• Nenhum resultado encontrado

Um olhar sobre os dados

No documento A Supervisão no campo educativo (páginas 97-100)

Prática pedagógica supervisionada e feedback formativo co-construtivo

3. Uma experiência formativa assente na centralidade da prática supervisionada A emergência de uma tipologia de

4.2. Um olhar sobre os dados

Analisaremos de seguida os feedbacks co-construtivos produzidos no contexto da escrita de narrativas autobiográficas no sentido de se perceber a sua natureza e a forma como evoluiu ao longo do processo de escrita reflexiva. Procederemos, primeiro, à análise dos feedbacks relativos às narrativas de processo.

A análise dos dados permitiu, em primeiro lugar, verificar que, du- rante o ano, foram utilizados 1672 feedbacks relativamente à escrita das narrativas autobiográficas de processo, dos quais 1036 foram produzidos no primeiro semestre e 636 no segundo.

Qual a razão de tal discrepância? Poderá estar relacionada com o facto de alguns estagiários terem passado, a partir do início do segundo semestre, a leccionar o dia inteiro (5 horas), o que não acontecia até en- tão18. Mas não é de excluir a hipótese, a validar em estudos futuros, de que, à medida que a prática pedagógica evolui – e ocorre o concomitante desenvolvimento profissional dos estagiários – diminui a frequência de

feedbacks. Esta diminuição seria então consistente com a ideia de que,

face à evolução nas suas competências e na sua autonomia, passariam a precisar de menos feedbacks.

Mas a análise evidenciou também uma panóplia de feedbacks, cuja variabilidade e evolução, expressa no Gráfico 1, merece uma análise mais detalhada.

18  No primeiro semestre, a intervenção educativa de cada estagiário, tinha uma duração média de 2 horas e 30 minutos. No segundo semestre, o número de intervenções decresceu por ter aumentado a sua duração (5 horas), em virtude de cada estagiário passar a assumir a gestão pedagógica do grupo-turma o dia inteiro. Desta decisão, resultou que, no primeiro semestre, em dez semanas de estágio, os estagiários produziram 90 narrativas autobiográficas e, no segundo, com doze semanas de estágio, produziram 77.

Gráfico 1

Evolução dos tipos de feedback nas narrativas autobiográficas de processo

0 5 10 15 20 25 30 35 40

Nov. Dez. Jan. Fev. Mar. Mai. Jun.

% a b c d e f Legenda:

a) Questionamento como pedido de esclarecimento b) Questionamento crítico ou estimulador

c) Apoio/encorajamento d) Recomendação e) Síntese/balanço

f) Esclarecimento conceptual, teórico e metodológico

O “Apoio/encorajamento” apareceu como o tipo mais considerado. O apoio/encorajamento foi, neste processo formativo, assumido não na lógica de um reforço de natureza behaviorista, mas no sentido de que as representações construídas ou as práticas experienciadas eram validadas pelo supervisor. Este tipo de feedback, emergindo no primeiro semestre como o mais importante, foi também o que mais evoluiu à medida que a qualidade da verbalização representacional e da descrição do desempenho profissional se tornava progressivamente mais consistente com os quadros teóricos mobilizados.

O “Esclarecimento conceptual, teórico e metodológico” foi o segundo tipo de feedback mais utilizado. Ao incorporar os esclarecimentos conceptuais e teóricos do supervisor, a conceptualização/teorização das práticas narradas e, de forma crescente, a auto-conceptualização dos próprios estagiários, este tipo de feedback teve uma frequência relativamente estável ao longo do ano sofrendo, contudo, uma ligeira diminuição da sua importância relativa no final do ano. Tal regularidade é de assinalar, se considerarmos que este

tipo agrega expressões que pretendiam não só esclarecer, aprofundar ou reorientar o sentido teórico verbalizado pelos supervisores, mas também a tradução conceptual e teórica das práticas narradas.

Em terceiro lugar, surgiu o “Questionamento crítico ou estimulador”. O questionamento crítico ou estimulador visava induzir nos alunos respostas crítico-reflexivas susceptíveis de fazer despontar a compreensão de novas relações da realidade profissional e a construção de saber e de competên- cias profissionais. Este diálogo supervisivo atravessou intertemporalmente o processo de escrita reflexiva e, neste sentido, terá contribuído para o desenvolvimento de um “olhar crítico”, condição da construção do profis- sional reflexivo e autónomo.

A “Recomendação”, embora mais presente na fase inicial do processo de escrita, foi mantendo alguma importância ao longo do ano. Não tendo carácter prescritivo, este feedback assumia, contudo, uma “carga” orien- tadora, que se traduzia em sugestões/propostas teórico-metodológicas alternativas, sugestões de aprofundamento conceptual e teórico e que, por isso, se manteve até ao final do ano.

O feedback “Síntese/balanço” traduz a representação do supervisor sobre tendências já relativamente estabilizadas de representações e de práticas reflectidas nos discursos que é devolvida ao estagiário. Evidencia, no fundo, a avaliação em termos de “estabilidade”19 das competências adquiridas até então. Compreende-se, por isso, que, à medida que os esta- giários iam construindo patamares crescentes de convicções e de práticas teoricamente sustentadas, também este tipo de feedback, enquanto espelho desse crescimento, fosse aumentando ao longo do ano.

Finalmente, o menos usado foi o “Questionamento como pedido de

esclarecimento”. Tendo assumido maior importância na fase inicial da escrita

das narrativas autobiográficas, foi perdendo peso à medida que o processo de escrita avançava, chegando a ser praticamente residual na fase final do ano. A principal razão que parece explicar a sua diminuição progressi- va pode ser encontrada na gradual integração da descrição e explicação das variáveis envolvidas num determinado fenómeno ou acontecimento vivido no enredo narrativo. Uma explicação plausível para este resultado global pode ser encontrada no próprio processo de escrita reflexiva. Isto é, estando os estagiários familiarizados com este tipo de feedback desde 19  O termo estabilidade é apresentado entre aspas, porque traduz um estádio de desenvolvimento que não deixa de ser dinâmico e, por isso, mutável.

o início do ano, é natural que a sua importância fosse diminuindo à medi- da que a compreensão das intenções subjacentes ao processo de escrita reflexiva evoluía.

Em síntese, complementarmente à diminuição dos feedbacks ao longo do ano, face à evolução, no sentido profissionalizante, das represen- tações e práticas espelhada nas narrativas autobiográficas, constatou-se uma reorientação progressiva do sentido dos feedbacks anteriormente utilizados. Com efeito, as reflexões passaram gradualmente a integrar ou a considerar dimensões objecto dos diálogos supervisivos anteriores. Ou seja, se, no início do ano, por exemplo, era recorrente solicitar aos estagiá- rios que explicitassem as razões e/ou as finalidades de certas acções, este questionamento foi perdendo pertinência à medida que a explicitação dos objectivos e fundamentação da acção desenvolvida passou a acompanhar a descrição da mesma.

4.3. Evolução dos tipos de feedbacks utilizados nas narrativas

No documento A Supervisão no campo educativo (páginas 97-100)