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2.2 O trabalho da psicologia hospitalar

2.2.1 O psicólogo hospitalar na órbita da doença

Retomando o que foi apresentado no capítulo anterior sobre a órbita da doença, relatarei a seguir sobre o trabalho do psicólogo hospitalar a partir desse viés.

O paciente na posição da negação estará produzindo uma espécie de defesa psicológica. Ele estará se defendendo de uma ameaça, que neste caso é a doença. Como vimos anteriormente, nessa posição, ele não aceita estar doente e pode até fingir que a doença não existe. Simonetti (2011, p. 120) nos mostra como seria a intervenção de um psicólogo neste ponto:

Com o paciente na posição de negação, o trabalho de atendimento psicológico abordará outros temas que não a doença. É importante permitir que o próprio paciente escolha os temas das conversas, mas se ele não fizer, o psicólogo pode encaminhar estrategicamente a entrevista para assuntos mais artificiais, até que outras questões possam ser abordadas.

Com o paciente na posição de negação o psicólogo trabalhará com questões que não tem a ver com a doença. Essas questões podem ser escolhidas pelo próprio paciente. Trabalhar com a doença neste ponto poderia atrapalhar o trabalho do psicólogo, uma vez que, o paciente não está aceitando sua condição de doente. Caso o paciente não escolha o assunto das conversas, o psicólogo poderá abordas assuntos do cotidiano.

Na posição de revolta o paciente está envolvido em sentimentos de raiva. Cabe ao psicólogo trabalhar o sofrimento psíquico dessa situação. O foco sempre será na verdade do sujeito.

A revolta não pode ser subjugada, dominada a força, e sim ultrapassada, tornada desnecessária pela ventilação dos sentimentos reprimidos. Diante de um paciente na posição de revolta o psicólogo deve focalizar a verdade da pessoa e não apenas o errado da situação. Esse é um princípio fundamental, válido para todas as situações em psicologia hospitalar. Todo problema envolvendo pacientes apresenta essas duas facetas, como dois lados de uma moeda: o que é errado do ponto de vista do tratamento médico, e o que é certo do ponto de vista da vivência do paciente. (SIMONETTI, 2011, p. 120).

Segundo o autor, nessa posição o paciente pode estar “envolvido em conflitos com a enfermagem, com a família ou com a equipe médica”. Nesse sentido o psicólogo jamais fará um julgamento da situação. Ele trabalhará escutando esse “drama subjetivo” do paciente.

A posição de depressão é esperada pelo psicólogo no processo de adoecimento. Cabe ao psicólogo dar um suporte para o paciente nesse momento. Atentando para o caso de a depressão passar de apenas uma fase para um estado mais avançado como podemos ver a seguir, de acordo com Simonetti (2011, p. 121):

A depressão diante da doença é uma reação esperada, por isso o psicólogo deve cuidar atenciosamente de seu paciente sem criticá-lo por estar deprimido, servindo mesmo de suporto enquanto ele atravessa essa fase difícil de sua órbita em torno da doença. Entretanto, se a depressão se tornar muito profunda, ou muito prolongada, deixando de ser fase e virando estado, deve-se então considerar-se a possibilidade de tratamento médico com o uso de antidepressivos.

O psicólogo precisa ficar atento nessa fase. Se deprimir diante de uma situação de adoecimento é normal. Porém, se ele observar que esta fase não irá passar ou está ficando cada vez mais profunda o psicólogo poderá considerar a possibilidade de requerer juntamente com o médico, um intervenção medicamentosa.

Na posição de enfrentamento o psicólogo não se atem às circunstancias do momento. O sujeito terá total liberdade para avaliar o seu estado. É dado um espaço para o sujeito refletir sobre sua condição. Não há necessidade dele ser coerente mas sim ser verdadeiro consigo mesmo. Essa verdade não é uma constante. Ela pode variar e assim dar continuidade ao processo de elaboração da doença.

O enfrentamento é uma posição de fluidez, tanto de emoções como de ideias, e se o psicólogo não interromper esse fluxo com interpretações apressadas já fará muito, pois estará libertando o paciente do peso de ser coerente. Para o paciente, há que ser verdadeiro em relação a sua doença, e não coerente, e a verdade muda de instante para instante: o que o paciente disse e sentia ontem pode ser diferente do que diz e sente hoje, e não há nenhum problema nisso: essa noção é muito valiosa, pois mostra que o psicólogo tem de se fixar na verdade que o paciente descobriu em relação a sua doença: ela pode ser apenas a primeira verdade, que logo será substituída por outra, que não tardará em ter o mesmo destino: ser substituída. Assim o importante é o paciente ser ajudado a falar a sua doença, e a falar novamente no dia seguinte. (SIMONETTI, 2011, p. 127).

Cabe ao psicólogo ficar atento às verdades do sujeito pois estas podem variar. O psicólogo acompanha esse processo sempre trabalhando na verdade do sujeito em relação a sua doença, mesmo que essa tenha mudado. E é através da fala que as mudanças irão acontecendo progressivamente.

O encerramento de um atendimento psicológico em um hospital não acontece necessariamente quando o paciente der a alta hospitalar. Este encerramento também não significa a cura da doença. É um processo que será determinado pelo profissional a partir do momento em que este avalia que o sujeito já elaborou a sua doença e que se encerrou a demanda. Lembremos que um pedido de atendimento psicológico pode ser solicitado pela família ou equipe de saúde já a demanda é o estado psicológico do sujeito. É a sua verdade naquele momento. Simonetti (2011, p. 158) nos fala deste encerramento da seguinte maneira:

[…] O que determina a conclusão do processo de atendimento psicológico na psicologia hospitalar não é nenhuma condição clínica do paciente, do tipo “cura da doença”, e também não é a ascensão do paciente a um estado ideal de perfeição psicológica em que ele seja capaz de enfrentar perfeitamente a doença. O que determina o final do tratamento psicológico é a cessação da demanda. Quando aquela condição que encetou o início do tratamento, geralmente um problema de manejo do paciente ou um questionamento do próprio doente sobre sua forma de lidar com a doença, se esvazia, se dissolve, o trabalho está concluído.

Com a conclusão do atendimento psicológico, cabe ao psicólogo ainda observar este paciente. Esse encerramento não é uma garantia de sucesso. O sujeito poderá entrar na órbita novamente e voltar a necessitar de

atendimento. Também é papel do psicólogo, em caso de alta hospitalar, encaminhar o paciente à uma psicoterapia, se assim for necessário. O tratamento psicológico em ambientes hospitalares é de grande importância para o sujeito. Ele leva em conta todos os seus aspectos tornando assim a sua estada em um hospital um momento menos doloroso. É também de grande importância para a humanização, pois trata do sujeito como um todo, além de proporcionar um espaço para a família que também é portadora de muita angústia e sofrimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desse trabalho foi abordar a doença, os aspectos psicológicos envolvidos no processo de adoecimento e a hospitalização assim como a psicologia hospitalar. No primeiro momento é abordada a questão da doença em um ponto de vista biopsicossocial. A partir desse contexto observamos que a doença é algo que faz parte da vida dos seres humanos. Todos passarão por isso em algum momento da vida. A doença implica no sujeito a perda de sua condição saudável. Perder a saúde significa perder o que lhe movimenta: a vida. A doença como biológica é aquela que se apresenta no corpo, porém implica diretamente nos aspectos psicológicos e sociais. O sujeito doente passa a ter sua vida modificada. Dependendo de seu estado de saúde não poderá cumprir suas atividades diárias como trabalhar, estudar, cuidar dos filhos, da família, etc. A partir daí a relação com as pessoas do seu convívio social também será afetada. A doença mostra como é frágil a nossa condição existencial.

A subjetividade do sujeito está diretamente ligada ao seu adoecimento. Cada sujeito é singular e mesmo portadores da mesma doença, passarão por este processo de maneira diferente. O adoecimento é o resultado da reflexão da doença. Essa reflexão será feita a partir de toda a sua história de vida, sua maneira de sentir, pensar, fantasiar. É único de cada um. Independente da estrutura psíquica, o adoecimento provoca no sujeito um abalo.

A órbita da doença está organizada para se observar a reação do sujeito diante de situações difíceis que podem surgir em sua vida. Este, ao se deparar com uma situação, muitas vezes, de difícil aceitabilidade passará a reagir de acordo com as posições da órbita. Entender a órbita é fundamental para analisar a situação do sujeito hospitalizado. Cada posição requer um atendimento e cabe ao psicólogo estar atento a isso.

A hospitalização é um momento de muito sofrimento para o sujeito. Ele estará sendo alocado em outro ambiente. Deverá aderir a esta nova rotina e, dependendo de sua condição de saúde passará um longo período neste local. A partir daí ganha uma nova vida e uma nova rotina. Há uma

descaracterização do sujeito em um ambiente hospitalar. Sabemos que não é possível aderir a todos os pedidos feitos pelos pacientes. O que se deve levar em conta é que o paciente pode estar passando por um sofrimento, tratá-lo de uma maneira mais singular poderá auxiliar no seu tratamento.

O psicólogo hospitalar sempre vai tratar o sujeito de forma singular. Ele trabalha com a subjetividade que é algo fundamental para o sujeito hospitalizado, mas que muitas vezes é deixada de lado. O psicólogo dará espaço para que o doente assuma sua condição de sujeito. O tratamento se encerrará quando cessar a demanda, ou seja, quando o sujeito conseguir elaborar a sua doença. Esse é o ponto principal a ser alcançado no tratamento.

Considerando o estudo realizado podemos afirmar que um profissional da psicologia dentro de uma instituição hospitalar torna-se fundamental para o auxílio do tratamento, acolhimento e humanização. As estatísticas mostram que há um grande número de pessoas adoentadas que encontram-se em um estado de hospitalização bem como de doenças que exigem cuidados por longos períodos.

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