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6 A PESQUISA

6.2 Procedimentos de análise das narrativas experienciais

6.2.3 O projeto ético-político e a formulação de novas formas

A dimensão ético-política perpassa por todo esse movimento para se construir uma proposta interventiva para o serviço social no ambiente do Fórum em questão; está presente em todos os momentos da discussão o pensamento de que o reconhecimento social da profissão está na capacidade do profissional em modificar algumas variáveis do contexto social dos usuários, buscando alterá-lo, ainda que momentaneamente. (NETTO, 1996).

Toda intervenção profissional é uma ação teleológica que implica uma escolha consciente das alternativas objetivamente dadas e a elaboração de um projeto no qual o profissional lança luzes sobre os fins visados e busca os meios que, a seu juízo, são os mais adequados para alcançá-los. Guerra (2015) explica que:

Toda intervenção encontra-se imbuída de um conjunto de valores e princípios que permitem ao assistente social escolher. É no cotidiano profissional, tenha consciência ou não, que o assistente social se depara com demandas e interesses contraditórios e com um leque de possibilidades, o que lhe permite exercitar a sua autonomia, que

sempre será relativa, ao fazer suas escolhas, no que se refere às finalidades estabelecidas e aos meios (condições, instrumentos e técnicas) para alcançá-la, em que resposta dar e em que direção o assistente social exerce sua dimensão ético-política; na qual preocupa-se com os valores (de que valem as respostas dadas) e com a direção social das mesmas (que conjunto de forças está sendo contemplado nas respostas). (GUERRA, 2015, p. 14)

Esse conjunto de valores encontra-se fortemente presente no trabalho cotidiano da equipe estudada:

Assistente social 2:

“Então, é isso que eu gostaria de frisar, de fato a nossa equipe precisa manter-se unida; manter a unidade no sentido também filosófico, no sentido também de visão de mundo, no aspecto ideológico. Claro que a nossa equipe como equipe já passou por momentos difíceis, mas quando mantivemos uma unidade alcançamos vitórias”.

Assistente social 3:

“A outra forma de ação, na minha opinião, é o enfrentamento coletivo. Eu penso que aprendemos das vivências passadas. Porque as experiências passadas que nós tivemos aqui, de desmonte, nos ensinaram; éramos muito sozinhas, percebemos isso depois dos infortúnios. Não que não fizéssemos parcerias, até fazíamos, mas não eram parcerias aprofundadas como procuramos firmar agora. Nesse sentido, a nossa aproximação para com os técnicos do ministério público, com os técnicos da defensoria é estratégica, para nós e pra eles”.

Assistente social 2:

“Estamos sempre discutindo sobre o que está surgindo, o que está aparecendo e, que intervenções vamos construir,(...) porque esse é o objetivo desses encontros que temos aqui entre nós e com os parceiros; por exemplo, quando das reuniões com grupo das articulações ou grupo do ministério público ou da defensoria; o que importa é que nós tomemos parte do rumo das coisas, temos que entrar na história. Então recentemente discutimos o plano municipal de atendimento sócio educativo ao adolescente; nós participamos das discussões, tivemos encontros aqui no Fórum. O grupo da articulação das medidas socioeducativas subsidiou a construção de um documento.(...) Algumas demandas que percebemos no atendimento, queríamos que fossem também contempladas; assim mandamos contribuições durante o período em estava aberta à consulta pública. Fizemos reuniões de equipe pra discutir essas contribuições. Hoje não ficamos mais isolados, estamos militando em prol de nossas possibilidades em nossa intervenção”.

Evidencia-se que apesar de fechado e restrito, o ambiente sociojurídico também proporciona um amplo horizonte de possibilidades para a atuação do assistente social, essas possibilidades estão diretamente relacionadas com a possíveis articulações entre os referenciais teórico-metodológicos e a dimensão teórico-prática, numa perspectiva ético-politica.

As declarações das colaboradoras desta pesquisa destacaram essas possibilidades, na materialização das lutas e conquistas da equipe técnica judiciária de serviço social do Fórum das Varas Especiais da Infância e Juventude de São Paulo. Observando suas ações críticas materializadas em projetos diferenciados bem como em propostas que não se materializaram devido a obstáculos impostos pela instituição, mas que, no entanto, provocaram uma discussão e lançaram luz a problemáticas alinhadas a defesa de direitos e possibilidades de se produzir impactos emancipadores, ainda que minimamente, nas histórias das pessoas atendidas neste espaço sociojurídico.

A nova natureza da prática não se encontra, portanto, na mera recusa ou no menosprezo das tarefas que são socialmente atribuídas ao serviço social, nos quadros da divisão sócio-técnica do trabalho. Essa nova natureza está no tratamento teórico-político atribuído a essa prática inscrita no contexto do mercado de trabalho. Envolve a explicitação e apropriação efetiva do espaço ocupacional, decifrando as determinações político-econômicas macroscópicas que o atravessam, para impulsionar a construção e implementação de estratégias de ação que imprimam nova direção social ao planejamento e execução de ações demandadas ao serviço social (IAMAMOTO, 2000, p. 104).

Sendo assim, é importante que o assistente social perceba e compreenda as implicações políticas de sua prática profissional, reconhecendo-a como polarizada pela luta de classes. De forma que se reforça o pensamento de que esta é a condição fundamental para que a categoria profissional realize sua opção teórico- prática por um determinado projeto de sociedade e supere as ilusões de um fazer profissionais que paira ‘acima’ da história (IAMAMOTO, 2000).

Esta postura requer a utilização de instrumentais científicos que possibilitem a realização de uma análise profunda da realidade social e um olhar atento sobre as mudanças conjunturais.

A interação entre o aprofundamento teórico rigoroso e a prática renovada, politicamente definida, constitui elemento decisivo para superar as artimanhas ideológicas incorporadas pela profissão em sua evolução histórica: o voluntarismo, a prática rotineira e burocratizada, as tendências empiricistas, o alheamento central do modo de vida do povo e o desconhecimento do saber popular etc. (IAMAMOTO, 2000, p. 37).

O exercício profissional das assistentes sociais estudadas, revela na prática o que IAMAMMOTO (2003) constata e descreve quando ao explicar que, o exercício profissional participa de um mesmo movimento que permite a continuidade da sociedade de classes e ao mesmo tempo cria as possibilidades de sua transformação.

A sociedade na qual se inscreve o exercício profissional é atravessada por projetos sociais distintos, IAMAMMOTO (2003) refere que essa condição cria o terreno sócio-histórico para a construção de projetos profissionais também diversos, indissociáveis dos projetos mais amplos para a sociedade.

Tem-se, portanto, a presença de forças sociais e políticas reais, não mera ilusão, que permitem à categoria profissional estabelecer estratégias político- profissionais no sentido de reforçar interesses das classes subalternas, alvo prioritário das ações profissionais.

Tais possibilidades e tentativas de se viabilizar essas possibilidades, com proposições diferenciadas, seja através de projetos diferenciados, seja na tentativa em dar um novo sentido para as ações já existentes no protocolo institucional, configuraram como sendo o ponto central da atuação do serviço social no espaço sociojurídico objeto dessa pesquisa, e aparecem como paradigma para outros profissionais, de outros espaços afins se referenciarem em busca da construção de suas intervenções profissionais.

As possibilidades estão dadas na realidade, mas não são automaticamente transformadas em alternativas profissionais. Cabe aos profissionais apropriarem-se dessas possibilidades e, como sujeitos, desenvolvê-las transformando-as em projetos e frentes de trabalho (IAMAMOTO, 2011, p. 21).

6.3 Projeto Iluminar Juvenil – uma experiência para uma intervenção crítica no