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5 “FASES BOAS E FASES TURBULENTAS”: A SOCIOLOGIA AMBIENTAL NA RELAÇÃO INTERDISCIPLINAR NOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

5.4 O PAPEL E O ESPAÇO DA SOCIOLOGIA AMBIENTAL NOS PPGMCA

O papel da pesquisa sociológica na relação interdisciplinar com as demais disciplinas das ciências ambientais merece atenção, visto que a disciplina tem apresentado certa evidência epistemológica na compreensão e interpretação dos problemas relacionados à questão ambiental. Isso significa dizer, em linhas gerais, que não são raras as contribuições teóricas e metodológicas das ciências sociais60, principalmente da sociologia ambiental, demonstrando, a partir disto, sua relevância epistemológica nos estudos que visam compreender e solucionar problemas que envolvem a relação natureza-sociedades. Este 60 Algumas das contribuições podem ser encontradas em Beck (2015), Hannigan (2009), Latour (2003), Guivant (1998), Bourg (1997), Stengers (2015), Fleury; Almeida; Premebida (2014), Fleury (2013), Acselrad (2004), Descola (2011) e Escobar (2011), entre outros.

pressuposto é corroborado pelo Entrevistado M, que afirma: “mesmo considerando os limites, eu penso que a sociologia tem desempenhado um papel interessante para oferecer um olhar mais profundo sobre os diferentes objetos analisados”. Tal argumento conduz à inferência de que o papel epistemológico da sociologia ambiental é fator de extrema centralidade para que os sociólogos logrem reunir forças (articulações) para demonstrar, diante das outras áreas, o quanto ela, enquanto discurso, apresenta condições de ser peça-chave na construção e no progresso científico das ciências ambientais.

Ademais, considerando o papel e a relevância da sociologia ambiental no seu programa, o Entrevistado M destaca que

[e]ssa valorização pode ser muito maior caso nós consigamos quebrar muitas dessas barreiras que hoje tornam as áreas de conhecimento do programa um pouco estanques. Quanto mais permeáveis essas fronteiras estiverem, mais eu acredito que possa haver esse reconhecimento da sociologia, a contribuição da sociologia, o modo de fazer da sociologia.

Nesse sentido, parece haver uma barreira, um limite para que a sociologia ambiental seja mais valorizada do ponto de vista epistemológico e político-institucional no programa do entrevistado M. Este limite é, de algum modo, construído pelas relações agônicas, em busca de consolidação e hegemonia, produzidas nas relações entre as disciplinas que compõem o programa. Todavia, o Entrevistado L (que integra o mesmo programa que o Entrevistado M) afirma, em relação à valorização e ao papel da sociologia ambiental no seu programa, que esta última possui certo grau de valorização. Afirma ele que

[e]ssa valorização não era de início assim, acho que foi uma conquista da área. Acho que hoje tem um respeito, acho que a gente tem dado uma contribuição no sentido de mostrar a importância do social, do psicológico, do antropológico etc., para a compreensão das questões ambientais. Acho que a gente demonstrou pra eles em algumas pesquisas que técnicas da biologia e de outras áreas poderiam obter resultados muito parecidos de forma mais rápida com os métodos das ciências humanas.

Faz-se necessário enfatizar quando o Entrevistado L faz referência ao “nós”, sociólogos e antropólogos, pesquisadores das ciências humanas em geral e ao “eles”, biólogos e outras áreas afins. Há uma evidente construção de um limite discursivo, um corte agônico e até mesmo antagônico entre as ciências humanas e as ciências biológicas, a depender das demandas que surgirem. Pode-se inferir, frente a isto, que mesmo cooperando em um determinado projeto de pesquisa ou em outra situação, a fronteira que demarca as identidades disciplinares ou o grupo de disciplinas o qual o pesquisador faz parte parece ficar bem estabelecida. É o “nós” aqui e o “eles” ali. Ou seja, há cooperação, acordos e até certos tipos

de consensos, desde que não se ultrapasse as demarcações construídas pelos conflitos inerentes a essas relações disciplinares.

Tal concepção, acima retratada, está baseada na perspectiva teórica de Mouffe (2015), para quem a tensão entre “nós” x “eles” é parte constituidora da natureza política. Logo, afirma-se que não existe política e, portanto, Ciência, sem que haja conflito entre as partes que formam determinado campo discursivo. Nesse sentido, ainda conforme a autora, toda identidade política alude à relação “nós x eles”, bem como ao estabelecimento de uma diferença, posto que toda identidade, especialmente para a teoria do discurso, está fundada na negatividade, ou seja, a identidade de determinado grupo é concebida a partir daquilo que esse grupo não é. Esta característica de não ser algo é o que faz com que a identidade venha a ser outro algo, ou seja, só existe um “nós” na medida em que existe um “eles”. Na linha deste raciocínio, Mouffe (2015) argumenta que a democracia reivindica, então, a formulação da “distinção ‘nós/eles’ de um modo que seja compatível com a aceitação do pluralismo, que é constitutivo da democracia moderna” (MOUFFE, 2015, p. 13).

Por conseguinte, o reconhecimento da sociologia ambiental ao qual o Entrevistado L se refere passa, segundo ele mesmo diz, por uma dimensão político-institucional muito importante: os sociólogos que fazem parte do programa já assumiram ou ainda assumem posições de coordenação. Nesse sentido, afirma o entrevistado: “nós temos reconhecimento no programa por estarmos presentes nas coordenações, nos processos de tomada de decisão e na elaboração de diferentes projetos que existem no programa” (Entrevistado L). Ele ainda afirma que “a sociologia faz parte desse grupo que ajuda a moldar na tomada de decisões. Tem sua importância. É certo que ela não é excluída, isso eu posso te assegurar. Nós estamos presentes nos processos decisórios do programa” (Entrevistado L).

Tal espaço de tomada de decisões pode ser determinante para que uma área conquiste seu espaço, fazendo valer suas demandas e suas reivindicações, o que pode mostrar, muitas vezes, um sintoma de consolidação e legitimação de determinada disciplina em meio aos conflitos e às articulações nesses programas. Para ilustrar os argumentos dos Entrevistados L e M acerca da participação e do lugar da sociologia nas tomadas de decisão no seu PPGMCA61, apresenta-se, a seguir, cinco gráficos que demonstram com que frequência os sociólogos têm assumido a titularidade ou a suplência na comissão coordenadora do programa, de 2011 (ano de criação da área de avaliação em ciências ambientais) até dezembro de 2019.

61 Apresenta-se apenas um programa, dos três investigados, pois não foi possível encontrar os dados históricos da comissão coordenadora dos outros dois.

Gráfico 8: Número de titulares e suplentes de determinado PPGMCA de excelência investigado (2011).

Fonte: Elaborado pelo autor.

Gráfico 9: Número de titulares e suplentes de determinado PPGMCA de excelência investigado (2011-2013).

Fonte: Elaborado pelo autor.

Período: 2011 -