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4.4 P RESCRIÇÕES DA L EITURA PELO GP E P OSSÍVEIS R ELAÇÕES COM OS M ODOS DE L ER

4.4.3 Opinião dos Participantes Acerca dos Textos Indicados

A palavra ‘opinião’ conferida a esta categoria já revela a ênfase no caráter subjetivo que atribuímos às respostas. Mas como nos lembra Larrosa:

pensar a leitura como formação implica pensá-la como uma atividade que tem a ver com a subjetividade do leitor: não só com o que o leitor sabe, mas, também, com aquilo que ele é. Trata-se de pensar a leitura como algo que nos forma (ou nos de-forma e nos trans-forma), como algo que nos constitui ou nos põe em questão naquilo que somos (LARROSA, 2002, p.133).

As questões buscaram pinçar a opinião das participantes acerca dos textos indicados nas diversas disciplinas do núcleo comum e parte diversificada do referido curso. Os enunciados das quatro questões palavras-chave como ‘gosto, difícil, chata e desinteressante’ deram ao respondente do GA uma abertura maior para respostas, sendo tal abertura confirmada pelas justificativas apresentadas, ou seja, 51% das participantes justificaram os quatro itens; a grande maioria dos outros 49% apresentaram algumas justificativas. No GP apenas 23% apresentou justificativa (parece não ficar ‘bem’ revelar o que pensam a respeito da bibliografia proposta para o curso dentro da sua disciplina), no entanto a opção de assinalar apenas uma entre as opções bastou para que nossas análises prosseguissem.

As opções para as respostas apresentadas sob uma graduação modalizadora (sempre, freqüentemente, algumas vezes, raramente e nunca) foram transformadas em pontuação com os valores quatro, três, dois, um e zero para cada uma delas. A Tabela 11 apresenta em dados percentuais a opinião de GP e GA acerca de textos indicados.

Tabela 11 – Opinião dos participantes acerca dos textos indicados

Questões/ Opções de resposta

Gosto pela leitura de textos indicados Considera a leitura destes textos DIFÍCIL Considera a leitura destes textos CHATA Considera a leitura destes textos DESINTERESSANTE SEMPRE 5% (GP) 7% (GA) - 15% (GA) - 7% (GA) - 10% (GA) FREQUENTEMENTE 42% (GP) 13% (GA) 16% (GP) 10% (GA) 26% (GP) 23% (GA) 21% (GP) 20% (GA) ALGUMAS VEZES 53% (GP) 64% (GA) 64% (GP) 64% (GA) 42% (GP) 46% (GA) 32% (GP) 39% (GA) RARAMENTE - 11% (GA) 10% (GP) 11% (GA) 16% (GP) 13% (GA) 21% (GP) 20% (GA) NUNCA - 5% (GA) 10% (GP) 2% (GA) 16% (GP) 11% (GA) 26% (GP) 18% (GA)

Ricardo Azevedo, em entrevista a João Zuccaratto para o site do Leia Brasil (2007), aponta para algo que poderá esclarecer o posicionamento de professores e alunos acerca da leitura no ambiente escolar como o desenhado pela Tabela 11. Para o escritor, a leitura é um processo construtivo lento e demorado que exige trabalho, treino e capacitação. Este escritor estabelece ainda as diferentes posturas adotadas diante da diversidade de gêneros textuais quando afirma que existem tipos de leitura: ler ficção pode ser muito diferente do que ler poesia. Estudar através da leitura é diferente de ler tanto ficção quanto poesia. O autor revela ainda que, mesmo sendo um leitor habitual e escritor reconhecido, quando optou pelo mestrado e doutorado descobriu que tinha o hábito da leitura, mas não sabia estudar. Demorou até conseguir atingir certo ritmo de leitura satisfatório.

A leitura a respeito da qual investigamos é aquela à qual Ricardo Azevedo reporta-se: à leitura de estudo, leitura com vistas à aprendizagem, leitura de caráter utilitário e ‘obrigatória’, mas que é estritamente necessária, uma vez que sem ela a razão de ser da instituição escolar se perde. Ainda assim, o posicionamento do GP se assemelha, e muito, com o do GA nos pontos convergentes e divergentes, ou seja, afirmam que gostam ‘algumas vezes’ do que lêem, salientando, no entanto, que esta leitura ‘algumas vezes’ é difícil, chata e desinteressante. A divergência está na percentagem: 42% do GP afirma gostar do que lê contra 13% do GA. Em todos os outros níveis que denotam o gosto e a opinião acerca dos textos, as percentagens estão muito próximas, o que nivela as participantes em graus de expectativa acerca dos textos com os quais têm de trabalhar no cotidiano da escola.

Poderíamos recorrer à poesia para caracterizar a luta com os textos em ambiente escolar, como bem sintetiza Drummond em seu poema “O lutador” onde expressa sua labuta com as palavras, tentando atraí-las para perto de si, quando se refere à produção escrita. No poema, referente a este tema, nas palavras de Merquior (1996, p. 72), o poeta não desiste da luta e tenta apanhar as palavras para delas não apanhar. Assim é o trabalho com leitura na escola, laborioso, do qual não se pode desistir.

Perrotti (1999) inspirado por Sartre diferencia “ledores” de “leitores” (Sartre cria o paradoxo “fazedores de livros” e “escritores”). Para Perrotti

os primeiros seriam sujeitos que se relacionam apenas mecanicamente com a linguagem, não se preocupando em atuar efetivamente sobre as significações e recriá-las. O texto é tabula rasa, exposição sem mistérios das poeiras do mundo. Os leitores, ao contrário, seriam seres em permanente busca de sentidos e saberes, já que reconhecem a linguagem como possibilidade e precariedade, como presença e ausência ao mesmo tempo, ambigüidade irredutível face aos objetos que nomeia (PERROTTI, 1999, p. 87).

Parece-nos que as leituras de textos na escola têm assumido o caráter utilitário da leitura como fonte de aprendizagem, no entanto, a função de despertar o prazer, apontada entre as três funções de maior valoração no GP e GA confronta-se com as percentagens apresentadas: gostar sempre: 5% (GP) 7% (GA); gostar raramente: 5% (GP) 7% (GA); gostar nunca; 5% (GA).

Concordamos com Azevedo (2007) quando coloca a leitura como um processo construtivo demorado que exige trabalho, treino e capacitação. A esse treino, ininterruptamente, devem se submeter alunos e professores, mas o papel mediador tão fundamental, este é, ainda, função do professor.

Ousar e experienciar uma nova concepção de leitura pode ser o início de uma mudança. Não basta saber, é preciso permitir que o que sabemos nos modifique, nos transforme. Nenhum participante insinuou que a leitura não seja importante, mas apenas conceber a leitura como instrumento valioso sem o qual o trabalho não tem sentido não basta. É preciso conceber a leitura como possibilidade de formação e transformação, como nos lembra Jorge Larrosa (2002, p. 136)

para que a leitura se resolva em formação é necessário que haja uma relação íntima entre o texto e a subjetividade. E se poderia pensar essa relação como uma experiência, ainda que entendo experiência de um modo particular. [...] Vemos o mundo passar diante de nossos olhos e permanecemos exteriores, alheios, impassíveis. Consumimos livros e obras de arte, mas sempre como espectadores ou tratando de conseguir uma satisfação transcendental e instantânea. “Sabemos muitas coisas, mas nós mesmos não mudamos com o que sabemos”. [....] Pensar a leitura como formação supõe cancelar essa fronteira entre o que sabemos e o que somos, entre o que passa (e que podemos conhecer) e o que

nos passa (como algo que devemos atribuir um sentido em relação a

nós mesmos (LARROSA, 2002, p. 136. Grifo nosso).

Romper com paradigmas é um processo doloroso, mesmo quando as mudanças são para melhor. Por isso, ‘repensar’ a leitura na escola e colocá-la como a via pela qual todos devem caminhar não extingue, por completo, dificuldades pontuais.