• Nenhum resultado encontrado

PARTE I – REVISÃO CONCEPTUAL E EMPÍRICA

Capítulo 2 – A Escrita Expressiva

3. O Paradigma de Pennebaker

Na década de 80, Pennebaker desenvolveu o Paradigma da Escrita Expressiva. As sessões de escrita expressiva (EE) eram realizadas em laboratório, não sendo dado feedback aos participantes. Eram aplicadas as seguintes instruções standard:

A aplicação deste paradigma demonstra que quando é dada aos indivíduos a oportunidade de revelarem aspectos altamente pessoais das suas vidas, fazem-no prontamente (Pennebaker, 1997). O paradigma da EE é um processo eficaz para se conseguir alcançar a saúde mental (Niederhoffer & Pennebaker, 2002). Quando as pessoas escrevem sobre os seus pensamentos e sentimentos mais profundos, relativamente a um acontecimento emocionalmente significativo, ocorrem vários benefícios em várias áreas: bem-estar, saúde física e mental, concretizações e crescimento pessoal (Pennebaker & Graybeal, 2001). O paradigma da EE afecta as pessoas em várias dimensões. Dependendo do nível de análise de cada um, existem diferentes formas de explicar os efeitos positivos do paradigma da EE: explicações ao nível emocional, cognitivo, comportamental, interpessoal, etc. Provavelmente é a interacção entre múltiplos factores ao longo de vários níveis de um sistema complexo, que está na base dos múltiplos benefícios. Mais ainda, um dos aspectos mais importantes do paradigma original é a sua capacidade de gerar novas formas de pensar sobre as emoções, processamento cognitivo e saúde (Smyth & Pennebaker, 2008). É benéfico para as pessoas que tenham algum grau de consciência sobre as suas motivações, objectivos, pensamentos e sentimentos numa dimensão de compreender o próprio. O paradigma da EE permite alcançar esta compreensão delas próprias através da linguagem escrita (Pennebaker & Graybeal, 2001). Além disso, o paradigma da EE pode ser mais eficaz para pessoas que vivenciaram experiências traumáticas e sobre as quais sentem dificuldade em falar com outros (Pennebaker & Graybeal, 2001).

“Durante os próximos 3 dias, gostaria que escrevesse sobre os seus pensamentos e sentimentos mais íntimos, relativamente a um assunto emocional extremamente importante que o tem afectado a si e à sua vida. Na sua escrita gostaria que se libertasse e explorasse os seus pensamentos e emoções mais profundos. Pode associar o seu tópico às suas relações com os outros, incluindo pais, parceiros amorosos, amigos ou familiares; ao seu passado, ao seu presente ou ao seu futuro, ou para quem tem sido, quem gostaria de ser ou para quem é actualmente. Pode escrever sobre os mesmos assuntos ou experiências gerais em todos os dias de escrita ou sobre tópicos diferentes a cada dia. Tudo o que escrever será totalmente confidencial. Não se preocupe em escrever correctamente, nem com a estrutura das frases, ou com a gramática. A única regra é que a partir do momento em que começar a escrever, continue a fazê-lo até que o seu tempo termine.”

24

3.1 Efeitos a Curto e a Longo Prazo do Paradigma da EE

Apesar dos evidentes e largamente comprovados benefícios para a saúde e comportamento, em termos de efeito imediato escrever sobre experiências traumáticas tende a fazer as pessoas sentirem- se mais infelizes e angustiadas, nas horas seguintes à escrita. Muitos dos participantes referiram que choraram ou que se sentiram profundamente perturbados pela experiência. Escrever sobre experiências stressantes aumenta as emoções negativas a curto prazo e reduz as emoções positivas. Ou seja, a curto prazo, escrever é psicologicamente doloroso. Estas emoções podem ser vistas como apropriadas, considerando os tópicos que os indivíduos estão a confrontar, na medida em que voltam a experienciar as emoções negativas associadas ao trauma, e que foram elicitadas pelo exercício de escrita. Assim, a focalização nas emoções negativas pode ser necessária para se conseguir genuinamente superar os traumas e crescer como um ser humano mentalmente saudável. Contudo, passadas duas semanas, estes indivíduos sentem-se mais felizes, evidenciando um claro benefício a longo prazo. Nas semanas a seguir à escrita, as pessoas pensam menos sobre os seus traumas e conseguem dedicar-se a pensar sobre outros assuntos das suas vidas. Os participantes reconhecem a importância deste efeito imediato negativo como uma forma preliminar para conseguirem superar o trauma, e a grande maioria reportou que a experiência de escrever teve valor e significado nas suas vidas. Logo, ocorrem mudanças emocionais e cognitivas positivas a longo prazo, sendo que o efeito negativo a curto prazo se dissipa ao longo do tempo, o que, em algumas semanas, leva a uma diminuição da ocorrência de pensamentos emocionalmente carregados de negatividade sobre o tópico da escrita (Lepore, 1997; Pennebaker, 1997; Esterling, L’Abate, Murray & Pennebaker, 1999; Pennebaker & Seagal, 1999; Niederhoffer & Pennebaker, 2002; Pennebaker, 2004; Smyth, 1998). Neste sentido, a escrita facilita e promove o crescimento positivo pós- traumático a partir do sucedido. Isto acontece quando a escrita enfatiza a expressão emocional e o processamento cognitivo, ou seja, quando estão envolvidos esforços para compreender e dar sentido e significado a um acontecimento traumático e respectivos benefícios que surgiram a partir do mesmo. As pessoas pensam de forma diferente sobre o sucedido após a tarefa de EE, fazendo reavaliações da mesma, o que origina mudanças cognitivas (Ullrich & Lutgendorf, 2002; Guastella & Dadds, 2006, 2008). Estas mudançaspromovem a motivação para discutir o assunto com outros. As pessoas tornam-se menos focadas no passado e na experiência traumática e mais focadas no presente e no futuro. Tornam-se menos traumatizadas, mais positivas e com maior capacidade de insight (Guastella & Dadds, 2006). Ou seja, através do processamento emocional e cognitivo durante as tarefas de EE, é possível encontrar benefícios, sentido e significado nos acontecimentos negativos. As pessoas desenvolvem reavaliações, reorganizações e reenquadramentos cognitivos e emocionais sobre a situação, construindo novas formas de pensar sobre as suas experiências, o que constitui o mecanismo de mudança da EE. As pessoas escrevem sobre os efeitos positivos do

25 sucedido relativamente a eles próprios, na sua relação com os outros e na sua visão do mundo, o que está na base de um crescimento pessoal positivo (Guastella & Dadds, 2006; Segal, Tucker & Coolidge, 2009). Em suma, escrever é um processo analítico sobre os pensamentos e sentimentos associados a uma experiência de vida traumática, que pode proporcionar uma forma para os indivíduos aceitarem as suas vivências e as recordarem de uma forma diferente. Permite-lhes ir além dos seus problemas, alcançarem um sentido e significado, de resolução e de controlo sobre acontecimentos de vida passados que são perturbadores, o que tem um impacto positivo em várias dimensões da vida do indivíduo (Lyubomirsky, Sousa & Dickerhoof, 2006). Adicionalmente, o estado emocional depois de escrever depende da forma como os indivíduos se sentem antes de escrever: quanto melhor se sentirem antes da escrita, pior se irão sentir posteriormente e vice-versa (Pennebaker & Seagal, 1999). O paradigma original tem sido largamento aplicado em investigação e em intervenção clínica. Tem sofrido alterações e tem sido adaptado em função das centenas de estudos nesta área (Smyth & Pennebaker, 2008).