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Opções de Portugal no quadro da segurança do mar europeu

No documento A segurança no mar e a União Europeia (páginas 44-88)

a. Condicionantes de génese para uma EESM

O Parlamento Europeu, na sua Resolução de 12 de setembro de 2013, sintetiza bem a necessidade de se elaborar a EESM, referindo que ela deverá reduzir as lacunas entre a PMEI “…que não integra uma dimensão de segurança… “ e a EES “…que não

aborda os riscos e as ameaças à segurança marítima…” (Parlamento, 2013)23. Conclui ainda que “…a regulação da segurança marítima afetará … todas as outras

componentes da prosperidade e da segurança europeias;” (Ibidem).

Tomando como referência o nexo entre desenvolvimento e segurança assim sublinhado é oportuno produzir um enquadramento, forçosamente resumido, da evolução e do posicionamento institucional, no quadro da UE, das duas “agendas”: desenvolvimento e segurança.

Como se viu, o desenvolvimento, particularmente na sua vertente económica, está na génese da UE. O Tratado de Maastricht, quando criou a estrutura de “três pilares”, inseriu o “desenvolvimento económico” no primeiro pilar – o pilar supranacional, que incluía as políticas integradas, onde os Estados já haviam transferido mais soberania e a via da integração europeia estava mais adiantada, enquanto a PESC constituía o seu segundo pilar.

Com a adoção do Tratado de Amsterdão, em 1999, a Área de Liberdade Segurança e Justiça (ALSJ) - outro domínio relevante para a “segurança”, focada na vertente interna - passou a estar inserida no primeiro pilar. Deu-se assim a “comunitarização” desta área, com a Comissão a assumir o monopólio da iniciativa legislativa sobre os assuntos correspondentes (Vitorino, 2005).

Mais recentemente o Tratado de Lisboa substituiu a estrutura dos “pilares” por uma outra de repartição de competências, cujas principais tipologias são:

competências exclusivas - domínios onde a UE é a única a poder legislar e a adotar atos vinculativos;

competências partilhadas - espaços onde a UE e os Estados-Membros estão habilitados a adotar atos vinculativos, mas os Estados só podem exercer competências quando a UE não o tenha feito;

competências de apoio - áreas onde a UE não dispõe de poder legislativo e só pode intervir para apoiar ou coordenar a ação dos Estados-Membros.

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Este tratado, no seu Art.º 3º, estipula que a União “…proporciona aos seus

cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça sem fronteiras internas…” (UE,

2007), englobando este espaço no conjunto de competências partilhadas.

A “política externa”, contudo, constitui uma tipologia particular de competências, diferente das anteriores, onde a UE implementa a “política externa” por intermédio, nomeadamente, da Alta Representante, mas os Estados retêm a competência legislativa. Ao contrário da propensão negocial que acompanha as “partilhas de soberania” noutras áreas do processo de integração, nas matérias da PESC - a vertente externa da segurança - os Estados são ainda muito ciosos dos seus poderes (Techau, 2012).

A ALSJ inclui as preocupações com a vertente interna da segurança, mas também com o controlo de fronteiras externas e portanto com os fenómenos transnacionais como a imigração clandestina, o terrorismo ou o tráfico de droga, numa sobreposição com a vertente externa da segurança. Em contraponto à “política externa”, na ALSJ o processo de decisão está já “comunitarizado” com a iniciativa fortemente assumida pela UE, nomeadamente a Comissão.

O Programa de Estocolmo indica claramente que a segurança interna e externa estão fortemente ligadas e que, para a proteção da UE e dos seus cidadãos, é essencial enfrentar as ameaças mais distantes (UE, 2010). “A distinção entre segurança interna e

externa está-se a dissolver” (Alta Representante, 2013b, p. 1) e é comum ver conceitos

de segurança e defesa, segurança interna e externa, entidades civis e militares e setores público e privado aparecerem cada vez mais interligados.

Existem portanto diferenças, de génese e institucionais, entre os domínios da ALSJ e da PCSD que poderão condicionar o relacionamento entre organismos e instituições e a visão de “segurança” que privilegiem.

Para alguns autores, as ligações entre a PCSD e a ALSJ assentam excessivamente na vertente económica e no uso do motor tecnológico e da IDI em temáticas de duplo uso (civil-militar) que revelam a prevalência das rivalidades interinstitucionais da UE (Mawdsley, 2013). Este académico considera que a Comissão tem fomentado uma aliança com a “indústria” por convicção que a tecnologia pode proporcionar segurança, mas, simultaneamente, porque consegue assim manter uma “porta de entrada” para estabelecer diretrizes na área da PCSD.

É neste quadro institucional, de alguma desarticulação entre as vertentes interna e externa da segurança, que a EESM está a ser elaborada. Perspetiva-se portanto que a UE

assumirá agora a intenção de, para o domínio marítimo, também melhorar a coordenação entre os domínios da ALSJ e a PCSD.

Fruto parcial dos constrangimentos institucionais acima expostos, dificilmente se poderá vir a considerar a EESM uma estratégia no sentido clássico, i.e. devendo identificar os fins, avaliar os meios e definir os métodos para adequar uns com os outros24. De facto a UE não dispõe realmente de todos os meios para conseguir determinar as melhores linhas de ação, porque “… a decisão de empregar e controlar a

força militar ou policial, uma vez tomada a decisão, releva não da UE, mas dos Estados…” (WisePens, 2011).

Antecipa-se ainda que a EESM reunirá o seguinte conjunto de características, de consequências relevantes para os Estados-Membros:

Será, como a generalidade das diretrizes emanadas pela UE, um documento inclusivo, precavendo excluir quaisquer visões dos Estados sobre o tema e evitando a perceção de haver perdedores. Não deverá portanto estabelecer modelos ou denunciar preferências por soluções organizacionais, que serão deixadas na esfera de decisão dos Estados-Membros;

Procurará ser integradora, estabelecendo modelos enquadrantes que estimulem a cooperação e a coordenação dentro de cada Estado e entre Estados- Membros, e, sendo a abordagem global incontornavelmente a matriz conceptual, incentivará “…que todas as agências - quer sejam responsáveis

pela segurança da navegação ou pela luta contra os tráficos [-] estejam organizadas e preparadas para coordenar os seus esforços com os meios da Defesa.” (WisePens, 2011).

b. Uma antevisão da EESM pela UE

A elaboração de um documento estruturante sobre um domínio muito amplo, porque envolve normalmente diversas “partes interessadas”, é um processo complexo, lento e difícil. Recorde-se que, no plano nacional, as entidades com responsabilidades ligadas ao mar incluem organismos, institutos, forças e serviços dos Ministérios da Administração Interna, Agricultura e do Mar, Defesa, Economia, Finanças e Justiça.

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Semelhante situação ocorrerá noutros Estados, extrapolando e multiplicando as dificuldades de coordenação quando se passa para o âmbito europeu.

Adicionalmente, para além de tentar conciliar os interesses dos Estados, a UE assistiu também a uma rivalidade entre os seus próprios organismos. Em 2010 o Conselho da UE expressou formalmente uma solicitação para que a Comissão e a Alta Representante elaborassem uma proposta de EESM (Conselho, 2010b).

A presidência espanhola do Conselho da UE, ainda durante esse ano, tomou a iniciativa de propor um documento nesse sentido. Contudo, a existência de conceções próprias e distintas sobre o tema entre as diversas Direções-Gerais (DG) da Comissão, que procuram salvaguardar o âmbito das suas competências das interferências dos Estados-Membros e “…desconfiando em particular da comunidade de Defesa...” (Junquera, 2013, p. 3) frustraram essa iniciativa.

O quadro institucional europeu, resultante da implementação do Tratado de Lisboa estava (e continua …) ainda a estabilizar, com a Comissão e o Conselho da UE a acomodarem-se em novas posições, num cenário que passou a contar com o recém- criado SEAE para apoiar as renovadas funções da Alta Representante, também eles em busca do seu espaço (Monteiro, 2011).

Entretanto, as iniciativas para produzir a EESM foram retomadas e, desde maio de 2013, diversos documentos conceptuais têm estado em consulta junto dos Estados- Membros, visando reunir contributos e matéria para elaborar a EESM (Pereira, 2014). Recentemente foi divulgada uma comunicação conjunta, da Comissão e da Alta Representante, com título abreviado “Para um domínio marítimo global aberto e

seguro…” que produz alguma aclaração sobre o que expectavelmente será o conteúdo

daquela estratégia (Alta Representante, 2014). A análise desta comunicação, à luz da abordagem global perfilhada pela UE, permite identificar quatro princípios basilares, que deverão estar subjacentes aos objetivos estratégicos da EESM e enquadrar a suas linhas de ação prioritárias:

Uma abordagem transetorial, englobando parceiros civis e militares, públicos e privados;

A integridade funcional, evitando alterar autoridades, responsabilidades e competências definidas;

O multilateralismo marítimo, para que a UE possa adotar uma posição representativa de todos os Membros;

O respeito pelas regras e os princípios do “direito”, que no setor marítimo releva a importância do Direito Marítimo Internacional, da IMO e em particular para o cumprimento da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar25 (UNCLOS).

Espera-se que a EESM venha proporcionar um enquadramento comum no espaço da União, identificando opções para que as autoridades nacionais e europeias possam desenvolver as suas políticas específicas neste domínio e encetar as correspondentes ações, com o objetivo de contribuir "…para a boa governação do mar" (Alta Representante, 2014, p. 4).

A EESM deverá "...facilitar uma abordagem transectorial da segurança dos

mares" (Ibidem) e para assegurar coerência entre abordagens, políticas e estratégias dos

diferentes setores, dará especial ênfase ao reforço das ligações entre a segurança marítima interna e externa e à colaboração civil e militar (Ação Externa, 2014). A sua concretização far-se-á através dos seguintes quatro objetivos, que hipoteticamente serão objetivos estratégicos da EESM:

Fazer o uso mais eficiente das capacidades existentes

A EESM será inclusiva, apoiando todas estas estruturas e organizações existentes - incluindo as edificadas pelos Estados-Membros e as agências da UE relevantes nesta matéria - com vista a proporcionar uma melhor cooperação transfronteiriça.

Promover parcerias eficazes e credíveis no domínio marítimo global

A globalização está suportada em cadeias logísticas globais, sustentada em larguíssima escala no transporte marítimo de natureza verdadeiramente mundial que dever operar sem descontinuidades. Para tal é essencial cooperar com parceiros internacionais.

Promover uma melhor relação custo-eficácia

A EESM será elaborada tendo em conta as consequências da crise financeira nos recursos da UE e da maioria dos Estados-Membros. Uma melhor integração entre os diversos instrumentos nacionais, nomeadamente entre as capacidades civis e militares, uma melhoria das comunicações e da coordenação entre os sistemas nacionais e os da União contribuirão para prosseguir este objetivo.

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Reforçar a solidariedade entre os Estados-Membros

Nenhum dos Estados da UE tem capacidades para prevenir, detetar e responder isoladamente a todas as perturbações ou ameaças à segurança das vias de navegação. A EESM deverá contribuir para que os Estados-Membros colaborem no planeamento e prevenção de respostas a riscos e a ameaças e bem como incentivar o apoio mútuo na resposta às crises.

A EESM identificará as ameaças e os riscos principais, em alinhamento genérico com os que já estão definidos na EES e ESI (conflito entre Estados, proliferação de armas de destruição em massa, criminalidade transnacional, terrorismo, ciberataques, etc. quando ocorram ou tenham por alvo o domínio marítimo) e específicos do ambiente marítimo (pesca ilegal, poluição, catástrofes naturais e outras ocorrências no mar ou na zona costeira com impacto no desenvolvimento baseado nos setores marinho ou marítimo).

Numa abordagem mais prescritiva do que noutros documentos anteriores, para além das áreas principais de atuação, nesta comunicação conjunta vêm já identificadas linhas de ação e elencadas as que, estima-se, assumirão maior prioridade:

Ação externa – esta linha de ação visa alargar as práticas atuais da UE, nomeadamente a normas relativas à segurança (safety e security) de navios, portos e de trabalhadores marítimos (códigos e convenções IMO e OIT), a outros parceiros da União. Embora com um âmbito global, referenciam-se especificamente regiões prioritárias, como os golfos da Guiné e de Adém, em África, e as SLOC de interesse para a UE - que ligam a Europa aos outros continentes e onde se incluem o Atlântico e o Mediterrâneo.

Refere-se também a intenção de conferir maior visibilidade à PCSD, nomeadamente encorajando a realização de exercícios marítimos regulares com países terceiros. Relacionado com esta área de atuação é de assinalar a adoção, quase em simultâneo, da Estratégia da UE para o Golfo da Guiné (Conselho, 2014a), já mencionada atrás, e que corrobora o uso da abordagem global da UE ao tema da segurança

Vigilância e partilha de informação no domínio marítimo – linha de ação que deverá dar continuidade aos esforços de partilha de informação neste domínio, reiterando a ambição de edificar o CISE como modelo de integração e partilha de dados e informação.

Assinale-se a ambição de edificar a curto prazo, no âmbito do programa COPERNICUS26 (Programme, 2014), as capacidades da tecnologia espacial para melhorar a vigilância, deteção e o seguimento de pequenas embarcações utilizadas em atividades ilícitas. É também feita uma alusão mais extensa ao sistema EUROSUR, gerido pela Agência FRONTEX, ambos incluídos nos objetivos de coordenação e ação conjunta que a Alta Representante e a Comissão devem privilegiar.

Desenvolvimento e reforço de capacidades – nesta linha de ação salienta-se a importância da função de coordenação para racionalizar capacidades. A agência FRONTEX - que coordena capacidades nacionais para a vigilância das fronteiras externas - e a rede ATLAS - que estimula o emprego das unidades especiais de intervenção das polícias europeias no combate ao terrorismo - são apontadas como exemplo de coordenação entre Estados- Membros.

Contudo, na identificação dos domínios de atuação prioritários, ressalta a dicotomia entre as áreas de intervenção da Comissão e da Alta Representante e a necessidade de coordenação e articulação entre si, para garantirem resultados coerentes. As responsabilidades da Comissão neste domínio são significativas, particularmente na área da regulamentação, na vertente interna da segurança – onde também se inclui a vigilância marítima – e no financiamento das atividades de IDI, em particular das capacidades de duplo uso (civil-militar).

Gestão de risco, proteção de infraestruturas críticas e situações de crise – linha de ação que pretende estimular as boas práticas de gestão de risco. Pretende-se ampliar o uso destas metodologias - exemplificando com as práticas da agência FRONTEX relacionado com as cadeias logísticas ou com a vertente interna da segurança - para desenvolver análises abrangentes para a gestão de risco, a avaliação de ameaças no mar, a proteção de infraestruturas marítimas ou a gestão de emergência.

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Programa europeu de observação da Terra a partir de dados recolhidos por satélite; proporciona dados e informação que poderá ser útil para diversas áreas temáticas: informação sobre a terra, o ambiente marinho, a atmosfera, o clima, gestão de emergência e segurança.

Refere-se aqui também a necessidade de regular o emprego de guardas armados privados para proteção de navios comerciais no mar. Esta medida é certamente polémica porque vai no sentido contrário à tendência dos últimos séculos, que tem sido a de monopolizar nos Estados o uso da força armada no mar. É argumentável que tais ações, mal regulamentadas, poderão mesmo fazer renascer a atividade de “corso” no mar, facto que muito duvidosamente contribuirá para melhorar a segurança marítima (Rodrigues, 2012). A Comissão e a Alta Representante deverão dar prioridade a ações que reforcem a cooperação transfronteiriça entre entidades civis e militares e à inclusão de legislação sobre guardas armados a bordo de navios comerciais no âmbito das convenções da IMO.

Investigação, formação e inovação – linha de ação que é comum a todas as iniciativas de cariz estruturante, como já havia sido com a PMEI. Nesta área entende-se privilegiar as ações que articulem a investigação em matéria de segurança marítima e que potenciem as capacidades formativas existentes, visando a sua hipotética disponibilização a países terceiros. Também é particularizada uma linha de investigação visando melhorar a capacidade de deteção de pequena embarcações.

A comunicação conclui referindo a importância de desenvolver planos e roteiros mais pormenorizados que detalhem a forma como a execução de cada linha de ação estimulará a cooperação, fundamental, entre os diversos setores. Numa perspetiva ampla, a EESM procurará defender os valores fundamentais da União no domínio marítimo, contribuindo para a promoção de objetivos políticos em regiões de interesse, para a prevenção de crises ou a prestação de apoio e assistência no restabelecimento da estabilidade e da segurança.

A relevância e aprofundamento que as dimensões societais, ambientais e sobretudo económicos merecem, nesta comunicação, minimizam a relevância e a importância dos setores político e militar, de acordo com o modelo europeu de edificação de segurança.

A previsível adoção pela UE da EESM no próximo Conselho Europeu irá preencher um “vazio”, existente no domínio marítimo, entre as perspetivas do desenvolvimento e da segurança, procurando adicionalmente estabelecer uma melhor

articulação entre as vertentes da segurança interna e externa (Alta Representante, 2013b).

c. Atuação de Portugal

Em 2013 Portugal adotou o CEDN (Conselho de Ministros, 2013) que reflete uma aproximação ao conceito de segurança de perspetiva alargada, no sentido que lhe confere a “escola de Copenhaga” (Rodrigues, 2013a).

Quase em paralelo foi revista, discutida e adotada uma nova ENM 2013-2020 (Conselho de Ministros, 2014). O seu foco está centrado principalmente num modelo de desenvolvimento para o mar e é mesmo “…possível […] confirmar o alinhamento entre

a ENM 2013-2020 e a …” PMEI (Soares, 2013). A ENM tem portanto um pendor

marcadamente centrado no desenvolvimento e sobretudo nas vertentes económica, social e ambiental.

Desta forma Portugal desenvolveu dois enquadramentos estratégicos: para a “segurança” - principalmente na sua vertente externa - e para o “mar”, com pouca ligação entre si e que, com alguma semelhança relativamente à UE, apresentam hiatos apreciáveis no que se refere à segurança no mar. A necessidade de produzir um documento estabelecendo orientações ao nível estratégico, para a segurança no domínio marítimo, desejavelmente antes da UE, foi reconhecida em tempo (Rodrigues, 2013b).

A atuação de Espanha, ativa nesse sentido quando assumiu a presidência do Conselho da UE no primeiro semestre de 2010, procedeu com esse “tempo”, formalizando recentemente a sua estratégia para a segurança no mar (Gobierno, 2013b).

Considerando no entanto que a EESM deverá ser um documento inclusivo e intencionalmente concebido para evitar a exclusão de qualquer estrutura ou organização, existe ainda tempo para Portugal agir e procurar salvaguardar os seus interesses no domínio marítimo. Assim, para além de reconhecer ser primordial, e ainda oportuno, formalizar uma estratégia nacional para a segurança marítima (ENSM), é essencial criar primeiro o “sentido da sua necessidade” (Rodrigues, 2014).

Esse sentido de “necessidade” impõe-se também porque a crise económico- financeira global afetou de forma particularmente aguda a zona Euro, colocando à prova o processo de construção da UE. Perante esta situação “a República Portuguesa, após

vinte e cinco anos de participação na UE e vinte anos depois do fim da Guerra Fria, tem efectivamente de repensar as suas prioridades externas…” (Ferreira, 2010, p. 46)

interesse em integrar projetos de unificação continental, nos quais será sempre uma periferia tolerada” (Félix Ribeiro, 2014, p. 11).

Perante este cenário, na elaboração daquela ENSM, sendo recomendável incorporar os princípios da abordagem global e a conceptualização da “escola de Copenhaga” para assegurar uma boa articulação com a EESM e com as políticas europeias, é sobretudo fundamental que contribua para materializar já “…a necessidade

de o País se dotar de novo de uma política externa activa, que seja muito mais do diplomacia” (Ferreira, 2010, p. 47).

Para assegurar esse dinamismo, a ENSM deve ser acompanhada de uma estrutura organizacional, tão simples quanto possível, que capitalize aquelas que já são as práticas atuais (Ribeiro, 2014). Servem também para tal os modelos organizacionais adotados na elaboração de documentos similares, como são os casos dos EUA e Espanha, que se discriminam nos Anexos C e D, respetivamente. A CIAM (DGPM, 2012) é um exemplo dessas estruturas cujas competências concretas como órgão de reflexão e decisão estratégica sobre o mar o posicionam naturalmente para, salvaguardando ajustamentos na composição, assumir a função de “ponto de coordenação” e a competência para a fixação das diretrizes sobre a segurança marítima e subsequente estrutura para a sua execução.

Como qualquer documento desta natureza, a estratégia nacional deve identificar o seu propósito, de alguma forma relacionado com a garantia da “boa ordem no mar” (Till, 2009, p. 286) no sentido mais amplo da definição de segurança marítima, identificar as ameaças, estabelecer objetivos (fins), avaliar os meios e identificar, com realismo, as formas de adequar meios e fins.

Sendo importante identificar linhas de ação a privilegiar por uma ENSM, deverá ser também levado em conta que em Portugal foi já produzido um conjunto significativo de reflexões, particularmente durante a discussão do CEDN (Fontoura et al., 2013).

Por outro lado, Portugal tem de se reencontrar com a sua posição de centralidade numa perspetiva oceânica e de ligação do espaço da UE com o Magrebe e os continentes americano e africano, mais especificamente as regiões ibero-americana e a da África lusófona, que o diferencie e valorize no conjunto dos Estados da UE (Simões, 2013). Ou, de forma ainda mais assertiva: “Portugal – e o espaço lusófono – só

sobreviverão com relevância mundial num quadro da globalização, naturalmente

No documento A segurança no mar e a União Europeia (páginas 44-88)

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