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Ocorrência de E coli produtora de toxina de Shiga em cortes

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.2 Ocorrência de E coli produtora de toxina de Shiga em cortes

Das 100 amostras de cortes refrigerados de bovinos adquiridos no varejo da grande São Paulo, 86 foram positivas para a espécie Escherichia coli nos testes bioquímicos, obtendo-se 1233 isolados. Apesar de se ter isolado E. coli dessas amostras pela metodologia empregada, os fatores de virulência codificados por stx1, stx2, eaeA e ehxA estão ausentes.

Não há informações na literatura sobre a ocorrência de STEC em cortes de bovinos adquiridos no varejo no Brasil. Os poucos trabalhos publicados sobre o assunto estão relacionados à carne moída e, apesar de indicarem uma baixa frequência do microrganismo, revelam que a carne moída é um importante veículo na transmissão de STEC, entre os produtos de origem animal (Cerqueira et al., 1997; Bergamini et al., 2007; Rodolpho e Marin, 2007).

Cerqueira et al. (1997), no Rio de Janeiro, analisaram 105 amostras de produtos cárneos, sendo 35 de carne moída refrigerada, 35 de hambúrgueres congelados e 35 de almôndegas congeladas. STEC foi detectada em 20

amostras (19%), sendo que nove (45%) pertenciam a amostras de carne moída, dez (50%) a amostras de hambúrgueres e uma (5%) a amostras de almôndegas. Entre os genes de virulência, stx1 foi positivo em 8 (40%), stx2 em 6 (30%) e stx1 e stx2 em 6 (30%) amostras de STEC. O sorotipo O157:H7 não

foi detectado nesse estudo, entretando, duas cepas (O113:H21 e NT:H21) estão entre os sorotipos não O157 mais comumente isolados de diarréia em humanos, evidenciando a importância da detecção de sorogrupos não-O157.

Nossos resultados concordam com os de Silveira et al. (1999), apesar de sua pesquisa ter sido realizada com 886 amostras de hambúrgueres provenientes de oito produtores da região sul do Brasil. Bergamini et al. (2007) também não detectaram o microrganismo ao analisarem 136 amostras de carne moída em Campinas, São Paulo. Por outro lado, no mesmo estudo, relatam uma prevalência de 3,5% (4/114) de STEC em carne moída adquirida em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Três amostras foram positivas para stx2 e ehxA e uma amostra carreava os genes stx1 e stx2, enquanto eaeA não foi detectado. Os isolados pertenciam aos sorotipos O93:H19, ONT:HNT, ONT:H7 e O174:HNT.

Rodolpho e Marin (2007), em Taquaritinga, São Paulo, analisaram 23 açougues, coletando 91 amostras de carne moída, 42 amostras das mãos dos manipuladores e 154 amostras das máquinas moedoras de carne. STEC foi isolada de duas (2,1%) amostras de carne moída e de duas (1,2%) amostras de moedores, enquanto nenhuma amostra obtida das mãos dos manipuladores foi positiva. Somente o gene stx2 foi detectado. Entre as amostras positivas, duas pertenciam ao mesmo açougue (uma de carne moída e uma de moedores), indicando que a higienização insatisfatória dos aparelhos torna-se uma fonte potencial de contaminação das carnes durante o processamento.

Em outros países, os trabalhos envolvendo carne moída também são mais frequentes e estão de acordo com os obtidos em nosso país (Chapman et al., 2000; Tarr et al., 1999; Heuvelink et al., 1999b; Chinen et al., 2001; Fantelli e Stephan, 2001; Vernozy-Rozand et al., 2002; Samadpour et al., 2002; Dontorou et al., 2003; Cagney et al., 2004; Martínez et al., 2007; Varela et al., 2008; Abong’o e Momba, 2009; Nastasijevic et al., 2009; Chinen et al., 2009; Sarimehmetoglu et al., 2009).

Como o que acontece no Brasil, os estudos sobre a ocorrência de STEC em cortes de carne bovina em outros países também são bastante limitados.

Resultados semelhantes aos nossos foram relatados por Minami et al. (2010), na Tailândia, que também não isolaram STEC de 79 amostras de carne bovina e 46 amostras de carne de porco provenientes de supermercados e feiras- livres.

Por outro lado, há relatos na literatura sobre o isolamento de STEC em cortes de carne e produtos cárneos. Entre eles, pode ser citado o de Little et al. (1999), no Reino Unido, que encontraram STEC O157 em uma (0,5%) entre as 183 amostras de carne bovina adquiridas em diferentes açougues. Os mesmos autores, porém, analisaram 212 amostras ambientais obtidas de 105 casas de carnes e não detectaram esse microrganismo.

Nossos resultados também discordam dos obtidos por Al-Gallas et al. (2002), na Tunísia, que ao analisarem 120 amostras de carnes e produtos cárneos detectaram STEC em três (2,5%), sendo stx2 detectado em todas as amostras, enquanto stx1 foi detectado em duas e eaeA em apenas uma.

Na Palestina, Adwan e Adwan (2004) coletaram 300 amostras de carne bovina provenientes de açougues locais, e isolaram STEC de 44 (14,6%). Doze isolados foram identificados como O157; stx1 foi detectado em três (25%) e stx1 e

stx2 em nove (75%). Entre os 32 isolados identificados como não-O157, stx1 foi detectado em seis (19%), stx2 em quatro (12%) e stx1 e stx2 em 22 (69%).

Ao analisarem 134 amostras de carne bovina, Mayrhofer et al. (2004), na Áustria, evidenciaram o envolvimento das STEC nesse tipo de alimento. Em seu estudo, foram identificados dez isolados de E. coli potencialmente patogênicos e, destes, sete pertenciam ao patotipo das STEC.

Na China, Koitabashi et al. (2008) analisaram 53 amostras de vários tipos de carnes vendidas em supermercados e açougues locais. Dessas, 31 foram de carne bovina, e a percentagem de STEC foi de 68% (21/31), sendo considerado o tipo de carne mais contaminado. Foram recuperados 30 isolados, com stx1 tendo sido detectado em oito (26,6%), stx2 em 11 (36,6%) e ambos os genes também em 11 (36,6%).

Lee et al. (2009), na Coréia do Sul, constataram a frequência de 0,93% para STEC em 750 amostras de carne bovina adquiridas no varejo do país no período de 2004 a 2006. Foram identificados quatro perfis genéticos pela PCR: stx2 (28,5%), stx1 e stx2 (28,5%), stx2 e eaeA (28,5%), stx1 e eaeA (14,3%).

Xia et al. (2010), nos EUA, analisaram a ocorrência de STEC em 7.258 isolados de E. coli coletados pelo Sistema Nacional de Monitoramento de Resistência Antimicrobiana dos Estados Unidos, entre 2002 e 2007. Os isolados foram obtidos de carnes de varejo de diferentes supermercados e STEC foi positiva em 0,89% (16/1.806). Entre os genes de virulência, stx1 foi detectado em 6,25% (1/16), stx2 em 62,5% (10/16), stx1, stx2 e ehxA em 25% (4/16), stx1 e stx2 em 31% (5/16) e somente ehxA em 19% (3/16). O sorotipo mais encontrado foi o O83:H8, que não tinha sido isolado anteriormente de alimentos e animais.

4.3 Ocorrência de E. coli produtora de toxina de Shiga em cortes

refrigerados de frango

Das 100 amostras de cortes de frango analisadas, 91 foram positivas para E. coli nos testes bioquímicos, perfazendo 1428 isolados. Entretanto, assim como os resultados obtidos para os cortes de carne bovina, STEC também não foi detectada nessas amostras.

No Brasil, o único trabalho sobre a ocorrência de STEC em cortes de aves foi realizado por Costa (2010), em São Paulo, que obteve o mesmo resultado relatado neste trabalho ao analisar 138 amostras de coxa de frango crua comercializadas a granel em supermercados e hipermercados do município.

Diversos pesquisadores de outros países também relatam a não ocorrência de STEC em cortes de aves (Read et al., 1990; Heuvelink et al., 1996; Heuvelink et al., 1999b; Mayrhofer at al., 2004; Chomvarin et al., 2005;

Bohaychuk et al., 2006; Koitabashi et al., 2008; Esteban et al., 2008; Xia et al., 2010; Minami et al., 2010).

Read et al. (1990), em Ontário, Canadá, não detectaram nenhum sorotipo de STEC ao analisarem 200 amostras de pedaços de frango obtidos em duas plantas de processamento do país. O mesmo resultado foi alcançado por Mayrhofer et al. (2004), na Áustria, ao analisarem 288 amostras de frango adquiridas em estabelecimentos varejistas do país.

Nossos resultados também conferem com os obtidos por Heuvelink et al. (1996), na Holanda, que não isolaram STEC O157 de 300 amostras de produtos avícolas, e com os relatados por Heuvelink et al. (1999b) ao analisarem 819 amostras de carne de frango. Esteban et al. (2008), na Argentina, não isolaram esse sorogrupo em 60 lotes de aves provenientes de 34 granjas.

Chomvarin et al. (2005), na Tailândia, apesar de terem isolado o sorogrupo O157 de um sanduíche de carne de frango típico da região, não detectaram os genes de virulência stx1 e stx2.

Bohaychuk et al. (2006), no Canadá, analisando 800 amostras de produtos cárneos, distribuídas entre carne suína, bovina e de aves, verificaram que o patógeno estava ausente nas 201 amostras de frango analisadas, sendo 100 de coxa de frango e 101 de salsicha de frango.

Xia et al. (2010), nos EUA, analisaram a prevalência de STEC em 7.258 isolados de E. coli coletados pelo Sistema Nacional de Monitoramento de Resistência Antimicrobiana dos Estados Unidos, entre 2002 e 2007. Os isolados foram obtidos de carnes adquiridas em supermercados e, entre eles, 2.179 foram recuperados de peito de frango. STEC não foi detectada em nenhum desses isolados, entretanto, eaeA estava presente em cinco deles (0,23%), tornando-os pertencentes ao patotipo das E. coli enteropatogênicas.

Outros trabalhos onde STEC estava ausente foram relatados por Minami et al. (2010), na Tailândia, que pesquisaram o patógeno em 61 amostras de carne de frango provenientes de supermercados e feiras-livres e por Koitabashi et al. (2008), na China, ao analisarem duas amostras obtidas no varejo do país.

Por outro lado, Chinen et al. (2009), ao pesquisarem STEC O157 em hambúrgueres de frango adquiridos em restaurantes “fast-food” de Buenos Aires, Argentina, detectaram STEC em 7,6% (6/79) das amostras de hambúrgueres de frango não cozidos e em 4,0% (2/50) de hambúrgueres de frango cozidos. A percentagem para os genes de virulência foi de 66,6% (4/6) para stx1 e stx2, 33,3% (2/6) para stx2 e 0% (0/6) para stx1 nos hambúrgueres não cozidos e de 50% (1/2) para stx1 e stx2, 50% (1/2) para stx2 e 0% (0/2) para stx1. Todas as amostras foram positivas para eaeA e ehxA. Neste mesmo estudo, detectaram STEC em 10,3% (4/39) das amostras de frango refrigerados e congelados. Foram detectados stx1 e stx2 em 75% (3/4), stx2 em 25% (1/4), enquanto stx1 não foi encontrado. Todas as amostras foram positivas para eaeA e ehxA. Este estudo evidencia a circulação de cepas potencialmente patogênicas na Argentina, o que pode contribuir para os elevados índices de SUH desse país.

Lee et al. (2009), na Coréia, também relatam a presença de STEC em carnes de frango comercializadas no varejo. O microrganismo foi detectado em 0,3% (3/900) das amostras estudadas. Dos fatores de virulência pesquisados através dos genes stx1, stx2 e eaeA, somente o gene stx2 foi identificado nas três amostras. Os isolados pertenciam aos sorotipos O6, O15 e O128.

A comparação entre os resultados obtidos por este trabalho com os de outros autores torna-se difícil devido a influência de diversos fatores como a utilização de diferentes protocolos de amostragem, a metodologia usada no isolamento e identificação dos isolados, a qualidade higiênico-sanitária dos locais de coleta e também o tipo de amostra utilizada.

Como neste trabalho foram utilizadas amostras de cortes de bovinos, o que exclui a carne moída, considerada o principal produto cárneo envolvido em surtos por STEC, a baixa frequência desse patógeno encontrada em nosso estudo era esperada.

Mesmo não ocorrendo a detecção de STEC em amostras de carne bovina e de aves, é de suma importância a aplicação de medidas higiênicas e

de controle em todos os estabelecimentos envolvidos, pois embora se espere que a maioria das carnes e produtos cárneos seja devidamente cozida antes do consumo, o que ocasiona a destruição do patógeno, a presença de carnes contaminadas no varejo e a preferência pelo consumo de carnes consideradas mal-passadas por muitos consumidores pode colocar em risco a saúde pública.

Estes resultados são de extrema importância para o Brasil, considerado, tradicionalmente, como um dos maiores produtores e exportadores de carne pois a não detecção de STEC em amostras de carne bovina e de aves comercializadas no varejo da grande São Paulo indica que medidas eficazes para reduzir ou eliminar o risco de contaminação por estes microrganismos foram conduzidas nos diversos estágios da produção e comercialização do alimento. Como nos abatedouros não existe um procedimento de higienização específico para eliminar STEC, a aplicação de Boas Práticas Agrícolas (GAP), Boas Práticas de Fabricação (BPF) e Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (HACCP) são necessárias em todas as etapas de produção da carne, desde a indústria até o comércio, principalmente por aqueles responsáveis pela manipulação e processamento da carne crua, uma vez que ficou evidenciado, por este estudo, a presença de STEC, mesmo que em baixa frequência, no couro de bovinos.

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