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A depender dos objetivos que um aprendiz de língua estrangeira almeja atingir, há diferentes abordagens de ensino/aprendizagem que podem motivar tal aluno a alcançar o nível de proficiência desejado. Caso o aluno tenha o propósito de dominar a produção e a compreensão oral, seu aprendizado precisa ir além do estudo do sistema linguístico, deve contemplar também a aquisição dos componentes pragmáticos, que variam de cultura para cultura.

Com o intuito de vir a colaborar com os estudos de português para estrangeiros, objetivamos, na presente pesquisa, estudar as estratégias de elaboração de pedidos empregadas por estudantes universitários brasileiros e alemães. Ao contemplarmos o estudo dos atos de fala, damos ênfase em especial à oralidade, prática que consideramos essencial para que o aprendiz de L2 se comunique de forma eficiente nos diferentes contextos do dia a dia. Acreditarmos que, uma vez compreendidas as formas de produção de sentido nessas duas línguas, poderíamos contribuir com aspectos relevantes para a aquisição das estratégias necessárias para o domínio da competência comunicativa por aqueles que desejam interagir em português brasileiro e alemão.

Visto que faz parte do domínio da competência comunicativa o conhecimento da estrutura da língua associado ao entendimento de seus diferentes usos nas diversas situações de comunicação, analisamos os pedidos que configuram o nosso

corpus em nível macro e micro, em sua estrutura e forma – de tal maneira que

examinando-os em sua complexidade pragmática conseguíssemos desvelar, por exemplo, não somente quais são os pronomes que os falantes usam ao interagir com o seu interlocutor, mas em que contextos os empregam, e quais possíveis efeitos de sentido produzem ao se comunicarem de determinada maneira.

Diante do número cada vez maior de intercambistas que as universidades brasileiras vêm recebendo e da necessidade de esses estudantes interagirem de maneira adequada e natural, as situações do Discourse Completion Test (DCT) elaborado para o recolhimento do corpus da presente pesquisa refletem cenários do âmbito acadêmico. Julgamos relevante observar como o aluno brasileiro se comunica com o professor, assim como com os colegas e contrastamos seu comportamento discursivo com o do alemão. Pudemos, dessa forma, verificar as diferentes estratégias

de que estes falantes lançam mão, a depender da relação de poder e distância social que ocupam em relação ao seu interlocutor e do grau de imposição do pedido enunciado.

No que tange à forma com a qual os informantes iniciam o pedido, constatamos que, ao elaborar o ato de fala, o brasileiro emprega Elementos de Abertura com mais frequência do que o alemão, e que Formas de Tratamento foi a subcategoria que apresentou maior regularidade no corpus brasileiro. Averiguamos que os informantes brasileiros se dirigiram ao mestre por meio do emprego do título “professor”; usaram dessa Forma de Tratamento como fórmula de deferência, marcando, por meio da estratégia de polidez negativa, distanciamento e respeito em relação ao interlocutor. Embora com menos frequência, nestes mesmos contextos, os estudantes alemães fizeram uso da Forma de Tratamento “senhor professor” e “caro professor” e, diferentemente dos brasileiros, a comunicação não apresentou o emprego do pronome “você”, sendo sempre o “senhor” a forma preferida na interação com o professor. A opção pelo registro formal por parte dos informantes alemães foi observada não só na comunicação entre aluno/professor, como também entre monitor/aluno. Tal uso da linguagem nos leva a apontar uma inclinação, por parte dos informantes germânicos, a um comportamento social linguístico mais formal do que o dos brasileiros, tendência que poderia vir a ser estudada em pesquisas futuras.

A estratégia mais usada pelos alemães ao abrir o pedido foi a de reparar-se com o seu interlocutor pelo pedido que viria a seguir. Visando proteger a face negativa do ouvinte, utilizaram as expressões da categoria Reparação Antecipada “Entschuldigung” (desculpe) e “Es tut mir Leid” (eu sinto muito).

Além das Formas de Tratamento, os brasileiros também empregaram com frequência o marcador de polidez “por favor”, ao se dirigirem, em um primeiro momento, ao interlocutor. Portanto, a estratégia de polidez negativa foi a opção que os informantes estudantes de Niterói e de Leipzig mais usaram na abertura dos pedidos. É importante não deixar de ressaltar que, ainda que em menor porcentagem, os brasileiros, antes de pedir, cumprimentaram e saudaram com um “tudo bem?” o interlocutor, lançando mão, também, de estratégias de polidez positiva, comportamento não observado entre os informantes universitários alemães.

No que diz respeito ao estudo do ato principal dos pedidos, nossos resultados revelam que a maior parte dos nossos informantes, de ambas as línguas, demonstrou a preferência pelo uso de atos convencionalmente indiretos, especialmente nos

cenários em que o ouvinte ocupava a posição hierárquica superior. Verificamos também que os estudantes brasileiros foram os que usaram mais estratégias diretas e que apenas uma minoria de participantes, de ambos os países, lançou mão de estratégias indiretas.

Apesar de uma considerável porcentagem dos solicitantes brasileiros ter elaborado os pedidos de forma direta, os mesmos foram atenuados por meio de diferentes estratégias linguísticas de preservação das faces – empregadas não só por meio da emissão do ato principal em si, como também dos Elementos de Abertura e dos Atos de Apoio. Tal constatação confirma nossa hipótese da importância do estudo do ato de fala de pedidos em sua complexidade, de forma que o exame do diretivo não contemple somente o grau de diretividade do ato principal em si, mas considere também a análise das estratégias de abertura e fechamento do mesmo.

A análise das modificações internas ao ato principal mostrou que os alemães fizeram uso mais frequente de atenuantes em relação aos brasileiros e em ambas as línguas as estratégias foram empregadas, em sua maior parte, nas situações do questionário em que o solicitante ocupava posição hierárquica inferior à do ouvinte. O condicional foi a subestratégia gramatical que apresentou maior consenso de uso nas duas línguas. Quanto à manifestação da polidez por meio dos recursos lexicais, verificamos que não houve semelhança intercultural quanto ao uso, de forma geral, das categorias. A subjetivação foi a estratégia mais usada pelos brasileiros, enquanto os marcadores de polidez foram os atenuantes mais encontrados no corpus do alemão.

Os Atos de Apoio mais recorrentes foram as justificativas, tanto no alemão, quanto no português do Brasil. A categoria Repetição do Ato Principal foi a segunda mais usada em ambas as línguas e, diante do fato de a justificativa ter sido uma estratégia de atenuação largamente aplicada, verificamos que a terceira categoria com mais frequência de uso, a Preparação para o Pedido, foi empregada por poucos informantes. O percentual de uso dos demais Atos de Apoio mostrou-se inexpressivo. Um estudo futuro, a partir da presente pesquisa, que investigue quais são os aspectos culturais implicados na forma com que os pedidos são proferidos por brasileiros e alemães - contribuiria para um melhor entendimento das estratégias que os falantes dessas duas sociedades lançam mão ao elaborar atos de fala. Da mesma maneira, práticas pedagógicas que contribuíssem para aperfeiçoar o processo de ensino/aprendizagem do uso de atos de fala nas duas línguas em análise também

poderiam colaborar para que aprendizes do português do Brasil e do alemão interagissem nesses idiomas de forma mais eficiente e natural.

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