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O OLHAR DOS ENFERMEIROS SOBRE OS GRUPOS EDUCATIVOS

No documento priscilaaraujorocha (páginas 64-72)

7 RESULTADOS E DISCUSSÕES

7.3 O OLHAR DOS ENFERMEIROS SOBRE OS GRUPOS EDUCATIVOS

Nesta categoria, apresentam-se os resultados revelados pelos enfermeiros quanto à visão da importância dos grupos educativos, quanto ao seu papel nessa prática e relação com a promoção da saúde. Um ponto que emergiu nos depoimentos dos enfermeiros foi a importância do grupo. Foi possível identificar relatos expressivos sobre pontos de relevância dessa prática.

“O grupo é uma prática importantíssima na atenção básica! É o momento que você está utilizando para estar divulgando práticas de saúde, prática de prevenção e práticas de cuidados para os usuários.” (E8)

“Eu acho que essa prática de grupos educativos ela é essencial no Programa Saúde da Família porque esta vai embasar a prática com base na prevenção e promoção da saúde em vista da população. Saindo um pouco daquele modelo hospitalocêntrico, né, buscando modificar, tentar orientar, modificar alguns comportamentos. Acredito mais nessa fala, nesse sentido.” (E13)

As falas acima apontam, primeiramente, a relação de importância da realização dos grupos educativos para a APS, pois é considerado um momento oportuno para a realização das práticas de cuidado à saúde junto da comunidade. Esses achados vão ao encontro da visão de vários autores (PEKELMAN, 2008; MAFFACCIOLLI; LOPES, 2011; FORTUNA et al., 2013; OLIVEIRA et al., 2013) de que o grupo é um espaço privilegiado para as atividades educativas em saúde na APS.

Nessa lógica, outro aspecto ligado ao valor dos grupos é a oportunidade de aprendizado que é oferecida aos usuários. A atividade educativa no contexto do grupo vem no sentido de fazer um esclarecimento ao usuário sobre os mais diversos assuntos em vista do seu processo de saúde-doença (BRASIL, 2012).

“Os grupos são justamente para isso, para esclarecer o que eles muitas vezes fazem no automático e não sabem o porquê estão fazendo aquilo, por que é importante tomar medicação desta forma, por que é importante a dieta, por que é importante a atividade física, entender como a coisa funciona para eles incorporarem naquela prática e aí vem o resultado.” (E1)

“Importância para o usuário, com certeza! Ali (grupo) é onde ele aprende e onde tem oportunidade de está conversando com outras pessoas.” (E3)

Os enfermeiros também afirmam a importância do grupo diretamente para os usuários, principalmente, ligada ao desenvolvimento pessoal, ao coletivo, à busca de. Desse modo, os grupos contribuem para o aprendizado a partir da valorização dos saberes e possibilitam uma construção coletiva do conhecimento, facilitam a expressão das necessidades, angústias e expectativa e promovem a reflexão da realidade.

Como uma ação coletiva, as atividades de grupo demonstram ser fundamentais no apoio e incentivo que os participantes dão um ao outro, sobretudo pela troca de experiências, mostrando mais uma vez a importância dessa prática.

“Acho que o grupo fortalece, um se fortalece no outro, um dá força para o outro e nós vamos [...] e se consegue alguns resultados.” (E7)

“Então eu acho importante por conta dessa troca.” (E11)

“Através de trocas de experiência também é muito importante.” (E13)

As relações interpessoais estabelecidas no grupo permitem que as pessoas troquem experiências relacionadas à vida e, ao adoecer, é algo que os ajuda a entender suas próprias questões. Os grupos também podem ser um espaço para que as pessoas valorizem sua própria experiência de vida e saberes práticos que desenvolveram (FRANCO; SILVA; DAHER, 2011).

A prática educativa do enfermeiro, através dos grupos de educação em saúde, busca a colaboração dos usuários participantes em seu próprio processo terapêutico em que se tem a oportunidade de estimular a encontrar estratégias coletivas de enfrentamento dos problemas vividos pela comunidade (COSTA; RODRIGUES, 2010; FELIPE, 2011).

Outro ponto importante ressaltado pelos profissionais entrevistados foi o fortalecimento e a criação do vínculo. O enfermeiro tem nessa prática uma aproximação com o usuário que permite o estreitamento de laços de confiança e interação.

“Eu vejo muito como troca, porque eles trazem muita bagagem de prática deles, do dia a dia. E a gente acaba aprendendo com eles também. Às vezes, acaba passando uma parte que a gente aprende teoricamente, inclusive o conhecimento da gente de profissional, do tempo que já tem de profissão.” (E4)

“Eu acredito muito que o trabalho de grupos educativos seja de fundamental importância. Consegue fazer com que a própria troca entre os participantes favoreça a interlocução. Tanto entre quem está ali facilitando o aprendizado quanto entre os próprios participantes do grupo. Eu acredito muito no grupo educativo como uma forma de educação da coletividade.” (E6)

“Traz sim uma resposta para o usuário. Traz também uma resposta para os profissionais. É o que nós buscamos. E trazer essa parceria de levar pro usuário essa reflexão do que é melhor pra ele naquele momento.” (E14)

Assim, o grupo não é somente um número de pessoas reunidas no mesmo local. É, portanto, um conjunto de indivíduos interagindo propício para a educação em saúde com propósito de troca de experiências, melhora e mudança de comportamentos para o desenvolvimento da autonomia e responsabilização. Entretanto, mesmo avaliando positivamente os grupos, uma questão bastante presente e preocupante nas falas são a não participação e o envolvimento dos usuários.Essa postura pode ser entendida pela metodologia tradicional de educação adotada com a permanência da visão curativista baseada ainda no modelo biomédico, que não incentiva a participação.

“Tem que ter esse interesse do usuário também. Não adianta eu só ter a vontade, porque não anda, não vou ter interação, uma troca. Uma coisa que por enquanto até desanima a gente como profissional a fazer. Porque você faz, prepara e tudo e não vem.” (E5)

“A gente percebe que as pessoas querem as coisas já montadas e a gente não trabalha com isso!” (E9)

“A gente tem essa dificuldade ter o público pra nos ouvir. Às vezes você marca toda empolgada, arruma a mesa, cafezinho, as atividades, aquelas coisas todas chega na hora três pessoas! Sendo que a demanda é de um grupo de 15, 20 pessoas.” (E15)

Essa questão também reflete na dificuldade do alcance dos resultados dessa prática na vida do usuário, gerando sentimento de frustração por parte do enfermeiro.

“Isso (alcance dos resultados) eu acho que é uma coisa que desanima muito todos os profissionais. Pelo empenho da equipe em promover os

grupos, a resposta é muito pequena! Infelizmente, as comunidades ainda responsabiliza a equipe pela saúde não se corresponsabilizam pela própria saúde. Então, não entende que esse papel transformador da educação é pra eles e não para nós! Para nós é o nosso trabalho e a gente acredita nisso! Quando você trabalha com grupos de direitos reprodutivos e daqui a um ano você vê que as mulheres estão grávidas “ah, eu não queria esse neném”, é frustrante, né? E quando você trabalha, às vezes, grupo de tabagismo entra 20 pessoas e no final uma só para de fumar. Quando ela volta a fumar depois, fica mais frustrante ainda! Mas se uma parar de fumar em 20 eu acho que já está bom. Mas os resultados ainda são muito pequenos! Bom, eu acho que isso é um processo longo apesar de eu já ter 26 anos de atenção primária. E há 26 anos a gente acredita que o grupo educativo tem esse poder transformador já era para ter muitos resultados. Mas acho que isso vai muito também da característica do brasileiro. O brasileiro é muito manso, vai muito devagar. Acredito que daqui a uns 50 anos as respostas vão ser melhores.” (E6)

Nesse sentido, é importante, como visto anteriormente, por parte do enfermeiro, conhecer a realidade da comunidade, suas características socioeconômicas, culturais, as necessidades e prioridades da sua população para realizar os grupos na APS. Conforme Leite, Prado e Peres (2010), ter conhecimento e domínio sobre a temática não é suficiente para uma prática de qualidade, é necessário conhecer e analisar o contexto em que está inserido o usuário, compreender quem é o sujeito e como se ensina.

Acrescenta-se que a reiteração da responsabilização do enfermeiro como principal agente do trabalho grupal fortalece o reconhecimento de que suas atribuições demandam competência e qualificação, para coordenar e realizar as ações destes grupos (SOUZA, M., 2011). Reafirma-se que esse profissional precisa se assegurar no domínio do saber-fazer, englobando aspectos técnico, político, ético da atuação, articulando liberdade, responsabilidade e compromisso com os usuários-sujeitos na dimensão dialógica visando à promoção da saúde.

Dentro dessa perspectiva, nos discursos dos profissionais, destaca-se o olhar sobre o seu papel nas práticas de grupos. Fica evidente a importância crucial que o enfermeiro exerce nos grupos educativos.

“Nós (enfermeiros) é que fazemos os grupos! Não tem a participação do médico e de outros profissionais.” (E1)

“Na minha opinião, sem o enfermeiro, NÃO VAI ANDAR! Penso que o enfermeiro é peça fundamental. NÃO TEM GRUPO SEM ENFERMEIRO! Mesmo que ela não esteja lá ele está dando o suporte.” (E7)

“O papel do enfermeiro é fundamental e primordial. E quase a maioria dos grupos é realizada pelos enfermeiros.” (E15)

Pode-se afirmar que o enfermeiro dentro da equipe de profissionais da atenção básica é o executor principal, ou seja, a base das práticas de grupos. Isso vai ao encontro da opinião de alguns estudiosos (ABRAHÃO; FREITAS, 2009; FERREIRA NETO; KIND, 2011; SOUZA, M., 2011) de que o enfermeiro é agente principal na proposição de grupos.

O enfermeiro desde a graduação e a até no exercício profissional é marcado por atividades em grupos, não sendo, portanto, uma novidade (MUNARI E FUGERATO, 2003), outro fator que colabora para o destaque do enfermeiro é a sua formação. Bastable (2010) reforça que o papel de educador dos enfermeiros está profundamente atrelado ao crescimento e ao desenvolvimento de sua profissão. Para Souza e Horta (2012, p. 27) "o enfermeiro é, acima de tudo, um sujeito educador".

A ação educativa está no centro da prática profissional do enfermeiro e permeia todo o trabalho assistencial fazendo parte do cuidado em enfermagem (ACIOLI, 2008; LEONELLO; OLIVEIRA; 2008; LEITE; PRADO; PERES, 2010; SOUZA; HORTA, 2012).

“Olha, eu acredito que o enfermeiro é um educador por excelência. Eu acredito muito nesse papel, principalmente, quando você trabalha na atenção primária. Se você não tem o foco na educação tentando mudar a realidade do usuário o nosso trabalho fica muito aquém daquilo que a gente precisa impactar, né? Eu acho que o enfermeiro tem que ter sempre esse olhar na educação da comunidade e de papel transformador. Eu digo muito isso se você não consegue transformar o meio que o usuário mora, o seu trabalho não fortifica porque não consigo modificar o que ele faz na casa dele. Não sou eu que vou lá fazer... Então, eu tenho que educá-lo para que ele transforme o domicílio, a vizinhança e a comunidade dele.” (E6)

“Eu acho que é no papel de educador que o enfermeiro esta voltado mesmo.” (E8)

“O enfermeiro tem um papel central! A nossa formação tem muito presente o enfoque educativo. E a gente acaba abraçando, a figura do facilitador do grupo.” (E14)

É possível notar pelos depoimentos acima essa forte característica de educador que o enfermeiro absorve. Além disso, outras qualidades desse profissional também foram mencionadas.

“Então, eu acho que o enfermeiro em qualquer grupo ele tem que ter o papel de líder. Ele tem que saber conduzir, ter um olhar crítico para ver qual a necessidade do usuário e adequar os grupos educativos perante essas necessidades.” (E5)

“E a gente acaba sendo um moderador, um pacificador, um orientador, um ativador para outro que está desanimado! O nosso olhar é diferenciado, né?” (E9)

“Eu vejo que o enfermeiro nessa assistência (grupos) ele é diferenciado porque tem uma capacidade maior de estar escutando.” (E11)

Desse modo, conforme Lopes, Anjos, Pinheiros (2009) o enfermeiro é um educador por natureza que, ao sistematizar e individualizar o cuidado e se voltar não somente para a doença, pode exercer influência sobre o estilo de vida das pessoas, fazendo-as sujeitos de suas próprias decisões e mobilizando toda a sociedade para a implantação de políticas públicas saudáveis.

Acredita-se nas competências necessárias para a ação educativa do enfermeiro relacionada por Leonello e Oliveira (2008): promover a integralidade do cuidado à saúde; articular teórica e prática, exercitando a práxis no cuidado à saúde; promover acolhimento e construir vínculo com os sujeitos; reconhecer-se e atuar como agente de transformação da realidade em saúde; respeitar a autonomia dos sujeitos em relação aos seus modos de andar a vida; reconhecer e respeitar o saber de senso comum, reconhecendo a incompletude do saber profissional; utilizar o diálogo como estratégia para a transformação da realidade em saúde; operacionalizar técnicas pedagógicas que viabilizem o diálogo com os sujeitos assistidos; instrumentalizar os sujeitos com informação adequada; valorizar e exercitar a intersetorialidade no cuidado à saúde. É importante que essas sejam as premissas para a formação inicial do enfermeiro.

Outro aspecto identificado, importante a ser destacado, foi a relação entre a prática de grupos educativos e a promoção da saúde. Ao indagar sobre essa questão, a maioria dos enfermeiros a considera como uma relação fundamental e indissociável.

“O grupo está relacionado com a promoção principalmente, né? Dificilmente você consegue, dificilmente não, mas eu digo, prioritariamente, você trabalha com a promoção da saúde e a prevenção a doenças também. E assim de forma curativa acho que causa menos impacto, né?” (E6)

“Eu não consigo ver separado (grupo educativo e promoção da saúde). E assim como na atenção primária o serviço é longitudinal se você não fizer promoção da saúde, não surte efeito.” (E10)

“A promoção da saúde caminha passo a passo realmente com a realização de grupos. Traz sim uma resposta para o usuário e também uma resposta para os profissionais. É o que nós buscamos trazer essa parceria de levar pro usuário essa reflexão do que é melhor pra ele naquele momento.” (E14) “Com certeza é a promoção da saúde e também a prevenção! Promoção e prevenção porque se você não tiver conhecimento você não vai prevenir nada. E a nossa intenção aqui no psf é a prevenção.” (E15)

O grupo educativo, dessa forma, é visto como uma das ferramentas na APS para as ações relacionadas à promoção da saúde em consonância com as ideias de Ferreira Neto e Kind (2011) e das diretrizes da PNAB e PNPS (BRASIL; 2006, 2012).

Concordando com Carneiro e colaboradores (2012), para que as práticas no campo da promoção da saúde se configurem como educativas, o profissional deve trabalhar em favor da autonomia. É fundamental a realização da educação em saúde para capacitar a população para atuar como promotora da saúde (LOPES et al., 2013). Tendo como referência o conceito da Carta de Ottawa para a promoção da saúde como o “processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo” (BRASIL, 2002, p.19), apenas 3 dos 15 enfermeiros entrevistados relataram quanto ao fato de o grupo ser uma oportunidade de tornar o indivíduo ativo no cuidado a sua saúde e ser responsável sobre ela.

“Bom, eu entendo que os grupos educativos na promoção da saúde fazem com que a pessoa se torne ativa no processo de cuidar da saúde... Junto com ele construir o plano de cuidado em que se torna protagonista do processo e não passivo de receber só as orientações”. (E5)

“Eu digo muito isso se você não consegue transformar o meio que o usuário mora, o seu trabalho não fortifica porque eu não consigo modificar o que ele faz na casa dele, não sou eu que vou lá fazer [...] Então, eu tenho que educá-lo para que ele transforme o domicílio dele, a vizinhança, a comunidade dele”. (E6)

“Então, quem é que tem que fazer alguma coisa? Quem é que é dono da própria história? E a gente tá trabalhando esse ano uma coisa muito importante 'que é o sentido do fato'. A pessoa tem que sentir, perceber o quê que ela tá vivendo. Não adianta você chegar pra ele, falar o que tem que fazer.” (E7)

Os dados acima permitem afirmar que os enfermeiros ainda de forma incipiente trabalham com o verdadeiro significado da promoção da saúde e, por consequência, a sua prática não está completamente voltada para a promoção e sim para prevenção de doença. Conforme um estudo realizado por Rocha e colaboradores (2012), os enfermeiros da APS têm uma visão distorcida sobre a promoção da saúde caracterizando tudo o que deve ser feio para a população não adquirir determinada doença. De fato, através dos dados dessa pesquisa percebe-se a necessidade de aproximação do conceito da promoção da saúde em sua essência e nas estratégias de ação.

“O que tem mesmo para acrescentar que a gente está trilhando esse caminho. A nossa perspectiva é de aumentar nessa lógica da promoção da saúde que é a lógica que a atenção primária procura trabalhar.” (E14)

É importante considerar a realização de grupos como uma ação singular para a promoção da saúde, da autonomia e do protagonismo da população e, que, a coordenação de grupo pelo profissional de saúde requer uma fundamentação teórico-prática que o instrumentalize.

No documento priscilaaraujorocha (páginas 64-72)