• Nenhum resultado encontrado

2. AS INFÂNCIAS DO IBC

2.8 A Deficiência Múltipla no IBC: Modelo Ecológico Funcional e o PREA

2.8.2 O Programa Educacional Alternativo do IBC – PREA

Para entender como ocorreu todo o processo de organização no atendimento a crianças e jovens com DM no IBC até a concretização do Programa Educacional Alternativo (PREA), foi necessário buscar na instituição as pessoas que viveram esses momentos e participaram ativamente dessa construção. No momento do campo da tese, tivemos a oportunidade de conversar com a professora Elisabeth

Ferreira de Jesus no ano de 2018 atendendo às crianças com deficiência múltipla na Educação Infantil. Através da história oral, as memórias são revividas e relembradas, uma vez que,

na História Oral, é toda a subjetividade do diálogo que se materializa em escrita, a voz que me conta a sua história de vida, o silêncio que consiste num intervalo ou uma pausa no meio da conversa, os olhares, a entonação da voz, os gestos do corpo. São todos esses fatores, documentos vivos de escrita. O sujeito, como agente histórico (OLIVEIRA, 2009, p. 31).

Todo o projeto do PREA começou a partir de observações realizadas no ano de 1989, pelos professores Elisabeth de Jesus e Paulo Sérgio de Miranda, que atendiam a uma aluna com comportamentos considerados inadequados durante as suas aulas, que consistiam em Atividade da Vida Diária e Educação Física, respectivamente. Os professores recorreram ao psicólogo do IBC, pois não havia nenhum outro aluno com as mesmas características dessa aluna. A professora Elisabeth assim relata:

Na verdade começou no ano de 1989 com uma aluna na antiga classe de alfabetização do IBC, ela apresentou comportamentos inadequados tanto na minha aula, quanto na aula do professor Paulo Sérgio. Quando ela era contrariada, ela tirava a roupa. Eu era professora de AVD e ele de Educação Física, e toda vez que ela não queria fazer a atividade, ela tirava a roupa. Ela apresentava uma emeplagia, tinha o lado direito uma dificuldade motora [...] Eu trabalhava com ela com a brincadeira do meu mestre mandou, ela gostava e com os comandos ela colocava a roupa.

Em 1990, o IBC sofreu uma intervenção federal e a chegada ao instituto à professora Ana de Lourdes de Castro Barbosa, interventora enviada pelo MEC. Ela passa a conhecer cada departamento do IBC e constata que o instituto atendia a 27 alunos com deficiência múltipla incluídos nas classes regulares. Em uma reunião com os professores, Ana de Lourdes propôs ajudar a quem gostaria de trabalhar com esses alunos. Foi feito um convite à professora da UERJ, Doutora Maria Cecília de Freitas Cardoso, para dar um suporte e assessoria na elaboração de um projeto de atendimento para esses alunos. Foi escolhido um espaço para a realização dos atendimentos e, em 22 de março de 1991, o programa fica pronto, com a metodologia que seria trabalhada, sendo o marco inicial do trabalho com deficiência múltipla no IBC com a colaboração da professora Maria Cecília, tendo funcionado

até 1993.

Também foi realizada uma parceria com a UERJ e o IBC para a implantação do primeiro curso de pós-graduação em Deficiência Múltipla com uma única turma cuja maioria era formada por professores do IBC. A professora Maria Cecília de Freitas Cardoso foi muito importante na implantação do modelo de atendimento. Foi elaborado um currículo específico para atender aos alunos com Deficiência Múltipla, conhecido no IBC como Programa Educacional Alternativo (PREA) com a participação dos professores da instituição.

Apresentamos a seguir os objetivos do PREA15, construídos sob a orientação

da professora Maria Cecília de Freitas Cardoso (1998):

ALUNOS A QUE SE DESTINA

Alunos que atendam aos critérios de entrada no Programa de 7 a 17 anos, podendo, depois dessa idade, permanecer no programa por mais um ou dois anos, no máximo, caso seja recomendado pela equipe para término de aquisição de conhecimentos ou comportamentos que estejam sendo trabalhados.

OBJETIVO GERAL

Proporcionar oportunidades para o pleno desenvolvimento do aluno e sua integração e participação em seu grupo social (família, escola, comunidade).

Oportunizar ao aluno maior grau de independência e autonomia em suas atividades:

Da vida diária em seu lar:

 cuidados pessoais, autogerenciamento e segurança;  cuidados com objetos, animais, plantas;

 cuidados com a casa e atividades típicas do lar;  preparo de refeições;

 dinâmica de vida em família;

 comportamentos adequados em diferentes situações;  afetividade e interações com pessoas significativas.

15 Estas informações estão contidas na apostila produzida pela professora Elisabeth de Jesus que

a utiliza no curso Modelo Ecológico Funcional na Educação de Alunos com Deficiência Múltipla que ministra no IBC, que também faz parte do seu artigo Deficiência Múltipla e Modelo Ecológico Funcional, publicado em1998 na revista Benjamin Constant.

Ocupacionais:

 arrumação e manutenção do local onde vive e/ou trabalha;  atitudes e responsabilidades perante o trabalho;

 serviços e ocupações simples na escola;  serviços e ocupações simples em casa;

 serviços e ocupações simples na comunidade. Comunitárias:

 utilização de serviços e recursos da/na comunidade;  participação em atividades e/ou ambientes coletivos;  participação em eventos e/ou na comunidade;

 locomoção na comunidade;

 relacionamento social com vizinhos, conhecidos e pessoas desconhecidas da comunidade.

De recreação e lazer:

 artes (música, artes plásticas e cênicas);  práticas esportivas;

 jogos individuais ou coletivos;  jogos de mesa e/ou de salão;

 utilização de recursos da comunidade.

A participação integrada em atividades da escola com alunos desse Programa, alunos das turmas de escolaridade regular do Instituto e de outras instituições, garante sua inserção em todas as modalidades de atividades oferecidas pela escola, como:  esportivas;  recreativas;  cívicas;  artísticas;  ocupacionais / profissionalizantes;  pedagógicas;

 relacionadas a projetos específicos.

3. O desenvolvimento de habilidades específicas de: Locomoção / Mobilidade

 lateralidade;

 esquema corporal;

 esquema espaço-temporal;  sinais captados pelos sentidos;

 locomoção pelas diversas dependências da escola;

 locomoção nas diferentes vias de acesso da comunidade mais ampla. Comunicação Oral e Escrita (Braille ou cursiva)

 vocabulário enriquecido;

 emprego correto das formas gramaticais;  construção de frases e períodos diversificados;  linguagem gestual e expressão facial.

Matemática (tempo, quantidade, volume, peso)  contagem;

 medição;  comparações;

 manipulação de diferentes materiais;  relatos;

 planejamentos.

Aquisição de conhecimentos gerais através de atividades funcionais.

Matrícula:

O candidato deverá apresentar diagnóstico de deficiência visual associada à deficiência mental leve ou deficiência visual associada a um grande atraso generalizado no desenvolvimento global com hipóteses para prognóstico de deficiência múltipla e atender a, pelo menos, um dos seguintes itens:

a) Necessitar de apoio ou supervisão sistemática em maior intensidade e frequência do que os outros alunos da mesma faixa etária matriculados na instituição;

b) Necessitar, mesmo que temporariamente, de atendimento educacional individualizado, sem possibilidade de participação em grupo ou em nenhuma atividade pedagógica;

c) Necessitar de desenvolvimento de currículo com conteúdos relacionados a habilidades adaptativas que normalmente já são dominadas por alunos da instituição com a mesma idade cronológia.

Conclusão:

O aluno deverá atender a, pelo menos, um dos seguintes itens:

a) Demonstrar capacidade para acompanhar o programa regular de ensino da instituição;

b) Demonstrar progresso na aquisição de habilidades adaptativas que lhe possibilitem participação e integração na vida familiar, comprovado por uma

avaliação sistemática e longitudinal, mesmo que não tenha adquirido independência na área ocupacional;

c)Demonstrar domínio de habilidades ocupacionais que lhe possibilitem contribuir para a sua subsistência em sua comunidade.

DINÂMICA DE ORIENTAÇÃO À FAMÍLIA

Na estratégia pedagógica utilizada, é fundamental a participação da família no planejamento educacional e na avaliação, através de:

 Oferecimento de informações iniciais e parecer em relação às atividades propostas pela equipe;

 Relato do desempenho e análise do progresso do aluno;

 Oferecimento de orientação à família: reuniões mensais com o professor ou coordenador do Programa. Atendimento com qualquer membro da equipe em outros horários sempre que solicitado, com horário marcado pela Coordenação do Programa.

FUNCIONAMENTO DO PREA NO IBC

A coordenação do Programa Educacional Alternativo (PREA) funcionava em dois turnos com os seguintes horários: manhã (8h às 11h40 min), com atendimentos aos alunos na faixa etária de 10 a 17 anos, e à tarde (13h às 16h), com alunos na faixa etária de 7 a 10 anos.

O trabalho desenvolvido com esse público foi baseado no Modelo Ecológico Funcional. O atendimento no PREA foi encerrado no ano de 2016, tendo, no ano seguinte, todos os alunos sido incluídos nas turmas regulares do IBC.

Isso posto, este capítulo tratou das infâncias do IBC e da história do próprio Instituto. Apresentando a importância dos estudos da infância e contextualizando o trabalho com as crianças com deficiência múltipla. No próximo capítulo trataremos da Geografia da Infância no Brasil e no IBC.