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O Pré-Teste e a Escolha dos Grupos Experimental e Controle

CAPÍTULO V: ANÁLISE DOS RESULTADOS

5.1 O Pré-Teste e a Escolha dos Grupos Experimental e Controle

A princípio foram analisadas produções textuais de 250 crianças, distribuídas em quatro turmas de cada série. Estes textos foram analisados, num primeiro momento, apenas visando identificar os elementos da estrutura argumentativa que compunham cada produção. Deste modo estabelecemos um critério de comparação entre os grupos. As segundas-séries foram comparadas entre si, assim como as quartas séries. O objetivo desta análise foi a

extração de duas turmas – dentre quatro disponíveis – com desempenho equivalente no que se refere à produção da estrutura textual em questão.

É comum observamos na literatura que, em situações como esta, os grupos sejam comparados buscando-se identificar se há ou não entre eles uma diferença significativa. Entretanto, esta análise nos impõe uma limitação. A partir do momento em que buscamos identificar se há diferença entre os grupos, para que esta seja identificada o teste estatístico requer um certo quantum de discrepância. Caso este quantum não seja alcançado o teste pode apontar como resultado uma certa homogeneidade que – ainda que não significativa para as exigências do teste – seja importante para a comparação do perfil entre os grupos.

O que fizemos então foi usar um procedimento que nos indicasse em que medida esses grupos estão próximos em termos da produção dos elementos que compõem uma escrita argumentativa. Assim, o teste só vai nos fornecer um diagnóstico de homogeneidade caso os grupos estejam próximos (e não insuficientemente diferenciados). Tal procedimento consistiu na utilização de uma ferramenta estatística descritiva multidimensional, utilizada em suporte informatizado, para a realização de análise de tipo classificação hierárquica. Tal análise permite organizar dados de forma a reunir os sujeitos que forneceram esses dados em categorias o mais possíveis homogêneas, que por sua vez podem ser reagrupadas em

categorias hierarquicamente superiores: “gatos” postos em um grupo devidamente separado de “cães”, porém aglutináveis nas categorias superior “mamíferos”.

A sutileza da diferença entre as duas opções de análise pode não ser evidente à primeira vista. Uma forma de torná-la mais clara é fazendo uma analogia com a seguinte situação15. Imaginemos uma situação em que buscamos identificar dentre um grupo de alunos aqueles que são bons em matemática, perguntando a um teste se os alunos são ruins em matemática. O resultado encontrado pode ser que os alunos não são ruins, porque o nível de dificuldade que é exigido pelo teste é superior à dificuldade que os alunos na realidade têm. Esta situação camuflaria os resultados na medida em que o teste não apontaria para a

dificuldade. Mas, na realidade, a partir desta análise nós não teríamos selecionado os alunos bons em matemática, apenas a dificuldade deles não teria sido suficiente para obter índices significativos de diferença no teste. Se ao contrário, pedimos ao teste que, dentre um grupo, nos aponte os alunos que são bons em matemática (ou que são homogêneos, para retomar nosso caso de análise), e o teste nos diz que sim, é porque esta homogeneidade atingiu um nível tal de equivalência que nos permite mais segurança. A ferramente classificatória informatizada acima aludida teve portanto esse objetivo. Trabalhou-se com o algorítimo DS- 3, proposto por D. Corroyer para o tratamento prévio dos dados (Corroyer, 1990), seguido do algoritmo de análise classificatória hierárquica CAHVOR, desenvolvido pela Association pour lê Développement de l’Analyse dês Données (ADDAD, 1990).

A elaboração do teste seguiu o seguinte procedimento. Os participantes das quatro turmas da segunda-série foram enumerados seqüencialmente, sem que fosse informado ao teste a que turmas se referia cada participante identificado. Informações referentes a elementos da estrutura argumentativa produzidos por cada participante foram igualmente fornecidas, e o teste buscou então agrupar casos semelhantes em categorias homogêneas

15 J. Falcão, 2001 – comunicação pessoal.

(participantes o mais possível ‘parecidos’ em termos dos itens de estrutura argumentativa analisados). Tal procedimento permitiu verificar não ter havido segmentação dos sujeitos em função das turmas, o que evidenciou que esta variável (“Turma”) não gerava diferenciação entre os grupos, ou seja, tais turmas eram homogêneas entre si, conforme se desejava verificar. Tal resultado foi confirmado por análise fatorial realizada sobre dados nominais, utilizando-se para isso o algoritmo ANCORR (Analyse factorielle des correspondences) (ADDAD, 1990b), que confirmou não haver diferenciação dos sujeitos analisados em função de aspectos ligados à estrutura argumentativa.

Os fatores identificados podem ser das mais diversas naturezas: sexo, por exemplo não seria um fator relevante para nossa divisão do grupo entre controle e experimental; já a presença de elementos de contra-argumentação seria um fator em que jamais os grupos poderiam diferir, já que estaria diretamente relacionado com a habilidade que pretendíamos desenvolver. Finalmente, por garantia, informamos ao teste de análise fatorial acima referido a classificação de cada sujeito em termos de sua turma de origem – A, B, C ou D – de forma a verificar se tal variável explicavhá alguma variação entre tais grupos (ou seja, em termos técnicos, “contribuição da variável à variância global da nuvem multidimencional das informações da amostra”). A análise nos mostrou que a contribuição de tal variável (“Turma”) era irrelevante, não havendo portanto qualquer variação entre os participantes explicável pela turma. Nesse caso, optamos na segunda-série pelas turmas A e B, que foram aquelas para as quais os índices de homogeneidade dos participantes foram os mais altos.

Dentre tais turmas, restava-nos apenas escolher aquela que seria o grupo controle e o grupo experimental. Para tanto foi marcado um encontro com as duas professoras

responsáveis por estas turmas e a elas foi perguntado se havia uma dentre elas que tivesse alguma restrição a participar do programa de intervenção. Restrição esta que poderia ir desde uma baixa motivação para o trabalho com o tema, até a falta de disponibilidade para investir

no treinamento e participar de todos os encontros previstos com a pesquisadora. Não houve qualquer restrição de nenhuma das duas. Neste caso foi feito um sorteio, no qual ficou definido que a turma A comporia o grupo experimental e a turma B o grupo controle. Assim foram escolhidos os grupos da segunda série.

Na quarta série o procedimento deveria ter sido o mesmo, não fosse um imprevisto ocorrido no momento da coleta. Para as quatro quartas séries temos apenas duas professoras – uma responsável pelas duas turmas do turno da manhã, e outra responsável por duas turmas de quarta-série à tarde. Aconteceu que a análise do pré-teste das turmas da manhã

demonstrou uma tendência do grupo a focar em suas produções não aquilo que nos era mais valioso – a polêmica inerente à escolha dos programas, se feita pelos pais ou pelas próprias crianças. Ao invés disto, as crianças tenderam a produzir textos tratando dos programas de televisão – discorrendo sobre os bons e os ruins, ou os de que gostam e os de que não gostam. Vejamos um texto ilustrativo da performance de duas das turmas da quarta série:

Programa de TV16

Existem vários tipos de programa de televisão como: novela, filme, desenho, jornal, etc. tem novelas que são para crianças e outras que já são para maiores de doze anos.

Os filmes tem de censura livre e censura para adultos.

Os desenhos animados são super legais e feito para crianças assistirem, mais não é só as crianças não os adultos e até velhinhos gostam de ver os desenhos.

Eu gosto muito de todos menos jornal, mais o que gosto mais é novela. A novela não é inspirada num fato real e sim criada isso a torna mais divertida, mais em outros casos como A Padroeira, Os Maias e outros são tirados de fatos real. Malhação por exemplo não era para ser exibida às 5 horas, porque mostra muita violência, os adolescentes namorando, pessoas mexendo com droga, etc. Crianças de todas as idades assistem essa novela. A minha mãe ela não deixa eu assistir mais às vezes eu a convenso ela deixa. Às vezes as novelas estão tão ruim que prefiro ir estudar ou assistir desenho.

As programações de hoje em dia estão muito avansadas para as crianças.

Os jornais mostram tanta violência que foi eleito o pior jornal de notícias. Às vezes gosto mais de ler um livro do que ver qualquer programa de televisão.

Nós crianças temos que ter educação é fundamental na vida.

Como se pode observar, a produção textual está mais voltada para discorrer sobre as características dos programas do que um texto que tenha o objetivo comunicativo de

convencer um leitor sobre uma posição do autor diante da polêmica proposta. Diante disto, foi marcado um novo encontro com a professora responsável pelas duas turmas a fim de orientá-la para uma nova coleta que tivesse sua instrução mais voltada para o problema da escolha dos programas e não para os programas em si. A segunda coleta foi realizada mas novamente as produção dos alunos não foi equivalente ao desempenho dos outros

participantes. Restava-nos, portanto, investigar a homogeneidade das duas turmas restantes. Assim, foi feito o mesmo procedimento relatado para a escolha da segunda série com as duas turmas da quarta. Mais uma vez, os resultados encontrados garantem a homogeneidade entre as duas turmas C e D – turno da tarde. Dentre essas, definimos por sorteio a escolha do grupo experimental.