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Antes mesmo de entender como se deu o processo de formação dos setores de educação dentro do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, é preciso uma compreensão acerca de sua gênese. Pode-se dizer que o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) foi fruto de uma questão agrária histórica e também estrutural no Brasil.

Segundo a educadora e membro do Coletivo Nacional do Setor de Educação do MST, Roseli Salete Caldart (1999), o movimento:

“nasceu da articulação das lutas pela terra, que foram retomadas a partir do final da década de 70, especialmente na região Centro-Sul do país e, aos poucos, expandiu-se pelo Brasil inteiro. O MST teve sua gestação no período de 1979 a 1984, e foi criado formalmente no Primeiro Encontro Nacional de Trabalhadores Sem Terra, que se realizou de 21 a 24 de janeiro de 1984, em Cascavel, no estado do Paraná”.18

Com o tempo o movimento ganhou força e passou a se organizar em 22 estados do país, a fim de lutar por terra e pela realização de uma ampla reforma agrária, que de fato contemplasse os milhares de camponeses sem- terra pelo país. A princípio os sem-terra tinham como prioridade a conquista pela terra e a construção de uma sociedade mais justa sem explorados e nem exploradores. Mas, já em suas primeiras ocupações, viram que isso não era o bastante. Embora a terra fosse importante para trabalhar, produzir e viver com dignidade, ainda faltava um instrumento fundamental na continua luta por esse bem. E a educação poderia ser esse instrumento.

Sabe-se que boa parte dos trabalhadores do campo possui pouco ou nenhum estudo. Era preciso mudar esse cenário, “apagar a imagem de caipira- analfabeto que se tem do trabalhador rural e propiciar a formação de cidadãos completos, letrados e politizados”. (MORISSAWA, 2001:239)

A preocupação do MST passou a ser não só a ocupação como também a educação de seus militantes, desse modo, todas as vezes que se fazia um

18 Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?%20script=sci_arttext&pid=S0103-

plano de ocupação nele era incluído a escola para as crianças e adultos. Com o passar do tempo, esse movimento camponês que ganhou projeção nacional, passou a ter um setor responsável pela educação em todos os estados que atingia. O Setor da Educação passou a cuidar diretamente das escolas dos acampamentos e assentamentos, aquelas já consolidadas e também, daquelas que ainda não existiam, mas que faziam parte dos posteriores projetos de ocupações.

Segundo Morissawa (2001): o primeiro deles surgiu no acampamento Fazenda Annoni, no Rio Grande do Sul e a equipe de professores foi formada por acampados. Surge neste momento uma escola diferente das outras. A escola do MST não poderia ser como as escolas formais, a começar pelos professores, estes deveriam ser simpatizantes da luta pela terra, os conteúdos deveriam incluir a história do movimento, os livros, as experiências e a realidade dos sem-terra e a relação professor-aluno deveria constituir uma relação de companheiros.

Conforme Morissawa (2001) ainda: em 1987 aconteceu o 1º Encontro Nacional de Educadores do MST, ocasião em que educadores do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e Bahia, puderam discutir a implantação das primeiras escolas de 1ª à 4ª série bem como a formação de professores para as escolas de assentamento. No bojo deste importante encontro surgiram algumas questões norteadoras: 1º O que se pretende com as escolas de assentamento? , 2º Como deve ser uma escola de assentamento? Desse modo, foi dado o primeiro passo pelo movimento no que se refere à formalização da educação, ou seja, sua base teórica e metodológica, muito influenciada também por grandes pensadores e educadores como, por exemplo, Paulo Freire. Paulo Freire foi um grande pesquisador da educação brasileira, elaborou diversos métodos de alfabetização, entre eles, aquele que o consagrou, intitulado “Pedagogia do Oprimido”, cujas bases foram a educação como libertação, respeito à linguagem do povo, ensinar partindo da realidade do aluno e a interdisciplinaridade.

“o homem não cria sua possibilidade de ser livre, mas aprende a efetivá-la e exercê-la... impõe-se pensar e viver a educação como prática da liberdade...” (FREIRE, 2005, p.18)

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra tem sua própria pedagogia, baseada em grandes teóricos como Paulo Freire, e considera que a única forma do homem ser livre, seja ele camponês ou da cidade, é através da educação.

Como resultado desse primeiro encontro ainda, foi criado no ano seguinte (1988), o Setor de Educação do MST nos estados que o movimento já atingia, conforme as necessidades de cada acampamento e assentamento. Dentre as preocupações iniciais estavam além da alfabetização de crianças e a educação de jovens e adultos (EJA), a formação política dos militantes. Paralelamente a isso, vieram também os cursos profissionalizantes nas áreas de administração e contabilidade, com intuito de formar assentados que pudessem gerir as cooperativas familiares, bem como cursos técnicos na área de agronomia, que capacitam o assentado a exercer técnicas de uso do solo (plantio, colheita, correção do solo, etc.). (MORISSAWA, 2001)

Nesse momento fez-se necessário também a elaboração de uma proposta pedagógica própria do movimento, seguindo os princípios: desenvolvimento da consciência crítica dos alunos, a partir da aplicação de conteúdos que os levassem a reflexão e que permitisse uma visão de mundo ampla, diferente daquela do discurso da escola formal, arraigada no sistema vigente, além da história de luta e conquista pela terra e reforma agrária, do qual resultou o assentamento; desenvolvimento de atividades que capacitem o aluno às experiências com o uso de técnicas alternativas que contribuam para o avanço do trabalho coletivo, exercícios práticos para fomentar o assentamento nas áreas da agricultura, administração, contabilidade, entre outros.