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Muitas são as questões que devem ser analisadas antes de se generalizar o trabalho das crianças como um trabalho exploratório. Existem crianças que exercem tipos de trabalho que podem realmente auxiliá-las em seu desenvolvimento, dando-lhes,

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A vida infantil a que me refiro é o momento da vida em que a criança pode brincar sem ter um trabalho regular e obrigatório, para o próprio sustento ou dos demais familiares, e suas representações como adulto possam ser meramente simbólicas.

por exemplo, responsabilidade, mas, a partir do momento em que o trabalho começa a interferir na vida escolar e na hora da brincadeira das crianças, se fazem necessárias alternativas socioeconômica, política e escolar, para que não seja negada uma fase da vida tão importante para elas.

Nesse sentido, Manacorda explica que Marx via no trabalho de fábrica uma função educativa, e que, abolindo seus aspectos mais alienantes, poderia até desenvolver uma função libertadora, como podemos perceber:

(...) no texto de Marx, há um acréscimo que chama muito a atenção: a demanda para abolição da atual forma de trabalho das crianças nas fábricas. Um esquecimento de Engels? Certamente, mas motivado por sua utópica fé no automatismo da eficácia transformadora do moderno sistema de produção. E como não ver, nesse acréscimo de Marx, a continuação implícita da sua polêmica contra o ensino industrial, proposta preferida dos burgueses? Em todo caso, é compreensível que, após a exigência da abolição do trabalho das crianças nas fábricas, mesmo que sob sua forma atual, Marx prefira evitar, no mesmo contexto, o uso da expressão industrielle, que, sem aquela abolição, não representa uma hipótese positiva. Parece, de qualquer modo, que se pode afirmar que Marx, ao aceitar o princípio da união do ensino ao trabalho material produtivo, exclui, no entanto, qualquer instrução desenvolvida na fábrica capitalista, tal como essa se apresenta, porque, para ele, a fábrica não é um sistema que elimina a divisão do trabalho, mas antes um sistema que, unicamente pela intervenção política (que não se reduz apenas às medidas e insuficientes), poderá, ao abolir seus aspectos mais alienantes, desenvolver uma função libertadora. (MANACORDA, 2007, p. 40-41)

Para esses autores, o trabalho infantil não é obra do capitalismo, mas esse sistema criou condições para que as crianças se transformassem em adultos precoces e fossem destituídas de uma tradição de relações familiares e de vizinhança, na qual se permite a sua reprodução enquanto criança. Outros autores, baseando-se em Marx e Engels, também expuseram a necessidade da articulação entre o trabalho e a educação e como essa relação poderia ocorrer de forma satisfatória. Neste sentido, Dermeval Saviani, afirma que

Marx e Engels insistiram, em praticamente todas as obras, quanto à necessária articulação entre trabalho produtivo e formação intelectual, entendendo que essa relação deveria ser aberta a todos os educandos, e não somente aos filhos dos trabalhadores. Não se tratava de um mero ensino técnico, da aprendizagem de um ofício, mas de uma concepção de educação fundada na articulação entre ensino com o trabalho produtivo pago. A articulação entre trabalho e educação tem sido exaustivamente pesquisada e teoricamente debatida. Parece haver relativo consenso de que essa análise marxista expressa que “trabalho

e educação são atividades especificamente humanas”, no sentido de que “apenas o ser humano trabalha e educa”. (SAVIANI, 2007, p. 152)

José Claudinei Lombardi, ao discutir esta questão, tomando como fundamento a obra de Marx e Engels, afirma que

essa articulação entre trabalho e educação, teoricamente, é tratada como um modo de ser do homem, como meio de produzir sua própria existência. Ao buscarem a distinção do homem dos demais animais expressam que não é a consciência (ou cultura) que distingue os homens dos outros seres, mas o modo de produção de seus meios de vida (...). (LOMBARDI, 2010, p. 231-232)

É com essas palavras que entramos no entendimento, já bastante discutido por vários autores, de que o homem difere do animal por ser capaz de fazer com que a natureza se adapte às suas necessidades, ao contrário dos animais, que se adaptam a ela sem modificá-la para sua necessidade. Esse poder de mudança que o homem exerce na natureza é mais conhecido por nós como Trabalho, que é a materialização da “essência humana”.18

O trabalho precoce geralmente promove efeitos negativos no desenvolvimento físico e educacional, impedindo o jovem de se dedicar a atividades extracurriculares, como atividades lúdicas e sociais próprias de sua idade, trazendo isolamento dos jovens entre seus pares e familiares (WESTPHAL, 2002, p. 268).

Muitas são as questões que envolvem esse tipo de reflexão sobre o trabalho infantil como sendo educativo. Faz-se relevante destacar a existência de uma ampla literatura que defende o trabalho como sendo educativo, e essa afirmação suscitou discussões sobre o que seria, afinal, esse trabalho, e ele pode ser efetivado de forma positiva.

Muitos autores definem o trabalho como educativo, mas de diferentes formas. A exemplo, temos Pistrak, que contrapõe seu ideal de escola e trabalho com o de alguns autores. Sobre esse tema, esse autor define:

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(...) o sentido marxista de essência humana não é o da metafísica: como um conjunto de propriedades imutáveis e eternas do homem, como algo dado ao homem, uma dádiva divina ou natural. Ao contrário, a essência humana é usada no sentido de característica fundamental dos homens, sendo esta produzida pelos próprios homens. O que o homem é, o é pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se profunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico (LOMBARDI, 2010, p.232 – grifo meu).

(...) o trabalho, qualquer trabalho, é uma base excelente de educação, permitindo resolver os problemas de pura educação, mas não de ensino. Graças ao trabalho o homem se torna disciplinado e organizado: é preciso ensinar o amor e a estima em geral. O trabalho eleva o homem e lhe traz alegria; educa o sentimento coletivista, enobrece o homem e é por isso que o trabalho, e particularmente o trabalho manual de qualquer tipo, é precioso como meio de educação. (PISTRAK, 2000, p.48)

Para esse autor, a relação entre o trabalho e a escola deve ir muito além do que é colocado. Essa relação deveria ter um caráter real, que seria a preocupação com a realidade atual, jamais separando o ensino da educação. Lembrando que a reflexão de Pistrak é feita a partir de uma formação dentro do modelo revolucionário.

Em contrapartida, no Brasil, a discussão sobre o trabalho infanto-juvenil perpassa pelas leis que defendem e amparam a criança trabalhadora, tendo o Estado um caráter protetor, tanto no que diz respeito ao beneficio individual do trabalhador, em relação principalmente à marginalidade, quanto no que diz respeito ao amparo de sua família pelo fato de seu trabalho auxiliar a renda familiar. Também é discutida a importância da escola e o fato de que o trabalho exercido pela criança não pode afetar sua assiduidade nem seu desempenho escolar.

Segundo essas discussões, a escola é necessária para a criança e para sua família, uma vez que, estudando e trabalhando, a criança não está tão suscetível à vida marginal e, ainda, contribui com a renda familiar. No entanto, muitas são as discordâncias em torno da idade a partir da qual a criança pode trabalhar, do tempo de sua jornada de trabalho e da obrigatoriedade escolar.

Em Marx e Engels, via-se a necessidade do trabalho da criança juntamente com a educação. De acordo com Manacorda, a posição desses autores em relação ao trabalho infantil era a seguinte:

Nas instruções (MARX; ENGELS, 1962, p. 192 - 195), Marx, tendo definido como progressiva e justa (apesar da maneira horrível como se realiza) a tendência da indústria moderna de fazer colaborar na produção crianças e adolescentes dos dois sexos, e tendo reforçado a tese de que, a partir de nove anos, toda criança deve-se tornar um operário produtivo, e de que todo adulto deve, segundo a lei geral da natureza, “trabalhar não apenas com o cérebro, mas também com as mãos”, propõe subdividir as crianças, para fins de trabalho, em três classes ou grupos – dos 9 aos 12, dos 13 aos 15 e dos 16 aos 17 anos – com horários diários, respectivamente, de 2, 4 e 6 horas. Portanto, após ter acrescentado que o ensino pode começar antes do trabalho, mas que, para o momento, trata-se de fixar as medidas absolutamente

necessárias, retoma o tema – que já havíamos encontrado nos dois textos do período 1847 – 1848 – do poder político democrático que deve servir aos fins imediatos do socialismo. (...) Assim, seu discurso atinge, pela primeira vez, uma autêntica e pessoal definição do conteúdo pedagógico do ensino socialista. (MANACORDA, 2007, p.43-44)

Manacorda avança em seu raciocínio, utilizando, ainda, as palavras do próprio Marx, ao afirmar que por ensino entendemos três coisas:

Primeira: ensino intelectual;

Segunda: educação física, dada nas escolas e através de exercícios militares;

Terceira: Adestramento tecnológico, que transmita os fundamentos científicos gerais de todos os processos de produção e que, ao mesmo tempo, introduza a criança e o adolescente no uso prático e na capacidade de manejar os instrumentos elementares de todos os ofícios. (MANACORDA, 2007, p.43-44)

De acordo com Manacorda, esta situação avançaria com o gradativo avanço da divisão do ensino após os 9 anos de idade, conforme a argumentação de que

Com a divisão das crianças e dos adolescentes dos 9 aos 17 anos em três classes deveria estar vinculado um programa gradual e progressivo de ensino intelectual, físico e tecnológico (...) A união do trabalho produtivo remunerado, ensino intelectual, exercício físico e adestramento politécnico elevará a classe operária acima das classes superiores e médias. (MANACORDA, 2007, p.43-44)

Ao se pensar na realidade atual, aos olhos dos mais puritanos e desconhecedores da realidade do século XIX, pode parecer precoce, e até horrível, alguém considerar que crianças, a partir dos 9 anos, comecem a trabalhar como operários produtivos, mas não podemos deixar de considerar o fato de que, na época tratada pelo autor, as crianças começavam a trabalhar muito mais novas e por muito mais tempo, transformando o que está escrito em uma solução mais amena para a vida dessas crianças na época em questão.

Quanto à definição de ensino socialista, que compreende a escola associada ao trabalho produtivo, que, segundo Manacorda (2007), Marx definirá pela primeira vez, podemos observar que ela se deu efetivamente na Colônia Gorki, como descrita por Makarenko (2005), onde as crianças tinham o ensino intelectual, a educação física, por meio de exercícios militares, e tinham, também, a iniciação tecnológica e cientifica por

meio de oficinas de trabalho, que os iniciavam no ofício dando, assim, oportunidade de emprego e qualificação a esses estudantes.

Os colonistas, como eram chamadas essas crianças que viviam em uma colônia, eram automaticamente educandos e trabalhadores. Essa relação de trabalho e ensino, segundo os relatos feitos por Makarenko19 (2005), acabou por ter êxito, mesmo sendo a sobrecarga de trabalho uma característica da Colônia.

É com essa relação intensa de trabalho que os educadores e colonistas conseguiram, depois de alguns anos na Colônia, fazer com que ela se auto-suprisse economicamente, além de trazer, entre os alunos, uma grande compreensão da importância do trabalho associado aos estudos, para assim poderem atingir sua “independência” cultural e econômica no interior da sociedade socialista vigente na época. Aqui o trabalho aparece como um princípio educativo e não como a simples venda de força de trabalho.

Esse trabalho infanto-juvenil na antiga União Soviética, praticado por menores infratores e/ou órfãos na Colônia Gorki20, era dividido por turmas, que se definiam como “destacamentos mistos” e que, segundo Anton Makarenko (2005), cada misto ficava encarregado de executar uma função dentro da Colônia.

O primeiro misto trabalhava desde as seis da manhã até o meio-dia, e o segundo, do meio dia até as seis da tarde. Os destacamentos mistos

19 De 1920 a 1928, Makarenko esteve à frente da direção da Colônia Gorki, instituição rural mais conhecida como “Colônia”, a qual atendia crianças e jovens órfãos que viviam na marginalidade. Durante esse período, colocou em prática uma maneira eficaz de educar, segundo seus relatos no livro Poemas Pedagógicos (2005). De acordo com a pedagogia de Makarenko, o jovem deveria ser educado em uma escola baseada na vida em grupo, no autocontrole, no trabalho e na disciplina. Os jovens, além de seguirem regras disciplinares, eram ouvidos e podiam opinar a respeito das regras em reuniões e votações. Essas ações, segundo o autor, os deixavam mais abertos aos métodos educacionais.

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A colônia levava o nome do escritor Gorki pela importância que os colonistas atribuíam aos feitos desse autor. Gorki nasceu em um meio social pobre, em Nizhny Novgorod, cidade que, em 1932, passou a se chamar Gorki por ordem de Stalin, tendo sido seu nome revertido em 1991. Órfão de pai, foi criado pelo avô materno que era tintureiro. Em 1878, quando sua mãe faleceu, teve que deixar a casa do avô para ir trabalhar. Foi sapateiro, desenhista, lavador de pratos num navio que percorria o Volga, onde teve contato com alguns livros emprestados pelo cozinheiro, o que acabou despertando sua consciência política. Em 1883, com apenas 15 anos, publica dois romances, Romá Gordieiev e Os Três. Aos 16 anos, muda-se para Kazan, onde tenta cursar gratuitamente a universidade, porém, não consegue e, frustrado, vai trabalhar como vigia num teatro para sobreviver. Mais tarde, torna-se pescador no mar Cáspio e vendedor de frutas em Astrakan. Como a situação não melhorava, decide buscar melhores oportunidades, e viaja para Odessa com um grupo de marginais nômades que iam de cidade em cidade à procura de emprego. Assim, ele exerce várias profissões, sofre com a miséria, com a fome e com o frio. Aos 19 anos, volta a morar em Kazan, onde, desesperado com a situação e sem vontade de continuar vivendo, tenta o suicídio com um tiro, o qual atinge um dos pulmões, mas sobrevive, e adquire tuberculose. Essa experiência fatídica resultará, anos depois, em dois escritos: Um incidente na vida de Makar, escrito em

eram organizados para uma semana. A cada nova semana, a combinação das forças colonistas sempre mudava um pouco de destacamento para destacamento, muito embora certa especialização também tivesse lugar. (...) Os destacamentos mistos trabalhavam bem na lavradura, mas havia oscilações, dependentes do solo, dos cavalos, do declive do local, do tempo e outras causas, de fato objetivas. (MAKARENKO, 2005, p. 358-359)

Esses mistos, como eram definidos os grupos responsáveis por cada tarefa dentro da Colônia, muito aprendiam com a prática de trabalho, pois era preciso que entre eles se desenvolvessem noções de matemática, de lógica e raciocínio rápido. O trabalho acabou se tornando uma responsabilidade entre os colonistas, e nenhum deles queria ser considerado incapaz perante o trabalho − que não era, em nenhum momento, visto como um “fardo” para os alunos, e sim como uma forma de superação e de reconhecimento dentro da Colônia.

No Brasil, a efetivação do que seria o trabalho educativo só teve uma definição quando:

(...) muito depois de experiências bem e mal sucedidas, foi muito depois de muitas tentativas de conceituá-lo [o trabalho educativo], que o direito foi chamado para formulá-lo em termo dever-ser e o fez, pela primeira vez, de modo explícito, tratando do trabalho do adolescente no art. 68 do ECA. Neste artigo se introduziu em nossa legislação a figura do trabalho educativo... (OLIVEIRA, 1997, apud FONSECA, 2003)

O trabalho educativo é entendido como atividade laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo, conforme o Art. 68, parágrafo primeiro da Lei 8069/90 – ECA. Nem sempre, porém, tem esse caráter, pois muitas vezes não é acompanhado, de forma sistemática, se o desenvolvimento proposto ocorre, de forma efetiva, no local de trabalho.

Além dos aspectos legais, várias são as justificativas ideológicas acerca do trabalho infantil. Setores interessados na utilização desse tipo de mão de obra se justificam alegando que crianças e adolescentes devem trabalhar, pois, inseridos no trabalho, estão protegidos dos malefícios da rua.

Alguns setores sociais reafirmam essa ideologia defendendo a continuidade dessa prática, alegando que o trabalho precoce é uma possibilidade de conhecimento de

um oficio pelas crianças, pela ocupação de seu tempo ocioso, atuando como medida preventiva contra a marginalidade e pela possibilidade de ampliação da renda familiar.

Não se pode descartar a idéia de que crianças ociosas estão mais suscetíveis à marginalidade − o que de fato pode acontecer −, mas o trabalho infantil exploratório não pode se tornar justificativa de setores empresariais sob esse ponto de vista.

A escola também, segundo alguns autores, tem sua parcela de culpa no exercício trabalho infantil, uma vez que não passa confiabilidade aos seus alunos. Existe um crescente descrédito, entre a população de baixa renda, acerca da eficácia da escola quanto ao mercado de trabalho, de quanto vale o investimento no estudo dos filhos, uma vez que, nos dias atuais, esse mercado não consegue absorver a mão de obra disponível e, quando o faz, não leva em conta sua qualificação (SARTI, 2005, p.41).

A família desses trabalhadores mais pobres constitui aí a mediação entre, de um lado, as consequências destrutivas que o ingresso precoce no mercado de trabalho acarreta do ponto de vista da falta de qualificações, melhor dizendo, de habilidades sócio-culturais, exigidas pela vida e pelo trabalho urbano, e, de outro lado, a inadequação da instituição escolar a essa clientela potencial, do ponto de vista exatamente dessas habilitações. (GNACCARINI, 1993, p. 98)

Percebe-se, nesse caso, uma maneira deturpada de se ver as instituições escolares, onde a educação deveria ser encarada como uma possibilidade de se desvencilhar desse trabalho alienante, como uma alavanca para a conscientização, mas, ao contrário disso, o salário se torna o fetiche da sociedade capitalista e este sentimento é tão forte entre as camadas menos abastadas que:

(...) nele e por ele, repõe-se imediatamente a identidade da pessoa com as condições alienadas da vida e apaga-se todo o vestígio de conflito; mas, ao mesmo tempo, o salário, com esses atributos próprios da forma-dinheiro, reforça as diferenças naturalizadas nas discriminações, estabelecendo as bases morais e os incentivos motivacionais para a concorrência dos trabalhadores entre si. Para além da igualdade formal que o salário implica, essas crianças, filhas dos subalternos mais excluídos, não se espelham em nenhuma identidade possível e, portanto, em nenhuma relação real de concorrência. (GNACCARINI, 1993, p.111-112)

Em Limeira, este fato é muito evidente, uma vez que o trabalho informal em domicílio contrata muitas pessoas, entre elas, as crianças.

De acordo com o corpo docente da escola pesquisada no que se refere ao rendimento escolar desses alunos, o seu desempenho em relação ao desempenho

daqueles que apenas estudam, é inferior. Isso ocorre devido ao cansaço dos alunos, e ao pouco tempo que têm para estudar e fazer as lições em casa, como foi constatado em muitas falas quando se questionava sobre o rendimento escolar dos alunos:

(...) criança não é para trabalhar, é para estudar, brincar. Ele está pulando uma etapa da vida dela. É diferente da criança que ajuda a mãe em casa organizando seu quarto, suas coisas, do que assumir um compromisso. Nós temos crianças, realmente, que assumem o compromisso do trabalho. E é obvio que influencia. Às vezes a gente via aluna, mesmo os meninos, com a pontinha dos dedos meio queimadinhas, machucada, principalmente machucadinha, acho que no apertar alicatinho da jóia, cortar, alguma coisa assim. Isso dificulta no desenvolvimento motor da escrita. Tem a própria atenção porque está cansado, foi dormir tarde porque tinha coisa pra entregar. Só que o principal é que eles não divulgam isso. A gente sabe com muito trato, aquela conversa de muito carinho, atenção que a gente acolhe. Então, ao longo do ano, você vai criando um elo de carinho, afetuoso mesmo, com os alunos você começa... Um conta uma coisinha, outro conta um pouquinho e da observação também. (PROFESSORA R., 13/12/2010)

Essa falta de atenção, o sono e o cansaço, segundo as professoras de quarta série dessa escola, é recorrente em todas as turmas que têm crianças trabalhadoras. Outra professora diz o seguinte sobre a influência do trabalho na escola:

Eu tenho trinta e duas crianças, metade delas trabalham e isso atrapalha, sim. Por exemplo, sete horas é para eles chegarem um pouco mais cedo para tomar leite com bolacha que a escola oferece, mas eles já chegam atrasados, meio correndo, porque acordam por si