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O segundo grupo de estratégias consiste nas olimpíadas científicas. Essas competições vêm sendo praticadas por diversos países do mundo. No Brasil, assim como

em outros países, anualmente, várias olimpíadas são realizadas organizadas por área de conhecimento. No período referente aos dois governos Fernando Henrique Cardoso (1995- 2002) e o primeiro governo de Lula da Silva (2003-2006) foram criadas várias olimpíadas de conhecimento no país.

Para a análise, o grupo da estratégia das olimpíadas científicas está dividido em dois tipos, as olimpíadas criadas pelas entidades científicas com o apoio do governo federal e a criada pelo governo federal com apoio da entidade científica.

As principais olimpíadas realizadas no período de 1995 a 2006 são: a Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) vem sendo organizada, desde 197994, pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), para todos os estudantes brasileiros do 6º ano do Ensino Fundamental até estudantes universitários de instituições públicas ou privadas (OBM, 2013). A Olimpíada Brasileira de Química (OBQ)95 foi criada em 1986, por iniciativa do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP). Após ter sua realização suspensa, volta a acontecer, em 1996, por iniciativa da Universidade Federal do Ceará (UFC), da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP), com o patrocínio da Petrobrás e Editora Saraiva. Atualmente, a OBQ recebe o apoio do CNPq, da Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados (ABICLOR) e da Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM). Participam dessa competição estudantes do Ensino Médio das escolas públicas e privadas que tenham disputado as olimpíadas estaduais de química (OBQ, 2013b).

A Olimpíada Brasileira de Informática (OBI)96 foi criada em 1999, sendo organizada pelo Instituto de Computação da UNICAMP e realizada pela Sociedade Brasileira de Computação (SBC). A competição é voltada para alunos do Ensino Fundamental e Médio selecionados em diferentes modalidades, de acordo com o nível de escolaridade (OBI, 2013). Também criada em 1999, a Olimpíada Brasileira de Física

94 Apesar da OBM não ter sido criada no período referente ao governo Fernando Henrique Cardoso (1995-

2002), foi entre os anos 1991 e 2001 que essa competição passou por mudanças importantes em seu formato resultando em sua organização atual. Para saber mais detalhes acerca das modificações da OBM, acessar o site a seguir: <http://www.obm.org.br/opencms/quem_somos/breve_historico/>.

95 Para mais informações sobre a OBQ, ver <http://www.obquimica.org/olimpiadas/brasileira>. 96 Para mais informações sobre a OBI, ver <http://olimpiada.ic.unicamp.br/info_geral/regulamento>.

(OBF)97 é um programa permanente da Sociedade Brasileira de Física (SBF) com o apoio do CNPq. Esse programa é destinado aos estudantes do Ensino Médio (OBF, 2013).

A Fundação Oswaldo Cruz98, em parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), em 2001, criou a Olimpíada Brasileira do Meio Ambiente (OBSMA)99. Realizada a cada dois anos, a OBSMA recebe, avalia e divulga projetos de alunos e professores do 6º e 9º ano do Ensino Fundamental e do 1º e 4º ano do Ensino profissionalizante e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) (OBSMA, 2013). A Olimpíada do Conhecimento100 é uma competição da educação profissional, criada em 2001. É promovida pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e destinada a estudantes do SENAI selecionados e que passam por seleção na escola e no estado (SENAI, 2013).

Em 2005, foi criada pela Associação Nacional de Biossegurança (ANBio) a Olimpíada Brasileira de Biologia (OBB)101, destinada à participação de estudantes do nível médio (OBB, 2013). Em 2006, destaca-se a criação da Olimpíada Nacional de Oceanografia (ONO)102, aprovada pelo CNPq, sendo uma iniciativa conjunta da Associação Brasileira de Oceanografia (AOCEANO) e do Fórum de Coordenadores de Cursos de Graduação em Oceanografia do Brasil. A competição é voltada para estudantes do 8º e 9º ano do Ensino Fundamental e alunos do Ensino Médio e que não estejam matriculados em nenhuma instituição de Ensino Superior até o dia da prova (ONO, 2013).

Nesse contexto, merece destaque a criação direta, por parte do governo federal, de uma olimpíada científica destinada para as escolas públicas, a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP). A OBMEP foi criada em 2005, promovida pelo MEC, em parceria com o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPE), e é dirigida a alunos do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental e aos alunos do Ensino Médio (OBMEP, 2013).

97 Para saber mais acerca da OBF, acessar <http://grupodefisica.wordpress.com/historico-das-olimpiadas/>. 98 Segundo o site da instituição, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde, é a

mais destacada instituição de ciência e tecnologia em saúde da América Latina e tem como objetivos promover a saúde e o desenvolvimento social, gerar e difundir conhecimento científico e tecnológico, ser um agente da cidadania (FIOCRUZ, 2012).

99 Para saber mais sobre a OBSMA acessar <http://www.olimpiada.fiocruz.br/>.

100 Para maiores informações sobre as Olimpíadas do Conhecimento, acessar

<http://www.portaldaindustria.com.br/senai/iniciativas/programas/olimpiadas-do- conhecimento/2012/10/1,7163/

o-que-e.html?parent=A%20Olimp%C3%ADada>.

101 Para maiores detalhes sobre a competição consultar:

<http://www.anbiojovem.org.br/obb/index.php?mod=mat&id_materia=301>.

Na OBMEP, destaca-se o estímulo do governo federal para a participação dos estudantes. As premiações vão além da distribuição de medalhas e certificados, a exemplo da distribuição de bolsas de iniciação científica com edital específico do CNPq. Essa competição vem se destacando pelo aumento significativo no número de participantes103, sendo considerada “a maior Olimpíada de Matemática do mundo” (OBMEP, 2013). Essa competição, de acordo com a OBMEP (2013), possui as seguintes realizações:

o Programa de Iniciação Científica Jr. (PIC), para os medalhistas estudarem Matemática por 1 ano, com bolsa CNPq; o Programa de Iniciação Científica – Mestrado (PICME), para medalhistas que estejam cursando graduação com bolsas do CNPq (IC) e CAPES (Mestrado); a Preparação Especial para Competições Internacionais (PECI), que prepara medalhistas de ouro selecionados pela excepcionalidade de seus talentos para competições internacionais; o POTI - Polos Olímpicos de Treinamento Intensivo, que pretende democratizar e ampliar o acesso dos alunos brasileiros a treinamento para competições matemáticas; a criação dos Clubes de Matemática, que vão propiciar outros modos de estudo da matemática entre alunos e professores, com atividades interessantes e em ambiente interativo; a mobilização de Coordenadores Regionais para a realização de atividades como seminários com professores e cerimônias de premiação (OBMEP, 2013, s. p.).

O grande número de participantes gerou estudos sobre o impacto dessa competição na qualidade da educação das escolas públicas: Maranhão et al. (2011), e Biondi, Vasconcellos e Menezes-Filho (2012).

Para avaliar o impacto de tal olimpíada na melhoria da qualidade do ensino, Biondi, Vasconcellos e Menezes-Filho (2012) utilizaram a nota dos alunos em matemática na Prova Brasil, no ano de 2007, comparando com a nota de escolas que nunca participaram da competição. Esse estudo concluiu que “a OBMEP influencia a qualidade da educação pública, aumentando a nota média de Matemática das escolas na Prova Brasil. Esse resultado é ainda mais pronunciado conforme o número de participações e para os alunos com melhor desempenho escolar” (p. 4). O referido estudo objetivou, também, calcular o retorno econômico da competição, com base nos custos de sua realização e nos benefícios futuros proporcionados aos estudantes. Nesse sentido, de acordo com Biondi, Vasconcellos e Menezes-Filho (2012),

103 Desde 2005, data de sua criação, a cada competição, a OBMEP tem apresentado aumentos expressivos no

número de participantes: de acordo com informações do site da competição, em 2012, cerca de 19,1 milhões de alunos se inscreveram na competição e 99,4% dos municípios brasileiros estiveram representados (OBMEP, 2013).

a OBMEP apresenta uma taxa de retorno elevada e promove benefícios salariais futuros aos jovens participantes, ainda mesmo sem considerar possíveis externalidades positivas para a sociedade e para o país, como redução da criminalidade, aumento do bem-estar social, entre outros resultantes da melhoria da qualidade da educação pública (p. 4).

Os autores consideram os aspectos puramente positivos da competição, sem problematizar as conclusões apresentadas, estabelecendo uma ligação direta entre sair-se bem na competição e os benefícios à sociedade como um todo.

De maneira geral, essas competições possuem diversos objetivos em comum, podendo ser resumidos nos seguintes: melhorar a qualidade do ensino; selecionar jovens para representar o Brasil nas olimpíadas científicas internacionais; incentivar a dedicação dos estudantes; avaliar a qualidade da educação oferecida; identificar os melhores estudantes, estimulando-os com premiações; e estimular o interesse dos jovens pela área de conhecimento da competição, incentivando-os para torná-los futuros profissionais.

No que tange às formas de realização, essas competições também apresentam semelhanças. A realização das competições nacionais é precedida de etapas estaduais, onde são selecionados os alunos que participarão do evento nacional. Este, por sua vez, seleciona os que representarão o Brasil em competições internacionais nas respectivas áreas de conhecimento. No nível nacional, a realização das competições, na maioria das vezes, é dividida em três etapas e em níveis de acordo com a escolarização dos estudantes. Na primeira fase, todos os participantes inscritos realizam provas de múltipla escolha e passam para a segunda fase os participantes que atingirem um número mínimo de acertos na prova. Na segunda fase, as provas são mistas e, na terceira, as provas são discursivas. Sem dúvida, a lógica pressente na realização das olimpíadas científicas é a da competição, mediante a seleção dos alunos em etapas sucessivas na escola, nos estados, nas regiões e no país.

Outro aspecto a ser colocado aqui é o estabelecimento das premiações concedidas aos competidores que obtiverem as melhores pontuações finais. Na cerimônia de premiação, os estudantes, a depender de suas colocações, recebem medalhas de ouro, prata e bronze. Há, também, entrega de certificados para todos os alunos participantes e para a escola, como também entrega de brindes relacionados à área de conhecimento da olimpíada. Considerando as características usualmente presentes nos procedimentos de seleção e classificação adotados nessas competições, destaca-se a noção de meritocracia, pois fica subentendida a ideia de que o sucesso dos ganhadores resulta de seu esforço

pessoal, assim como os competidores que fracassam são responsabilizados por isso, visto que tiveram as mesmas oportunidades que os outros. Com relação à noção de meritocracia nas competições escolares, Rezende e Ostermann (2012) explicam que

O princípio meritocrático pressupõe que todos os alunos que estejam envolvidos em testes escolares ou em competições escolares, como as olimpíadas, sejam submetidos, obviamente, às mesmas provas. É claro que as diferenças se aprofundam rapidamente, e alguns alunos parecem incapazes de continuar competindo. Dado o fracasso da maioria dos estudantes, a avaliação escolar cria enormes desigualdades entre alunos bons e os menos bons, o que é próprio de todas as competições escolares, tais como as olimpíadas (p. 252).

Também devem ser consideradas no estudo das olimpíadas científicas questões referentes ao currículo escolar e à preparação dos alunos. Os regulamentos dessas competições estabelecem e definem os conteúdos a serem estudados. Com o objetivo de alcançar posições de destaque na competição, consequentemente, os alunos acabam sendo treinados para responderem as provas. Essa prática contribui para a instituição de mudanças no currículo das disciplinas escolares e resulta em uma situação que, segundo Bonamino e Sousa (2012), já é conhecida com relação à avaliação em larga escala; o ensinar para o teste e, que, no entendimento desse estudo, também se repete no que diz respeito às olimpíadas. Segundo as autoras, essa situação ocorre quando “os professores concentram seus esforços preferencialmente nos tópicos que são avaliados e desconsideram aspectos importantes do currículo” (BONAMINO; SOUSA, 2012, p. 383).

Apesar das olimpíadas, no Brasil, já serem realizadas desde a década de 1970,

vinculadas às sociedades científicas e universidades, no entanto, cumpre destacar o papel preponderante do governo federal no apoio financeiro para a realização dessas competições. Em 2002, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), por intermédio do CNPq, lança o Edital nº 017/2002 convocando os interessados a apresentarem propostas para obtenção de financiamento de atividades dirigidas à realização de olimpíadas relacionadas com as áreas da Ciência e Tecnologia. Desde então, essas olimpíadas recebem suporte financeiro do CNPq. De acordo com o edital, o objetivo é

apoiar a realização, em todo o território nacional, de Olimpíadas como um instrumento para a melhoria dos ensinos fundamental e médio, com a consequente atualização de professores, bem como de identificação de jovens talentosos que podem ser estimulados a seguir carreiras científico- tecnológicas (BRASIL, MCT/CNPq, 2002b, p. 1).

A leitura do objetivo do governo ao apoiar a realização das olimpíadas revela semelhanças com relação aos objetivos individualmente propostos por essas competições acerca da melhoria da qualidade do ensino. De modo geral, para receber o apoio financeiro, as propostas devem cumprir os requisitos de admissão quanto à forma de apresentação, ao conteúdo e à observação dos itens que são financiáveis. Após a análise e a aprovação da proposta, firma-se um termo de compromisso entre o proponente e o CNPq, no qual as duas partes assumem compromissos. No termo de compromisso, o proponente é responsável por todas as obrigações contratuais, permitindo que o CNPq, a qualquer tempo, possa confirmar a veracidade das informações prestadas. Além disso, é obrigado a fornecer qualquer informação solicitada pelo CNPq para o bom desenvolvimento e acompanhamento do projeto aprovado. Em contrapartida, cabe ao CNPq o compromisso de efetivar a liberação dos recursos, segundo cronograma e disponibilidade financeira (BRASIL, MCT/CNPq, 2002b).

Em síntese, no caso das olimpíadas científicas, essa competições, a partir da segunda metade da década de 1990, passam a figurar, ainda que de forma inicial, dentro da orientação da política educacional no Brasil. Desse modo, com apoio financeiro do governo federal, as olimpíadas científicas colaboram para a disseminação de valores como a meritocracia e a competição no âmbito escolar, como também podem tornar-se referência para implantação dos currículos escolares e influenciar a prática docente, reduzindo-a ao treino ou à preparação dos alunos para essas competições.

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