• Nenhum resultado encontrado

SHF SSF SSCF CBP

2. CAPÍTULO II – CELULASES

2.2. ORGANISMOS CELULOLÍTICOS

As celulases para a hidrólise de materiais lenhocelulósicos podem ser produzidas por bactérias e fungos. Estes microrganismos podem ser aeróbicos ou anaeróbicos, mesofílicos ou

termofílicos. As bactérias pertencentes aos géneros Clostridium, Cellulomonas, Bacillus,

Thermomonospora, Ruminococcus, Bacteriodes, Erwinia, Acetovibrio, Microbispora, e Streptomyces podem produzir celulases [15]. Cellulomonas fimi e Thermomonospora fusca

foram intensivamente estudados para a produção de celulases. Embora muitas bactérias celulolíticas, particularmente anaeróbias, tais como Clostridium thermocellum e Bacteroides

cellulosolvens, produzam celulases com actividade específica elevada, estas não produzem

quantidades de enzimas elevadas [16]. Dado que os microrganismos anaeróbios têm uma taxa de crescimento muito baixa e requerem condições de crescimento em anaerobiose, a maioria da produção de celulases comerciais incidiu sobre os fungos [16]. São diversos os fungos referidos como produtores de celulases, incluindo Sclerotium rolfsii, Phanerochete

chrysosporium e espécies de Trichoderma, Aspergillus, Schizophyllum e Penicillium [16].

De todos estes géneros, correntemente, a maioria das celulases comerciais (incluindo β- glucosidase) são produzidas por espécies de Trichoderma e Aspergillus [37], [38]. De entre os

diversos microrganismos capazes de produção de celulases, Trichoderma reesei produz um sistema enzimático de celulases extracelular, estável e eficiente [39].

2.2.1. O

FUNGO

T

RICHODERMA REESEI

O Trichoderma reesei é um fungo mesofílico, filamentoso, sendo um dos mais poderosos secretores de proteínas extracelulares, usado industrialmente para a produção de várias proteínas homólogas e heterólogas [40]. Este é um eficiente produtor de celulases e xilanases. O T. reesei foi isolado, quando no Pacífico Sul durante a Segunda Guerra Mundial, um fungo degradou algodão, roupas e tendas.

O T. reesei isolado originalmente (estirpe selvagem, QM6a) produz um sistema celulolítico completo extracelular, no entanto, tem como desvantagem a sua susceptibilidade a repressão catabólica na síntese de celulases e a baixa eficácia das celulases devido à sua baixa actividade específica [16]. Com o objectivo de melhorar quer produção de celulases, actividade específica e capacidade de produção de celulases em substratos solúveis, foram produzidas diversas estirpes mutantes, por mutagénese aleatória, as quais possuíam um ou mais destes atributos (figura 2.1) [16].

Figura 2.1 - Desenvolvimento de estirpes a partir do Trichoderma reesei QM6a

Uma das estirpes desenvolvidas foi o T. reesei Rut C-30, que é uma estirpe mutante largamente estudada, parcialmente desreprimida catabolicamente, hiperprodutora de celulases, quando comparada com outras estirpes e com a estirpe nativa [41], [42]. Embora esta seja

capaz de produzir celulases em elevadas concentrações e rendimentos, a mistura de enzimas secretadas é desequilibrada considerando a razão de β-glucosidase/celulase [42].

O T. reesei não produz normalmente celulases durante o seu crescimento em meio contendo glucose. No entanto, foi demonstrado que a produção de celulases no T. reesei Rut C30 não é sensível a repressão pela glucose dado que comporta uma forma mutante do gene cre1, que normalmente transmite a repressão pela glucose [43].

A capacidade de produzir um complexo celulolítico completo enquanto crescendo num substrato solúvel, açúcar metabolizável, também foi conseguido com esta estirpe, sendo que o

T. reesei Rut C30 produz este complexo em lactose como única fonte de carbono [16]. O

desenvolvimento de estirpes, capazes de produção de celulases em lactose, resolveu os problemas de transferência de massa associados aos substratos celulósicos sólidos. A lactose tem ainda a vantagem de ser um substrato solúvel, barato e que pode ser esterilizado, vantagens que podem facilitar o desenvolvimento de processos contínuos de produção de celulases [16].

As celulases do fungo aeróbio Trichoderma reesei têm sido foco de investigação ao longo dos últimos 50 anos e são as celulases que vulgarmente mais se usam na produção de bioetanol em escala laboratorial e piloto [19].

2.3. CELULASES

As celulases são o grupo de enzimas hidrolíticas capazes de hidrolisar celulose insolúvel a glucose. Estas são produzidas, normalmente, como um sistema de celulases constituído por diversas e distintas enzimas [44].

Os componentes dos sistemas de celulases foram primeiro classificados baseando-se no modo da sua acção catalítica e foram mais recentemente classificados com base nas suas propriedades estruturais [45]. Existem três tipos de enzimas que são tradicionalmente incluídas no sistema de celulases: (i) endoglucanases (endo-1,4-β-glucanases ou 1,4-β−D-glucano-4- glucanohidrolases, EC 3.2.1.4), (ii) celobiohidrolases ou exoglucanases (exo-1,4-β-glucanases ou 1,4-β-glucano celobiohidrolases, EC 3.2.1.91), e (iii) celobiases (β-glucosidases ou β-D- glucosídeo glucohidrolases, EC 3.2.1.21) [44], [31].

O T. reesei produz um complexo celulolítico que consiste de diversas celulases que agem sinergeticamente. Até ao momento foram identificadas pelo menos duas celobiohidrolases (CBHI e II), seis endoglucanases (EGI a VI), 2 β-glucosidases e hemicelulases. Destas a CBHI, CBHII e EGII são os três principais componentes do sistema de celulases do T. reesei, representando 60±5%, 20±6% e 12±3% do total de celulases, respectivamente [27], [46], [31], [40].

As endoglucanases (EG) podem hidrolisar aleatoriamente ligações internas da cadeia polissacarídea de celulose em locais internos amorfos, produzindo oligossacarídeos de diversos comprimentos, libertando novas extremidades terminais. As celobiohidrolases (CBH) agem de modo progressivo nas extremidades redutoras (CBHI) e não redutoras (CBHII) da cadeia polissacarídea de celulose, extremidades das cadeias existentes ou geradas pelas endoglucanases, libertando celobiose [30], [35], [47], [48]. Ambas enzimas podem degradar celulose amorfa mas, com algumas excepções, as CBHs são as únicas enzimas que degradam eficientemente a celulose cristalina. As CBHs e EGs podem libertar moléculas de celobiose. Uma hidrólise efectiva da celulose também requer β-glucosidases, que são somente activas sobre celo-oligossacarídeos e celobiose, e libertam unidades monoméricas de glucose a partir de celobiose (Figura 2.2). As celulases distinguem-se de outras hidrolases de glicosídeo pela sua habilidade para hidrolisar ligações β-1,4-glicosidicas entre resíduos glicosílicos [49], [31], [30], [35].

Figura 2.2 - Degradação enzimática de celulose a glucose. A CBHI Celobiohidrolase I actua nas

extremidades redutoras; CBHII Celobiohidrolase II actua nas extremidades não redutoras; EG endoglucanases hidrolisam ligações internas. β-G β-Glucosidase cliva o dissacárido celobiose a glucose (adaptado de [30])

Enzimas celulolíticas isoladas a partir de diversas fontes diferem nas suas características moleculares (peso molecular, composição em aminoácidos, e sequência, ponto isoeléctrico, conteúdo em carbohidratos), adsorção à celulose, actividade catalítica, e especificidade ao substrato [44].

Todas as celulases de T. reesei, excepto a EGIII, tal como muitas outras celulases de outros microrganismos têm uma estrutura de dois domínios consistindo num domínio catalítico (CD -

catalitic domain) e um domínio de ligação à celulose (CBD - cellulose binding domain), que se

encontram ligados entre si por um ligante flexível (figura 2.3) [50]. O domínio de ligação à celulose interage com a celulose ligando a enzima a esta. Os CBDs são particularmente importantes na hidrólise da celulose cristalina, tendo-se demonstrado que a capacidade das celobiohidrolases para degradar celulose cristalina diminui quando o CBD está ausente [51]. O efeito do CBD na acção de endoglucanase, EGI e EGII, e celobiohidrolases, CBHI e CBHII de

T. reesei demonstrou ser dependente do substrato [52]. No entanto, o papel e mecanismo

exacto de acção dos CBDs é ainda matéria de especulação.

Figura 2.3 - Representação esquemática da organização dos domínios nas enzimas celulolíticas. CBD-

domínio de ligação à celulose, CD- domínio catalítico (adaptado de [51])

2.3.1. M

ODO DE ACÇÃO DAS CELULASES

O sinergismo entre os componentes individuais de um sistema de celulases, isto é, a acção de uma mistura de dois ou mais componentes celulolíticos individuais é superior à soma da acção de cada componente, agindo sobre celulose insolúvel adiciona ainda mais complexicidade ao estudo dos mecanismos da acção das celulases. A principal dificuldade no estudo deste fenómeno é que o efeito sinergético varia dependendo das formas múltiplas de componentes celulolíticos usados no estudo, na fonte de celulases, e na amostra de celulose usadas no ensaio [44].

Existem duas classes de sinergismo em mistura de celulases: sinergismo entre endoglucanases e exoglucanases, e sinergismo entre certas exoglucanases [48].

Ambas as celobiohidrolases (CBHI e CBHII) são muito lentas na diminuição do grau de polimerização da celulose, sendo que as endoglucanases são consideradas como responsáveis pela diminuição do grau de polimerização por clivagem interna das cadeias de celulose em regiões relativamente amorfas, gerando novas extremidades das cadeias de celulose susceptíveis à actuação das celobiohidrolases [31]. Assim sendo, a degradação da celulose cristalina requer uma acção sinergética de ambas endoglucanases e exoglucanases, as exoglucanases removem rapidamente as unidades de celobiose a partir das extremidades recentemente formadas pela acção de endoglucanases, assim, prevenindo a re-formação de ligações glicosídicas. As duas enzimas podem agir consecutivamente ou em concertação [53]. A necessidade de seis tipos de endoglucanases no sistema celulolítico de Trichoderma reesei ainda não foi esclarecida, não se tendo demonstrado claramente sinergismo entre endoglucanases [31].

Documentos relacionados