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LOCALIDADE MUNICÍPIO

1ª MA JAN/85 FAZ. CAPOEMA SANTA LUZIA 2ª PE AGO/85 FAZ. CALDERÃO PEDRA 3ª SE 198529 FAZ. BARRA DA ONÇA POÇO REDONDO 4ª AL JAN/87 FAZ. PEBA DELMIRO GOUVEIA 5ª BA MAI/87 ÁREA DA V. DO RIO DOCE ALCOBAÇA30

6ª PB ABR/89 FAZ. SAPUCAIA BANANEIRAS 7ª CE MAI/89 FAZ. REUNIDAS S. JOAQUIM QUIXERAMOBIM

8ª PI JUN/89 FAZ. MARRECAS S. JOÃO DO PIAUÍ 9ª RN OUT/89 FAZ. BOM FUTURO CAMPO GRANDE Adaptado de Fernandes, 2000: p. 97-125.

Algumas destas investidas iniciais não chegaram a se consolidar, ou seja, não levaram a conquista da terra. Entretanto, em nenhum dos casos isto causou a desistência da luta e, a partir da articulação e da unidade gerada pelas primeiras ocupações realizadas em cada estado, desencadeou-se o processo de espacialização e de territorialização do MST no Nordeste. Nesta construção histórica o MST se deparou com um espaço que lhe impôs/impõe limitações e exigiu dele – enquanto movimento social - adaptações que possibilitasse desenvolver em cada estado sua história e dinâmicas com contornos próprios e específicos.

A configuração do MST no Nordeste é produto da acumulação de suas ações de territorialização nos diversos estados da Região e uma conseqüência de seu processo de espacialização. Sendo ele – o MST – definido como um movimento social camponês do Brasil, ele carrega em si a espacialidade camponesa mediada pela realidade da unidade política e histórica nacional. Como resultado de sua história e modo de desenvolvimento, o MST representa um grande número de assentamentos a ele atrelados ou por ele representados politicamente. Os dados a seguir foram adquiridos

28 Em Fernandes (2000) as informações não estão colocadas na ordem cronológica que aqui

apresentamos.

29 Fernandes (2000), não informa o mês exato em que fora realizada esta ocupação. 30 Antigo município do Prado.

em consulta junto aos dirigentes e secretarias estaduais do Movimento nos nove estados do Nordeste. O critério de definição como pertencente ao Movimento refere-se à representação política realizada por parte do MST, junto aos órgãos de representação e gestão do Estado31. O número de áreas e sua distribuição por estado é o seguinte:

Quadro 2 – Número de assentamentos e de famílias ligadas ao MST por estado nordestino. ESTADO N° DE MUNICÍPIOS COM PRESENÇA DO MST % N° DE ASSENTAMENTOS FAMÍLIAS N° DE Alagoas 18 6,2 39 2.365 Bahia 47 16,3 105 7.624 Maranhão 26 9,0 42 4.953 Paraíba 27 9,3 48 2.897 Piauí 11 3,8 26 2.507 Ceará 42 14,5 162 1.577 Pernambuco 68 23,5 178 11.597 Rio Grande do Norte 09 3,1 18 1.502 Sergipe 41 14,2 151 7.742 TOTAL DO NORDESTE 289 100,0 769 42764

Fonte: Direções e secretarias estaduais do MST-NE, 2007.

Como podemos perceber no Quadro 2, o estado de Pernambuco é o que possui maior número de assentamentos e de famílias assentadas ligadas ao MST, seguido pelos estados do Ceará, de Sergipe e da Bahia. Estes quatro estados concentram 77,5% do total de assentamentos ligados ao MST no Nordeste (v. quadro2 e gráfico 2).

31 Entendemos por pertencentes ao MST, os assentamentos em que as direções das associações e/ou

cooperativas realizam em conjunto com o Movimento as negociações relativas e direcionadas aos órgãos governamentais (Incra, governos e secretarias municipais, estaduais, etc.). Nessa relação o MST passa a realizar o papel de representante público-institucional das demandas e reivindicações dos assentados em sua unidade espacial: o assentamento. A definição depende bastante, evidentemente, da percepção dos dirigentes e direções estaduais do próprio MST.

Gráfico 2

Já no que diz respeito à distribuição das famílias, o Ceará perde posição, enquanto o Maranhão ganha maior destaque. Mas ainda aqui, Pernambuco reafirma sua posição hegemônica na distribuição dos assentamentos no Nordeste concentrando 26% das famílias ligadas ao MST. O bloco formado por Pernambuco, Sergipe e Bahia corresponde a 63,1% das famílias que vivem em assentamentos ligados ao MST na região (v. gráfico 3).

Gráfico 3

Fonte: Direções e secretarias estaduais no MST-NE, 2007.

Evidentemente esses dados são uma aproximação. Para considerá-los devemos ter em conta duas questões. A primeira é derivada da técnica utilizada para coletar as informações. Os dados apresentados, como afirmado anteriormente, foram adquiridos junto aos dirigentes e secretarias estaduais do próprio Movimento. Desta forma as informações podem estar distorcidas pela própria fonte dos dados, de um lado porque a informação está baseada no entendimento que os dirigentes e militantes possuem da realidade que participam32 (posto que para o MST são os dirigentes a fonte de informação), de outro pela própria capacidade do MST enquanto organização em manter um sistema de controle interno, que represente a realidade. Deve-se também levar em consideração que a realidade examinada – sendo parte da realidade social – é bastante dinâmica e em conseqüência não é possível ter exata mensuração, principalmente no que diz respeito ao número de famílias participantes. As dificuldades maiores que encontramos na mensuração estão ligadas aos estados onde o Movimento possui maior vulto.

Esses dados, na forma como estão colocados, pouco significam para uma análise propriamente geográfica. Visto que a geografia procura o elemento espacial como

32 Lembremos que a opinião dos dirigentes e militantes e a informações oriundas das respectivas

secretarias estaduais foram balizadas pelo critério de representatividade por parte do Movimento em relação aos órgãos de gestão e administração pública.

instrumento de reflexão que possibilita o conhecimento, é preciso verificar como estes dados expressam a realidade social, estabelecendo posteriormente um processo de reconstituição que possibilite o entendimento da forma própria pela qual o movimento da realidade produz/produziu tal configuração espacial. A diferenciação entre a simples

distribuição dos assentamentos e sua configuração espacial, revela neste caso a

episteme geográfica como forma de investigação sobre a realidade. Após a identificação e delimitação do objeto, é preciso construir abstratamente um sistema sustentado por categorias que permita o ‘desmonte’ desta realidade.

O posicionamento aparentemente fortuito dos assentamentos é, na verdade, o produto de uma lógica de produção que envolve um conjunto de determinantes que podem ser identificados e explicados a partir da totalidade da realidade social. Os determinantes são, neste caso, uma expressão aparente de um instante da história da realidade social em seu movimento de produção e reprodução. A conjunção de certo número de determinantes é o que possibilita identificar a tendência (ou as tendências) presentes no movimento da realidade. Mas o valor e significado atribuído a cada variável são dados pelo método de interpretação escolhido.

A ‘decomposição’ da realidade pode se iniciar assim, para o geógrafo, pela localização e delimitação de seu objeto de pesquisa. Vejamos então a seguir a configuração espacial do MST no Nordeste para em seguida delimitarmos de início alguns aspectos da ação do agente formador:

FIGURA 1:

Para esboçar uma explicação desta configuração espacial, caracterizemos de início o comportamento espacial do MST. Como agente imediato da produção desta configuração, o MST é base fundamental para a interpretação e o abordamos a partir dos conceitos de espacialização e territorialização.

A espacialização do MST se produz – sendo ele um movimento social camponês – como expressão política da espacialidade camponesa. Mas o que é afinal uma espacialidade? Como definido anteriormente, na forma como utilizamos aqui,

espacialidade quase que equivale ao que na sociologia entende-se como identidade social, o que equivale à representação sócio-espacial cristalizada por uma classe ou

fração de classe na superfície fenomenológica da atividade social. A essa representação cristalizada corresponde determinada posição que o agrupamento social ocupa na estrutura de reprodução da sociedade.

Pensando a partir de Marx, diríamos que a base fundamental da formação de uma espacialidade, ou sua condição última, é sua forma de participação, sua forma de ‘encaixe’ nas relações básicas de produção da vida social, ou seja, dito de forma mais direta, a espacialidade em última instância, é um reflexo da formação/participação de tal segmento/agrupamento/classe no modo de produção que sustenta a sociedade da qual determinada espacialidade é parte. Desta forma, o MST, definido como movimento social camponês ou de base camponesa, por existir em uma sociedade dominada pelo modo de produção capitalista, é produto do movimento de reprodução do capital. Como derivado, interpreta-se que o conjunto de objetos e ações que ora examinamos, é a expressão empírica deste movimento de reprodução da sociedade brasileira, que acontece/aconteceu hegemonizado pelo modo de produção capitalista, do qual os camponeses – conforme explicado no ponto ‘2’ desse trabalho – são parte.

Mas esse conjunto de relações de produção é apenas reconhecível através da forma histórico-concreta na qual toma corpo. Esta forma é, por sua vez, imbricada pelo complexo processo de desenvolvimento que envolve de um lado as relações de produção e de outro, o conjunto superestrutural expresso pelas relações políticas e ideológicas herdadas e resignificadas na totalidade social. Neste sentido é particularmente importante a análise da forma histórico-concreta que toma o fenômeno, posto que tratamos aqui não apenas de campesinato, mas e ao mesmo tempo, do

campesinato em uma forma histórica de organização política e ideológica específica: o MST33.

Como visto anteriormente, o MST se espacializa a partir da ocupação. Mas a ocupação acontece apenas como o resultado da reorganização de um conjunto de condições formadoras de uma espacialidade pré-existente na sociedade. O MST não cria tal espacialidade, ele apenas produz as condições organizacionais (condições subjetivas) para que a espacialidade camponesa se efetive no espaço, isto é, para que o que existia como latência, como potencialidade na sociedade, se torne concreção. O MST se ergue desta forma, sobre um conjunto de condições que se estabeleceu em um momento anterior a sua própria existência, oferecendo as condições para que esta classe social (ou fração de classe) se expresse politicamente. Assim sendo, a ocupação é acima de tudo um ato político34.

A espacialidade camponesa formada que é sobre um conjunto de condições que envolvem determinada forma de participação no conjunto produtivo social, dialeticamente imbricada pelas formas histórico-concretas de desenvolvimento ideológico-político de dado período, carrega consigo essa dualidade: De um lado, permanece intimamente ligada a terra enquanto símbolo de seu mecanismo de participação na atividade produtiva da sociedade; por outro lado, mantém determinado conjunto superestrutural, que regula e possibilita a reprodução de sua vida social.

Visto desta forma, o campesinato que tentamos compreender neste momento, é um híbrido de elementos antigos e renovados. Antigos, pois foram produzidos em um momento anterior ao da ação de espacialização que é realizada através do MST; renovados, pois tomam novo sentido, na resignificação dada pelo movimento da totalidade social. Veja-se que o mesmo sujeito que serviu outrora como instrumento de sustentação e manutenção da propriedade como uma extensão da forma de reprodução do latifundiário, tenta agora destruí-la. Parte das instituições que realizavam o papel de naturalizar a exploração, servem à expressão e a legitimação da luta camponesa (GAIGER, 1987).

33 Nesta perspectiva a compreensão aqui colocada sobre o MST se aproxima de algumas abordagens

neomarxistas. Cf. Gonh, 2004. Em especial o capítulo V “O Paradigma Marxista na Análise dos Movimentos Sociais” (p. 171 -210).

34 Infelizmente pelos limites impostos ao presente trabalho não é possível realizar uma ampla discussão

sobre o papel do MST como movimento social. Reconhecemos aqui, no entanto, essa lacuna e a necessidade da reflexão acerca desse assunto. Para um apanhado geral das teorias sobre os movimentos sociais, ver Gonh, (Ibidem).

A espacialidade camponesa historicamente reelaborada como surge no MST, utiliza como caminho de resistência uma forma de rompimento radical não apenas com a espacialidade, mas também com a territorialidade hegemônica da sociedade brasileira. A ocupação de terra expressa, como ato político-simbólico, esse rompimento do grupo em relação à ordem social vigente. Estes trabalhadores nada têm a perder, a não ser seus grilhões (MARX & ENGELS, 1953). Mas, desde a existência de uma formação social regulada pelo Estado-Nação, esse movimento só se torna possível através da mediação das diversas classes sociais em luta ou, diga-se, da ação realizada no campo de forças político das classes sociais através da disputa da hegemonia ideológico-cultural na unidade nacional.

Ao mesmo tempo, a efetivação desta espacialidade, ou sua espacialização resignificada, defronta-se com sua condição antitética, que por sua vez se expressa no conflito irreconciliável entre a ordem hegemônica de apropriação da terra – plasmada na propriedade mercantil da terra – e a própria espacialidade dela decorrente – a classe proprietária. Esse é um mecanismo – o do conflito extremado desenvolvido com a ocupação - que age com selecionador, na medida em que seus participantes – os participantes do MST - têm que necessariamente revolucionar sua própria identidade, atribuindo novos significados e reelaborando suas práticas. É importante refletir sobre os limites que a institucionalização de certo grupos de símbolos, valores e práticas (como a ocupação) impõe a participação de indivíduos ou grupos camponeses, por força das formas cultural-ideológicas específicas que a diversidade histórico-regional do país produziu.

A territorialização demarca deste modo, um rompimento que só pode ocorrer através de uma complexa trama que envolve de um lado, a participação de uma identidade coletiva ou coletivizada e orientada a partir do conjunto de símbolos, valores e práticas socialmente institucionalizadas pelo MST. Para que isto aconteça é necessário que haja primeiro, a formação da espacialidade camponesa mais geral no conjunto sócio-espacial e que, a partir de determinado movimento da realidade, essa espacialidade seja colocada em situação de confronto. Por outro lado, a disputa que estes camponeses realizam via MST, deve atingir um grau de articulação social que possibilite a realização da luta pela hegemonia ideológico-cultural na sociedade.

Esse duplo movimento implica na reestruturação, reelaboração e revolução do conjunto de instituições que compreendem os mecanismos através dos quais o grupo se reproduz socialmente. Esse movimento extremamente dinâmico se refletirá, por

conseqüência, na estrutura mais geral de reprodução da sociedade tanto no nível das relações de produção, quanto na reelaboração da superestrutura ideológico-política.

Resumidamente, a ocupação é a ação política que possibilita a espacialização do MST. O Movimento por sua vez, é uma representação política de uma classe social. Ao produzir a espacialização dessa classe – que tenderia a ser negada pela dinâmica engendrada pelas forças capitalistas – materializam-se também as condições de sua territorialização35. Com a territorialização, ou seja, com a conquista da terra, a espacialidade camponesa é legitimada pelo Estado e passa a fazer parte do pacto político que sustenta a reprodução social. Desta maneira, o assentamento é também a expressão material da nova relação que se estabelece entre a espacialidade camponesa e as demais classes sociais.

A configuração espacial do MST é produto desta complexa trama espacial que envolve as relações multidirecionais e multidimensionais, formadoras de um ‘feixe’ de forças que se estabelece de forma irregular no espaço, ou seja, sua distribuição sob a superfície da terra depende de como o conflito se materializa a partir do movimento de reprodução capitalista. Os objetos, para a geografia, devem ser interpretados como a expressão do arranjo irregular e conflitivo estabelecido entre a forma de reprodução social e a representação que toma o processo, expresso no conflito de classes sociais pertinentes a cada período.

Pensamos que os assentamentos, como expressão da territorialização do MST, ou a territorialização da espacialidade camponesa, é produzida em contraponto a destruição da territorialidade do capital e, mais especificamente, dos proprietários de terras. Mas esse processo ocorre em uma dialética luta entre as partes diretamente componentes da disputa, mediados pela existência da unidade política nacional expressa pelo Estado36.

Analisando diretamente a configuração espacial do MST no Nordeste, é possível identificar certas tendências expressas sob sua irregular distribuição no espaço regional. De forma geral e grosseira, ainda dotada de pouca precisão, é possível reconhecer

35 Como demonstra Fernandes (2000: p. 300 e 301), as ocupações se constituem na principal forma de

acesso a terra no Brasil pós-ditadura.

36 Poderíamos mesmo levantar as implicações e desdobramentos das ações de agentes internacionais

como a atividade financeira especulativa dos bancos sobre a terra ou a presença de empresas multinacionais ligadas ao agrobusiness em relação a luta pela terra. A atuação desses agentes implica na configuração de uma outra correlação de forças no movimento de espacialização e territorialização do MST.

algumas ‘manchas de concentração’, localizadas de forma mais veementemente reconhecíveis em cinco pontos:

a - oeste do Maranhão área de tradicional atividade camponesa de extração do babaçu na mata dos cocais;

b - oeste da Bahia ou cerrado baiano, área de recente expansão da atividade agrícola capitalista, principalmente com a produção monocultora de soja para o mercado externo;

c - sul da Bahia, área onde historicamente se sedimentou a atividade de produção do cacau. Existe nesta área um amplo estrato de população camponesa;

d - Centro-Norte do Ceará área receptora de migração do interior do estado; e - e uma grande mancha que envolve grande parte das áreas litorânea no sentido Norte – Sul, da Paraíba a Sergipe, alongando-se no sentido Leste - Oeste - no estado de Pernambuco - até o encontro com as áreas limítrofes do estado da Bahia.

Esta última área é a de maior concentração da atividade do MST em todo o Nordeste. É formada pela junção de duas áreas: a zona litorânea dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, fortemente marcada pelo movimento de expansão e retração da atividade canavieira e o médio São Francisco, local onde há algumas décadas vem se intensificando a atividade capitalista de produção fruticultora intensiva para exportação, com o uso de irrigação.

Uma observação mais atenta da configuração espacial do MST no Nordeste (Fig. 1), logo perceberá que o traço comum presente em praticamente todas as áreas de concentração dos assentamentos do MST na região e que as unifica como parte da mesma realidade, é a proximidade de tais áreas aos centros de expansão da acumulação e das relações capitalistas. Verifica-se que tanto as manchas de concentração localizadas no oeste baiano, no Norte do Ceará e principalmente no médio São Francisco e zona litorânea dos estados da Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, são lócus de realização dos processos de acumulação capitalista. O que fica demonstrado pelo mapa a seguir:

FIGURA 2:

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