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Modelos e Práticas em Intervenção Precoce

3.1. O que é a Intervenção Precoce?

Segundo a European Agency for Development in Special Needs Education “a IPI é uma área importante quer a nível político quer a nível profissional, no que respeita ao direito das crianças em idades muito precoces e das suas famílias, a receber o apoio de que necessitam. A IPI tem como objectivo apoiar e fortalecer a criança, a família e os serviços envolvidos. Ajuda, assim, a construir uma sociedade inclusiva e coesa que esteja atenta aos direitos das crianças e de suas famílias” (2003/2004, p.4).

De forma semelhante ao conceito de participação, o conceito de intervenção precoce está longe de ser unívoco (Pimentel, 1999) e tem evoluído ao longo do tempo sobretudo fruto de investigações cientificas que têm vindo a ser realizadas, sendo refletido todo este processo quer no campo teórico, quer no campo das práticas, levando-nos a chegar ao conceito atual de IP. Destacamos a mudança conceptual como consequência do que referimos anteriormente, passando do modelo médico para o modelo social, isto é, houve uma mudança no foco de intervenção. Passámos de uma intervenção focada na criança (modelo médico) para uma intervenção focada na família, numa abordagem que envolve a criança que faz parte integrante da família e o meio envolvente (comunidade) – o modelo social (European Agency for Development in Special Needs Education, 2003/2004).

A IP, segundo Pinto (1991, p.49) é “ uma forma de ajudar e apoiar a família e a criança deficiente ou em risco, a potencializar ao máximo as suas capacidades, de forma a atenuar ou a ultrapassar os seus potenciais atrasos”, ou seja, a IP abrange uma multiplicidade de serviços e apoios que se desenvolvem com base num relacionamento de parceria com a família, fomentando o desenvolvimento da criança.

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Da definição de Pinto (1991) para a definição proposta por Thurman e Brown (1997) houve uma evolução. Na definição proposta por Thurman e Brown surgem as perspetivas sistémicas e ecológicas de desenvolvimento humano associadas à sua definição, pois salientam os serviços prestados com vista a promover o conforto das crianças, que podem ter o seu desenvolvimento comprometido quer por fatores ambientais, quer por fatores biológicos, numa perspetiva de parceria com a família das crianças.

Também Dunst, Trivette e Jodry (1997) acrescentam à definição de IP um novo conceito - redes: as redes sociais de apoio formal e informal. Sendo claro o enfoque que dão à capacitação da família para apoiarem e fortalecerem o funcionamento da criança, ou seja, trabalhar com a família promovendo as suas competências para fortalecer as capacidades das crianças.

Tegethof (2007) apresenta uma definição mais abrangente de IP referindo que a IP é vista como um conjunto de serviços e apoios a serem prestados a crianças em idades precoces, em diferentes contextos onde se encontram inseridas, numa base de relação de parceria com a família, de modo a promover o desenvolvimento das crianças com atraso ou em risco de desenvolvimento, com deficiência ou incapacidade, tendo em vista melhorar a qualidade de vida das crianças e das suas famílias. Assim, a IP constitui um conjunto de medidas que visam apoiar as crianças nos seus contextos naturais e as suas famílias a vários níveis.

Em suma:

“Todas as definições de IP, para além de identificarem uma faixa etária específica, enunciam alguns princípios que lhes estão subjacentes e são comuns. Todas entendem a criança como um todo e, sendo assim, tendem a considerar a intervenção como global. Também consideram a criança não apenas nas suas características intrínsecas e individuais, mas inserem-na num contexto de vida, relacional e cultural. Acentuam ainda a necessidade da intervenção ter um momento certo e oportuno, tão cedo quanto possível, para ser feita, independentemente da natureza das acções específicas que a possam orientar” (Franco & Apolónio, 2008, p. 19).

Assim, as definições referidas anteriormente por diferentes investigadores apontam que com a evolução do conceito IP e dos programas de IPI, esta passou a ser centrada na família e comunidade, estamos perante um conceito que tem uma abordagem cada vez mais ampla e contextualizada como podemos observar no quadro 1 que sumariza a evolução ocorrida:

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Indicadores Paradigma anterior Paradigma atual

População-Alvo Crianças dos 0- 3 com deficiência

Crianças dos 0-5 anos com deficiência e/ou outros fatores de risco e famílias

Contexto Centros de estimulação; centros terapêuticos; instituições

Contexto natural (creche, casa, etc.). Base comunitária Práticas “Pronto-a-vestir” (Programa estandardizado) “ Feitas à medida” (Individualizados) Papel dos Profissionais

Peritos/ Decisores Facilitadores

Papel da Família Recetores passivos de serviços Participantes ativos/ decisores Objetivos Desenvolvimento da criança Prevenção, compensação

(deficiência). Inclusão Resultados Remediação da deficiência Empoderamento/capacitação

da família Trabalho de Equipa Multi ou interdisciplinar.

Uniserviço

Transdisciplinar e

interserviços (com inclusão da família)

Enquadramento filosófico da IP

Focada na criança. Baseada nos défices

Centrada na família, baseada nas forças, focalizada na relação, ecológica e reflexiva Quadro 1 - Evolução da Intervenção Precoce (adaptado de Boavida & Borges, 2003)

Na nossa perspetiva e reportando-nos à análise do quadro 1, e a cada um dos indicadores no geral, consideramos que decorreram alterações acerca do que é a IP.

No entanto, consideramos que a criança é quase invisível, temos em conta o papel da família, mas esquece-se um pouco o papel da criança que fica perdida no meio da intervenção. Esta, independentemente do seu problema biológico, psicológico, social ou a combinação de vários destes ou de outros fatores, deverá ser um participante ativo, tal como está patente nos princípios estabelecidos na CDC que foi um dos documentos base na criação do Decreto-Lei nº 281/2009 de 6 de outubro. Guiando-nos para os direitos de proteção, provisão, mas também de participação.

As práticas dos profissionais para com as crianças são desenvolvidas de modo individualizado, com base num plano que para elas foi traçado em conjunto com as suas famílias, mas ao qual não são chamadas a participar.

Defendemos que a criança mediante o seu direito de participação, para além da família deveria ser considerado como agente ativo que independentemente das suas

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problemáticas e à sua medida possa ser “escutada”, possa contribuir, dando a sua opinião, fazendo parte de todo o processo de IPI e não apenas como um elemento que é intervencionado. Quando aqui falamos em “escutada” daí estar entre aspas, não quer dizer que seja através da linguagem verbal, pois algumas patologias assim o impedem, mas a linguagem não-verbal e os sistemas aumentativos de comunicação, podem ser elementos facilitadores para a participação das crianças desde que se esteja aberto e se defenda essa possibilidade.