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2. R EFERENCIAL TEÓRICO

2.2 O NOVO INSTITUCIONALISMO

Sabe-se que os modelos por processo constituem estudo de atividades políticas e administrativas, o que coincide com análise de comportamento político. Com o movimento comportamental iniciado após a Segunda Guerra Mundial, os cientistas políticos de fato passaram a direcionar suas atenções para a realidade da atividade política e administrativa efetivamente exercida na época, focalizando suas abordagens no nível micro, para olhar o dia- a-dia dos tomadores de decisões políticas (DAHL, 1961). Com efeito, o amplo behaviorismo emanado da psicologia norte-americana, promotor de maior cientificidade pela adoção de métodos de observação empírica e rigor teórico na ciência política, tinha o comportamento observável como dado básico para análises dos fenômenos políticos. Foi em razão dessa perspectiva que emergiu a crítica institucionalista, de que não se pode olvidar que todo comportamento ocorre no contexto de instituições, como elucida Immergut (2006).

A apreciação dos fenômenos políticos através somente da observação comportamental é baseada nas preferências que foram expressas pelos atores em suas atividades político- administrativas. O retorno da visão institucionalista vem, então, em defesa da ideia de que os resultados políticos são de fato decorrentes de preferências expressas pelo comportamento político dos atores, todavia, essas preferências são moldadas por configurações das circunstâncias. É por meio das instituições que essas configurações das circunstâncias operam no processo político, armando o ambiente de oportunidades e incentivos para as ações dos indivíduos, que podem ser favoráveis a mudanças ou a conservação do status quo.

Assim sendo, o novo institucionalismo passa a ser difundido ao lado da tese de que para melhor compreender os resultados do processo político faz-se necessário investigar como as instituições afetam as preferências. Essa visão, portanto, prioriza ainda mais o processo político. Já o comportamento e as ações dos indivíduos, ao invés de serem entendidos como dados básicos para o estudo das preferências, se tornam objeto de análise (junto com as decisões coletivas) para a observação da tomada de decisão, a qual é sempre vista como contextualizada.

“(...) What were the consequences, if any, of opinions? That question and the

need to understand the nature of continuity and change were fundamental to the resurgence of institutions as a focus of analysis. Because institutions channeled the opportunities and incentives for behavior or induced powerful

insulation to change, opinions distributions by themselves told us little”.

(Rhodes, Sahah e Bert, 2006, p. xiii)8

Não obstante a real diferença entre instituições e comportamento, a dicotomia de abordagens não perdura na ciência política contemporânea. Diermeier e Krehbiel (2003) explicam esse fenômeno por meio do reconhecimento de que o novo institucionalismo é mais um método do que uma doutrina única de conteúdo substantivo. É por isso que hoje esses estudos não são rivais do behaviorismo e nem, muito menos, evitam o comportamento.

Conforme mencionado, a visão institucionalista busca considerar as ações políticas sem as desvencilhar de seus contextos com abordagens que variam entre as que focalizam (a) a natureza das instituições; (b) os processos que traduzem estruturas e regras em impacto político, tomando as instituições como condicionantes da tomada de decisão, ou seja, como exógenas; e (c) os processos que traduzem o comportamento humano em regras e instituições, e estabilizam, sustentam, transformam ou eliminam instituições (MARCH e OLSEN, 2006, p. 4). Essa última abordagem tem recebido grande atenção por parte dos adeptos do novo institucionalismo. Trata-se da questão referente à existência, preservação e continuidade das instituições, em que os atributos institucionais passam a ser vistos não como causa, mas como consequência das ações. O que se resume ao seguinte raciocínio: além de condicionarem escolhas atuais, as instituições também são fruto de escolhas. Foram e são, portanto, condicionadas pelo comportamento no momento de suas origens, permanências e mudanças. Nesse sentido, o olhar para as instituições como endógenas torna-se também um elemento explicativo dos fenômenos políticos. Com efeito, o novo institucionalismo é configurado em perspectivas que, mesmo não homogêneas quanto às abordagens analíticas, buscam esclarecer os papeis das instituições nos resultados das interações entre os atores sociais (HALL e TAYLOR, 2003; HALL, 2010). As correntes do neo-institucionalismo histórico e da escolha racional são as que mais se alinham à base teórica deste trabalho.

Pelo neo-institucionalismo da escolha racional as instituições são as ‘regras do jogo’, ou seja, as normas, procedimentos e regras válidas dentro do processo decisório, com as quais os indivíduos buscarão maximizar suas preferências. Assim as instituições são percebidas mais como rotinas de processamento de informações e sistemas de interpretação, em geral estáveis e relativamente duradouras. A questão da origem e mudança institucional fica, muitas vezes, vinculada a pressupostos de equilíbrio e acabam descritas como dependentes de

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“Quais as consequências, se houver, de opiniões? Essa questão e a necessidade de compreender a natureza de continuidade e mudança foram fundamentais para o ressurgimento das instituições como objeto de análise. Porque as instituições canalizaram as oportunidades e incentivos para o comportamento ou induziram poderosa proteção à mudança, as distribuições de opiniões por si só nos disse pouco” (tradução da autora).

choques externos. O principal objetivo dessa corrente passa a ser as interações no nível micro, entre atores racionais com diferentes preferências, acentuando-se o individualismo metodológico. Nessa seara, ao considerarem os limites cognitivos da racionalidade e também as estruturas interpretativas, estudiosos dessa linha encaram as escolhas coletivas como resultantes dos padrões de procedimentos operacionais. Assim como nas teorias da organização, e nos roteiros da “lata de lixo”, o padrão processual tão valorizado na tradição institucionalista é identificado como um produto do aprendizado organizacional (COHEN, MARCH e JOHAN, 1972). Por essa razão Immergut (2006) situa os teóricos das organizações como mais próximos dos teóricos da escolha racional (em relação a seus entendimentos das preferências, comportamento e agregação) do que dos behavioristas em si. Como se verá mais adiante, tais roteiros da lata de lixo, garbage can model, influenciaram John Kingdon na sua modelagem de múltiplos fluxos aqui utilizada. Mas, esses roteiros de garbage can, para além de se aproximarem apenas da vertente da escolha racional, possuem relações com o novo institucionalismo em seu núcleo mais geral. Nesse sentido, salientou Olsen (2001): “the focus has been extended from decision making in formal organizations, to an interest in political institutions and democratic governance, to how and when international political orders are created, maintained, changed, and abandoned” (p. 193)9.

Já sobre o institucionalismo histórico, cabe destacar a correspondência de muitos de seus atributos com o referencial teórico em especificação. Debates sobre a reinclusão do Estado em contraste às teorias da modernização (como exemplificado em seção anterior sobre descrição das correntes explicativas para o Welfare State) representam um de seus esforços mais vestibular. Essa corrente sustenta que o processo político é estruturado pelas Constituições, instituições políticas, estruturas estatais, interações entre diversos atores, cada um em contextos e lógicas traçadas pela sua própria história (IMMERGUT, 2006). A maneira que tanto Immergut (2006) como Hall e Taylor (2003) descrevem as particularidades do institucionalismo histórico confirma a semelhança com os modelos adotados no presente trabalho.

Immergut destaca, por exemplo, que o individualismo metodológico dessa linha é moderado pela análise da agência humana integrada a fatores estruturais, mas ela também menciona a relevância dada ao papel das ideias. Hall e Taylor relevam o tratamento conferido

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“o foco tem sido estendido da tomada de decisão em organizações formais, para um interesse nas instituições políticas e na governança democrática, para como e quando as ordens políticas internacionais são criadas, mantidas, alteradas e abandonadas” (tradução da autora).

por essa corrente à questão da distribuição desigual de poder entre os grupos de interesse, o que seria patrocinado pela maneira como as instituições incidem sobre a tomada de decisão. A relação entre indivíduos e instituições e ações é tratada considerando ora fatores de interação estratégica, ora fatores culturais. Pela perspectiva dos fatores de interação estratégica as instituições fornecem subsídios para escolhas calculadas, que incluem informações sobre o comportamento passado e futuro dos atores e sobre as regras para aplicação e regulação dos acordos etc. Ao ponderar fatores culturais, por sua vez, admite-se que as ações não são inteiramente fruto das estratégias, mas também, sofrem forte influência das interpretações. Nesse caso as instituições atuam como filtros para a percepção dos indivíduos sobre as situações e sobre si próprios. Por fim Hall e Taylor (2003) igualmente apontam fatores como o papel das ideias nas explicações de fundo institucionalista histórico acerca da participação das instituições nos resultados políticos.