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CAPÍTULO 2. O HISTÓRICO DO SURGIMENTO DAS CRECHES

2.3. O novo PNE e o debate atual do financiamento

A vinculação de um percentual dos impostos para a educação foi, durante muito

tempo, postergado pelo Estado, sendo, finalmente, incorporada na Constituição Federal de 1934 e na LDB de 1996. Para que essa vinculação não fosse pulverizada em ações pontuais, a sociedade civil sempre recomendou ao Governo Federal um plano de ação que, entre outras metas e estratégias, determinasse um percentual de recursos para assegurar um ensino de qualidade. A referência ao padrão mínimo de qualidade foi materializada na Carta Magna e no artigo 74 da LDB:

Art. 74. A União, em colaboração com os estados, o Distrito Federal e os municípios, estabelecerá padrão mínimo de oportunidades educacionais para o ensino fundamental, baseado no cálculo do custo mínimo por aluno, capaz de assegurar ensino de qualidade.

Parágrafo único. O custo mínimo de que trata este artigo será calculado pela União ao final de cada ano, com validade para o ano subsequente, considerando variações regionais no custo dos insumos e as diversas modalidades de ensino.

Sobre o PNE, trata-se de um documento que vai traçar metas e estratégias para garantir acesso, com qualidade, às políticas para a educação. No que diz respeito à educação infantil, o Plano, que vigorou de 2001 a 2011, fixou metas que exigiriam um grande aporte de recursos financeiros, o que não aconteceu. O resultado foi um número de efetivação de metas bem aquém das esperadas, principalmente em relação ao atendimento das crianças de zero até três anos, cujo percentual de matrícula em creches foi de 18,1%, em relação aos 50% que definiam na época de sua expiração.

Um novo PNE, com texto principal do relator Angelo Vanhoni, deputado do PT do Paraná, encontra-se em tramitação no Congresso Nacional, recebendo da sociedade uma crítica em relação ao custo aluno, pois esse referencial não é vislumbrado como meta, mas como estratégia:

Meta 20: Ampliar, em regime de colaboração, o investimento público em educação de forma a atingir, ao final do decênio, no mínimo, o patamar de sete e meio por cento do Produto Interno Bruto do País considerando o investimento.

Estratégias: 20.5) Implementar o Custo Aluno Qualidade (CAQ) como parâmetro para o financiamento da educação de todas etapas e modalidades da educação básica, a partir do cálculo e do acompanhamento regular dos indicadores de gastos educacionais com investimentos em qualificação e remuneração do pessoal docente e dos demais profissionais da educação pública; aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino, aquisição de material didático-escolar, alimentação e transporte escolar.

Em um planejamento, a meta tem indicativo de sua concretização, não sendo possível transferir para outro a responsabilidade que é da União. Já a estratégia é um compromisso de

todos, Estados e Municípios, o que pode dar continuidade à lógica financeira da distribuição atual dos recursos, sem responsabilizar o Governo Federal em assumir seu papel como indutor de políticas públicas, disponibilizando maiores aportes.

Para a o atendimento das crianças pequenas, é decisivo o apoio da União aos governos municipais, uma vez que as metas quantitativas precisam estar articuladas com as metas de qualidade, transformando uma realidade atrelada à educação infantil há muitos anos, que é a ampliação insuficiente e sem o devido acompanhamento técnico. Um maior apoio financeiro e acompanhamento pedagógico do Governo Federal mudaria a realidade do atendimento em muitas cidades brasileiras que, com a municipalização das políticas de educação e também de saúde, pouco avançam em suas ações.

As emendas da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação ao novo PNE, que terão validade até 2020, fixam em 8% do Produto Interno Bruto - PIB o percentual de recursos a ser disponibilizado para a educação e amplia para 10% esse percentual até o final de sua vigência, o que torna a adoção do CAQi uma perspectiva positiva, principalmente diante da atual distribuição desses recursos que não têm ultrapassado os 5% do PIB.

Algumas publicações que dão conta da avaliação dos avanços e perspectivas do PNE 2001/2011 apontaram que, sem maiores recursos e sem a adoção do CAQi, não haverá efetivas mudanças para educação brasileira. Para Dourado, a necessidade de ações articuladas a partir de um regime de colaboração entre os entes federados, na perspectiva de cumprir a vinculação constitucional de recursos, torna-se imperativo:

Aplicar valores financeiros que ultrapassem o percentual de 5% é, portanto, um desafio que exige enorme esforço e vontade política conjunta da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e da sociedade brasileira (DOURADO, 2010, p. 286).

Em relação ao financiamento e às ações do Governo Federal que atendam e articulem metas de quantidade e qualidade para a educação infantil, vale resgatar que a gestão do presidente Lula investiu no Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE e frustrou as expectativas da sociedade, cuja expectativa era que, no lugar de programas pontuais como o PROINFÂNCIA2 e o PROINFANTIL3, fossem envidados esforços para avaliar e redefinir metas do Plano Nacional de Educação, como a consolidação do CAQi, que vai assegurar a efetivação de princípios e pressupostos preconizados por essa base legal.

2 PROINFÂNCIA: Programa do Governo Federal com o objetivo construir, reformar e equipar instituições de

educação infantil com disponibilidade de quase 100% dos recursos. Quase todos os municípios brasileiros solicitaram o Programa, mas até o ano de 2009 apenas aproximadamente duas mil unidades foram financiadas. O Programa tem hoje a continuidade através do PAR – Plano de Ação Articulada.

3 PROINFANTIL: Programa de formação inicial para os professores sem a titulação mínima exigida pela LDB

Retomando o período histórico da implementação do PDE e o contexto político pelo qual passava a educação infantil, o programa, apelidado de PAC da educação, foi apresentado ao povo brasileiro no início de 2007, e o MIEIB aproveitou a conjuntura de grande efervescência política para solicitar aos fóruns estaduais que realizassem uma análise em relação aos dois programas citados acima, confrontando os programas, as suas bandeiras de luta e as metas do PNE. O Movimento realizaria o seu XXII Encontro Nacional na cidade de São Luiz do Maranhão, no final de agosto daquele mesmo ano. Pela programação do encontro, já se antecipava que, politicamente, seria um momento importante para a educação infantil brasileira e para o Movimento, pois, além do debate sobre o PROINFÂNCIA e o PROINFANTIL, ainda estavam na pauta à revisão da LDB e o conveniamento do poder público com as instituições privadas sem fins lucrativos.

Sobre esse conveniamento, o Fundeb, lei sancionada em junho de 2007, provisionou que a pré-escola teria uma trava nessa parceria, com extinção no ano de 2010. Entretanto, diferentemente para as creches, esse conveniamento seria estendido até o final da vigência do Fundo, em 2020, consolidando um modelo comunitário de atendimento, em detrimento da bandeira de luta ostentada por diferentes organizações na defesa de uma escola pública. A ideia do custo-aluno, referendado inicialmente no Fundef e resgatado no Fundeb, era a ideia de gasto por aluno, tendo como objetivo levantar esses gastos e definir um valor mínimo anual, evitando muitas diferenciações entre estados e municípios brasileiros. Para que esses valores representassem não qualquer valor, mas um correspondente a um padrão mínimo de qualidade, o termo passou a incorporar a redação do Fundeb:

Art. 4o A União complementará os recursos dos Fundos sempre que, no âmbito de cada Estado e no Distrito Federal, o valor médio ponderado por aluno, calculado na forma do Anexo desta Lei, não alcançar o mínimo definido nacionalmente, fixado de forma a que a complementação da União não seja inferior aos valores previstos no inciso VII do caput do art. 60 do ADCT.

§ 1o O valor anual mínimo por aluno definido nacionalmente constitui-se em valor de referência relativo aos anos iniciais do ensino fundamental urbano e será determinado contabilmente em função da complementação da União.

§ 2o O valor anual mínimo por aluno será definido nacionalmente, considerando-se a complementação da União após a dedução da parcela de que trata o art. 7o desta Lei, relativa a programas direcionados para a melhoria da qualidade da educação básica (BRASIL, 2007).

Com a justificativa de limitação orçamentária, muitos municípios, principalmente os dos estados nordestinos, que recebem complementação mínima da União, não conseguem ir para além do estabelecido nos fatores de ponderação do Fundeb.

Eis o desafio do próximo PNE em tramitação: considerar como opção política os valores destinados para a educação infantil como um direito e não como um investimento, cuja lógica capitalista atual é para ganhar, lucrar. A opção representará para essa etapa da educação básica uma grande diferença nas políticas públicas para a infância, uma vez que a lacuna no atendimento e a precarização das creches e pré-escolas existentes exigirá um esforço dos governantes, de todas as esferas políticas, para que a lógica seja a de saldar a dívida com esse segmento da sociedade.

CAPÍTULO 3. OS MOVIMENTOS SOCIAIS NA LUTA PELA CRECHE E O SEU