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3.3 Ocupação do Norte do Paraná

3.3.1 Ocupação espontânea por paulistas e mineiros

A Lei de Terras de 1850 proibia concessões de terras por outro título que não fosse a compra, embora admitisse a posse, desde que pacífica, com cultura permanente por mais de cinco anos. Porém, ocorreram concessões no Norte do Paraná, como confirma o auto-criminal 26/41, 119 no qual se encontra a concessão de 250.000 braças quadradas de terras a João Antônio de Assis, no Aldeamento de São Pedro de Alcântara, feita pelo Presidente da Província José Feliciano Horta, com base na Instrução de 25/04/1857, em 28/02/1868.

É provável que essas concessões estivessem vinculadas à Guerra do Paraguai, porque por ali passava o caminho das tropas em combate -, Colônia Militar de Jataí (1855) -, e o local dos Aldeamentos de São Pedro de Alcântara, São Jerônimo e Paranapanema.120

Contemporânea a essas concessões, por volta de 1860, teve início a ocupação efetiva do Norte do Paraná,121 com o mineiro Thomas Pereira da Silva que adquiriu vasta área próxima do rio Itararé. Sua fixação, entre os rios Tibagi e Itararé, nos vales dos rios Paranapanema, Cinzas, Laranjinha e Antas, se fez

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DHIS/CDPH: UEL, Acervo dos Autos Criminais da Comarca de Londrina, 1934-1970. Doação registrada no Livro B1 - Títulos e documentos, fls. 16, registro n. 373, de 13/10/1938 – Curitiba, PR.

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PADIS, P. C., op. cit., p. 86.

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O Norte do Paraná fazia parte da Província Jesuítica de Guairá - primeira organização administrativa da região, então de domínio espanhol, delimitada pelos rios Paranapanema, Ivaí, Tibagi e Iguaçu, destruída em 1641 pelos bandeirantes.

acompanhar por grande contingente de mineiros, surgindo, em 1862, a Colônia Mineira, hoje Siqueira Campos e outros núcleos populacionais. 122

A rapidez dessa se deveu à sua baixa valorização por paranaenses, pelo seu isolamento da capital e dos portos de Antonina e Paranaguá. Assim, a busca pelas terras paranaenses por mineiros e paulistas, fora do controle do Governo do Estado, levou-o a tentar ordenar essa ocupação. Assim, em 1892 e 1894, em mensagens ao legislativo, via urgência em:

(...) legislar sobre terras devolutas (...) autorizando a venda de terras do Estado (...) sitas no vale do Paranapanema, que são tão ambicionadas pelos mineiros e paulistas e (...) por estes últimos consideradas, para cultura do café, como um prolongamento de seu Estado.

O povoamento das fertilíssimas regiões do imenso sertão (...) do Paraná, é assunto que deve ocupar vossa atenção, pois é lá que há de desenvolver-se a (...) grande lavoura de café, já iniciada com ótimos resultados nos vales dos rios Paranapanema, Cinzas e Jataí. 123

A primeira Mensagem, que se fez acompanhar da Lei Estadual nº. 68, de 20 de dezembro de 1892, regulamentada pelo Decreto nº. 1, de 08 de abril de 1893, regulava a situação das terras devolutas do Estado, reconhecia as posses, e autorizava o governo a “alienar terras (...) aqueles que se propusessem, (...) a torná-

las úteis”, para evitar as posses.124

Isso aconteceu porque, com a Constituição de 1891, as terras devolutas que eram, no Império, administradas pela Repartição de Terras do Brasil - criada pela Lei de Terras -, passaram à alçada dos governos estaduais, havendo, pois, a necessidade de uma lei que regulamentasse tal mudança, principalmente dada à presença, desde meados do século, de paulistas e mineiros na região. Tanto assim que, quando da iniciativa do executivo, em 1892, já existiam, como salientado,

122 São desse período: Tomazina (1865), Santo Antônio da Platina ( 1866 ),Wenceslau Brás (1867) e Jacarezinho (1900).

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PARANÁ. Mensagens do Presidente do Estado, Francisco Xavier da Silva ao Congresso Legislativo do Estado do Paraná, 04/10/1892, p. 15 e 20/10/1894, p.24. Curitiba: Paranaense, 1894.

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diversos núcleos populacionais nessa região que se convencionou chamar de Norte Pioneiro.125 (Mapa 2)

O governo vinha, na verdade, concedendo terras devolutas a grupos privados, pois estava impossibilitado de levar avante projetos de colonização de um Estado esparsamente ocupado.

Nos anos 20, devido a crise cafeeira de superprodução, de 1896, pelo imposto instituído pelo governo federal aos estados produtores, com vistas a impedir novas plantações, e ao esgotamento das terras das propriedades do “Oeste” paulista, uma nova expansão completou a ocupação delimitada pelos rios Itararé e Tibagi.126 Como o Paraná ainda não havia alcançado a quota de produção sobre o qual incidia o imposto e como era de seu interesse ampliar a produção cafeeira do Estado, não impediu novas plantações, motivo pelo qual o Paraná, que possuía terras férteis comercializadas a baixos preços, tornou-se atraente aos mineiros e paulistas. Acresce, ainda que a chegada da ferrovia Sorocabana a Ourinhos, em 1908, abriu condições para a espetacular corrida do café para o Norte Novo que

“estava agora ao alcance da mão”.127

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A expressão Norte Pioneiro ou Norte Velho passou a se empregada a partir dos anos 50, para contrapor a ocupação dos anos 30 - Norte Novo - à área de povoamento mais antigo - Norte Velho -, mas também para diferenciar as formas de ocupação - espontânea, em grande propriedade e a dirigida por empresas colonizadoras, em pequenas propriedades.

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Cambará, Bandeirantes, Cornélio Procópio e Andirá, fundados entre 1904 e 1926.

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A falta de comunicações entre a região ocupada e Ourinhos, terminal do ramal da Sorocabana, levou alguns fazendeiros, a exemplo do que ocorrera em São Paulo a partir da segunda metade do Século XIX,128 a conseguirem concessão do governo paranaense para a construção de uma ferrovia - Estrada de Ferro Noroeste do Paraná - ligando Ourinhos a Cambará, tendo em vista o escoamento da produção para o porto de Santos. No entanto, dada a falta de recursos os trilhos ficaram parados em Leoflora, depois Cambará, no Paraná.

Estimulados por essas concessões do Governo paranaense, grupos paulistas, pressionados pela política de restrição a novas plantações de café, cruzaram o Paranapanema, dando início a uma ocupação dirigida, a oeste do Rio Tibagi. Em 1919, Leopoldo de Paula Vieira, Antônio Machado César e o francês Cezar Corain, requereram, ao Presidente do Estado Afonso Alves de Camargo, a concessão de duas glebas de 50.000 hectares de terras (cada uma), localizadas entre os rios Tibagi e Paranapanema, que deram origem à firma Corain & Cia. Uma outra concessão à Companhia Colonizadora Tibagi Ltda., deu origem a Sertanópolis que, rapidamente se consolidou e deu origem ao município de igual nome e incorporou o Patrimônio de Primeiro de Maio e povoações próximas. No loteamento por eles estabelecido e que seguia diretriz do Governo do Estado com vistas a impedir a posse da terra por populações migrantes do Paraná Tradicional, os lotes iam dos espigões aos cursos d'água, com tamanho variável - chácaras, sítios e pequenas propriedades.129 (Mapa 3)

Como se não fizesse parte do território paranaense, em razão de sua pouca importância social e do isolamento físico pela falta de comunicação com o Estado, mas em especial com Curitiba e Paranaguá, o Norte do Paraná, voltou-se para São Paulo – origem dos fazendeiros – e, incorporado à economia paulista passou a usufruir de sua infra-estrutura – comércio, beneficiamento, transporte ferroviário para o porto de Santos, casas exportadoras e estabelecimentos bancários.

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Cf. SILVA, Sérgio, op. cit., p. 58-60, em São Paulo, fazendeiros de café organizaram sociedades anônimas para a construção de estradas de ferro, em especial que passassem por suas fazendas, com vistas a facilitar o envio do produto ao porto de Santos.

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Em conseqüência, as terras do Norte do Paraná, transformadas em mercadoria cobiçada e, até certo ponto, desordenadamente ocupadas, drenaram seus lucros do café para São Paulo.

Por esse motivo, quando em meados do século XIX, quando fazendeiros paulistas e mineiros, buscaram o Norte do Paraná - região distante e sem comunicação com o resto do Estado -, e iniciaram o plantio de lavouras de subsistência e café -, não alteraram o desempenho da economia do Estado porque seus vínculos pessoais e econômicos estavam em São Paulo.