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Capítulo III. O empreendedorismo nos programas de desenvolvimento

III.2 O trabalho informal

Se nos países desenvolvidos, o Estado garante um subsídio para a satisfação das necessidades primárias, muitas vezes, nos países em desenvolvimento, quando o governo não consegue criar empregos para aos cidadãos, estes não têm outra hipótese se não a de encontrar uma solução alternativa sozinhos : é o que acontece com o trabalho informal. A modernização trouxe novas necessidades para permitir aos indivíduos desenvolverem oportunidades profissionais fora das atividades de auto-subsistência, como a agricultura, ou atividades tradicionais, como o artesanato. John Friedmann define o trabalho informal como:

[o] trabalho desempenhado no contexto de mercados de trabalho urbanos, altamente fragmentados – e segmentados. As atividades informais articulam a economia de subsistência de unidades domésticas com o regime de acumulação do modo de produção capitalista, onde constitui uma das principais fontes de «mais-valia» ou lucros. É este entrelaçamento da subsistência e da acumulação que contribui para a nebulosidade do conceito (Friedmann, 1996: 103).

A contribuição do trabalho informal nas zonas urbanas dos países em desenvolvimento é indiscutível. De facto, o crescimento da população é mais rápido que o crescimento económico. O sector informal engloba então uma grande diversidade de atividades e de

1 Podemos tomar como exemplo as politicas de alojamento urbanas conduzidas em França nos anos 70 que

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formas de unidade de produção. O comércio, parecendo ser a atividade informal mais generalizada em África, é também a área que absorve principalmente pessoas sem escolaridade (Lachaud, 1985: 109-113). O trabalho informal é sobretudo associado à zona urbana, no entanto, nas zonas rurais, as atividades não se cinjem apenas ao trabalho da terra e à agricultura familiar, mas também com outros tipos de trabalho informal. Os agricultores podem vender os seus produtos nos mercados das fronteiras entre o mundo urbano e rural. Como por exemplo, possuir uma moto necessita, de vez em quando, necessita a intervenção de um mecânico, tanto no campo como na cidade. Portanto existe uma economia na zona rural que permite fazer a ligação entre o mundo moderno e tradicional, abrangida pelo sector informal.

O trabalho da terra não permite satisfazer todos os habitantes. Pode sempre ser fonte de alimentação, mas não é toda a população que consegue viver dos rendimentos resultantes do trabalho agrícola. Depois de ter optimizado a sua produção, o agricultor tem de aumentar a superfície da cultura dos seus campos ou melhorar o trabalho da terra. A mecanização representa um custo importante e o Estado apoia mais nas produções de exportação. Os agricultores recorrem à utilização dos fertilizantes químicos ou procuram outras atividades. (Scherpereel, 1985 : 202-210). No entanto, a regra parece ser mais uma combinação entre o trabalho da terra e o trabalho informal traduzindo “une nécessité imposée par la déterioration des conditions de vie” (Baumann, 1985: 232). Para além disso, a dinamização do sector informal parece ser difícil, e a produtividade resultante do capital, não parece compensar o investimento da força de trabalho (Baumann, 1985: 237). Outra desvantagem é que, mesmo que o trabalho informal se possa liberar das relações de poder próprias à sociedade antiga (Baumann, 1985: 241), o leque de oportunidades económicas é muito restrito já que é influenciado pelos estereótipos sexuais (Lachaud 1985: 113). As mulheres têm a tendência a voltar-se para o lado da costura, mesmo que o mercado já esteja saturado (Baumann, 1985: 241-243).

O trabalho informal provém de uma iniciativa pessoal, que não parece ter uma rede de protecção fragilizando as identidades profissionais. Efetivamente, são os titulares dos saberes práticos, sem reconhecimento do mundo escolar, formativo ou profissional, que são os mais instáveis, e então próximos da zona “hors-travail” e por consequência da exclusão (Dubar, 2002: 258-261). No entanto, para John Friedmann, o trabalho informal é muito importante no desenvolvimento alternativo. Deve ser aceite pelo Estado. É melhor reconhecê-lo como uma

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maneira para os pobres satisfazer em as suas necessidades fundamentais. A existência de regulamentos pode ser um risco, porque o mercado de trabalho pode não ser capaz de absorver esta massa de trabalhadores (mas não dispensa a proibição de formas abusivas de trabalho como o trabalho de crianças). Porém, o autor recomenda a organização dos trabalhadores informais na valorização dos seus direitos, pois só dessa forma será possível adquirir poder social (Friedmann, 1996 : 108-109).

O trabalho informal não é sempre ilegal. Ao contrário, ele pode respeitar certos regulamentos de base das autoridades como uma autorização municipal. Mas é quando se fala de um nível superior, como os custos que representam a fiscalidade ou os contratos de trabalho, que a legalização encontra o seu limite (Maldonado, 1985: 334-336). A regulamentação do trabalho informal pode provocar condições de trabalho mais precárias e o desemprego. Contudo, o trabalho informal precisa de se abrir a novas perspectivas. A organização de micro-produção permitiria aumentar a produtividade e por consequência os rendimentos dos indivíduos. Também se podem desenvolver outras profissões através de formações com uma finalidade apenas rural, para não incitar uma migração urbana (Baumann, 1985: 245-246). Os programas de desenvolvimento devem apoiar o trabalho informal, mas do lado de mercados não saturados, com novas oportunidades económicas, respondendo às necessidades do território, mas também com ferramentas de gestão e uma superação da divisão sexual do trabalho. No entanto, esses programas devem ter presente que não podem perturbar a lógica organizacional e cultural própria do contexto do território. O trabalho informal é fonte de paz social, permite diminuir os efeitos devastadores da pobreza e facultar uma certa autonomia do povo perante o Estado.

Percebemos que não pode ser uma solução sustentável. Por exemplo, o trabalho informal pode ter externalidades positivas como conseguir enviar crianças à escola através do empowerment econónomico das mulheres, no entanto, tornar o acesso à escola como um direito universal será mais exigente. O trabalho informal tem pelo menos esta vantagem de manter as pessoas na vida social e económica do território. Para Danielle Cénezuelle, quando fala da economia informal na sociedade francesa, não a considera inclusiva em termos de rendimentos porque se trata de um sector instável e saturado. No entanto, “la dimension marchande de l’activité est inséparable des relations non-marchandes qui sont socialisantes” (Cénezuelle, 1996 : 151). De facto, Jean Pierre Lachaud lembra que “les relations sociales qui

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prévalent dans le secteur informel tendent à reconstituer une solidarité professionnelle qui ne disparait pas avec la transition économique” (Lachaud, 1985 : 114).

Quando se fala de inclusão por autonomia financeira, seja de uma maneira formal ou

informal, trata-se então de autonomia na subsistência, de sistema de relações de

interdependência e solidariedade, e de acesso aos direitos humanos. Por isso, os recursos

económicos não podem ser as únicas dotações para lutar contra a pobreza. Não é suficiente “ter”, é preciso “saber” e “poder” (Bihr e Pferfferkorn, 2008: 10-11). É nesta luta contra a marginalização que nasceram iniciativas fazendo renascer uma solidariedade espacial

abrangida por uma alternativa à lógica mercantil capitalista: a economia social e solidária.

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