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O quotidiano litúrgico-musical no Convento de Cristo

No documento A MÚSICA NO CONVENTO DE CRISTO EM TOMAR (páginas 178-186)

CAPÍTULO 3. PERSPECTIVA HISTÓRICO-MUSICAL DO CONVENTO

4.1. O quotidiano litúrgico-musical no Convento de Cristo

O dia-a-dia e o ritmo semanal dos freires do Convento de Cristo, tal como em outros mosteiros de outras Ordens religiosas, regulavam-se pelo horário das Horas Canónicas. A compreensão do tempo naquela época dividiu ainda

2 Ainda que este Cerimonial da Ordem de Cristo (1674) tivesse sido sujeito a uma acção

de restauro e posterior microfilmagem para sua preservação durante o tempo de recolha de elementos para a tese, o seu estudo e análise através do microfilme tornou-se mais difícil, em virtude de em cada fólio se concentrarem e fazerem notar, agora com maior nitidez, o sombreado das manchas de tinta de ambas as faces dos fólios.

3 Esta circunstância poderá encontrar justificação no facto de a designação de Mestre de

Capela muitas vezes se confundir com a designação de Cantor-mor, que acabou por se generalizar com o tempo.

4 Para o estudo e análise do Cerimonial da Ordem de Cristo datado do século XVIII,

escolheu-se o volume manuscrito da Biblioteca Nacional de Lisboa, secção de Reservados, sob a catalogação “Cod. 9899”, por mostrar uma caligrafia mais legível que o Manual de Usos e Cerimónias datado de 1702 à guarda dos ANTT, sob a catalogação “MCO, OC/CT 29”.

o ano litúrgico, para efeitos de regulação horária, em quatro estações, delimi- tadas entre: o primeiro domingo da Quaresma até ao dia da Exaltação da Cruz, a 14 de Setembro; de 14 de Setembro até ao dia de Todos os Santos, a 1 de Novembro; deste dia até ao dia das Candeias a 2 de Fevereiro, e fechan- do a roda do ano, deste dia até ao primeiro domingo da Quaresma. Cada um destes períodos de tempo imprimia um horário para as Horas no Convento, adiantando ou atrasando a hora do seu início, principalmente das Matinas, em cerca de meia-hora ou uma hora. Sem ser nos dias feriais, ou seja, nos dias das festas mais solenes apontadas pelo calendário litúrgico, ou nas festas particulares da Ordem de Cristo, o horário de algumas das Horas também era ajustado segundo a liturgia própria e procissões realizadas nesses dias.5

O serviço religioso no Convento de Cristo completava-se com a celebra- ção de três Missas diárias: a Missa conventual, a Missa rezada pelos defun- tos da Ordem e dos seus benfeitores, e a Missa rezada de Nossa Senhora.6 Para além destas três Missas obrigatórias, celebravam-se as Missas de “obediência”, ou capelas de aniversário de defuntos, registadas na Tábua da Sacristia, acrescentando, por isso, a estas três celebrações eucarísticas cerca de mais nove Missas.7

O dia-a-dia de um freire de Cristo

O dia dos freires do Convento de Cristo começava por volta do quarto para a meia-noite, altura em que se preparavam para ir participar nas Mati- nas, logo seguidas das Laudes. Assim que estas acabavam, podiam ir descan- sar um pouco ou recolherem-se em oração nas celas, até se levantarem de novo para Prima, às cinco e meia da manhã.8 Seguia-se um novo intervalo, até que o sino voltava a tocar, desta vez para Tércia, às oito horas. Um quarto de hora depois, rezavam Sexta, finda a qual, se seguia a primeira e principal Missa do dia no Convento, a Missa conventual.9 Quando a Missa acabava, podiam ir comer a sua primeira refeição, que não se prolongava para além das onze horas da manhã, pois por esta hora se devia começar

5 Consulte-se o quadro 5 em anexo. Este quadro foi elaborado com base no Cerimonial

da Ordem de 1741 e nas Constituições estabelecidas no Capítulo Geral de 1684 (ANTT, MCO, OC/CT 16; BNL, Cod. 8833).

6 ANTT, MCO, OC/CT 252, fl. 5v. 7 Consulte-se o quadro 8 em anexo.

8 Para que esta secção do texto não se tornasse confusa, devido ao ajuste dos horários das

Horas consoante a época do ano, decidi descrever um dia no Convento desde a Quaresma até 14 de Setembro, inclusive.

Noa. Se houvesse Ofício solene de defuntos,10 a Noa seguia-se imediatamen- te Tércia, antes da Missa conventual. Noa, que na maior parte do ano se rezava ao meio-dia, podia ter um horário “livre”, em hora a marcar, caso houvesse «alguma occupaçam antes ou depois da Missa»,11 como, por exem- plo, uma procissão, uma cerimónia de Profissão e comunhão.

A tarde no Convento começava com Vésperas, às quinze horas. Era após esta Hora que os freires dispunham de algumas horas seguidas para outros afazeres, até que, às sete da tarde, se reuniam para Completas. O Ofício ficava completo com o Ofício Menor de Nossa Senhora, após o qual os frei- res se deviam reunir no coro para a oração mental, a que nenhum religioso devia faltar.

Depois das suas obrigações religiosas, os freires deviam cumprir as «suas particulares obediencias, depois das escholllas, como os mais officios».12 Entre Noa e Vésperas, e mesmo depois de Completas, aqueles que não tives- sem “particulares obediências” podiam gastar o tempo «em oraçam, e liçam, e em outros officios espirituaes, ou em obras de maos proveytozas a reli- giam».13 Antes de jantar podiam recolher-se às celas, para orar e estudar a Lição. Deviam circular pelo Convento em silêncio respeitoso, podendo falar uns com os outros sobre questões importantes para a religião, apenas após a Missa conventual.

Nada se pode concluir destas palavras sobre o tempo que os freires eventualmente dedicavam ao estudo da música ou ao ensaio de composições para executarem no Coro. No entanto, se bem que o Manual de Cerimónias (1741) não o refira directamente, podemos ponderar a hipótese de que nas “particulares obediências” se incluiriam tarefas relacionadas com a activida- de musical do Convento.

A prática litúrgico-musical no Ofício e na Missa quotidianos

A prática litúrgico-musical adoptada durante o serviço religioso do Convento de Cristo é explicada nos Cerimoniais da Ordem, apontando os momentos em que se devia cantar ou rezar no Ofício e na Missa, de acordo com preceitos e indicações dependentes da liturgia do próprio dia e do grau de solenidade das quadras litúrgicas.

10 Segundo o Cerimonial de 1741, a Missa solene de defuntos era celebrada às segundas-

-feiras com procissão (BNL, Cod. 9899, fl. 18).

11 IDEM, fl. 1v. 12 IDEM, fl. 55. 13 IDEM, ibidem.

O esquema das Horas cantadas ou rezadas no Convento de Cristo é muito minucioso e complexo; por vezes, a prática litúrgico-musical de cada Hora era dependente das outras Horas.14 Ao longo do ano, as Matinas eram reza- das, mas cantavam-se solenemente nas principais festas solenes do calendá- rio litúrgico, como, por exemplo, na Páscoa, seguidas por Laudes igualmente cantadas nessas quadras.15 Prima era sempre cantada quando se cantavam Laudes, excepto nos dias de jejum. Tanto Tércia, como Noa e Vésperas eram sempre cantadas ao longo do ano, excepto nos dias cuja solenidade obrigava apenas à sua recitação.16 Completas eram cantadas ou rezadas consoante a quadra litúrgica que se comemorava, ao passo que as antífonas de Nossa Senhora eram sempre cantadas ao longo de todo o ano.17

O Martirológio e as Lições também deviam ser cantados, nomeadamente a «Liçam breve que se chama absolutio Capituli (…) mas a Pratiosa [verso Pretiosa] rezada».18

A natureza canónica, e não monástica, do Ofício da Ordem de Cristo é clara na menção pelo Manual de Cerimónias de 1741 do número de lições (nove) correspondentes ao «officio maior».19 São mencionados os versos dos dias de nove lições,20 e «os dias que o Padre Supprior faz o officio dira a nona Liçam na estante ordinaria».21 Não se confirma directamente quantas lições teria o Ofício de defuntos, aludindo-se apenas ao número de noctur- nos: «não sendo Sabado se diram as [Vésperas] de defuntos duples com oraçam Deus indulgentiam, e logo depois dellas os tres nocturnos concluídos com a mesma oraçam».22

O Cerimonial de 1674 não nos apresenta detalhes sobre a execução de canto de órgão no Ofício de cada dia; foca antes a sua atenção na prática litúrgico-musical para os dias festivos comemorados no Convento, soleniza- dos pela música polifónica ou pelo cantochão. Os textos de 1741 não acrescentam mais pormenores sobre este assunto, resumindo-se à confirma-

14 Consulte-se o quadro 6 em anexo que apoia esquematicamente o assunto apresentado

nesta secção do texto.

15 BNL, Cod. 9899, fl. 2. 16 IDEM, ibidem. 17 IDEM, fl. 2v. 18 IDEM, fl. 2, 11v.

19 IDEM, fl. 11v. Consulte-se o quadro 7 em anexo. 20 BNL, Cod. 9899, fl. 12.

21 IDEM, fl. 14v. 22 IDEM, fl. 18v.

ção da execução de canto de órgão no Ofício, durante o qual ainda se poderia “tanger”, ou tocar, algum instrumento.23

A Missa conventual diária «em o Convento de Thomar será sempre canta- da, e officiada com ministros, e conforme o missal».24 Por vezes, celebravam- -se em Tomar mais duas Missas conventuais solenes, «por ter este Convento preeminencia de Igreja Catedral».25 A informação contida nos Cerimoniais sobre a Missa conventual é completada com algumas breves instruções incluídas nas Constituições de 1684.26 Para além das partes constituintes do ordinário e próprio da Missa que são cantadas, devia-se cantar sempre com muita solenidade «o Gloria, o Credo, o Pracfactio [Prefacio], e Pater Noster».27

O Cerimonial da Ordem de 1674, relaciona a prática musical adoptada nesses momentos da Missa com o órgão,28 indiciando que este instrumento podia ser determinante na escolha entre a execução de canto de órgão, ou cantochão. Este assunto é apresentado de forma mais sucinta no Cerimonial de 1741,29 embora concorde com a fonte do século XVII.30 Obtém-se, no entanto, a confirmação de que era principalmente nos dias de festas solenes que se cantava canto de órgão durante a Missa.31

O Coro e a Capela do Convento

Para a prática musical do Ofício e da Missa, o Convento contava com o Coro, para tudo o que se cantasse em cantochão, e com a Capela, para tudo o que se cantasse em canto de órgão, ou polifonia. Tanto o Coro como a Cape- la podiam ser acompanhados por vários instrumentos, mas o Coro só podia ser acompanhado pelo órgão. Toda a comunidade religiosa do Convento de Cristo fazia parte do Coro, mas a Capela era constituída por um grupo de cantores, que cantavam à estante grande.32

23 IDEM, fl. 7. Leia-se sobre este assunto, o subcapítulo seguinte. 24 IDEM, fl. 22v.

25 IDEM, ibidem.

26 Este é um exemplo concreto de que estas duas fontes se complementam no que diz

respeito ao modo como se devia fazer o Ofício e celebrar a Missa.

27 ANTT, MCO, OC/CT 16, fl. 5; BNL, Cod. 8833, fl. 4. 28 ANTT, MCO, OC/CT 30; fl. 47v

-

48v.

29 BNL, Cod. 9899, fl. 34

-

35.

30 Este assunto é desenvolvido no subcapítulo 4.3. 31

Este assunto é desenvolvido no subcapítulo 4.2.

32 O número de elementos mínimo para formar uma Capela será de quatro elementos,

correspondentes às vozes de Superius, Altus, Tenor e Bassus, mas esta podia ser constituída por seis, oito, ou doze cantores.

Todos os sábados, durante a refeição da noite, era lida a “brevia” (ordem de serviço semanal), onde figuravam os “domários”, ou os dois cantores, escolhidos para presidir ao Coro durante o Ofício daquela semana.33 Os seus nomes eram depois afixados na porta do coro. Um dos dois religiosos devia ser sacerdote. Ao domário, ou cantor da semana mais velho, competia ajudar o Cantor-mor a organizar as orações do dia seguinte e os livros para a estan- te. Dirigia o “Coro do domário”, do lado direito, e o outro cantor da semana ficava no lado oposto.34 Das várias responsabilidades do domário durante o Ofício, destacava-se o levantar (entoar) da primeira antífona de Laudes e Vésperas, à excepção do Ofício Menor de Nossa Senhora, de defuntos, e Ofício simples.35 Num sufrágio, ou comemoração fora do Ofício Divino, era o domário que devia dizer os versos em vez dos versiculários (religiosos destacados para dizer os versículos), e nos Ofícios de nove lições dizia a nona lição das Matinas e a terceira se houvesse homilia.36

Para além da “brevia” do domário, havia ainda uma outra “brevia” sema- nal, desta vez para ser afixada na porta da sacristia, onde os freires estavam organizados em duas turmas, ou dois Coros de dez religiosos cada, acompa- nhados de dez acólitos.37 A estas turmas competia acompanharem as missas dessa semana, bem como as capelas de aniversário de defuntos.38 A primeira turma era constituída pelos «officiaes da Caza, Mestres, e estudantes, haven- doos», ou até quem pedisse para deste grupo fazer parte.39 Era este “Coro” de religiosos que devia assistir no coro até Prima, inclusive. A segunda “turma” era formada por «todos os sacerdotes acolitos»40 que andavam no Coro, e caso faltassem elementos, deviam ser compensados pelos sacerdotes mais velhos e jubilados.41 Os acólitos eram «irmãos de subdiacono para baxo»,42 ou então «tambem estudantes, e Mestres; que nam forem sacerdo- tes, ajudadores de officiaes, e novissos em falta destes».43

33 BNL, Cod. 9899, fl. 9v, 25v. 34 IDEM, fl. 11. 35 IDEM, fl. 25v. 36 IDEM, fl. 26. 37 IDEM, fl. 37. 38 IDEM, fl. 10. 39 IDEM, fl. 9v. 40 IDEM, ibidem.

41 IDEM, fl. 10. Apesar desta alternativa, o Cerimonial recomendava muito cuidado e respei-

to pela idade avançada de alguns sacerdotes, pelo que não deviam ser escolhidos repetidas vezes, nem serem nomeados para as capelas de aniversário de defuntos mais penosas.

42 BNL, Cod. 9899, fl. 29v. 43 IDEM, fl.9v.

O Coro de freires dividia-se e posicionava-se “em cima” e “em baixo” no coro alto do Convento.44 Os religiosos que não tivessem quinze anos de hábito desciam «ao Coro de baxo, quando se cantarem Matinas, ou Laudas, ainda de defuntos, e a toda a Missa Conventual, excepto Sanctus, e Agnus Dei».45

Em redor da estante grande do coro, dispunham-se os versiculários. Para esta tarefa podiam ser escolhidos noviços com quatro meses de hábito. Ti- nham por obrigação assistir às primeiras lições das Matinas, e nos Ofícios maiores e menores deviam virar as folhas «do livro com muito tento, e cuidado e diligencia».46Algumas das suas obrigações consistiam em começar as antífonas rezadas e as cantadas do «officio ferial, e sancto simplex».47 Juntos diziam ainda os responsórios breves e os versos dos dias de nove lições.48 O versiculário mais antigo devia dizer a Calenda e a lição breve absolutio capituli e a lição breve de Completas. Dentre as suas várias tarefas, era responsável pelo breviário e devia colocá-lo aberto na estante.49 O versiculário mais novo preparava a estante e a cadeira do Cantor-mor para as lições das Matinas e levava para o coro o missal e a sobrepeliz. Devia ainda ordenar na estante grande as profecias da Missa. Durante o Ofício devia «fazer (…) Liçois, Versos, levantar a antífona do Benedictus, Magnificat e Nunc Dimittis (…) [e o mesmo] nas horas de defuntos sendo rezado, e de tres liçois como tem o officio menor».50

O Mestre de Capela e o Cantor-mor

Os “mestres de música” responsáveis pelo Coro e pela Capela, eram respectivamente o Cantor-mor e o Mestre de Capela. O Cantor-mor podia ainda contar com a ajuda do Subcantor para organizar o Ofício e a Missa. Se bem que nas Constituições de 1684 se registe um sumário das obrigações e qualidades do Mestre de Capela e do Cantor-mor, é nos Cerimoniais da Or- dem que as funções inerentes a estes cargos encontram grande especificação. O Mestre de Capela deveria ter competência e experiência no seu Ofício, e, para além de «reger canto de orgam [tinha que] ensinalo: fundandosse em prover exactamente o que em publico se hade cantar».51 Dava as lições aos 44 IDEM, fl. 8. 45 IDEM, fl. 5v. 46 IDEM, fl. 11v. 47 IDEM, ibidem. 48 IDEM, fl. 12. 49 IDEM, ibidem. 50 IDEM, ibidem.

moços da casa, que, por sua vez, «possão ainda ajudar a cantar os Religiozos no Choro».52 Era responsável por guardar todos os livros de canto de órgão e por escolher os que colocava na estante, para se cantar. Combinava com o Cantor-mor, ou com o Subcantor, na ausência do primeiro, quando se devia «lançar contraponto [canto de órgão] em algua anthifona, Alleluya ou introi- to de missa».53 Juntos começavam o que se havia decidido cantar, mas era o Mestre de Capela que marcava o compasso durante a execução de canto de órgão, passando a regência do Coro para o Cantor-mor quando se passava ao cantochão.54 Para além de dirigir o canto de órgão, o Mestre de Capela podia escolher quais os instrumentos litúrgicos que o deviam acompanhar em dias de festas solenes. Sobre estes instrumentos, o Cerimonial da Ordem do sécu- lo XVIII oferece-nos uma breve e resumida referência: «Quando em o offi- cio Divino se canta Canto de Organ ou se tange algum instrumento (…)»,55 e durante a Missa conventual, «para se começar o prefacio sendo cantado, e Pater Noster havendo Orgam, mas nam se se cantar a elle, ou a outro qual- quer instrumento».56

Muito embora o Cerimonial de 1674 não indique igualmente os instru- mentos musicais escolhidos, refere-se ao uso de todos os instrumentos que houvesse no Convento, executando o repertório musical que a Ordem permi- tia em dias de Vésperas e Completas, mas que não é aqui assinalado. O Mes- tre de Capela podia, portanto, «mandar cantar aos instromentos que no mos- teiro ouver e a ordem premite o que se escute nas festas que neste livro de nossos uzos se apontão».57 Fora disso, teria que obter licença do Prelado.

Ao Cantor-mor competia «governar o Coro emmendar os Religiosos em tudo, o que pertencer ao officio Divino, (…) em qualquer parte, que se can- tar, ou rezar».58 Organizava todas as Lições, Epistolas, Evangelhos e Calen- das, e «tudo o mais que se houver de dizer em o Coro, e altar»,59 embora tudo o que se devia cantar estivesse exclusivamente sob a sua orientação. Apesar disso, não podia alterar o cerimonial sem autorização do Prelado, ou Dom Prior, do Convento de Tomar.

52 IDEM, ibidem. 53 Ibidem. 54 Ibidem. 55 BNL, Cod. 9899, fl. 7. 56 IDEM, fl. 31.

57 ANTT, MCO, OC/CT 30, fl. 50v. 58 BNL, Cod. 9899, fl. 7v.

Exactamente porque o Cantor-mor tinha a responsabilidade de organizar tudo o que se cantasse no Coro, estava dispensado de Prima quando era rezada, e de outras oficinas do Convento que não se relacionavam com a música. Era, no entanto, obrigado a ir trabalhar na horta, caso parecesse bem ao Prelado. Todos os livros pertencentes ao Coro estavam à sua guarda, e sempre que alguns deles necessitassem de alguma emenda nos cânticos, ou algum restauro, devia avisar o Prelado. Era o Cantor-mor que elaborava a “brevia” da comunidade, onde se enumeravam os cantores seleccionados para as “turmas”, ou “Coros”, de religiosos para cada semana. Ordenava também os religiosos no coro, dispondo-os nas suas cadeiras «quando sem cauza justa estejam fora dellas».60

O Cantor-mor ficava no Coro de baixo, do lado direito, que era também o Coro do domário, e o Subcantor do lado esquerdo.61 Começava todos os hinos, mesmo que estes fossem acompanhados pelos órgãos.62 Durante Mati- nas, devia estar atento aos domários, aos cantores e versiculários, para emen- dar algum descuido ao cantar ou rezar. O Cerimonial chega a aprofundar este assunto, entrando no domínio técnico da execução do cantochão, devendo o Cantor-mor manter o Coro «em tom moderado, e grave levanta[n]do, e abaxando quando disso vir que tem necessidade, mas sempre com muito tento (…) muito solicito em que se fassa ponto, e pauza nos versos, e psal- mos de modo que va tudo em hum andar certo, sem que vam adiante, ou fiquem atras em o Cantar, ou Rezar».63 Apesar de ser responsável por tudo o que cantava o Coro, não podia mandar cantar «o psalmo do Fabordam, nem cantar ao Orgam»,64 em dias de Vésperas e Completas solenes, a pretexto de devoção e sem a permissão do Prelado.

4.2. O Ano litúrgico no Convento de Cristo

No documento A MÚSICA NO CONVENTO DE CRISTO EM TOMAR (páginas 178-186)

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