. O NEIIA conta ao todo com o trabalho de 54 pessoas além da Equipe Diretiva. Dentre essas, há Servidores da Universidade, profissionais que atuam com vinculação a uma Empresa Terceirizada, Educadores – Professores Referência e Bolsistas – contratados pela FATEC e Bolsistas da PRAE. Somam-se a esses, em períodos limitados de tempo, os Estagiários que estão vinculados ao curso de Pedagogia e Educação Especial.

Quanto ao financiamento do NEIIA, este também apresenta características bastante peculiares, já que, como não é parte da Estrutura Organizacional da UFSM,51 não há como obter receita própria, o que faz com que os recursos sejam

oriundos de várias fontes. A Estrutura Física e equipamentos do Núcleo são de responsabilidade da Reitoria e da Pró-Reitoria de Administração, a Alimentação é recebida do Restaurante Universitário e o restante de materiais pode ser adquirido pelos recursos do Projeto. Da mesma forma que é o Projeto, mediante o pagamento das mensalidades, que subsidia os salários dos Educadores.52

É em meio a todas essas características tão peculiares que o Núcleo de Educação Infantil Ipê Amarelo vive seu cotidiano e projeta sua possível institucionalização com vistas a ser dignamente reconhecido pela sua história e contribuição na Educação de crianças dentro do espaço da universidade. É nesse

51 Em anexo consta o Organograma do Centro de Educação onde se percebe que não há como

visualizar a vinculação do Projeto do NEIIA à Unidade Universitária a qual está ligada (Centro de Educação).

52 Nos Apêndices há um Organograma do NDI com o Programa que o constitui, bem como os

contexto de luta que o NEIIA se vê com a possibilidade de consolidar-se como um espaço acadêmico legítimo, mas também legal e com recursos para que a indissociabilidade Ensino, Pesquisa e Extensão se efetive. Isto pode ser expresso nesse trecho do PPP:

Cabe também ressaltar a importância desta unidade de Educação Infantil no processo de Ensino, Pesquisa e Extensão dentro da UFSM, o que precisa ser cada vez mais discutido e valorizado para que possamos participar do meio acadêmico difundindo experiências e pesquisas aqui realizadas, consolidando seu papel dentro da Universidade rumo à institucionalização desta unidade (2009, p. 5).

As questões que se relacionam ao histórico do NEIIA se mostram relevantes e são trazidas nesse trabalho no sentido de entender sua estrutura e organização atuais. Também se considera que a história contada, os cenários reconstruídos podem auxiliar na interpretação do cotidiano e seus cenários atuais, embora não justifique todos os seus aspectos.

O trabalho pedagógico acontece nesse cotidiano - que oscila entre as marcas da indefinição institucional e a vontade às vezes coletiva, às vezes solitária, de que se defina um trabalho com foco na criança. É nesse cotidiano que se acredita ser importante a discussão sobre o caráter pedagógico das ações que se realizam com as crianças. Admite-se que uma intencionalidade profissional - pedagogicamente

referenciada à educação da criança pequena, defendida nessa Tese, seja a principal

indefinição presente em outros espaços educativos de crianças. Por isso o investimento nessa pesquisa e na visualização de Referências Positivas possíveis e necessárias no trabalho pedagógico desenvolvido com as crianças no contexto em que vivemos.

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