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Penso e examino a história a partir da perspectiva de uma sociedade de classes sociais contraditórias e de interesses antagônicos, que se manifestam e se explicitam ora em relações dialógicas, ora em relações conflitantes na correlação de forças, em espaços de disputas pela hegemonia. Por conseguinte, o meu ponto de vista se expressa na consciência de classe, recurso intelectual pelo qual examino situações históricas concretas pelo método de análise de conjunturas sociais, políticas e culturais, como momentos históricos específicos de uma sociedade. O método de análise de conjunturas permite, ou melhor, possibilita perceber o modo como se combinam as propostas, as ações, as intervenções e a vontade política dos diferentes agentes sociais de uma determinada conjuntura histórica. Fica, então, explicitado o método dialético como caminho da pesquisa, análise e explicitação dos fenômenos e acontecimentos sociais aqui investigados.

E qual deve ser o ponto de partida da investigação? E o ponto de chegada? Para estabelecer o Status do método recorro a categorias de análise de K. Kosik. “O ponto de partida do exame deve ser formalmente idêntico ao resultado” (1976, p.29). Assim, o ponto de partida da investigação é o mesmo ponto de chegada: “A Formação Continuada de Professores em Terras de Fronteiras – Oeste do Paraná – 1973-1992”. Porém, com a diferença de que o ponto de partida é apenas o real dado – “caótica representação do todo” – enquanto que o ponto de chegada é o concreto teorizado – “totalidade concreta”, não mais um fenômeno histórico aparente, mas desvendado em um de seus sentidos. Para atingir a “concreticidade” – a passagem do real dado a concreto pensado – é necessária a mediação das categorias de análises historicamente formuladas – conceitos teóricos e abstrações que resultaram de fenômenos históricos determinados

na ótica de pensadores que os formularam. Assim, antes de serem aqui investigados e narrados os programas, projetos e ações de formação continuada de professores, eram conhecidos em sua caótica representação do todo, porque não investigados, não examinados, não interpretados em seus múltiplos e inacabados sentidos, não narrados, um “mundo não-escrito” (CALVINO), uma realidade não teorizada, pensada. Ao contrário, no ponto de chegada temos os fenômenos reorganizados, e compreensíveis, porque agora examinados, interpretados, compreendidos, narrados, teorizados e pensados - “mundo escrito”.

Então, o status do método quem confere são as vozes dos sete pensadores marxistas e dos seus múltiplos intérpretes, expostos e apresentados no capítulo próprio e retomados ao longo da própria narrativa dos fatos, particularmente nos comentários.

A opção pela narrativa genealógica tem se sustentado no pressuposto de que o sentido da recuperação do curso do tempo tem sua concreticidade na recomposição de certos acontecimentos e na restauração de circunstâncias determinadas mediante o registro da ação dos atores e protagonistas no cenário real sócio-político-econômico- educacional determinado – objeto da presente investigação. A narrativa demonstra que cada acontecimento provoca novos acontecimentos, que, por sua vez, ampliam e aprofundam o sentido original dos acontecimentos iniciais, gestores das ações novas e estabelecem conexões entre si para além da área da educação. Um movimento genuinamente dialético da história. Na narrativa genealógica dos acontecimentos há comentários, intencionalmente breves. Mesmo examinando os acontecimentos da história do passado no terreno e tempo de hoje, foi preciso manter a linguagem do seu tempo – preservar as categoriais, campos conceituais de domínio intelectual, daquelas conjunturas, ainda de circulação restrita sob a vigilância da ideologia ditatorial. Já nos comentários prevaleceram as vozes da Ópera de Sete Notas – categoriais de análise que

deram o tom marxista aos comentários conceituais.

Certamente esta é uma possibilidade de tratar de um tempo num espaço específico. E qualquer que venha a ser o tratamento que se lhe possa dar, sempre haverá galerias temáticas que poderão ser novamente construídas e examinadas. Espero que o fio com que se teceu a narrativa faça jus ao menos em parte à perspectiva teórica aqui abraçada na ópera das sete vozes de autores que me serviram de referência. Uma abordagem polifônica requer uma relação do pesquisador e os seus outros envolvidos nos acontecimentos narrados e comentados.

2 ÓPERA DE SETE NOTAS NA ESCALA SOCIAL E INFINITUDE DE EMENDAS (UM PRELÚDIO NÃO MUSICAL)

Prelúdio

O professor de música e maestro, postado delicadamente imóvel no púlpito numa sala ampla e quase vazia, iluminada ao natural – em bocca chiusa, às vezes com o diapasão – dava o tom da escala musical. Com movimentos leves, delicados e precisos com a mão direita, igual as asas de uma gaivota em pleno voo sobre as ondas azuis do mar, dava o sinal de início do exercício vocal e com movimentos verticais – sempre leves – comandava o ensaio das vozes do coral. Em silêncio, todos a um só tempo, iniciávamos o solfejo das sete notas musicais, cuidadosamente em tom maior. O exercício vocal iniciava invariavelmente em tons de notas inteiras em escala ascendente e terminava a escala em sons descendentes. Um détour vocal. Começava pelo tom mais grave, ascendia até o tom mais agudo e repetia os tons até a nota novamente mais grave da escala. Este exercício era repetido em escala de tons inteiros até afinar completamente as vozes de cada um dos componentes do coral. Somente então, fazia-se o exercício com as notas de meio tom, o sustenido (adicionando meio tom para cima na altura de cada nota) e o bemol (diminuindo a altura do som em meio tom de cada nota). Assim, o solfejo era executado simultaneamente em suas duas escalas: a escala diacrônica – quando todas as notas têm o mesmo valor inteiro e – a escala diatônica – quando as notas estão em meio tom maior e meio tom menor.

A arte de solfejar era um belo exercício de afinação de vozes e de harmonização do coral. Estas duas qualidades em seu nível elevado – a afinação individual da voz e a harmonização coletiva – eram a perfeição almejada da arte musical, nas quais o coral revelava sua beleza artística na harmonia do conjunto das vozes. Impreterivelmente, a qualidade artística do coral revelava-se na combinação da beleza

individual de cada voz com a harmonia de conjunto das vozes. Bastava uma única voz desafinar e todo o coral se revelava desarmônico. Um desconsolo nervoso para o maestro. Às vezes, perpassava a sensação incômoda de desarmonia devido aos acidentes nas notas em sustenido e bemol, - tom menor - às vezes pelo descompasso na tonalidade de uma e outra das vozes – vozes desafinadas. Podia se supor uma dialética musical às avessas. A desarmonia não embelezava em nada a harmonia do coral. Diferentemente da oposição leveza-peso de um texto literário. A negação do oposto não era o complemento da harmonia. Era apenas o seu oposto, mas não a negação que pudesse justificar sua permanência. Tratava-se pura e simplesmente de eliminar a desarmonia, com a perfeição da harmonia. A harmonia plena atingia-se pela ausência total da desarmonia. É o caso em que o elemento oposto, contraditório, é desnecessário para constituir o todo da harmonia – o dado estético.

As múltiplas vozes que compunham o coral também eram ensaiadas, inicialmente, de forma individual: os tenores primeiro; os barítonos logo em seguida; os baixos e contra-baixos por último.1 A voz de falsete era muito rara. Poucos cânticos comportavam esta voz. O Agnus Dei, o Ora pro Nobis... e outras canções folclóricas populares, como as canções de “Folia de Reis”. Era muito divertido cantar a voz de falsete. Uma provocação em tom elevado. Era a voz das alturas. Mais que as demais vozes. Também eram escassas as vozes de solo. Exigiam muito talento e expressão individual de vozes geniais particulares. Além do mais, o solo cantado é uma projeção individual monofônica, não polifônica. São sonoridades contrastantes ao conjunto de vozes do coral. A exclusão total da desarmonia não confere por si só harmonia plena ao coral. A qualidade e a beleza da harmonia não estão apenas na ausência de desarmonia. Precisa haver melodia e sonoridade elevadas e perfeitas. É necessário ter timbre de voz

1 As vozes soprano, mezzo soprano e contralto deixam de ser mencionadas em virtude do coral ser formado

de cada uma das vozes. E todos, ao um só tempo, precisam ter um elevado timbre melódico. Um bel canto ressoava no eremitério diariamente, nos intervalos da meditação dos frades capuchinhos, com o propósito de desviá-los da luxúria do mundo profano. Os longos e persistentes solfejos e ensaios do coral elevavam a vida dos jovens e purgavam os seminaristas/frades dos seus pensamentos, desejos e atos em tons elevados, sempre seguindo os ensinamentos monásticos de preservar a pureza – a castidade – da vida dos jovens. Enfim, cantar glória e louvores a Deus, à Virgem Maria, aos santos e anjos era cultivar e vivenciar a alegria. Era uma forma de convivência fraterna, alegre, sorridente dos frades na forma de vida em confraternidade.

Na passagem da escala musical para a escala social há uma relação recíproca entre os elementos da música e os elementos que constituem as formas e os organismos da sociedade - os agentes sociais - às vezes em seu sentido inverso oposto, dialético. Mas, o verdadeiro valor do sentido está na alegoria, na imagem figurada. Há similitudes e também dessemelhanças. Há uma intrigante oposição similitude-dessemelhança. As vozes dissidentes, desarmônicas, são imprescindíveis na escala social, porque reais, históricas. Fruto das contradições, das desigualdades sociais, das imposturas dos dominadores, dos preconceitos, dos mecanismos de exclusão, das diversidades, etc. As vozes dissidentes fazem parte do todo da sociedade, ainda que em situações opostas e contraditórias.

Enquanto no sistema musical prima-se pela harmonia de conjunto, pela unidade na melodia, na sonoridade melódica das vozes afinadas, mesmo quando entrelaçadas e permeadas de solos, no sistema social predominam e reinam a desarmonia e os conflitos – unidade na diversidade – numa infinidade de relações dos movimentos historicamente constituídas por conta das contradições e das diversidades de interesses e de modos diversos de pensar, sentir e agir. A analogia musical e as alegorias dos tons musicais tem o valor metodológico para representar as múltiplas e divergentes vozes em

escala social polifônica, não necessariamente harmônica. Em seu sentido alegórico, há um misto de relações recíprocas entre os dois sistemas: similitudes e contradições. Nas relações sociais as contradições são mais fortes que as relações harmônicas do coral. É difícil atingir a harmonia e a unidade nas escalas sociais.

Esta ópera de sete notas2 compõe-se das vozes de sete pensadores

2 A despeito dos sentidos cabalístico e onírico que se tem dado ao sete – unidade numérica – é necessário ir além da

simples e ingênua curiosidade que este número tem incorporado em seu sentido mais amplo e profundo em determinados tempos da história, pelos mais diversos e paradoxais interesses e motivos. O sete tem sua gênese na narrativa que trata sobre a origem do mundo. Teria Deus trabalhado arduamente na criação dos céus e da terra e de tudo o que neles há, durante seis dias consecutivos. Após ter concluído suas obras, Deus teria descansado no sétimo dia. E assim a exemplo de Deus se determinou a semana de seis dias de trabalho e o sétimo dia se consagrou a Deus, repousando. Até hoje temos os sete dias da semana. E a Igreja do Sétimo Dia. Aí vem os sete anos de vacas gordas e os sete anos de vacas magras, que devoraram as sete vacas gordas. As sete espigas generosamente granadas e as sete espigas mirradas, que devoraram as sete espigas granadas. Temos os sete Sacramentos. Os sete pecados capitais. As sete virtudes. No cinema, temos os filmes clássicos do Faroeste Sete Noivas para sete Irmãos, Sete homens e Um Destino, A Revolta dos sete Homens. Não se sabe ao certo sobre a origem e o sentido histórico da expressão popular vou pintar o sete – no sentido de fazer extravagâncias, exceder nas permissividades. Ou vou trancafiar, esconder algo a sete chaves. Foi inventado o bicho de sete cabeças e o

gato tem sete vidas. O enterro a sete palmos de profundidade. Na música popular os caipiras cantam: tenho uma mula preta de sete palmos de altura. Até a natureza – em sua criação estética – tem revelado seu talento ao construir lenta e demoradamente as maravilhosas Sete Quedas de Guairá. As maravilhas da natureza que não soubemos amar. Sobre as ruínas e escombros, por afogamento, construímos a grandiosa barragem da usina de Itaipu – glória do progresso. Ninguém expressou com maior profundidade e lamento esta tragédia do que o nosso poeta maior Carlos Drummond de Andrade em seu poema Adeus a Sete Quedas. “Sete Damas por mim passaram/ E todas sete me beijaram” (Alphonsus de Guimarães – citado por Drummond na abertura do poema). “Sete quedas por mim passaram/ todas sete se esvaíram... Sete Quedas por nóspassaram/ E não soubemos, ah, não soubemos amá-las/ E todas sete foram mortas/ E todas sete somem no ar/ Sete fantasmas, sete crimes/ Dos vivos golpeando a vida/ Que nunca mais renascerá”. Temos, ainda, as sete notas da escala musical. O violão de sete cordas. O mata sete. A velha história dos sete anões. Filme policial 007 dos tempos da “guerra fria”. “Em cima de um monte há sete cavernas; numa delas está o Ogro” (fábula italiana-Calvino,2002,p.50). E o gato teria mesmo sete vidas? E os sete gatinhos de Nelson Rodrigues, não seriam oito, nove...? Assim, o título do presente capítulo se inclui e se confunde com a crença cabalística e a ciência – o mundo escrito na língua de pensadores sociais e escritores literários. Os sete pensadores tem uma relação com as sete notas da escala musical e serão ouvidos – auscultados – na sua própria voz, mediante a recitação de trechos de suas obras. A beleza e a melodia está no timbre da própria voz da vida que viveram e na sociedade que examinaram, interpretaram, compreenderam e propuseram transformar. É na ópera clássica elevada e na ópera popular – por vezes uma ópera bufa – composta por diversas vozes, em tons diversos, mas na mesma escala musical, que estes pensadores falaram e escreveram o pensamento marxista. A polifonia é composta por: Marx, Gramsci, Kosik, Löwy, Benjamin, Bakhtin e Calvino. As aberturas de cada voz são feitas por breves sinopses. Ao final da ópera são referidos os escritos de vários estudiosos, pesquisadores nacionais – como se fossem emendas de interpretação e atualização do pensamento marxista para a atualidade. Dentre eles, Míriam Limoeiro, Antônio Cândido, Carlos Nélson Coutinho, Leandro Konder, Milton Santos, Marilena Chauí, Cândido Grzybowski, Gaudêncio Frigotto, Corinta Grisolia Geraldi, João Wanderley Geraldi, Dermeval Saviani, Francisco de Oliveira e outros.

representativos do marxismo. As razões da escolha dos pensadores tem uma relação íntima com a base dos pressupostos metodológicos da investigação e da narrativa histórica. Não é mera coincidência com o número sete, mas uma relação da escala de notas no tom da escala de vozes marxistas. Nesta escala cabem mais do que sete vozes, aí teríamos uma escala maior do que sete notas (vozes). Cada um dos marxistas produziu belos elementos e contribuições ao pensamento de Marx. Pensar conceitualmente um real dado – um momento caótico da história, uma montanha de ruínas e escombros é pensá-lo segundo categorias de análise historicamente formuladas. É perguntar: como estes pensadores viram, vivenciaram, compreenderam e explicaram o mundo – a sociedade em um dado espaço e tempo – na maior parte das vezes “desfetichizando”, “desfantasmagorizando” teorias ideológicas, doutrinas falsas e acima de tudo “desalienando” as massas de trabalhadores e as classes subalternas da sociedade? Estes pensadores nos deixaram um “mundo escrito” na visão e na concepção que tiveram do homem em seu processo histórico. Portanto, o pressuposto primeiro que se constitui como base do pensamento marxista é o movimento da história como ciência do homem. O homem no seu sentido social. Por conseguinte, o homem é um ser histórico: determinado pelo meio e determinante do meio em que vive. Trata-se da história dos homens e das sociedades. Compreender quem somos como sujeitos e cidadãos, eis a questão.

Para escrever a história de seu tempo, estes pensadores vivenciaram seus momentos de angústia e tragédias humanas, contemplaram, examinaram, experimentaram a vida real, pensaram as contradições da realidade, tiveram que compreender a realidade nas suas contradições e em seu movimento permanente de transformação. Escrever o mundo do seu tempo e propor transformações deste mundo custou, não raras vezes, a própria liberdade e a vida. Compreender, explicar e escrever o mundo era a verdadeira

missão em vida destes pensadores. Deixaram para nós um “mundo escrito”. Cabe a nós e aos que vierem depois de nós a missão de escrever o “ mundo não-escrito” (na acepção de I. Calvino) e persistir nas ações e nos movimentos de transformação da sociedade.

Surge a necessidade, mas não a presunção arrogante, de dimensionar a validade e atualidade das teorias, das teses, destes pensadores no estudo e no exame de situações históricas contemporâneas. Na análise e compreensão dos fenômenos a serem investigados, hoje, cabe distinguir o que é datado – “pequeno tempo” – e o que é permanente nos escritos destes pensadores – “grande tempo” ( na concepção de M. Bakhtin). Uma amostra das sete notas será apresentada a seguir, na voz (escrita) de cada um dos pensadores que compõem este coral. Com o cuidado de não querer e pretender aplicar mecanicamente as premissas e as teorias destes pensadores na compreensão e explicação dos fenômenos de um passado recente que investigo. Confirmo e amplio este cuidado nas instigantes postulações e orientações de Geraldi sobre o uso e aplicação de teorias e métodos formulados pelos pensadores que lemos.

O maior elogio que se pode dar a um pensador é não aplicá-lo, mas usar dos seus modos de raciocínio para estudar fenômenos novos, ou dar uma nova visão a velhos fenômenos. Assim, não se trata de perguntar: Sócrates, Erasmo, Berkeley, Freud, Marx, Saussure, Nietzsche, Lacan, Deleuze, Guattasri... dão conta de tal assunto, mas se perguntar como, ocupando um posto de observação desenhado pelas suas práticas de pensar, eles enxergariam o fenômeno que estou estudando? Não se pode querer que um pensador tenha pensado problemas que não eram problemas de sua época (GERALDI, J.W. , 2010, p.12).

2.1 NOTA I

Sinopse – Em suas análises da história – pelos seus estudos e pela própria visão de mundo – Marx formulou métodos revolucionários e rigorosos de investigação das leis

fundamentais da sociedade - da complexa dinâmica estrutural das formações históricas sociais. Em particular, na formulação das teorias da era da revolução burguesa. Em suas investigações, Marx examinava os modos de organização da produção econômica do capital – elementos da estrutura - e as formações sociais e a organização do poder político – agentes sociais da superestrutura. Fez análises profundas e inéditas da revolução burguesa, em particular examinou o movimento, a formação e o desenvolvimento do capitalismo e sua classe protagonista – a burguesia. Ao examinar e interpretar o capitalismo – ao desvelar a “fetichização ideológica”3 – Marx causou medo e irritação à sociedade burguesa em seu pleno e triunfante progresso. O que mais irritou os revolucionários burgueses – além da desvelação da sociedade capitalista de classes sociais desiguais e contraditórias – foi a conclamação dos trabalhadores para a transformação do mundo, não se limitando ao trabalho intelectual de apenas entender e explicar por diversas e diferentes formas o mundo de então. A questão essencial era a transformação da sociedade.

Nas análises de caráter conjuntural, Marx via o mundo como teatro ao tomar as forças conjunturais da sociedade determinada como um espetáculo, embora nada estético e belo. Assim como no teatro - tragédia grega – há cenários, cenas, atos, personagens a representar, bons e maus atores, protagonistas, coadjuvantes, movimento de bastidores, o coro que não aparece em cena, a plateia de massa de espectadores, etc. Do mesmo modo como na tragédia grega – o centro do cenário ocupavam os heróis, os protagonistas, únicos que podiam estabelecer contato com os deuses – na moderna sociedade capitalista os personagens da classe dominante eram e são os protagonistas do progresso, governantes do Estado e dirigentes da sociedade. Neste cenário, personagem

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Brasil, o regime da ditadura civil-militar nos anos 70 fazia a “fetichização da Revolução de 31 de março” para

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