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2. EDUCAÇÃO DE ADULTOS: UM PERCURSO DIVERSO

2.2. O RECONHECIMENTO DOS ADQUIRIDOS EXPERIENCIAIS

Apesar de as primeiras práticas de reconhecimento de adquiridos experienciais terem surgido entre 1950 e 1970, é nos anos 90, no quadro da aprendizagem ao longo da vida que este “passa a ser contemplado nos documentos de política educativa e

atinge uma grande notoriedade social” (Cavaco, 2009, p. 138). Como refere Canário (2006),

“a corrente das histórias de vida e a consequente revalorização epistemológica da experiência, no âmbito das ciências da educação, forneceram os fundamentos de natureza teórica para sustentar a emergência de políticas, dispositivos e práticas de “reconhecimento de adquiridos”, como eixo central das políticas de “aprendizagem ao longo da vida”, nomeadamente no espaço europeu”(p. 240-241).

Subjazem a estas práticas um conjunto de pressupostos, dos quais se destaca o reconhecimento da centralidade da pessoa num processo de aprendizagem caracterizado por uma diversidade de origens ou modalidades, isto é, “ corresponde a entender o processo educativo como um continuum que integra e articula diferentes graus de formalização da acção educativa” (Canário, 2006, p. 242). A aprendizagem e o desenvolvimento dos adultos não ocorrem apenas nos espaços-tempos formais de educação/formação, institucionalizados. Os adultos aprendem, constroem os seus saberes e desenvolvem competências numa multiplicidade de situações e contextos (formais, não formais e informais) que fazem parte das suas trajectórias de vida.

Assumida a interdependência entre a experiência e a aprendizagem, ou seja, partindo da premissa que “as pessoas aprendem com e através da experiência” (Canário, 2006, p. 198), encara-se o adulto como sendo portador de capacidades, adquiridas ao longo do tempo, passíveis de utilização pelo próprio no processo de aprendizagem.

“Aprender não apenas durante a vida, mas aprender com a vida” (Carneiro, 2001), torna-se uma nova abordagem no âmbito do conceito de aprendizagem ao

longo da vida, num quadro de pensamento que valoriza as aprendizagens que as

pessoas realizam ao longo das suas trajectórias pessoais, sociais e profissionais, “ultrapassando as tradicionais fronteiras espaço-temporais delimitadas institucionalmente pelos sistemas de educação/formação” (Pires, 2007, p. 7).

Os saberes e as competências construídos através da experiência e noutros contextos que não os formais têm valor pessoal, social e profissional, no entanto, é fundamental que adquiram visibilidade, uma vez que “são geralmente tácitos, implícitos, “invisíveis” “ (Pires, 2007, p. 15). Como refere Canário (2006), uma vez que

“não é sensato pretender ensinar às pessoas aquilo que elas já sabem” (p. 198), torna-se evidente a importância de reconhecer e validar os seus adquiridos, permitindo uma legitimação social dos mesmos. Assume-se, deste modo, que “os saberes adquiridos à margem dos sistemas formais de educação/formação têm inegavelmente um valor pessoal, formativo, profissional, social e económico” (Pires, 2007, p.7).

Fruto de um conjunto de alterações sociais, económicas e científicas, as políticas e práticas de reconhecimento de adquiridos experienciais fundamentam-se em duas perspectivas distintas, “que se inspiram em diferentes concepções do homem” (Berger, in Cavaco, 2009, p. 601). A concepção humanista, centrada na pessoa, objectivando a emancipação individual e social e a perspectiva orientada para a gestão de recursos humanos, ao serviço da competitividade económica.

Actualmente, “as práticas de reconhecimento de adquiridos experienciais são enquadradas por políticas de modernização económica e de gestão de recursos humanos” (Cavaco, 2009, p. 602). Como refere Canário (2006), o reconhecimento de adquiridos experienciais é “marcado por um paradoxo que reside no facto de uma inspiração humanista estar associada a políticas e práticas de formação que contrariam essa inspiração fundadora” (p.35).

Não obstante, ao promoverem a visibilidade e a legibilidade das aprendizagens “ocultas”, as práticas de adquiridos experienciais constituem-se como uma importante fonte de novas dinâmicas formativas, uma vez que “abrem caminho para novas oportunidades de educação/formação - não numa lógica “carencialista” mas sim de “experiencialidade”-, facilitando a integração e mobilidade formativa, promovendo a aprendizagem ao longo da vida” (Pires, 2007, p. 15).

Vários estudos apontam, igualmente, para o efeito destas práticas no despoletar de uma auto-imagem mais positiva e no desenvolvimento da auto-estima dos adultos, contribuindo, paralelamente, para o reforço e a construção de identidades pessoais, sociais e profissionais.

Enquadradas em métodos inovadores, estas práticas “baseiam-se na tradição crítica do modelo escolar e na valorização do percurso de vida das pessoas” (Cavaco, 2009, p. 141). Os princípios de base nos quais se suportam as práticas de reconhecimento de adquiridos “encontram-se em coerência com a perspectiva da aprendizagem experiencial dos adultos, ao valorizarem as aprendizagens resultantes

de uma diversidade de contextos e de situações a ao atribuírem-lhes um estatuto de legitimidade” (Pires, 2007, p. 10).

O valor dos saberes experienciais detidos pelos adultos depende, essencialmente, de um processo de explicitação e formalização, tendo em conta que, pela sua natureza, os saberes experienciais são tácitos e implícitos. O objectivo destas práticas emergentes passa por “identificá-los, nomeá-los, dar-lhes visibilidade e legitimidade, tanto na dimensão pessoal como na profissional e social” (Pires, 2007, p.8). A vida é reconhecida como sendo um espaço/tempo de aprendizagem e de desenvolvimento de competências e a experiência é considerada uma fonte legítima de saber, que pode e deve ser formalizada e validada.

Tendo em conta os princípios que orientam as práticas de reconhecimento de adquiridos, centrados na pessoa e na sua singularidade, as metodologias utilizadas implicam processos personalizados, pouco compatíveis com procedimentos massificados. A Abordagem Biográfica, as Histórias de Vida e o Balanço de Competências, entre outras, são metodologias utilizadas, sendo possível e até, por vezes, desejável a utilização combinada e flexível de diversas técnicas, “com vista a uma exploração o mais rica possível, em detrimento de procedimentos estandardizados” (Pires, 2007, p. 15).

3.

EDUCAÇÃO DE ADULTOS EM PORTUGAL: UM PERCURSO INCOERENTE